A seção "Política Externa Brasileira em Foco" é produzida por alunos do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Política Externa Brasileira, Dra Janiffer T. Gusso Zarpelon. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
A busca de uma maior Inserção Internacional do Brasil por meio da Cultura e da Língua.
Felipe Dalcin Silva
Joseph Nye em sua
obra “The Future of Power” (2010),
coloca que o jogo pelo poder é disputado em diversos tabuleiros
simultaneamente, o Soft Power se
apresenta como peça essencial desse jogo. Isso significa que um Estado pode
buscar influenciar outro Estado através de vias como a cultural, ideológica ou
política, não utilizando o Hard Power que
é basicamente a intervenção por meios da força ou ameaça do uso da força (DIAS,
2014).
Dessa maneira a
cultura, mais especificamente o idioma, pode se configurar em um instrumento
utilizado pelos Estados para lograr seus objetivos. Língua e cultura são o
cerne da identidade nacional, todavia a primeira é o elemento chave para maior
conhecimento da segunda (ANDRADE, 2015). O Brasil levou certo tempo para
perceber isso.
A diplomacia
cultural brasileira apresenta maior solidificação depois da Segunda Guerra
mundial (pós 1945). O que antes se objetivava era demostrar para o mundo
exterior, principalmente para os Estados considerados mais desenvolvidos, que o
Brasil não era uma terra de selvagens “largada ao relento no meio de uma selva”
(DUMONT; FLÉCHET, 2014, p. 204-205).
Contudo por volta
dos anos de 1930 Élysée Montarroyos e Ildefonso Falcão – duas figuras
importantes, defensoras ativas da propagação cultural brasileira –
identificaram que a América Latina deveria receber investidas da diplomacia
cultural brasileira por diversos motivos: criar uma maior unidade entre os
Estados latino-americanos que poderia ser ameaçada diante das transformações
globais; aumentar a empatia dos nossos vizinhos com o nosso país; e, garantir o
status brasileiro de grande líder
latino americano (DUMONT; FLÉCHET, 2014, p. 208).
Nesse mesmo
período África e Ásia não eram visto como alvos importantes de politicas e
incentivos semelhantes. Diferentemente de Portugal, que por questão cultural,
linguística e histórica poderia ser uma zona de convergência certa da cultura
brasileira. O que o Brasil tentou em terras lusas foi o modo francês, em que se
busca influenciar através da língua, nesse caso especifico o português falado
no Brasil (DUMONT; FLÉCHET, 2014, p. 209).
Posteriormente,
entre 1945 e por volta de 1980, segundo Dumont e Fléchet (2014, p.210), a
propagação da cultura brasileira seguiu três diferentes caminhos: o tema ganhou
relevância em diferentes camadas da política brasileira; começou-se a valorizar
a disseminação de não só da cultura erudita do Brasil como também a popular; e,
se ampliou os alvos de atuação.
Vale destacar que
para que tais caminhos fossem trilhados era necessário maior investimento na
área, e, o que tudo indica isso ocorreu, apesar da dificuldade da obtenção de
dados relativos a divulgação cultural do Brasil no exterior. Porém de acordo
com o diplomata Sérgio Arruda (1983) havia ainda uma grande carência de investimentos,
ele argumenta que o Brasil em 1978 investiu 3,4 milhões de dólares na
divulgação cultural do país enquanto os Estados Unidos capitanearam sete
milhões de dólares somente no Brasil (DUMONT; FLÉCHET, 2014, p. 211).
Já nos anos 80 principalmente
o Brasil e Portugal começam a dar mais atenção a maior interação cultural e
principalmente linguística entre os países lusófilos, ficando mais nítido com a
criação de algumas organizações: Instituto Internacional da Língua Portuguesa,
1989, que buscava, através da língua portuguesa, maior aprofundamento das
relações culturais, educacionais, cientificas e tecnológicas; Instituto Camões,
1992, desenvolvimento de programas para maior disseminação da cultura e da
língua; e, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), 1996, com a
participação de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, Portugal
e São Tomé e Príncipe – com entrada mais adiante do Timor Leste depois de sua
independência em 2002 (ANDRADE, 2015).
O que Andrade
(2015) ressalta de forma categórica é tentar entender os reais motivos que
levaram países lusófilos a entrarem nessa empreitada; pois, se se é feito uma
comparação entre principalmente Brasil e Portugal com os demais países falantes
do português se nota uma clara assimetria, principalmente econômica. Mesmo
entre Portugal e Brasil nota-se que esse possui um peso muito maior na economia
global do que aquele. Principalmente para os países africanos a CPLP serve como
um espaço de acareação -- através da cooperação com seu par europeu e sul
americano – tecnológica, científica e também de educação. Já para Brasil e
Portugal objetivam aumentar sua presença nesses países.
Entretanto, nem
todos os acordos entre os países lusófilos são vistos com bons olhos por parte
da população. O mais claro caso disso é o Acordo Ortográfico, ratificado em
2008, que sofre grande resistência principalmente em Portugal. Segundo Mamede
(2015) há uma grande parcela de portugueses que enxergam no Acordo imposição da
versão linguística brasileira e não realmente a busca de uma maior sintonia das
diferentes formas que o idioma é empregado nos países que o utilizam. De forma
quantitativa ocorreu uma mudança na forma de se escrever de 0,8% do português
brasileiro, enquanto do ibérico houve 1,3% de transformações.
Em 2015 começaram
diversas manifestações nas ruas contra o Acordo Ortográfico, entre os
participantes é possível averiguar a participação ativa de políticos,
acadêmicos e artistas. O ponto de maior questionamento é a falta de abertura
para a população discutir com os seus governantes se estão de acordo ou não com
o Acordo, já que todas as decisões são tomadas no âmbito político sem
praticamente nenhuma consulta a população. No entanto há portugueses que
insistem no viés econômico do acordo, já que como a população brasileira é de
mais de 200 milhões e a portuguesa está em volta dos 10 milhões, uma maior
aproximação com o português do Brasil poderia significar um acesso mais fácil
ao mercado consumidor brasileiro, que é muito maior do que o português (MAMEDE,
2015).
Não obstante, na
verdade, é uma via de mão dupla, a cultura brasileira tem grande penetração em
Portugal, não somente devido ao grande número de brasileiros em solo luso, mas
também graças a iniciativas ligadas a música e telenovelas que atraem a atenção
dos portugueses com o que ocorre no Brasil; e, como já mencionado em cima a
cultura -- mais especificamente a língua, o cinema, a música, entre outros –
são fatores de Soft Power que podem
ser usados para o Brasil não só ganhar economicamente, como também ver o seu
prestigio internacional aumentado.
Não é só nos
países que já falam o português que a vertente brasileira se espalha, mas
também ao redor do globo. O destaque econômico vivido pelo país e a realização
de eventos esportivos como a Copa do Mundo FIFA 2014 e as Olimpíadas 2016,
ajudaram ainda mais o país e o português brasileiro atraírem atenção. O
Itamaraty, através da Rede Brasil Cultural, busca promover internacionalmente o
português brasileiro e também a cultura do país, em 2015 o programa contava por
volta de 200 professores brasileiros espalhados pelo mundo em 44 países. De
acordo com o chefe da Divisão de Promoção da Língua Portuguesa, Jorge Tavares,
a busca internacional desse serviço, muitas vezes prestado nas embaixadas do
Brasil em diversos países, é tão grande que o Brasil sofre para suprir a
demanda. Tavares também destaca que importantes universidades de várias partes
do planeta tem o interesse de incluir o português falado no Brasil como opção
de curso (GARCIA; MACEDO, 2015).
Andrade (2015),
vê com bons olhos tentativas de divulgação do português, não só para o Brasil,
para todos os países que adotam essa língua como idioma oficial pois:
É fato que a implantação efetiva das
estratégias de internacionalização geraria uma maior visibilidade dos países de
língua portuguesa no cenário internacional, inclusive daqueles que possuem uma
imagem mais fraca, podendo fortalecê-la tendo mais poder de decisão no sistema
internacional... Esse elemento – o idioma – possibilita também aos grupos que
compartilham a mesma língua, mesmo que distantes geograficamente, uma maior
integração, mesmo que não fronteiriça, ou gerando outras integrações
fronteiriças. (ANDRADE, 2015).
Apesar de poder
beneficiar a comunidade lusófila em geral, pois terão o seu idioma em destaque,
é óbvio que o Brasil é o grande condutor e beneficiário do alastramento do
português no mundo. Para o idioma português subir degraus, como para o Brasil
também, falta maior relevância dessa língua em foros e organizações
internacionais. Tornar o português uma das línguas oficias da ONU seria um
grande passo para o idioma e principalmente para as ambições internacionais brasileiras.
Referências:
ANDRADE, Fernanda. Internacionalização da Língua Portuguesa: Cooperação e Soft Power. Relações Internacionais.com.br, 2015. Disponível em https://relacoesinternacionais.com.br/internacionalizacao-da-lingua-portuguesa-cooperacao-e-soft-power/ . Acesso em 11/09/2016.
DIAS, Ana Paula. O Soft Power da Língua. Ponto Final,
2014. Disponível em: https://opiniaopontofinal.wordpress.com/2014/05/20/o-soft-power-da-lingua/ . Acesso em 10/09/2016.
DUMONT, Juliette; FLÉCHET, Anais. “Pelo que é nosso!”: a diplomacia cultural
no século XX. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 34,
nº 67, p. 203-221 – 2014.
GARCIA, Giselle; MACEDO, Danilo. Cresce procura pelo ensino do português do Brasil no mundo. EBC,
2015. Disponível em http://www.ebc.com.br/noticias/internacional/2015/05/cresce-procura-pelo-ensino-do-portugues-do-brasil-no-mundo . Acesso em:
13/09/2016.
MAMEDE, ‘Imposição do Brasil’ ou língua do futuro? Acordo ortográfico divide
Portugal. BBC Brasil, 2015. Disponível em : http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151007_acordo_ortografico_polemica_mf . Acesso em 10/09/2016.
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