Artigo apresentado na disciplina de Análise em Política Externa e Relações Internacionais, ministrado pela Profa Dra Janiffer Zarpelon, do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba. As ideias contidas no artigo não expressam a opinião da instituição, mas somente dos seus autores.
* Bruna Galani
O que
você acharia se existissem propagandas com homens seminus em poses
sexualizadas? Se os cargos de liderança nas empresas fossem todos ocupados por
mulheres? Se alguém te oferecesse a oportunidade que tanto quer em troca de
“favores” sexuais? Se a pressão por um “corpo perfeito” fosse transferida para
os homens? Se mulheres saíssem para correr sem camisa e sem a preocupação de
serem assediadas?
É exatamente isso
que o filme francês “Je ne suis pas un Homme Facile” (Eu Não Sou Um Homem Fácil),
de Eléonore Pourriat, nos mostra de maneira cômica e irônica. Damien,
interpretado por Vincent Elbaz, é um machista clássico que carrega todas as
características do arquétipo do patriarcado. Ele é um “conquistador” e trata as
mulheres como objeto. Além de que acredita existir exclusividades de gênero,
como roupas, formas de comportamento, tipos de bebidas para mulheres e dentre
outras coisas.
Porém, após bater a
cabeça numa placa das ruas de Paris enquanto assobiava para duas adolescentes
na rua, Damien acorda num mundo invertido em que homens e mulheres têm seus
papéis trocados de todas as formas possíveis.
Alexandra, a mulher
por quem ele tinha ficado interessado antes da mudança, se tornou a versão
feminina dele mesmo. A personagem, interpretada por Marie-Sophie Ferdane, faz
com que Damien sinta na pele a consequência de seus atos. Afinal, o que é
melhor do que perder os privilégios para captar que eles sempre existiram?
No início, quando vai
a pé para o trabalho e mulheres começam a olhar para suas pernas e bunda,
Damien até acha engraçado. Mas, não demora muito para ele não aguentar mais
viver no “mundo feminino”. Chega um momento em que procura e apoia os grupos
"masculinistas" existentes. Tanto o "masculinismo” de “Je ne
suis pas un Homme Facile”, quanto o Feminismo, são movimentos importantes e que
carregam a bandeira da igualdade.
Outro ponto
interessante para notar é que a comunidade LGBT do mundo invertido é delineada
como a “normalidade” do nosso mundo – existem mulheres de vestido e homens de
blazer, além de festas reservadas aos olhos do público, por exemplo. Percebe-se
que independente do mundo a sociedade marginaliza o diferente.
A cena em que
Damien está alcoolizado e é assediado física e verbalmente num bar escancara
como o contrário choca. No mundo real, chovem notícias de mulheres que passam
por situações iguais ou piores que, muitas vezes, passam, lamentavelmente, como
algo comum.
Existem situações
mais sutis retratadas no longa que também merecem destaque, como por exemplo, nesse
universo às avessas, a carta mais importante no jogo de pôquer é a Rainha e não
o Rei.
De uma forma geral,
Eu Não Sou Um Homem Fácil usa dos clichês tradicionais do gênero para construir
sua narrativa com o objetivo principal de criticar a sociedade patriarcal, o
machismo, a misoginia e a desigualdade de gênero existente.
O feminismo é um
conjunto de movimentos políticos, sociais, ideologias e filosofias que têm como
objetivo a igualdade política, econômica e social entre os sexos. Surgiu por
volta do século XIX e a história do movimento é dividida em três
"ondas".
De uma maneira
geral, pode-se dizer que a Primeira Onda (século XIX e início do XX) contempla
principalmente as lutas pelo Sufrágio Universal – direito ao voto, direito à
herança e à propriedade. A Segunda Onda (1960-1990) foi marcada pelas
reivindicações ao direito reprodutivo e ao mercado de trabalho. Já a Terceira
Onda, que se iniciou nos anos 90, tem foco na Ideologia de Gênero.
Vale ressaltar que
o movimento feminista não é homogêneo, pelo contrário, tem uma pluralidade de
vozes e se desenvolveu em várias vertentes por diferentes países, uma vez que
as realidades das mulheres são diferentes ao redor do mundo.
Nas Relações
internacionais o Feminismo chegou como uma crítica ao mainstream teórico.
Promoveu a desconstrução do conhecimento sobre as RI com base no gênero (fez
crítica ao realismo moderno; ao desenvolvimento de um debate teórico
masculinizado e militarista); e trouxe a reconstrução/construção de teorias que
levem em consideração a questão do gênero.
O Feminismo
Empírico trata o gênero ligado ao sexo biológico, ou seja, exploração de gênero
seria a exploração da mulher. O Feminismo Analítico aborda o gênero como
categoria teórica/analítica para refutar a distinção de gênero, além de
compreender seus aspectos nas Relações Internacionais. O Feminismo Normativo
traz o processo de teorização como parte da construção de uma agenda de
transformação social e política (discurso como um campo de luta); tem o
objetivo de mudar valores.
Existem algumas
autoras que merecem destaque, dentre elas Ann Tickner. No livro “Gender in
International Relations: feminist perspective on achieving International
security.” (1992), fala sobre o comportamento dos Estados estarem baseados em
“identidades masculinas”; sobre o poder estar relacionado ao masculino (uma vez
que se a mulher adquire poder também adquire comportamentos masculinos para se
impor).
A contribuição de
Cynthia Enloe, no livro “Bananas, beaches and bases.” (1990), é sobre a relação
entre violência sexual e violência internacional. Ela aborda as mulheres nos
casos de estupro e conflitos étnicos.
Já Christine
Sylvester vem com uma teoria pós-moderna em que o objeto de estudo são os atos
de linguagem. Traz a psicanálise ao falar que existe uma subconsciência
masculina e o seu objetivo é mudar conceitos e sentidos; tentativa de quebra da
estrutura falocêntrica.
O Feminismo
forneceu novas perspectivas para o mundo acadêmico. Sua importância está
justamente em promover questionamentos e mudanças para maior igualdade na
sociedade em geral, seja na academia, nas relações entre os países ou no dia a
dia de cada pessoa.
O universo criado por
Eléonore Pourriat no filme “Je ne suis pas un Homme Facile” mostra que uma
sociedade matriarcal seria tão ruim quanto a patriarcal. A roteirista usa da
comédia para abordar assuntos que muitos não levam a sério, como o Feminismo; ela
constrói uma obra que promove a igualdade e salienta o fato o gênero ser uma
construção imposta.
É um filme que
deveria ser assistido por todos; passado em escolas para os alunos do Ensino
Médio e no ambiente acadêmico acompanhado de reflexões sobre suas mensagens.
Com um elenco talentoso, Eu Não Sou Um Homem Fácil, é uma experiência de
empatia; e entrega, ao mesmo tempo, boas risadas e alfinetadas em todos.
REFERÊNCIAS
SARFATI, G. Teorias de Relações
Internacionais. São Paulo: Saraiva, 2005.
Referências eletrônicas:
* Bruna Galani é monitora da disciplina de Instituições Internacionais e estudante do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
Nenhum comentário:
Postar um comentário