segunda-feira, 18 de maio de 2020

Redação Internacional: o Brasil nas manchetes do mundo na semana de 10/05 a 17/05

   


            Na semana do Dia das Mães, o Brasil chega à marca das 15 mil mortes pela covid-19. Distante da ternura que marca o feriado, são milhares de famílias que, quando não velando seus parentes, têm mais motivos para preocupação do que para celebrar. Com mais de 200 mil casos confirmados (ainda que subnotificados) do coronavírus, o Brasil superou a França, se tornou o 6º país do mundo com maior número de infectados pela pandemia e caminha a passos largos para ultrapassar a Itália - primeiro epicentro da doença fora da China. 

            A popularidade do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vem caindo entre os eleitores brasileiros. Eram, antes da pandemia, 31% que o consideravam ruim ou péssimo. De janeiro para maio, segundo a CNT/MDA, a desaprovação presidencial  subiu 12 e meio pontos percentuais, o mais alto patamar de rejeição que já enfrentou. Perdendo apoio popular e mais um ministro da saúde em meio a uma crise sanitária, Bolsonaro tem manchado a imagem do Brasil na imprensa estrangeira. 
         O jornal The Guardian, que tem prestado bastante atenção nas notícias brasileiras, noticiou a “abrupta e repentina” saída do ministro da saúde Nelson Teich, que havia sido alçado ao cargo há menos de um mês, como uma “agitação” na política nacional. Substituindo o “popular antecessor” Luiz Mandetta (DEM), Teich entrou e saiu rapidamente de um governo em que “falta liderança” e onde há “governança pobre”, segundo o periódico inglês. A matéria repercutiu o que chamou de “constrangimento público”, sofrido pelo médico na segunda-feira (11) durante uma coletiva de imprensa. As divergências entre Bolsonaro e Teich sobre o uso da cloroquina e o isolamento social se evidenciaram incontornáveis quando o executivo anunciou barbearias, salões de beleza e academias de ginástica como serviços essenciais sem consultar a pasta sanitária. Teich, ao saber da decisão presidencial durante a entrevista que concedia, ficou “confuso”.


          Na mesma linha, o La Nacion noticiou que Nelson Teich, inicialmente alinhado com o discurso negacionista de Bolsonaro, estava “na corda bamba” desde que discordou do presidente acerca do tratamento da covid-19 com hidroxicloroquina. A mídia argentina analisa as possibilidades de substituição na cadeira, pleiteada pelo general Eduardo Pazuello e pela oncologista “entusiasta da cloroquina” Nise Yamaguchi, e destaca o tuíte do ex-ministro Mandetta: “oremos”. 


            O El País, na Espanha, trata a saída de Nelson Teich de maneira muito mais política que sanitária. O jornal indica que o governo do Brasil está em “combustão”. Com a crescente da pandemia, as saídas dos populares ministros Mandetta e Moro e as investigações sobre os filhos de Bolsonaro correndo numa instável Polícia Federal, o jornal espanhol classifica a saída de Teich como “azeda” para o Palácio do Planalto.
       Antes da demissão do ministro da saúde, a notícia-bomba da semana era a publicidade da reunião ministerial do dia 22 de abril, estopim para ruptura de Sergio Moro com o governo. O audiovisual do encontro pode ser muito “sensível” ao clã Bolsonaro a ponto de abrir, se autorizado pela Câmara dos Deputados, uma investigação contra o presidente. El País faz uma extensa análise da conjuntura política brasileira, em especial sobre o “fantasma da intervenção militar”. A mídia espanhola repercute artigos e falas do vice-presidente Hamilton Mourão e alerta que há, na visão de parcelas do oficialato e de civis, a possibilidade de insurgência dos quartéis “caso as coisas fiquem feias”. Mourão tem criticado governadores, prefeitos, Congresso e a imprensa, mas “mescla diálogo e narrativa militarista”.
            Outro ministro que perdeu muita força - a ponto de ter sua saída ventilada- nas últimas semanas foi Paulo Guedes, o “Posto Ipiranga” da Economia. Longe dos planos econômicos do governo para enfrentar a crise do coronavírus, Guedes foi preterido por  quadros militares no desenho do projeto de injeção de recursos públicos no Brasil. A presença significativa de generais na Fazenda foi tema da agência de notícias inglesa Reuters,que repercutiu a fala de Robin Brooks. O economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais (IIF) afirmou que há algo no mercado que “desgosta intensamente” do Brasil. Brooks diz isto baseado na saída recorde de investimentos do país em março: foram mais de vinte e dois bilhões de dólares. A disparada do dólar em relação ao real é outro fator que embasa a preocupação do especulador. Mesmo quando comparado com outras economias emergentes, o real segue muito menos cotado e a bolsa brasileira cai mais acentuadamente que em países “rivais”. Para a Reuters, o financismo brasileiro tem sido a “lanterna” entre seus pares. Rejeição do mercado global “nunca antes vista” ao Brasil põe Paulo Guedes, querido dos agentes financeiros, na linha tênue em que caíram Mandetta, Moro e Teich. 

      Além das crises sanitária, política e econômica, o Brasil também foi destaque negativo no âmbito da cultura. E não foi nem pelas desencontradas ações da secretária Regina Duarte - rotineiramente desautorizada pelo Palácio do Planalto - ou suas entrevistas controversas. O The Guardian não mediu palavras para noticiar o “desdém” que o governo brasileiro tem da cultura de seu próprio país. A matéria sobe mais ainda o tom quando diz que, alienado culturalmente, o presidente Bolsonaro tem como livro favorito o escrito por um torturador. O silêncio da secretaria de cultura em relação aos artistas brasileiros mortos recentemente (Rubem Fonseca, Aldir Blanc, Moraes Moreira, Dona Neném e Flávio Magliaccio) só mostra a “repugnância” que o “extremista de direita” nutre pelas artes e pela academia científica.
            Na Alemanha, a Deutsche Welle manchetou os embates entre a Confederação Israelita do Brasil (CONIB) e o governo, que em vídeo institucional da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM), reproduziu a mensagem “o trabalho, a união e a verdade libertarão o Brasil”. A CONIB lembra que a frase “o trabalho liberta” está inscrita no portão do campo de concentração de Auschwitz, “principal fábrica de mortos do nazismo” na Segunda Guerra, e lamenta a banalização de “questões caras ao judaísmo”. Deutsche Welle lembrou que o próprio secretário da SECOM, Fábio Wajngarten, 
é judeu e “abomina esse tipo de ilação canalha” de associar o governo brasileiro ao nazismo.
            Ricardo Sales (NOVO), ministro do meio ambiente, discutiu com o jornalista alemão Phillip Lichterbeck, da DW, em março de 2019. Salles rebatia críticas ao governo Bolsonaro feitas na coluna de Lichterbeck e insinuou que, pelo passado nazista, alemães não teriam moral para criticar outros países. Na pasta de relações exteriores, o ministro Ernesto Araújo comparou as medidas de distanciamento social impostas na pandemia com campos de concentração. O chanceler se viu “instado” a pedir desculpas à comunidade judaica, ressaltou o jornal alemão.
      A Confederação Israelita do Brasil repudiou o uso da bandeira de Israel nas manifestações antidemocráticas incentivadas pelo governo e por apoiadores de Jair Bolsonaro, que se aglomeram em torno de ataques às instituições em plena pandemia da covid-19. A CONIB alerta que a apropriação da estrela de seis pontas pelo bolsonarismo dá a “mensagem errada” sobre o pluralismo de sua comunidade.




         Tendo a sua imagem cada vez mais desgastada na imprensa internacional, o governo Bolsonaro, depois da saída de Nelson Teich, ainda não tem quem represente o país na assembleia mundial da saúde da OMS na segunda-feira (18) – que acontecerá de forma virtual.  Em editorial, o The Lancet, uma das maiores revistas médicas do mundo, citou a “ameaça” que Bolsonaro significa à saúde coletiva e os Médicos Sem Fronteiras se mostraram “chocados" com o desgoverno e com o colapso sanitário brasileiros.
Perdendo popularidade e ministros na mesma velocidade da multiplicação dos casos de coronavírus, deslizando aqui e ali em referências nazistas – acidentais ou não - e  em constante conflito retórico anticientífico de cloroquina contra isolamento social, o governo de Bolsonaro é o retrato de um Brasil que escapa do isolamento social para comemorar o dia das mães, apenas para, na semana seguinte, desampará-las, obrigando-as a enterrar seus filhos sem nem velá-los. 

  
Referências:
APÓS criticar Bolsonaro, revista Lancet reprova ações de Trump na pandemia. UOL, São Paulo, 15 mai. 2020.
BOLSONARO’S silence on artists’ deaths reflects disdain for Brazilian Culture. The Guardian, Rio de Janeiro, 12 mai. 2020.
BRASIL pierde a su segundo ministro de Salud en un mes en plena pandemia. El País, São Paulo, 15 mai. 2020.
BRASIL supera França em número de infectados pelo novo coronavírus, diz universidade. G1, Rio de Janeiro, 13 mai. 2020.
BRAZIL loses second health minister in less than a month as Covid-19 deaths rise. The Guardian, Rio de Janeiro. 15 mai. 2020,
CNT/MDA: avaliação negativa do governo Bolsonaro dispara a 43,4%. UOL, Brasília, 12 mai. 2020.
CONFEDERAÇÃO Israelita repudia mensagem do governo que remete a lema nazista. Deutsche Welle, Brasília 13 mai. 2020.
CORONAVIRUS en Brasil: renunció el ministro de Salud de Bolsonaro a menos de un mes de asumir. La Nación, Rio de Janeiro, 15 mai. 2020.
HÁ algo no mercado que “desgosta” do Brasil, diz economista-chefe do IIF. Reuters, Brasília, 14 mai. 2020.

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