terça-feira, 12 de maio de 2020

"É para o meu TCC": Intolerância religiosa - uma análise sobre os casos europeus e brasileiros

Fonte da imagem: https://conic.org.br/portal/noticias/2943-21-de-janeiro-o-dia-nacional-de-combate-a-intolerancia-religiosa



Isadora Pereira da Fonseca*

O presente artigo tem como objetivo trazer um breve resumo histórico a respeito do antissemitismo e a islamofobia disseminados na Europa, fazendo uma correlação com a discriminação sofrida pelos credos das religiões afro-brasileiras.
O termo “antissemitismo” refere-se a manifestação de ódio contra o povo de origem semita, no entanto está mais vinculado a perseguição sofrida pelos judeus desde a antiguidade. Considerada a religião monoteísta mais antiga do mundo, o judaísmo surgiu no oriente médio há cerca de 3300 anos e originou-se através do patriarca Abraão após o mesmo receber de Deus (denominado Javé ou Jeová) a ordem de buscar pela terra prometida. O princípio do judaísmo é marcado pela ascensão do povo judeu que através de reis como Saúl, Davi e Salomão se tornaram um povo muito influente.
A ruína do Primeiro Templo após a invasão de Jerusalém pelos Babilônios em 587 a.C. e a destruição do Segundo Templo pelas mãos dos romanos no ano 70 d.C. são dois eventos marcantes para a história da aludida religião, pois acabou transformando os judeus em um povo diaspórico, ou seja, estes episódios acarretaram a expulsão e dispersão de seu povo. Ademais, os judeus, ao rejeitarem Jesus Cristo como o Messias e contribuir para sua condenação e morte (como sugere o Novo Testamento), transformaram-se num povo deicida. Por esta razão, a Igreja Católica condenou os judeus a “servidão perpétua”, impedindo-os por exemplo, de ocupar cargos e atuar em diversas áreas profissionais.
Com isso, nasceu o sentimento de insegurança de uma minoria condenada a constantes perseguições. Ao longo de sua história, os judeus conviveram em pequenas comunidades, ocupando diferentes regiões pelo mundo. Eles não possuíam território próprio, mas eram considerados uma nação e conservaram sua identidade através da língua, religião, costumes e hábitos. Isto sem levar em consideração o momento histórico do holocausto, o qual partiu da ideia de que os judeus estariam se aproveitando da desgraça dos alemães, já que lucravam com os juros dos empréstimos de dinheiro.  A 2ª Guerra Mundial resultou na morte de cerca de 5 milhões de judeus. Desde o início do século XXI até os dias atuais, por conta do conflito entre Israel e os palestinos a Europa assiste uma onda de manifestações antissemitas
Não muito distante do supracitado antissemitismo, o termo islamofobia está relacionado ao preconceito, medo ou ódio contra o Islã e consequentemente os muçulmanos. O Islamismo ou simplesmente Islã, segunda maior religião monoteísta do mundo, surgiu no século VII por meio das ações de Maomé, que na história foi intitulado profeta, quando através do anjo Gabriel recebeu a revelação de Allah (que nada mais é do que a palavra Deus em árabe). A partir deste episódio, Maomé passou a receber mensagens que foram passadas a seus seguidores, e mais tarde compiladas em um livro sagrado chamado Alcorão. No entanto, diferente dos judeus, os muçulmanos não desconsideram as mensagens de outros profetas como Jesus Cristo, apenas defendem que Maomé teria sido o último mensageiro de Deus.
Embora tenha significado semelhante ao antissemitismo e em alguns momentos da história do islamismo os fiéis tenham sido perseguidos por conta de suas doutrinas, a islamofobia está muito mais entrelaçada com a política internacional do que propriamente com a fé da maior parte dos muçulmanos.
A partir dos anos 80, os EUA bombardeou e ocupou cerca de 15 países islâmicos, isso sem contar com as mais de 20 bases militares estabelecidas.  Desde o início da década de 90 e principalmente após o atentado de 11 de setembro de 2001 provocado pela Al-Qaeda (grupo de militares fundamentalistas islâmicos), as discussões sobre a islamofobia se intensificaram no mundo. Esses eventos fomentaram uma série de julgamentos e uma generalização arbitrária relacionada ao islã, que foram promovidos a bárbaros, irracionais, inimigos da liberdade e do ocidente. Ainda, a Guerra na Síria iniciada em 2011, apesar de interna, corrobora o choque entre países ocidentais e grupos islâmicos. Essa guerra civil, que perdura até os dias atuais, gerou uma imensa onda de imigração para a Europa, que seria o lugar de mais fácil acesso dos imigrantes, a maioria de origem árabe.
A tentativa de introduzir a cultura ocidental nos países de origem mulçumana suscitou uma dura resposta através da radicalização dos ideais islâmicos: o fundamentalismo, que levou a Al-Qaeda aos ataques e motivou a invasão do Afeganistão e Iraque pelos EUA. Percebe-se então que esse círculo vicioso se alterna entre intolerância e uso da religião para promover atos de violência e incitar guerra.
Observando um outro lado do prisma da intolerância religiosa, o Brasil foi palco de inúmeras perseguições e até tentativas fracassadas de catequização de povos primitivos anos após a sua descoberta. Ao longo da história, houve uma grande miscigenação, consequência da colonização, e isso fez com que o país abrigasse um vasto leque não apenas cultural, mas também religioso.
Os cultos de matriz africana que conhecemos hoje, surgiram a partir do comércio de escravos, provenientes de povos e territórios diferentes (Iorubás, Fon, Bantu, etc) que misturados nas senzalas fizeram surgir o candomblé. Outras práticas são derivadas do sincretismo que se fez presente no Brasil colônia, e começou a se formar no momento em que os católicos deram início à catequização de índios e negros com o propósito de apagar as crenças dos povos escravizados. A Umbanda é fruto desse sincretismo, mas só se iniciou de fato em 1908, quando Zélio Fernandino de Moraes anunciou a criação do novo culto em Niterói, estado do Rio de Janeiro. Essa nova religião se propõe como cem por cento brasileira, pois possui grande influência do kardecismo e do catolicismo vindos da Europa, do culto aos Orixás, oriundo do Candomblé e de ritos de pajelança tipicamente indígenas.
Embora sua grande diversidade, percebe-se pela história que o Brasil se fundou basicamente no cristianismo elitizado, por este motivo vemos ainda hoje uma grande dificuldade na aceitação de outras crenças ainda que a partir de 1890 o Estado já tenha sido declarado laico. As religiões de matriz afro-brasileiras foram por muitos séculos marginalizadas e reprimidas pela legislação, além de serem consideradas juntamente com o protestantismo e judaísmo, heresia e “crime contra a fé” pela Igreja Católica, já que colocavam em risco a prevalência dos dogmas da mesma.
Pouco mais adiante, durante o período do Estado Novo (1937 – 1946), houve atuação da Polícia Civil dentro do processo de repressão às religiões afro-brasileiras, fazendo com que a perseguição a terreiros aumentasse muito. Neste mesmo período umbanda fez um esforço para se consolidar dentro do campo religioso a partir de um discurso de embranquecimento e mestiçagem, com intuito de afastar essa repressão.
Além disso, nas últimas décadas o crescimento dos segmentos evangélicos neopentecostais no Brasil, levando em conta a prosperidade multinacional da igreja Universal do Reino de Deus, a tensão e os casos de intolerância só aumentaram pois seus fiéis passaram a demonizar a Umbanda e o Candomblé, especialmente em bairros periféricos onde os Terreiros seriam concorrentes a serem derrotados neste mercado da fé.
Isso posto, percebemos que a intolerância, isto é, comportamento odioso e agressivo àqueles que possuem diferentes opiniões, esteve sempre presente no decorrer da história da humanidade nas mais diversas culturas, podendo também ser interpretada a partir no conceito freudiano “narcisismo das pequenas diferenças” como um pensamento de que, justamente as diferenças mínimas entre os povos que, de fato são iguais, formam a base dos sentimentos de estranheza e hostilidade.


Bibliografia:       

HILBERG, RAUL. A destruição dos judeus europeus – 2016.

SORJ, Bila. ANTI-SEMITISMO NA EUROPA HOJE. Novembro de 2007.

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NOGUEIRA DOS SANTOS, Robson – A EXPANSÃO DO MUNDO ISLÂMICO PARA A EUROPA – dezembro de 2017.

CESARI, Jocelyn. Muslims In Western Europe After 9/11: Why the term Islamophobia is more a predicament than an explanation – 2006 - GSRL-Paris and Harvard University

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NEVES SILVA, Daniel. Islamismo. Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/religioes/islamismo.htm Acesso em 17/04/2020

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AMARAL TOMÉ DE SOUZA, Fabíola. O pensamento freudiano sobre a intolerância. 2016.
FERNANDES DE OLIVEIRA, Nathália. A repressão policial às religiões de matriz afro-brasileiras no Estado Novo (1937-1945). 2015.

*Isadora é aluna de Relações Internacionais do UNICURITIBA. O artigo acima é parte de sua pesquisa do Trabalho de Conclusão de Curso, orientada pelo Professor Andrew Traumann.






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