Rafael
Kouhei Sumiya*
É de conhecimento geral de que após a abertura dos portos para o mundo e a
Restauração Meiji em 1868, o Japão teve uma transformação substancial,
modificando a sua essência rural e feudal para um Estado industrializado e
extremamente belicoso. Este evento significa que o poder retorna para o
imperador novamente, já que anteriormente se encontrava com o xogunato de
Tokugawa. Mas acima disso, é a adaptação japonesa frente as tendências mundiais
capitalistas, liderada pelas elites capitalizadas, intelectuais e tecnocratas.
É então a partir desse momento, que a ocidentalização não apenas da economia,
mas do Japão como um todo começa, visto que alguns dos líderes da época
enxergavam que era uma forma de resistir as forças ocidentais e ter um
protagonismo no cenário internacional. Sim, “alguns”, já que não existia uma
centralidade nessa questão, pois os anos que se seguiram após 1868, foram
surgindo diversos polos de poder dentro do Japão, com várias facções
conflitantes.
Uma das formas de unificação
desses grupos foi a noção da identidade japonesa, a ideia do “Grande Império
japonês”. A glorificação do passado foi utilizada demasiadamente, além da
perspectiva dos japoneses como um povo singular, usando a homogeneidade da
língua, o passado compartilhado, o isolamento que o país passou, e etc., como
justificativas para ter um orgulho nacional. Nesse momento, já havia começado o
processo para que esse nacionalismo se tornasse um ufanismo sem controle. Tendo
em vista como exemplo, a expulsão dos ainus
(grupo étnico indígena habitante do Japão e Rússia) para o extremo norte do
país, nas terras ainda não exploradas, já que os mesmos não eram considerados
japoneses. Além da glorificação do passado e a língua comum, a religião
xintoísta foi utilizada também para reforçar a identidade nacional, pois os
japoneses teriam conexão com a linhagem imperial, ou seja, ligação com a deusa
do sol Amaterasu. Esse argumento foi
usado pelos nipônicos para se diferenciarem dos outros povos, consequentemente, colaborou para intensificar a crescente
xenofobia no país.
Focando na pauta do
desenvolvimento industrial, os líderes do arquipélago sabiam que suas terras
não teriam matérias primas o suficiente para oferecerem. A partir disso, foi se
articulando as ideias para a expansão territorial japonês, a começar pela
Coreia, que era cobiçada pela China e Rússia também. Dentro desse desenrolar,
ocorreu a Guerra Sino-Japonesa dentro do território coreano, que se estendeu
até as terras chinesas, em Manchúria, com a vitória dos nipônicos. É desse
conflito que o Japão mostra o seu potencial bélico para o mundo ocidental, da
onde surgiu a expressão “perigo amarelo”. Logo após esse evento, Japão entrou em
outra relação bélica, agora contra a Rússia, na Batalha de Tsushima em 1905, na
qual o país do sol nascente saiu vitorioso novamente.
Já nesse período, o Império
japonês havia deixado muitas cicatrizes nos países dominados, principalmente na
Coreia e Taiwan, o que posteriormente só iria piorar. Foram enviados inúmeros
japoneses para essas terras dominadas, para disseminar a ideia dos nipônicos
como os vencedores, a adoração para o imperador, e a noção desses povos
como súditos dos japoneses. O
número de coreanos e taiwaneses que estavam sob trabalho forçado no Japão
excede 5,5 milhões até o final da Segunda Guerra Mundial. E há várias denúncias
sobre diversas práticas sexuais abomináveis pelos soldados japoneses com a
população dominada, além de “médicos” que realizaram experimentos com coreanos,
como os nazistas haviam feito com prisioneiros de campos de concentração. A
expansão do Japão pela Ásia definitivamente o colocou numa posição de destaque
no cenário internacional, mas também, evidenciou as suas práticas desumanas e
condenáveis.
O trabalho que estou
desenvolvendo para a minha monografia tem o intuito de evidenciar essas marcas
profundas deixadas nesses países que estiveram sob o domínio do Império
japonês, e como o Japão seguiu após a derrota na Segunda Guerra, com suas
práticas políticas e diplomáticas. O arquipélago saiu destruído, não somente
pelas duas bombas atômicas, mas também em termos militares, devido a Declaração
de Potsdam, assinados por Harry Truman, Winston Churchill e Chiang Kai Chek.
Vários oficias japoneses foram condenados por crimes de guerra pelos diversos
atos desumanos praticados no Leste Asiático, e muitos civis japoneses sequer
tinham conhecimento dessas crueldades da guerra, e que veio a público algumas
décadas depois, após denúncias de diversas vítimas. Além disso, toda a
estrutura política e hierárquica do Estado japonês foi remodelado, chegando ao
ponto do imperador perder sua condição divina, e sendo criada uma nova
Constituição em 1946. A partir desse momento, iria surgir um novo Japão das
cinzas do Império, tanto na sua projeção econômica quanto cultural. Mas as
marcas deixadas pela guerra são profundas, e implicam nas práticas diplomáticas
japonesas até os dias de hoje.
Referências Bibliográficas:
YAMASHIRO,
José. Pequena história do Japão.
Editora Herder, 2ª edição, 1964.
SAKURAI,
Célia. Os Japoneses. Editora
Contexto, 1ª edição, 2007.
WATANABE, Paulo Daniel. Segurança e política externa do Japão no pós-Segunda Guerra Mundial. Editora Alameda, 1ª
edição, 2015
HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos - O breve século XX 1914 - 1991. Editora Companhia
das Letras, 2ª edição, 1997.
田中 史郎, 戦後 70 年 日本経済の軌跡 (O milagre econômico do Japão, 70 anos após a guerra). 「日立システムズホール仙台」にて行われた本学、人文社会科学研究所、第 24 回公開講演会(シンポジウム)での報告 (Relatório
do
24°Simpósio realizado no Hitachi Systems Hall
Sendai, do Laboratório de Ciências Sociais).
郭 洋春, 戦後世界経済と東アジア (A economia mundial no pós-guerra e o Leste
Asiático). 立教経済学研 (Iniciação Científica de Economia
da Universidade de Rikkyou).
Leste Asiático). 長崎県立大学東アジア研究所 (Laboratório de Leste Asiático da Universidade Federal do estado de
Nagasaki).
黒田 東彦 (アジア開発銀行総裁 2005 年 2 月 1 日 – 2013 年 3 月 18 日, Presidente
do Banco Asiático de Desenvolvimento 2005 a 2013), 東アジアの安定的成長と日本
の役割 (O
crescimento estável do Leste Asiático e o papel do Japão). 一橋大学
(Universidade
de Hitotsubashi).
*Rafael é aluno do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA. A presente pesquisa é parte de seu trabalho de conclusão de curso, orientado pelo Professor Andrew Traumman.
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