Artigo apresentado
na disciplina de Teoria das Relações Internacionais I, ministrado pela Profa
Dra Janiffer Zarpelon, do curso de Relações Internacionais do UNICURITBA. As
visões apresentadas no artigo não representam a opinião da instituição, mas sim
dos seus autores.
*
Amanda Marchiori de Souza Ramos
Kenneth N. Waltz
discorre, em sua obra “Theory of International Politics” acerca da estrutura
política que rege o sistema internacional. Para tanto, ele enxerga estrutura
como um mecanismo no qual os Estados se organizam, ignorando, ou pelo menos
abstraindo-se, das características das partes, dos seus comportamentos e das
suas interações, entendendo que há a necessidade de concentrar a atenção na
posição de uma unidade em relação às outras, ou seja, como estão organizadas ou
posicionadas, proporcionando um caráter estático à estrutura, de maneira que,
“apenas mudanças de disposição são mudanças estruturais”.
A fim de exemplificar
ainda mais o conceito, Waltz traz em sua obra a ideia de que “A preocupação
pela tradição e a cultura, a análise do caráter e a personalidade dos atores
políticos, a ponderação dos processos políticos conflituosos e acomodativos, a
descrição da feitura e execução da política - todos esses assuntos são deixados
de lado (...). São omitidos porque queremos descobrir os efeitos esperados da
estrutura no processo e do processo na estrutura”.
Contudo, não podemos
entender o conceito de estrutura como algo estático, pois ele, por si só não se
mostra como suficiente para acompanhar as mudanças no cenário internacional,
pois, para tanto, é de exímia importância acompanhar, também, a capacidade de
barganha, permuta ou negociação dos Estados abrangendo, dessa forma, um cenário
político e dando relevância como as unidades se relacionam entre si (como
interagem) e não somente como se organizam, dando origem à uma situação de
princípio da interdependência, observando-se uma dinâmica na estrutura, fazendo
com que os processos políticos estejam na base da análise, e não como uma
consequência, entrando em contradição ao que Waltz afirma: “As estruturas
políticas moldam os processos políticos”.
Ainda dentro do conceito
de estrutura, Kenneth Waltz entra no mérito de separá-la em três
características organizacionais, partindo do princípio de anarquia
internacional, uma vez que não há um agente regulador central global, fator
este desencadeador de conflitos, cooperação e sistema de “self-care”. A divisão
é baseada em: Princípios ordenadores, Caráter das unidades e Distribuição das
capacidades.
Incluso nos Princípios
ordenadores, encontram-se duas fontes: a de subordinação e a de coordenação. A
primeira é baseada em um sistema hierárquico, partindo da ideia de que alguns
devem comandar, e outros obedecer, realidade esta vivenciada em políticas
internas dos Estados, ao passo que contam com um governo central da união. Não
obstante, tal estrutura conta com alto grau de diferenciação a partir da
capacidade em que se está inserido, a exemplo da história desenvolvida por
Suzane Collins, Jogos Vorazes, na qual a estrutura do país fictício criado pela
autora, Panem, se mostra com alto grau de diferenciação por entre as partes
regionais, favorecendo ao agravamento do desencanto das regiões, tornando a
estrutura mais propícia à revoltas internas.
O segundo se enquadra no caso de anarquia, o qual rege os sistemas
político-internacionais e tem relação com a cooperação, na qual os Estados, por
serem soberanos, são semelhantes, mas não idênticos. Tal cenário pode ser
relacionado à uma estrutura microeconômica, na qual, mercadores econômicos,
assim como sistemas político internacionais, são formados por cooperações de
partes egoístas, formando e mantendo o princípio em um sistema de auto-ajuda
(self-care), de maneira que os Estados buscam assegurar sua sobrevivência como
objetivo mínimo e perpetuar ou realizar a manutenção de seu status quo como
máximo, reconhecendo que, “na busca de sua segurança nenhum Estado atua com
conhecimento e sabedorias perfeitos”, resultando no posicionamento não
favorável de Waltz perante as ideias de cooperação, de forma que, baseando-se
no ideal de self-care, incertezas externas, falta de confiança e altas
atividades em política interna, enxerga tal integração como insegura, não
recomendável e uma forma de se preocupar mais com políticas externas do que com
as internas, além da constante necessidade de garantias militares advindas de
seu próprio Estado como resultado da insegurança do não conhecimento pleno das
atitudes e intenções das demais unidades.
Contudo, desviando um
pouco das ideias trazidas por Waltz, um Estado contar com um elevado poderio
militar não significa que ofensivas irão se concretizar, pois tais medidas
podem trazer altos custos que as tornam ineficazes para alcançar seus
objetivos, fazer a manutenção dos status quo e, até mesmo, sobreviver,
servindo, muitas vezes, somente como formas de evitar ataques de demais países,
ao passo que pode ser instaurado o medo da resposta.
O caráter da unidades
reflete na determinação de acordo com o princípio de ordenação, ou seja, “a
hierarquia impõe relações de superioridade e subordinação entre as partes de um
sistema”, enquanto “a anarquia impõe relações de coordenação entre as unidades
de um sistema, e isso implica na sua semelhança”, enquadrando um cenário de
constante competição por entre os Estados, que acabam por diminuir sua
produtividade, de forma que, segundo Waltz: “Os Estados são parecidos nas
tarefas que enfrentam, apesar de não o serem nas suas capacidades para as
desempenhar. Os Estados desempenham ou tentam desempenhar tarefas, a maioria
das quais são comuns a todos eles; os fins a que aspiram são similares”.
Contudo, ele entende que, em um sistema de anarquia, as divisões específicas
requisitadas pelo caráter da unidade não é possível, já que os Estados, como
soberanos, são semelhantes.
A última divisão se
enquadra na Distribuição de capacidades, na qual, em um sistema anárquico
internacional, as unidades são distinguidas a partir de suas capacidades para
desempenhar tarefas similares, valendo ressaltar que, segundo Kenneth Waltz, a
estrutura muda quando as distribuições das capacidades variam. Nesse sentido,
quando há muitas unidades e as diferenças entre elas não são muito grandes
(características parecidas no poder militar, comercial e outros), a
competição tende a ser generalizada,
porém, quando somente um número restrito dessas unidades se destaca, favorece a
formação de pólos (potências) no sistema.
Deve-se ressaltar,
contudo, que, dentro da estrutura proposta por Waltz, a dinamicidade mostra-se
ausente, ignorando a situação que, em um cenário de fim de Guerra Fria, à
medida que a bipolarização perde força e a interdependência estatal é um
resultado de novas visões, enquadrando, até mesmo, o enfraquecimento da
descrição e retórica do discurso de “segurança nacional”, surge uma nova
necessidade de legitimar ações e desenvolver capacidades, uma vez que fluxos e
transições interestatais (comerciais, populacionais, bélicas e outras) implicam
em custos e constrangimentos, assim como dizia Keohane e Nye, gerando uma nova
interdependência e uma consequente mobilidade na estrutura política internacional,
não somente dependente das alterações de capacidades estatais.
Waltz segue seu
raciocínio e adentra à ideia de “Ordens anárquicas e balanças de poder”, a qual
reconhece a necessidade dos Estados estarem preparados para usar a força, pois,
caso contrário, estarão à mercê de vizinhos militarmente mais rigorosos,
resultado este de uma situação de guerra que é o estado de natureza do homem
como consequência do estado de anarquia a partir da ausência de um agente para
gerir ou manipular as partes em conflito. Nenhum apelo pode ser feito à uma
entidade superior revestida da autoridade e equipada com a capacidade de agir
segunda a sua própria iniciativa. Situação essa exemplificada quando se
faz diferenciação de uma política
interna da externa: “(...) um governo efetivo tem um monopólio no uso legítimo
da força, e legítimo aqui significa que os agentes políticos estão organizados
para evitar e para conter o uso privado da força. Os cidadãos não precisam se
preparar para se defender. As agências públicas fazem-no. Um sistema político
interno não é um sistema de auto-ajuda, O sistema internacional é.”
Dentro desse cenário de
anarquia, Waltz ainda traz a interdependência como resultado da dependência de
um país em relação ao outro devido à sua especialização em determinado ponto
estratégico para a sobrevivência que ele não tem, de forma que, em um ambiente
anárquico, as unidades semelhantes (que ainda se diferem muito em suas
capacidades) cooperam; contudo, a realidade de um sistema de auto-ajuda faz com
que grande parte dos esforços sejam direcionados à proteção em relação aos
demais, pois permanece o interesse na segurança interna e sobrevivência
enquanto há a falta de confiança para com as outras partes, prejudicando,
assim, o enriquecimento mútuo como resultado de integrações mediante
cooperação.
Seguindo essa linha de
raciocínio, a medida que um Estado se especializa, maior se torna a necessidade
de implementar cooperações devido ao aumento significativo de sua dependência
perante as demais áreas que fogem de sua capacidade e, como resultado dessa
maior interdependência, aos olhos de Waltz,
os Estados estão sujeitos à uma maior vulnerabilidade perante ao sistema
de self-care e a falta de confiança e incertezas no cenário das relações
internacionais.
Portanto, o ideal seria,
num ambiente desorganizado, cada unidade ter a capacidade de tomar conta de si
mesma, pois não pode confiar em mais ninguém para fazê-lo, entrando, dessa
forma em um looping da Teoria dos Jogos, pois, “a busca do interesse próprio
produz resultados coletivos que ninguém quer, contudo, os indivíduos ao
comportarem-se diferentemente irão prejudicar-se sem alterarem as resultantes”.
Um cenário ideal seria de
que o interesse internacional fosse servido, o que significaria na subordinação
das vontades nacionais; contudo, a partir do comportamento racional, cada país
é impelido a cuidar de si mesmo, não podendo, aos seus olhos, tomar conta do
sistema internacional.
Contudo, apesar de o
sistema de anarquia resultar na necessidade do self-care, a perspectiva de um
governo mundial seria um convite para a preparação da guerra civil
generalizada, assim como já mencionado quando citada a obra Jogos Vorazes,
perante a crescente insatisfação das partes, pois, dentro de um sistema global
com o poder centralizado, quanto mais poderosos
forem determinados Estados, maiores as chances deles aparecerem como
ameaças aos outros, resultando na necessidade de um maior controle do governo
central, porém, uma vez intensificada a concentração do poder, mais forte o
incentivo para os Estados se envolverem numa luta pelo seu controle.
Dessa maneira, permanece
o sistema anárquico, no qual, nacionalmente um governo trabalha em nome do
direito e da justiça, porém, internacionalmente, a força de um Estado é
empregue à própria proteção e vantagem, de forma que, o poder e as capacidades
do mais forte é capaz de concretizar sua ações, impedindo o mais fraco de
realizar conclamações, mas não porque o fraco reconhece a legitimidade perante
o governo do mais empoderado, mas simplesmente porque não é sensato envolver-se
com ele, na mesma medida em que o fraco pode gozar de certa liberdade de ações,
pois elas não se mostrarão como ameaças à sobrevivência e manutenção do status
quo do mais forte.
Vale-se ressaltar,
também, que, apesar das incertezas no cenário internacional prejudicarem ações
de cooperação e enriquecimento do sistema internacional, elas acabam, também
por inibir conflitos, pois “a possibilidade constante de que a força será
usada, limita as manipulações, modera as exigências e serve como incentivo para
a resolução das disputas”.
Surgem, então, as
balanças de poder, as quais se mostram como equilíbrio em que se chega entre
dois ou mais Estados a partir da competição da distribuição de recursos que
aumentam a chance de cada Estado de sobreviver no sistema internacional, dentro
desse contexto, elas encaixam-se em duas fases: esforços internos (maneiras de
maximizar as capacidades econômicas, aumentar a
força militar e desenvolver estratégias inteligentes) e esforços
externos (como uma maneira de fortalecer e alargar suas alianças ou enfraquecer
e encolher oponentes).
Dentro desse cenário,
Waltz reconhece a balança bipolar a melhor forma de balança de poder, devido à
sua previsibilidade por entre as ações de seus agentes, pois há um foco maior
no ambiente doméstico e guerra entre eles se torna menos provável, estipulando
uma coexistência pacífica, assim como ocorrido no período conhecido como Guerra
Fria. O autor exemplifica essa situação em um cenário de que “O jogo externo de
alinhamento e realinhamento requer três ou mais jogadores, e normalmente diz-se
que os sistemas de balança de poder querem, pelo menos, esse número. A
afirmação é falsa, porque num sistema de dois poderes, a política de balança
mantém-se, mas a forma de compensar um desequilíbrio externo incipiente é,
primariamente, intensificar os nossos esforços internos”.
Contudo, tomando uma
linha contrária ao autor, em um dinamismo do cenário internacional, uma balança
multipolar demonstra uma maior distribuição de poder, quebrando um pouco a
ideia de alianças ideológicas e a estaticidade de interesses, fazendo com que a
diversidade por entre as hegemonias gere uma maior atividade no cenário
internacional, movimentando divergentes interesses estatais e formando novas e
diversificadas alianças e/ou cooperações.
Portanto, para Waltz, as
balanças de poder mostram-se como consequências do sistema de auto-ajuda, pois
a possibilidade da incapacidade de manter sua sobrevivência perante o medo à
exposição do perigo, faz com que os Estados comportem-se de maneiras adequadas
à formar as balanças de poder, de forma que “ se o propósito do Estado é
favorecer uma balança, o propósito da balança é <manter a estabilidade do
sistema sem destruir a multiplicidade dos elementos que o compõem>”, valendo
ressaltar que estabilidade e a perpetuação da libra deve ser objetivo de todos
os Estados envolvidos, para que assim as suas funções de estabilidade
internacional e independências nacionais se concretizem, pois a política de
balança de poder prevalece onde dois requisitos existem: que a ordem
internacional seja anárquica e que seja povoada por unidades que desejam
sobreviver.
A teoria descreve as
relações internacionais como um domínio competitivo e o destino de cada Estado
depende de suas respostas às ações de outros Estados, de forma que a competição
produz uma tendência em direção à semelhança dos competidores a partir de um
sistema anárquico e de soberania estatal.
Pode-se chegar à
conclusão, portanto, que a balança de poder acaba por tornar-se um sistema de
assimetria entre os Estados, pois o equilíbrio de poder dentro do cenário da
lógica do comportamento das unidades estatais é uma consequência da propensão
de cada país ampliar sua capacidade de maneira superior aos demais, de forma
que a simetria jamais seria atingida, pois com agentes iguais em quesitos de
poder e força não há razão para tentar algum movimento de equilíbrio, de
maneira que a sobrevivência seria uma tarefa sem maiores ameaças e
interferências externas. Portanto, mantendo-se a assimetria é possível manter,
de certa forma, um sistema hierárquico dentro de um cenário anárquico (devido a
algumas unidades que mostram-se mais empoderadas, capacitadas e influentes no
cenário internacional), no qual a balança de poder mostra-se como o meio de
perpetuação e sobrevivência dos países dentro da estrutura.
Referencias Bibliográficas:
WALTZ, Kenneth N. Teoria Das Relações Internacionais. Lisboa: Gradiva, 2002. Caps 5 e 6.
* Amanda Marchiori
de Souza Ramos é estudante do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
Nenhum comentário:
Postar um comentário