segunda-feira, 15 de junho de 2020

Redação Internacional: o Brasil nas manchetes do mundo na semana de 08/06 a 14/06

                                               

Por Fernando Yazbek

 Em meio à polêmica dos novos métodos adotados pelo Ministério da Saúde na divulgação dos números de morte pelo novo coronavírus, o Brasil vai alcançando a triste marca dos 45 mil vitimados pela pandemia. A ininterrupta ascensão do contágio no país é rotineiramente noticiada no mundo inteiro. Nesta semana, a mídia inglesa reportou que, agora, o Brasil ultrapassou o Reino Unido em número de mortes e se tornou a segunda nação com mais óbitos pela covid-19. 

               A reportagem do The Guardian levanta a hipótese de que muito provavelmente o Brasil já havia ultrapassado os britânicos, considerando a subnotificação do país sul-americano. O jornal lembra que a estatística na contagem de mortos foi publicada por uma “coalisão independente” de veículos de imprensa na quinta-feira (12), uma vez que o ministro interino da Saúde, o General Pazuello, foi “acusado de tentar esconder os reais números” das fatalidades. The Guardian, que tem se notabilizado pelas críticas a Bolsonaro, lembrou as falas em que o presidente brasileiro menosprezava a pandemia, chamando-a de “gripezinha”, e “alegações falsas” em que o ex-capitão “admirador de Donald Trump” dizia que o vírus estaria desaparecendo. O veículo inglês ainda lamentou que o “populista de extrema-direita” continue a “subestimar o distanciamento social” indo a lojas e a comícios públicos enquanto mais de mil compatriotas morrem diariamente.
            O deputado Eduardo Bolsonaro, filho “zero três” do presidente, é apontado na matéria como “braço-direito” do ex-estrategista-chefe da Casa Branca, Steve Bannon. The Guardian relembra que o congressista alertou que o Brasil rumava para uma “ruptura” e finaliza a reportagem apontando o crescente autoritarismo do governo brasileiro. 


            A BBC News Brasil - braço da rede britânica - entrevistou, em Washington, o presidente da consultoria política internacional Eurasia. Ian Bremmer é um cientista político que administra escritórios de análise de risco para investidores nos Estados Unidos, Reino Unido, Japão, Cingapura e Brasil. O consultor avalia que a atenção mundial negativa que o Brasil hoje recebe é “responsabilidade pessoal” de Bolsonaro, a quem Bremmer classifica como “pior líder democraticamente eleito a lidar com a crise do coronavírus”. Ainda assim, o analista crê que, por se tratar de um “grande mercado emergente” e da “maior economia da América do Sul”, não deve haver represálias ou sanções comerciais ao Brasil.            
            Comentando as perspectivas para as eleições presidenciais norte-americanas, Bremmer afirma que Washington adora ter Bolsonaro como aliado no contexto internacional, mas duvida de um acordo de livre comércio entre os dois países: “Trump é fundamentalmente unilateralista”. O presidente da Eurasia diz ainda que o norte-americano médio “não presta muita atenção” nas questões referentes ao Brasil e que, portanto, o alinhamento automático do governo Bolsonaro com os EUA tem pouca relevância até para a mais alta classe política estadunidense. 


                 Na quarta-feira (10), o The New York Times deu que há probabilidade de haver um golpe militar em favor da manutenção de Jair Bolsonaro no poder. Detalhando as investigações judiciais contra os filhos e aliados políticos e empresariais do presidente, Times relembra as ameaças a ordem democrática de Eduardo Bolsonaro, assim como fez o Guardian. Para a reportagem, Bolsonaro surgiu como uma esperança em meio à derrocada econômica e política depois das decepções com governos de esquerda, mas que sempre flertou com o passado ditatorial do País. Sofrendo investigações nos âmbitos das eleições, de disseminação de fakenews e de ligações com milícias, Bolsonaro poderia até ser responsabilizado más por condutas no combate a pandemia. Cercado, “as incitações a intervenção militar” surgem como mantenedoras das tensões em pró do presidente.

          No mesmo raciocínio do jornal nova-iorquino, o Clarín mancheta um novo episódio na novela da “crise nos poderes” brasileiros. A frase disparada por Bolsonaro, em que insinuava desobediência contra ordens judiciais, fez soar novo alerta no sensor de institucionalidade no país. O comunicado presidencial, em resposta a medida cautelar do Ministro Luis Fux do Supremo Tribunal Federal, foi chamado de “inédito” pela mídia de Buenos Aires. O juiz da Suprema Corte determinara que as Forças Armadas “não são um poder moderador”, criticando a postura de Jair Bolsonaro em instiga-las contra o Congresso Nacional e o STF.
            Clarín aponta o chefe do executivo federal cada vez mais lotando militares em todas as instâncias da administração pública, em maior número do que na própria ditadura militar de 1964. São 11 apenas no Ministério da Saúde e mais 9 fardados em verde-oliva como ministros em outras pastas. Perdendo popularidade pelo descontrole da pandemia, Bolsonaro convocou sua militância para invadir e filmar leitos de hospitais que, segundo ele, estariam vazios e não superlotados como defenderiam a mídia e seus opositores – finaliza o jornal argentino. 

         Otimista, o El País traz um extenso material opinativo do economista Eduardo Levy e do cientista político Andrés Malamud. Com foto do presidente Jair Bolsonaro se debatendo com uma máscara sanitária, o texto compara “regimes doentes” com o Sars-Cov-2, vírus da pandemia que já matou mais de 40 mil brasileiros. Para os acadêmicos, assim como o corpo humano produz anticorpos para expulsar seres estranhos, a democracia tem sido infectada por “vencedores que não aceitam seus limites” e tentará se livrar deles num contra-ataque. El País fala de Bolsonaro apenas uma vez e o Brasil aparece citado nominalmente só por três linhas. É evidente, no entanto, que todo o desenrolar da publicação se baseia num populismo antidemocrático “infeccioso” no Brasil.


       No maior jornal do mundo árabe, a praia carioca de Copacabana apareceu como o “mais novo campo de batalha nas crescentes tensões” que assolam a política e a sociedade brasileiras. As areias de um dos mais famosos litorais do mundo foram tomadas por covas e lápides simbólicas em homenagem aos mortos pela covid-19. O protesto em forma de intervenção artística seguia pacífico, até o momento em que um apoiador de Bolsonaro, “negacionista” da pandemia, destruísse as cruzes estacadas na beira-mar, destacou a catari Al Jazeera. O filho do homem que desrespeitou a manifestação foi condenado por insider trading, operação ilegal no mercado financeiro na qual o especulador é munido de informações privilegiadas.


           Por fim, o jornal Le Figaro parece ter sido o único em que o Brasil não apareceu em tom de crítica ou de lamento. Os franceses celebram a volta dos jogadores brasileiros Thiago Silva, Marquinhos e Neymar à reintegração no Paris Saint-Germain, clube bilionário da capital. Na França, os treinamentos devem regressar no dia 22 de junho. O PSG é famoso por escalar craques da amarelinha, de Raí a Ronaldinho Gaúcho, e não abriria mão do atual camisa 10, apesar da situação epidêmica no Brasil. Neymar antecipou seu regresso a Paris, como aponta o Figaro, com medo de que o governo europeu anunciasse medidas de quarentena mais rígidas a quem chegasse de países onde pandemia não esteja controlada. No jeitinho brasileiro, o atacante driblou a burocracia sanitária. 
            A crise de saúde que assola o mundo se mostrou especialmente cruel no Brasil, onde dela se afluíram tantas turbulências políticas. O povo que se vê ora impedido de trabalhar, ora em exposição obscena ao contágio, tem de lidar não só com as incertezas salubres, mas agora também com ameaças de tirania. Jogado à própria sorte, resta ao brasileiro torcer. E tudo isto sem futebol...



Referências:
BOLSONARO é pessoalmente responsável pela atenção negativa que Brasil recebe, diz presidente de consultoria internacional. BBC, Washington, 9 jun. 2020. Disponível em <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52976774>
BRAZIL overtakes UK with worlds second-highest Covid-19 death toll. The Guardian, Rio de Janeiro, 12 jun. 2020. Disponível em << https://www.theguardian.com/world/2020/jun/12/brazil-coronavirus-death-toll-second-highest >> 
COVID-19 in Brazil: Copacabana beach filled with symbolic graves. Al Jazeera, Rio de Janeiro, 12 jun. 2020. Disponível em <https://www.aljazeera.com/news/2020/06/coronavirus-brazil-copacabanas-beach-filled-symbolic-graves-200612144624061.html>
CRISIS de poderes: Jair Bolsonaro desafia a la Corte y afirma que “los militares no cumplián ordenes absurdas”. Clarín, Buenos Aires, 13 jun. 2020. 
DE retour à Paris ce samedi, Neymar evite une éventuelle quarantaine. Le Figaro, Paris, 13 jun. 2020. Disponível em <https://sport24.lefigaro.fr/football/ligue-1/actualites/neymar-evite-la-quarantaine-et-revient-a-paris-1004517>
THREAT of military action rattles Brazil as virus deaths surge. The New York Times, Nova Iorque, 11 jun. 2020. 
YEYATI, Eduardo Levy & MALAMUD, Andrés. “¿Y si la pandemia mejora la democracia?”. El País, Madri, 13 jun. 2020. Disponível em <https://elpais.com/opinion/2020-06-13/y-si-la-pandemia-mejora-la-democracia.html

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