A
crise dos refugiados atinge níveis desesperadores e, ainda hoje, há países que
se recusam a recebê-los. A bem da verdade, os países têm uma obrigação de
não-devolução dos refugiados para seu país de origem - ou seja, quando um
refugiado entra em seu território, o Estado deve permitir sua permanência. No
entanto, ainda não há nada que os obrigue a auxiliar os refugiados, mesmo com
necessidades básicas. Quem faz esse trabalho - que se estende de construção
para moradias até resgate dos refugiados que fazem a travessia pelo mar - são
ONGs. A Sea Watch foi fundada em 2015
e surgiu da indignação de alguns europeus com a hipocrisia da União Europeia
que prega a democracia e a defesa dos direitos humanos, mas fecha os olhos para
os refugiados, sendo pela instalação de seguranças nas fronteiras ou por
acordos com outros países para a devolução de nacionais, como no caso da
Turquia.
Sea Watch 3 e a Justiça italiana
Carola
Rackete, a corajosa integrante da ONG e capitã do Sea Watch 3, foi presa no dia 29 de junho de 2019 por entrar em
território italiano sem autorização. Na embarcação - que estava à deriva há 17
dias - se encontravam 42 refugiados que foram resgatados do Mediterrâneo. Mesmo
em condições precárias, nenhum país europeu autorizou a entrada do Sea Watch 3 em suas águas. O
vice-premier e ministro do Interior da Itália Matteo Salvini alegou que Carola
violou a lei ao forçar a entrada no porto de Lampedusa, no sul da Itália.
Prender a capitã alemã foi um ato de crueldade, tanto pelos refugiados que ela
ajudou a resgatar, tanto pela própria Carola, que arriscou sua vida nesta
jornada. Felizmente, uma juíza italiana pensou assim também. Alessandra Vella
acredita que Carola estava cumprindo seu dever de salvar vidas e que sua única
opção era atracar na Itália, mesmo que os portos da Tunísia fossem mais
próximos, uma vez que não seria seguro para os refugiados desembarcarem neste
país - coisa que o Salvini pareceu ignorar completamente (e não
surpreendentemente, ele busca frear as imigrações no país). Salvini inclusive
chamou o Sea Watch 3 de navio pirata e ainda multou a ONG de
resgate.
Comandante fora-da-lei presa. Navio pirata capturado. Máxima multa para a
ONG. Imigrantes distribuídos para
outros países europeus. Missão cumprida.
O Ministro do
Interior anunciou publicamente que expulsaria Carola da Itália assim que ela
fosse liberada. Além disso, Rackete começou a receber ameaças pelo seu ato de
bravura. Por causa desses dois fatores, a capitã preferiu ficar, por um tempo,
em um lugar secreto para se proteger. Tal situação nos faz refletir porque
constantemente pessoas que praticam o bem são reprimidas dessa forma.
Felizmente, no dia 19 de julho, a Sea
Watch informou que a capitã voltou
ao seu país natal, porém sem detalhes, a fim de manter a segurança de Carola.
Carola Rackete
Carola
nasceu na Alemanha, na cidade de Preetz. Seu currículo acadêmico é bastante
impressionante. Ela primeiramente estudou na escola marítima da Jade University of Applied
Sciences, onde se graduou em Ciência, nas áreas de ciência náutica e transporte
marítimo. Essa graduação deu a ela o título de capitã pela Agência Federal
Marítima e Hidrográfica da Alemanha, que cuida da segurança marítima, monitora
poluição dos oceanos e aprova instalações em alto mar. Por dois anos, Rackete
navegou por dois anos pelo Ártico e a Antártida, em expedições científicas,
como parte do Instituto Alemão Alfred Wegener para a Pesquisa Polar e Marinha.
Depois disso, por um curto período de tempo, ela trabalhou como voluntária para
o Parque Natural dos Vulcões de Kamchatka. Após trabalhar em uma linha de
navios de luxo de Mônaco, ela acompanhou o Greenpeace em suas expedições e
também a British Antarctic Survey, que conduz pesquisas científicas na
Antártica. Em 2018, ela se tornou mestre em gestão ambiental. Atualmente, ela
comanda a embarcação Sea Watch 3, da
ONG homônima. Além de tudo isso, ela foi a primeira mulher a comandar um navio
de resgate humanitário.
Como se
pode notar, Carola Rackete é uma mulher extremamente corajosa - usar mulher e
corajosa na mesma frase é quase um pleonasmo, certo? Por certo que ela merece
todo o devido respeito e admiração de todas as partes do mundo (alô, Matteo
Salvini?). Como ela mesma disse em entrevista ao jornal italiano La Repubblica
“[...]Senti a obrigação moral de ajudar aqueles que não tiveram as mesmas
oportunidades que eu.” Carola mostra uma rara consciência de seus privilégios e
mais raro ainda é usar deles para poder ajudar os mais necessitados. Carola,
você não verá isso, mas obrigada por ser exemplo. Você é uma incrível Mulher de
Destaque.
*A ONG Sea Watch
se mantém por meio de doações. Se você deseja ajudá-los, acesse o link abaixo
para fazer sua contribuição.
Referências
https://sea-watch.org/en/sw-and-cpt-enforce-human-rights-eu-failed/
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