A seção "Redes e Poder no Sistema Internacional" é produzida pelos integrantes do Grupo de Pesquisa Redes e Poder no Sistema Internacional (RPSI), que desenvolve no ano de 2017 o projeto "Redes da guerra e a guerra em rede" no UNICURITIBA, sob a orientação do professor Gustavo Glodes Blum. A seção busca compreender o debate a respeito do tema, trazendo análises e descrições de casos que permitam compreender melhor a relação na atualidade entre guerra, discurso, controle, violência institucionalizada ou não e poder. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.
Os "Anonymous" e a Nova Ordem Tecnológica Mundial
Katlen Carvalho *
"Nós somos apenas um grupo de pessoas da internet que precisa de um local livre das censuras da sociedade"
O hacktivismo pode definido como o uso de ferramentas digitais para fins políticos. O termo também pode se referir ao uso de computadores e qualquer outro sistema de tecnologia da informação (TI) e rede que debate e sustenta questões políticas, o livre discurso e o apoio aos Direitos Humanos. Na sociedade líquida, definida por Zygmunt Baumann como sendo aquela que vive na pós-modernidade, o uso da tecnologia com estas intenções é algo interpretado como o a expressão de certo descontentamento, mas que também representa uma ameaça quee já criou um largo dano para a comunidade de TI com os cybers attacks. Segundo a Enciclopédia de Tecnologia, “um cyber attack é qualquer tipo de manobra empregada por diversos atores que visem sistemas informáticos, infraestruturas, redes de computadores por vários meios de atos usualmente provenientes de uma fonte anônima que rouba, altera ou destrói um alvo especificado ao invadir um sistema”. Em alguns âmbitos, estes agentes são os chamados Vigilantes online. O grupo Anonymus é o maior exemplo deles, que envolve diversas questões a respeito do tema.
O grupo surge em 2003, postando suas ideologias em uma rede social, se dizendo uma comunidade anárquico cerebral global, ou seja, um conjunto de indivíduos separados geograficamente, mas que pensam e agem como um só na rede, sem hierarquia, sem governo e sem Lei. Acreditam que o mundo digital e o mundo real são uma só coisa e não dois mundos separados. É uma comunidade sem gênero, aberta e que acredita na “emancipação do povo”.
Eles são um grupo anárquico, e sua proposta é criar uma plataforma na qual o modelo é horizontal e não vertical, defendendo a liberdade de opinião, sem haver identificação. Praticamente impossíveis de serem rastreados e muito bem organizados eles são ativistas que usam de sua capacidade de hackers para defender suas ideologias, usando diferentes plataformas que impedem seu rastreamento.
- Como o Anonymus age?
O MO (modus operandi) deles é, através das plataformas chamadas de Onions, assim chamadas pois são como cebolas, a tradução literal do nome, e possuem várias camadas em que são criadas diferentes conexões com diversas fontes em que não há como ter certeza qual a é fonte primária e nem o destino. Por meio dessa plataforma eles realizam os Ataques D ou S (em inglês denial of service attack), que nada mais é do que sobrecarregar sites que estão ferindo suas ideologias, basicamente um sistema de chaves ou senhas que impedem suas ações.
- Como eles conseguem não ser identificados?
Para explicar isso há três conceitos chaves: surface web, deep web e dark web. Eles geralmente geram confusão, por serem considerados conceitos disputados, mas recentemente há um crescimento no consenso sobre o seu uso.
A surface web nada mais é do que qualquer site que não necessita de login e senha para ser acessado. Um exemplo deste tipo de acesso seriam sites como o Google. A deep web, mais conhecida como aquela em que se encontram as coisas obscuras, como o nome já sugere é um grupo fechado, sites que necessitam de login e senha para serem acessados, exemplo: Facebook, Twitter, Instagram. E por último, temos a dark web, que é acessada por um programa chamado Tor, ou programas similares que impossibilitam o rastreamento da origem da pesquisa feita, porque diferente dos outros níveis da web aqui a informação não vai do servidor A para o servidor B para então voltar para o A, deixando rastros. Com o Tor a pesquisa sai do servidor A e já cai no B, C, D, E para chegar ao final que é o H e voltar para o A mas de forma aleatória passando por diversos servidores e chegando em A. Ou seja, a possibilidade de rastreamento com esse sistema é praticamente nula porque não deixa rastros nem da fonte nem do destinatário final.
Então, o Anonymus não é rastreado porque usa esse sistema e também porque se comunica pelos chamados Onions, fóruns de pesquisa, estudo ou conversa que também não são rastreáveis e usam códigos para a comunicação. Seria algo como cenas em filmes de ação, nas quais as agências tentam localizar a origem do IP do servidor, a sua identificação, através da pesquisa de dados na internet. Porém ao fazê-lo, descobrem que as informações passaram por diversos servidores mais de uma vez, criando como se fosse um labirinto com diversas saídas, não tendo como saber por qual delas a informação entra e sai, ou seja, qual a origem e o destino.
- O que o grupo já fez?
No mês de janeiro de 2015 ocorreram ataques terroristas na capital da França, Paris. No dia 07 daquele mês, 12 pessoas foram mortas e cinco ficaram gravemente feridas no ataque ao escritório do jornal satírico “Charlie Hebdo”, perpetrado pelos irmãos da família Kouachi, Said e Chérif. O atentado ocorreu como forma de protesto contra uma edição do satírico chamada “Charia Hebdo”, que ocasionara polêmica no mundo islâmico e que foi recebida como um insulto aos mulçumanos. Outros ocorridos geraram mais 5 mortes entre os dias 7 a 9 de janeiro. Os ataques foram todos reivindicados pelo grupo terrorista Estado Islâmico.
Então, no dia 13 de novembro de 2015, após os ocorridos na capital francesa, os hactivistas declaram guerra contra o grupo terrorista autodenominado Islamic State (ISIS), que foi o responsável pelo ato, e em questão de algumas horas eles tiraram do ar mais de 6.000 contas do Twitter relacionadas ao grupo terrorista.
*Esse é um comunicado para a imprensa de autoria do Anonymus.
Considerando o ataque de terror contra Charlie Hebdo, como previamente nós havíamos lhes dito, planejamos dar foco em todos os eventos e prestar nossa homenagem aos inocentes que foram mortos.
O Anonymus de todo o planeta decidiu declarar guerra contra vocês terroristas. Nós rastrearemos vocês até o último e iremos *matar (destruir) vocês. Vocês aprovaram vocês mesmos a matar inocentes. Nós, portanto, iremos vingar suas mortes.
Vamos rastrear suas atividades online. Fecharemos todas as suas contas em redes sociais. Vocês não irão impor sua Sharia em nossas democracias. Não deixaremos que sua estupidez matar nossa liberdade e nossa liberdade, e liberdade de expressão. Avisamos vocês. Esperem sua destruição. Acharemos vocês em qualquer lugar do planeta. Não há lugar seguro.
Nós somos anônimos.
Nós somos legião.
Nós não esquecemos.
Nós não perdoamos.
Sintam medo de nós, Estado Islâmico e Al Qaeda. Teremos nossa vingança.
- Como o grupo fez?
Realizando o ataque D ou S e depois fornecendo as informações para agências internacionais. A comunidade não age fisicamente, só informa, porque acreditam que a justiça não é por suas mãos e sim por autoridades competentes.
- Qual seu principal foco?
O grupo é mais focado em desmantelar casos de corrupção, lavagem de dinheiro, empresas que destroem o planeta, violações dos Direitos Humanos.
Percebe-se, portanto, a relevância da compreensão dos cyberattacks, e da ciberguerra em geral, para entender os conflitos na atualidade.
* Katlen Carvalho é acadêmica do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), e pesquisadora do Grupo de Pesquisa "Redes e Poder no Sistema Internacional".
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