sábado, 6 de junho de 2020

"É para o meu TCC": MARCAS DO IMPÉRIO - AS RELAÇÕES ENTRE JAPÃO E O LESTE ASIÁTICO NO PÓS-GUERRA





Rafael Kouhei Sumiya*



É  de conhecimento geral de que após a abertura dos portos para o mundo e a Restauração Meiji em 1868, o Japão teve uma transformação substancial, modificando a sua essência rural e feudal para um Estado industrializado e extremamente belicoso. Este evento significa que o poder retorna para o imperador novamente, já que anteriormente se encontrava com o xogunato de Tokugawa. Mas acima disso, é a adaptação japonesa frente as tendências mundiais capitalistas, liderada pelas elites capitalizadas, intelectuais e tecnocratas. É então a partir desse momento, que a ocidentalização não apenas da economia, mas do Japão como um todo começa, visto que alguns dos líderes da época enxergavam que era uma forma de resistir as forças ocidentais e ter um protagonismo no cenário internacional. Sim, “alguns”, já que não existia uma centralidade nessa questão, pois os anos que se seguiram após 1868, foram surgindo diversos polos de poder dentro do Japão, com várias facções conflitantes.

Uma das formas de unificação desses grupos foi a noção da identidade japonesa, a ideia do “Grande Império japonês”. A glorificação do passado foi utilizada demasiadamente, além da perspectiva dos japoneses como um povo singular, usando a homogeneidade da língua, o passado compartilhado, o isolamento que o país passou, e etc., como justificativas para ter um orgulho nacional. Nesse momento, já havia começado o processo para que esse nacionalismo se tornasse um ufanismo sem controle. Tendo em vista como exemplo, a expulsão dos ainus (grupo étnico indígena habitante do Japão e Rússia) para o extremo norte do país, nas terras ainda não exploradas, já que os mesmos não eram considerados japoneses. Além da glorificação do passado e a língua comum, a religião xintoísta foi utilizada também para reforçar a identidade nacional, pois os japoneses teriam conexão com a linhagem imperial, ou seja, ligação com a deusa do sol Amaterasu. Esse argumento foi usado pelos nipônicos para se diferenciarem dos outros povos, consequentemente, colaborou para intensificar a crescente xenofobia no país.

Focando na pauta do desenvolvimento industrial, os líderes do arquipélago sabiam que suas terras não teriam matérias primas o suficiente para oferecerem. A partir disso, foi se articulando as ideias para a expansão territorial japonês, a começar pela Coreia, que era cobiçada pela China e Rússia também. Dentro desse desenrolar, ocorreu a Guerra Sino-Japonesa dentro do território coreano, que se estendeu até as terras chinesas, em Manchúria, com a vitória dos nipônicos. É desse conflito que o Japão mostra o seu potencial bélico para o mundo ocidental, da onde surgiu a expressão “perigo amarelo”. Logo após esse evento, Japão entrou em outra relação bélica, agora contra a Rússia, na Batalha de Tsushima em 1905, na qual o país do sol nascente saiu vitorioso novamente.

Já nesse período, o Império japonês havia deixado muitas cicatrizes nos países dominados, principalmente na Coreia e Taiwan, o que posteriormente só iria piorar. Foram enviados inúmeros japoneses para essas terras dominadas, para disseminar a ideia dos nipônicos como os vencedores, a adoração para o imperador, e a noção desses povos


como súditos dos japoneses. O número de coreanos e taiwaneses que estavam sob trabalho forçado no Japão excede 5,5 milhões até o final da Segunda Guerra Mundial. E há várias denúncias sobre diversas práticas sexuais abomináveis pelos soldados japoneses com a população dominada, além de “médicos” que realizaram experimentos com coreanos, como os nazistas haviam feito com prisioneiros de campos de concentração. A expansão do Japão pela Ásia definitivamente o colocou numa posição de destaque no cenário internacional, mas também, evidenciou as suas práticas desumanas e condenáveis.

O trabalho que estou desenvolvendo para a minha monografia tem o intuito de evidenciar essas marcas profundas deixadas nesses países que estiveram sob o domínio do Império japonês, e como o Japão seguiu após a derrota na Segunda Guerra, com suas práticas políticas e diplomáticas. O arquipélago saiu destruído, não somente pelas duas bombas atômicas, mas também em termos militares, devido a Declaração de Potsdam, assinados por Harry Truman, Winston Churchill e Chiang Kai Chek. Vários oficias japoneses foram condenados por crimes de guerra pelos diversos atos desumanos praticados no Leste Asiático, e muitos civis japoneses sequer tinham conhecimento dessas crueldades da guerra, e que veio a público algumas décadas depois, após denúncias de diversas vítimas. Além disso, toda a estrutura política e hierárquica do Estado japonês foi remodelado, chegando ao ponto do imperador perder sua condição divina, e sendo criada uma nova Constituição em 1946. A partir desse momento, iria surgir um novo Japão das cinzas do Império, tanto na sua projeção econômica quanto cultural. Mas as marcas deixadas pela guerra são profundas, e implicam nas práticas diplomáticas japonesas até os dias de hoje.



Referências Bibliográficas:

YAMASHIRO, José. Pequena história do Japão. Editora Herder, 2ª edição, 1964.

SAKURAI, Célia. Os Japoneses. Editora Contexto, 1ª edição, 2007.

WATANABE, Paulo Daniel. Segurança e política externa do Japão no pós-Segunda Guerra Mundial. Editora Alameda, 1ª edição, 2015

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos - O breve século XX 1914 - 1991. Editora Companhia das Letras, 2ª edição, 1997.

田中 史郎, 戦後 70 年 日本経済の軌跡 (O milagre econômico do Japão, 70 anos após a guerra). 「日立システムズホール仙台」にて行われた本学、人文社会科学研究所、第 24 回公開講演会(シンポジウム)での報告 (Relatório do

24°Simpósio realizado no Hitachi Systems Hall Sendai, do Laboratório de Ciências Sociais).

郭 洋春, 戦後世界経済と東アジア            (A economia mundial no pós-guerra e o Leste

Asiático). 立教経済学研 (Iniciação Científica de Economia da Universidade de Rikkyou).


李 炯,  日本の東アジア外交60年 (60 anos de relações exteriores do Japão com o



Leste Asiático). 長崎県立大学東アジア研究所 (Laboratório de Leste Asiático da Universidade Federal do estado de Nagasaki).



黒田 東彦 (アジア開発銀行総裁 2005 2 1 2013 3 18 , Presidente



do Banco Asiático de Desenvolvimento 2005 a 2013), 東アジアの安定的成長と日本



の役割   (O crescimento estável do Leste Asiático e o papel do Japão). 一橋大学



(Universidade de Hitotsubashi).

*Rafael é aluno do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA. A presente pesquisa é parte de seu trabalho de conclusão de curso, orientado pelo Professor Andrew Traumman.

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