Placa de rua
em Managua (1983). Tradução: Morte ao Imperialismo Yankee. 4° aniversário da
Marinha Sandinista
A seção "Direito Internacional em Foco" é
produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais
da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional
Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão da monitora da
disciplina, Marina Marques. As opiniões relatadas no texto
pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da
instituição.
Caso das atividades paramilitares na Nicarágua
Gabriel
Wasilewski, Isadora Fonseca, Mariana Camargo
O caso das
atividades paramilitares na Nicarágua, de 1984, foi um marco importante para a
jurisprudência internacional. Como não possuía precedentes, a decisão da Corte
Internacional de Justiça (CIJ) se tornou emblemática ao proibir o uso da força
como norma jus cogens e ao fortalecer
o princípio da não intervenção. A importância do conteúdo dos jus cogens reside no fato de ser uma
norma imperativa de Direito Internacional. Em opinião separada após o
julgamento, o juiz Nagendra Singh, ao afirmar que o princípio do não uso da
força é de jus cogens, coloca tal
instrumento como vital para a paz e o progresso da humanidade[1].
O presente caso
encontra-se em um momento de acirramento da Guerra Fria, em que os Estados
Unidos da América financiou um grupo paramilitar contrário ao regime sandinista
na Nicarágua. A relação política
conturbada entre a Nicarágua e os Estados Unidos vêm de longa data,
influenciando diversas eleições e ajuda militar à presidentes liberais, como
Astolfo Diaz e Emiliano Chamorro. O governo revolucionário sandinista, apesar
de democraticamente eleito, ameaçava a segurança dos EUA, que o acusava de ser
influenciado pelo comunismo soviético. A partir do financiamento de armamentos,
munições, treinamentos e táticas de guerra dos “contras”, um grupo armado de
direita contrário ao regime vigente na época, os Estados Unidos contribuía com a
desestabilização do país.
No dia 9 de
abril de 1984, a Nicarágua processou os EUA perante a CIJ, sendo que a base
jurídica utilizada pelo país da América Central foi a violação das obrigações contidas
na Carta da ONU, mais especificamente seu artigo 2°, que afirma “Todos os Membros deverão evitar em suas relações
internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a
dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível
com os Propósitos das Nações Unidas”.
Ainda houveram violações à tratados bilaterais
assinados entre os países, como o Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, concluído em Manágua no ano de
1956. Seu artigo XXIV, artigo 2°, dispõe que “qualquer disputa que venha a
ocorrer entre as partes, quanto à interpretação ou à aplicação do presente
Tratado e que não puder ser solucionada de uma maneira satisfatória pela via
diplomática será levada perante a Corte Internacional de Justiça, a menos que
as partes concordem em solucioná-la por outros meios pacíficos”.
Eles ainda
argumentam que sua soberania foi violada por conta de ataques armados, invasão
de suas águas territoriais e espaço aéreo e utilização de intensa propaganda
contra os revolucionários, intimidando-os e coagindo-os.
Adotando como
base o livro de Francisco Rezek, na abordagem sobre soberania, o autor
argumenta que a mesma se trata de: "como atributo fundamental do Estado, a
soberania o faz titular de competências que, precisamente porque existe uma
ordem jurídica internacional, não são ilimitadas; mas nenhuma outra entidade as
possui superiores" e "Ela é hoje uma afirmação do direito
internacional positivo, no mais alto nível de seus textos convencionais."
Ou seja, todo Estado é dotado (e tem o direito) de soberania no Sistema
Internacional, visto que não há uma ordem superior no mesmo.
Porém, a
violação da soberania de um Estado em relação a outro pode gerar um atrito
entre ambos a partir do momento em que os respectivos interesses de cada um
entram em conflito, colocando em risco as relações entre os mesmos, como
acordos diplomáticos e até mesmo o reconhecimento mútuo perante o cenário
internacional.
O presente caso
também trouxe à tona discussões acerca da Cláusula facultativa de jurisdição obrigatória.
Segundo Francisco Rezek, “esta cláusula, agregada ao Estatuto da Corte desde o
início de sua primeira fase, é de aceitação facultativa: pode o Estado ser
membro das Nações Unidas e parte no Estatuto, preferindo, contudo, não firmá-la.
Seus signatários se obrigam por antecipação a aceitar a jurisdição da Corte
sempre que demandados por Estado também comprometido com a cláusula — o que
vale dizer, em base de reciprocidade”.
Foi a partir da
controvérsia com a Nicarágua que os EUA, curiosamente, iniciaram ressalvas em
relação à cláusula: sua aceitação da autoridade da Corte não se aplicaria a
conflitos com países da América Central. Hoje em dia, já fora da cláusula, os
EUA a repudiam por inteiro.
Apesar de
contestada pelo país réu, a Corte afirmou sua jurisdição. Já em 1984, os EUA
abandonam o processo. A sentença foi promulgada dois anos após o mesmo, em que
a decisão da CIJ consistia em decisão favorável à Nicarágua. Aceitando as
acusações referentes às violações da soberania nicaraguense, houve intensas
alterações nos princípios jurídicos de não intervenção e o não uso da força.
Após tal caso, a Corte Internacional de Justiça reafirmou o princípio de
solução de controvérsias por caminhos pacíficos.
Referências
Bibliográficas:
REZEK,
Francisco. Direito Internacional público
– Curso elementar, 16° edição. Saraiva, 2016
RONALDO,
Pablo. A legítima defesa como exceção ao
uso unilateral da força: o caso das atividades militares e paramilitares na
Nicarágua. UFF, 2015.
ORLANDO,
Fredys. A Corte Internacional de Justiça
e o caso Estados Unidos x Nicarágua. Brasília, 1995.
[1] ICJ, Summary of Judgments, Judgment
of 27 June 1986 – Case concerning military and paramilitary activities in and
against Nicaragua” (Nicaragua v. United States of America).
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