Por Francielle
Guimarães Uber[1]
Em 2015, a
População mundial foi estimada em 7,3 bilhões[2].
Uma parcela desse total é assolada pelas migrações forçadas, decorrentes de guerras,
fome e das mais diversas perseguições que colocam suas vidas em risco. Segundo o
relatório anual “Tendências Globais[3]”
produzido pela Agência das Nações Unidas para Refugiados, e datado do mesmo ano, alguns números resultantes
desse panorama são:
São
65,3 milhões de pessoas deslocadas no mundo. Tal dado é composto por 21,3 milhões
de refugiados, 40,8 milhões de deslocados internos e 3,2 milhões solicitantes de
refúgio.
Em média, 24
pessoas são forçadas a sair de suas casas, a cada minuto, a cada dia, contabilizando
aproximadamente 34.000 pessoas por dia. Jovens e crianças abaixo dos 18 anos compõem
51% do total de pessoas deslocadas. Contabilizou-se, ao menos, 98.400 crianças desacompanhadas
ou separadas de seus familiares.
Países chamados
“em desenvolvimento” hospedaram aproximadamente 13,9 milhões de refugiados e solicitantes
de refúgio, enquanto nos países chamados “desenvolvidos”, somou-se aproximadamente
2,2 milhões.
O Secretário-Geral
das Nações Unidas, Ban Ki Moon, alertou que: "Estamos enfrentando a maior crise de refugiados e deslocados do nosso
tempo. Acima de tudo, esta não é apenas uma crise de números; é também uma crise
de solidariedade".
Os dados são
alarmantes. A falta de solidariedade internacional é um problema crescente, grave
e de amplo trabalho e discussão.
No entanto,
também há solidariedade em meio a tanto sofrimento. Atores não – governamentais
tem desenvolvido trabalhos autônomos, ou ainda em parceria com Organismos Internacionais,
buscando auxiliar as pessoas que se encontram nessas condições de migrações forçadas.
Na
tentativa de minimizar a falta de informação sobre os familiares e amigos que foram
deixados para traz durante a fuga, a ONG REFUNITE[4](RU),
criada em 2005, resolveu unir tecnologia e inovação para reconectar essas pessoas.
Através da parceria com empresas da área de tecnologia e informação, como por exemplo
a Ericsson e recentemente a FreeBasics (Facebook), foi ampliado o alcance da ajuda
aos refugiados e deslocados internos. A estreita parceria com a ONU, nos campos
de refugiados e em diversos pontos na África e Oriente Médio, além de voluntários
espalhados por todo o mundo, é fundamental para o sucesso desse trabalho.
A
RU não promove a reunião física, no entanto, oferece uma ferramenta segura e anônima
de busca, que é preenchida e gerenciada pelo próprio usuário, para garantir a invisibilidade
dos que temem ter seus nomes e localização expostos.
Até
então, o método utilizado era o de escrever cartas ou ligações telefônicas, quando
havia tal possibilidade, e sem a garantia da entrega (no caso da carta), além da
incerteza da localização dos familiares, caso ainda estivessem com vida.
Alguns dados
importantes do site:
-
500.000 deslocados à procura de familiares desaparecidos, cadastrados na plataforma
online;
-
Os serviços da RU estão presentes em mais de 15 países;
-
Mais de 23 línguas, com novas línguas sendo constantemente sendo adicionadas;
-
Refunite & Freebasics[5]
- é um pacote de softwares livres disponibilizado pelo Facebook – atualmente
está disponível no Iraque, Níger, Libéria, Gana, República Democrática do Congo,
África do Sul, Ruanda, Quênia, Tanzânia, Paquistão e Filipinas;
A
REFUNITE enfrenta os desafios da tecnologia: construir uma ferramenta tecnológica
simples, que beneficie a limitação de usuários de países como a Somália ou o Sudão
do Sul. Ou ainda, enfrentar as limitações e as instabilidades do acesso digital
móvel, como no Iraque, por exemplo.
Além dos Números
Yonas
Samuel, homem de negócios e ativista político da Eritréia, é uma das pessoas que
conseguiu se reconectar a sua família através da plataforma da REFUNITE.
Casado
e com uma filha, apanhou até quase a morte ao ser acusado pelo governo do Zimbábue
por apoiar líderes oposicionistas. Quando recuperou a consciência, já não tinha
mais informações concretas do paradeiro da sua família, que havia fugido para um
destino desconhecido por ele. Partiu, então, para a África do Sul e passou por diversos
países, quando finalmente chegou ao Brasil em março de 2008.
Acreditando
que não mais encontraria informações sobre a sua família, visto que já havia dedicado
muito tempo e tentado de todas as formas encontra-los, estava cético e cansado.
Em São Paulo, finalmente cadastrou-se na REFUNITE, utilizando apenas duas palavras:
“expresso” e “Sudão”. A paixão pelo café expresso era reconhecida pela família,
portanto ele sabia que era uma característica pessoal forte para ser reconhecido.
Do outro lado, a família do Yonas, que encontrava-se refugiada no Reino Unido e
estava o procurando constantemente desde a separação, reconheceu a palavra “expresso”.
Naturalmente, trocaram mensagens e logo tiveram a certeza que eram pai e filha,
esposa e marido.
Ao
lembrar da família e recordar alguns trechos de sua história, Yonas sempre dizia
emocionado que a dor de não saber se a família dele estava viva ou não, era insuportável.
A felicidade do reencontro, ainda que virtual, era de tamanha alegria que ele não
imaginava mais poder passar nessa vida.
A
história do Yonas é mais do que um número: é a vida humana sendo colocada como prioridade,
devolvendo a humanidade a um indivíduo que teve sua vida destruída em incontáveis
aspectos. Tive a oportunidade de acompanha-lo, ainda que brevemente, mas o suficiente
para acreditar que a tecnologia, aliada à solidariedade, fazem a diferença. Não
importa a quantidade de pessoas que se consiga ajudar; o valor de uma só vida é
imensurável.
[1] Internacionalista, graduada pelo Centro
Universitário Curitiba, e pós-graduada em Gestão de Processos Sociais pelo
Centro Universitário Barão de Mauá-SP.
[5] https://refunite.org/free-basics-user-journey-3/
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