Karoline Menacho Lima Bach*
Sobre
a política externa é comum o enfoque na figura do Estado como única autoridade
a ter legitimidade para firmar acordos e tratados, ou seja, como único ator
central no cenário internacional. Mas é no pós Segunda Guerra Mundial que a
paradiplomacia surge nos Estados industrializados (Salomón, p.269) como uma
ferramenta para estabelecer vínculos entre diferentes regiões, e como uma forma
de flexibilizar e agilizar a diplomacia, agregando um novo nível nas relações
internacionais.
Ou
seja, a paradiplomacia caracteriza-se pelo envolvimento de agentes subnacionais
na política externa, podendo ser tanto em firmamento de acordos e tratados,
quanto em relações não jurídicas, como em relações econômicas, intercâmbio
cultural e educação, influenciando cada vez mais em decisões políticas, sociais
e econômicas no mundo.
Nesse
sentido, desenvolvem-se as cidades irmãs, ou seja, cidades que possuem características
em comum e estabelecem laços de cooperação. Em 1944, duas cidades devastadas
pela guerra, Coventry e Stalingrado estabeleceram as primeiras relações como
cidades irmãs, em uma tentativa de se reerguerem em meio ao caos. Nos dias de
hoje, Coventry conta com 26 cidades irmãs.
Apesar
das relações paradiplomáticas terem sido reconhecidas em 1944, foi apenas no
final da década de 1970 e início de 1980 graças aos debates acadêmicos acerca
do “novo federalismo”[1], que
o termo “paradiplomacia” é construído, elaborado pelo acadêmico Panayotis
Soldato (1990) e Ivo Duchacek (1990), que a definem como uma “atividade
diplomática desenvolvida entre entidades políticas não centrais situadas em
diferentes Estados”. (DUCHACEK; SOLDATO, 1990)
Outro
conceito que pode-se citar é
dado por Noé Cornago Prieto (p. 58 apud Castelo
Branco, 2011), que ensina:
A paradiplomacia pode ser definida
como o envolvimento de governo subnacional nas relações internacionais, por
meio do estabelecimento de contatos, formais e informais, permanentes ou
provisórios (ad hoc), com entidades
estrangeiras públicas ou privadas, objetivando promover resultados
socioeconômicos ou políticos, bem como qualquer outra dimensão externa de sua
própria competência constitucional. Embora bastante contestado, o conceito de
paradiplomacia não impossibilita a existência de outras formas de participação
subnacional no processo de política externa, mais diretamente ligado ao
departamento de relações exteriores de governos centrais, como a assim chamada
diplomacia federativa, tampouco impede o papel cada vez maior dos governos
subnacionais nas estruturas de multicamadas para a governança regional ou
mundial.
Nesse contexto, pode-se citar a cidade
de Curitiba, no Paraná. Em 1976, a Câmara Municipal de Curitiba sancionou a lei
Nº 4740/1973[2],
com o intuito de honrar cidades estrangeiras com o título de cidade irmã do
município. Nesta lei, constam os artigos:
Art. 1º É instituído o Título
Honorífico de CIDADE IRMÃ DE CURITIBA, com a qual a Capital do Estado Paraná,
agraciará Cidades estrangeiras que se identifiquem no ideal de humanismo,
cultura, civismo e outras características.
Parágrafo Único. Somente Cidades
pertencentes a nações que mantenham relações diplomáticas com o Brasil, poderão
fazer jus ao Título de que trata a presente Lei.
Curitiba também inaugurou em 2005 sua
própria Secretaria de Relações Internacionais e Protocolo (Salomón, p.183), com
o intuito de promover o diálogo com cidades internacionais, visando parcerias
tecnológicas, educacionais, etc. Além desses aparatos formulados pelo Município
para atuar no âmbito externo, a cidade conta com inúmeros atrativos que fazem
crescer o interesse de outras cidades e países pela região.
Entre esses atrativos, pode-se citar a
consciência sustentável de Curitiba. Com uma série de medidas para proteger o
meio ambiente, como a coleta do lixo reciclável, o sistema de deposição dos
resíduos no Aterro Sanitário da Caximba, e a separação do lixo doméstico, a
cidade se destacou no âmbito internacional, com a vitória dos prêmios United
Nations Environment Program (Unep), recebendo a atenção da ONU em 1990, e o
Globe Award Sustainable City em 2010, por cidade mais sustentável do mundo.
Além disso, foi considerada a cidade mais sustentável da América Latina em
relatório de pesquisa da Siemens em 2015, destacando-se pela qualidade do ar,
reuso de resíduos e mobilidade urbana.
Neste quesito de mobilidade urbana, a
cidade investe em meios de transporte alternativos para a população, como
aplicativos que disponibilizam bicicletas e patinetes para aluguel. Além disso,
conta com ciclovias e sinalização para a segurança de quem opta por estes
meios, incentivando a população a utilizar meios mais ecológicos de transporte.
A educação é, também, um ponto forte da
cidade. Contando com 30 instituições de ensino superior, oferecendo 122 cursos.
O intercâmbio de estudantes com países estrangeiros é bastante praticado, tanto
no recebimento quanto no envio destes, com oferecimento de bolsas ou suportes
para os intercambistas.
Com todas essas medidas, Curitiba conta hoje
com 18 cidades irmãs. Entre elas, o foco deste artigo é a relação com a cidade
de Suwon, na Coréia do Sul, que é a capital e maior cidade da província de
Gyeonggi, e se encontra a cerca de 30 km de Seul. É a única cidade murada da
região, contando com grande peso histórico, por suas muralhas chamadas de
Fortaleza Hwaseong, construídas em 1796. Hoje, a Fortaleza é reconhecida como
Patrimônio Cultural da UNESCO.
A cidade oferece uma mistura de tradição
e modernidade, contando com mais de um milhão de habitantes. É marcada por
atividades comerciais dinâmicas, com 972 empresas, e educacionais, contando com
14 universidades, segundo dados de 2013. Atualmente, é considerada um centro de
pesquisa e desenvolvimento tecnológico, com uma economia baseada em empresas
focadas em TI, biotecnologia e nanotecnologia. Oferece, inclusive, incentivo e
infraestrutura para que empresas se estabeleçam na cidade.
Em 2006, Suwon começou a estabelecer relações
com Curitiba, fazendo visitas a cidade paranaense. No mesmo ano, foi firmado o
Protocolo De Cidades Irmãs, assinado pelos presidentes de ambas as cidades,
sendo na época Carlos Alberto Richa (Curitiba) e Yong-Seo Kim (Suwon). Após a
comitiva de Suwon se estabelecer na cidade, com vereadores e autoridades
acompanhando Yong-Seo, estes realizaram visitas ao Instituto de Pesquisa e
Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) e os seus principais pontos turísticos.
O protocolo estabelecia as primeiras bases
para uma relação oficial, que foi firmada com a Lei Nº 13.155[3],
entregando o título de cidade irmã de Curitiba para Suwon em 23 de abril de
2009. Essa nova parceria estabelecia uma troca de experiências em várias áreas,
como na econômica, cultural, ambiental, transporte, turismo e urbanismo,
focando na área tecnológica, um ponto forte de Suwon e base para a relação. Não
se esquecendo da educação, formando assim um intercâmbio sólido de informações
entre as cidades, sempre levando em consideração as culturas e costumes de cada
um.
Desde então, o relacionamento só
prosperou. Visitas de comitivas de Suwon para conhecer aspectos importantes da
cidade paranaense se tornaram comuns, como em 2012, que a pauta principal da
visita foram os programas curitibanos nas áreas de transporte, urbanismo e meio
ambiente, uma pauta de grande importância para a cidade coreana, que a levou em
grande consideração ao firmar relações com Curitiba. Em 2013, Suwon organizou e
implementou o primeiro festival mundial de Ecomobilidade. O festival visava uma
implementação da mobilidade sustentável na vida da população, ou seja, um
transporte sustentável, eficiente e seguro, para efetivá-la, o prefeito Yeom
Tae-Young depois de um rigoroso planejamento, foi proposto que a população passasse
um mês sem a utilização de automóveis, se locomovendo apenas a pé, com
bicicletas ou transporte público.
Com todas essas medidas, pode-se dizer
que as cidades conseguem estabelecer laços fortes, compartilhando objetivos e
agindo em prol de sua população. Atualmente, o maior serviço trocado entre as
cidades, além da área ecológica, é a tecnológica, com um grande intercâmbio de
serviços industriais e a fabricação de automóveis.
A relação entre estas duas cidades irmãs
pode ser considerada um exemplo forte da paradiplomacia, onde princípios e
ideais andam de mãos dados, visando o crescimento de ambas, respeitando e
aceitando igualmente as suas diferenças.
REFERÊNCIAS:
CASTELO BRANCO, Álvaro Chagas. Paradiplomacia
& Entes Não-Centrais no Cenário Internacional. Curitiba: Juruá, 2011.
SALOMÓN, Mónica. A dimensão subnacional da
política externa brasileira: determinantes, conteúdos e perspectivas. In:
PINHEIRO, Letícia; MILANI, Carlos R. S. (orgs.) Política Externa brasileira:
as práticas da política e a política das práticas. Rio de Janeiro: Editora
FGV, 2012, p. 269- 299.
RIBEIRO, MCM. A ação internacional das entidades
subnacionais: teorias e visões sobre a paradiplomacia. In: Globalização e novos
atores: a paradiplomacia das cidades brasileiras [online]. Salvador: EDUFBA,
2009, pp. 33-68. ISBN 978-85-232-1201-8. Disponível em: <http://books.scielo.org/>
SÍTIOS ELETRÔNICOS:
SUWON ECOMOBILITY WORLD FESTIVAL. Disponível em:
<http://suwon.ecomobilityfestival.org/explore/suwon/>
*
Karoline Menacho Lima Bach é estudante
do 7º período do curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA. Este artigo foi apresentado na disciplina de Política
Externa Brasileira, ministrado pela Profa Dra Janiffer T. Gusso Zarpelon, do
curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA.
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