Artigo apresentado na disciplina de Teoria das Relações Internacionais I, ministrado pela Profa Dra Janiffer Zarpelon, do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba. As opiniões expressas no artigo pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
* Beatriz Deneka
Para o realista John Mearsheimer, os Estados agem buscando a
hegemonia no sistema, para garantir seu poder e segurança, independente disso
causar danos a outros Estados, são agentes egoístas que agem de forma agressiva
dentro do sistema.
Essa agressividade dos estados se
daria devido a configuração do sistema:
1.
Anarquia - não há um poder
central maior ao qual os estados devem obedecer;
2.
Capacidade militar ofensiva -
que permite causar danos significativos a outros Estados;
3.
Imprevisibilidade das ações
dos outros atores - gerando desconfiança e instabilidade;
4.
Sobrevivência como o maior
objetivo dos Estados;
5.
A racionalidade dos Estados
que os torna egoístas.
O fato de não se poder saber quanto
poder a mais um Estado deve ter em relação ao seu inimigo para estar seguro,
gera um aumento cíclico do poderio militar por ambas as partes, como resposta
ao outro, e visto que a riqueza pode se tornar força bélica, os estados também
sentem insegurança quando outro enriquece muito. A incerteza aumenta o anseio
pela hegemonia, para garantir sua segurança, possuir um poder incomparável para
que nenhum outro tenha uma força suficientemente grande para ousar desafiá-lo.
Os estados estão então constantemente buscando acrescentar ao seu poder, para
garantir sua capacidade de proteção nacional. Isso se aplicaria apenas às
potências, visto que os Estados pequenos têm uma capacidade limitada que os
permite apenas buscar preservar o que possuem, apesar de desejarem esse aumento
de poder.
O autor divide o poder em duas
esferas, o poder concreto se refere
às forças armadas, as forças terrestres do Estado; e o poder potencial abrange a quantidade de riqueza e população,
representa a capacidade de manter o poder concreto.
Existem porém fatores que podem
levar o Estado a optar por não utilizar sua força bruta, muitas vezes os gastos
com um conflito superaram os ganhos, pode não ser um momento propício para
engajar em tal, há também a incerteza da capacidade e do curso de ação do
estado adversário. Nestas situações então, buscaria ao menos manter estável o
poder que já possui.
É muito difícil um estado conseguir
se tornar alcançar a hegemonia global,
visto que para tal necessitaria não apenas ter o maior poder, mas ser a única potência no sistema. O chamado “poder parador da água” é o fenômeno
que, para Mearsheimer, impede o alcance desse status. Consiste no fato de o
envio de forças militares através de obstáculos, como o mar (água), dificultar
grandemente no processo de atacar outro estado, devido ao aumento de custos, a
realocação dos recursos disponíveis para o transporte (diminuindo a eficiência
no combate em si), ao momento do desembarque configurar em um grande perigo, a
necessidade de um número maior de combatentes para compensar as baixas
esperadas, a vulnerabilidade causada pelo menor número do exército restante
para a proteção nacional. A não ser que apenas um dos Estados seja um hegêmona regional, ao estarem separados
pela água uma potência não têm muita capacidade ofensiva contra a outra.
Portanto, conclui-se que a força nuclear indiscutivelmente superior e
insuperável seria a única forma de obter essa hegemonia.
Se torna muito mais viável se tornar
um hegêmona regional, o que exige
apenas uma riqueza consideravelmente maior e um exército mais poderoso que as
demais potências da sua região. As potências regionais ganham maior
importância, pela dificuldade apresentada pelo poder parador de águas de se tornarem potências globais. No âmbito regional, no entanto, também existem
impedimentos, a existência da balança de
poder regional: com a distribuição de poder entre as potências
existententes, ou com a interferência externa de outra potência que podem vir a
atuar buscando impedir um Estado de dominar uma região importante (por conta
própria ou aliado a um pertencente a região).
Uma grande vantagem do hegêmona regional é o fato de seus
adversários a altura terem o fator do “poder parador da água” dificultando seu
ataque. Quando uma potência atinge esse status, seu objetivo passa a ser impedir que outros países se tornem hegêmonas nas suas regiões, tornando
altamente improvável o confronto de seu poder por outro, aumentando sua
segurança. O hegêmona adota então uma
política conservadora, buscando manter o status
quo, atuando visando preservar as balanças de poder nas outras regiões.
Os estados estão sempre buscando
maximizar sua segurança e almejando se tornarem hegemonias regionais, para isso
necessitam do aumento de seu poder, que se dá pelo aumento da riqueza, do
poderio militar, da força terrestre e pela superioridade nuclear; e buscam ao
mesmo tempo diminuir esses fatores dos seus rivais.
O autor então lista então
estratégias que devem ser adotadas pelos Estados para aumentar seu poder, para
conter um agressor e as práticas que não
devem ser adotadas pois diminuiriam o poder dele.
1.
Aumentar o poder:
a.
Guerra - a vê como a maior
forma de aumentar o poder de um Estado, afirma que mesmo que se exija altos
custos para conquistar e na manutenção da área, o conquistador poderia obter
riqueza superior com o novo território de várias formas, além de agregar para
si um território de importância estratégica e excluir uma potência do cenário
mundial tendendo a balança de poder a seu favor;
b. Chantagem - o ato de coagir um
estado a fazer algo de seu interesse pela intimidação ou a ameaça de guerra,
seria muito atrativo pelo baixo custo atrelado, porém é efetivo apenas quando
utilizado contra países pequenos que não estejam aliados a potências;
c. Incitamento oportunista (bait and bleed) - quando se incita dois
rivais a entrarem em conflito sem se inserir nele. Porém é muito difícil de ter
sucesso nessa tática;
d.
Sangria - quando um país gera
o prolongamento de um conflito onde seu rival está inserido e ele não, para
buscar esgotar esse Estado e se fortalecer indiretamente.
2.
Conter um agressor:
a. Balanceamento - quando a
potência busca evitar que haja uma alteração na balança de poder existente:
i.
o balanceador pode, por
dissuasão ou guerra, mostrar seu comprometimento em manter o balanceamento;
ii.
os estados ameaçados podem
estabelecer uma aliança defensiva para conter o agressor (balanceamento externo);
iii.
os estados ameaçados podem
mobilizar recursos para tornar mais custoso o ataque contra eles (balanceamento interno).
b.
Transferência de custos (buck-passing) - quando um dos países
ameaçados (buck-passer) passa para
outros (buck-catchers) os custos do
balanceamento, se mantendo fora do conflito até que o agressor esteja
enfraquecido, diminuindo suas perdas. O buck-passer
pode atingir seu objetivo:
i.
estabelecendo boas relações
com o agressor;
ii.
afastando-se do buck-catcher;
iii.
intensificando o balanceamento interno;
iv.
fortalecendo o buck-catcher para que o agressor esgote
suas forças contra ele.
A
questão geográfica costuma ditar quem pode ser um passer ou um catcher, os
Estados que fazem fronteira com o agressor têm mais chances de serem buck-catchers. Porém, a aliança desejável
por todos os estados pode se inviabilizar, por muitos estarem tentando realizar
o buck-passing; ou o buck-catcher pode falhar como
enfraquecedor do agressor deixando o passer
para enfrentá-lo sozinho, na situação onde se fortalece o buck-passer, pode acabar então por torná-lo a maior potência.
3.
Ações a serem evitadas:
a. Bandwagoning - consiste no ato de um estado se aliar a um mais poderoso que ele
mesmo, e é negativo pois os ganhos serão desigualmente distribuídos,
enfraquecendo o Estado em questão. Compensa apenas para estados muito fracos ou
isolados.
b. Apaziguamento (appeasement) - quando se faz concessões
a um estado agressor, tendendo a balança de poder para o lado dele, buscando
apaziguar um conflito. O autor vê isso como, além de ser uma perda de poder para
o estado e demonstração de fraqueza, uma forma de “premiar” a agressão
realizada, estimulando que ocorra novamente.
As balanças de poder (regionais,
globais ou sistêmicas), causam diferentes níveis de medo nos Estados
dependendo da distribuição do poder dentro delas, e podem se configurar de
diferentes formas:
1. Bipolaridade: duas potências de poder bélico semelhante dominam e se
contrabalanceiam:
a.
Grau baixo de tensão, onde o
balanceamento se dá de forma imediata e eficiente por não haver a tentação de
se praticar o buck-passing.
2. Multipolaridade
equilibrada: três ou mais potências dominam e o
poder delas é semelhante:
a.
Nesta configuração não há uma hegemonia potencial, está equilibrado;
b.
Há maior tensão e o
balanceamento é mais ineficiente e demorado, devido a possibilidade de algum
Estado buscar praticar o buck-passing.
3. Multipolaridade
desequilibrada: três ou mais potências onde uma é hegemonia potencial:
a.
Maior grau de tensão devido a
grande possibilidade de o hegemonia
potencial vir a buscar se tornar o hegemonia
regional de fato;
b.
Os outros países se sentem
ameaçados e isso incentiva a aliança contra o agressor. Porém seu sucesso e
inviabilizado pela baixa expectativa de o contrabalanceamento funcionar e pelas
vantagens que os Estados podem ter ao serem desertores. Portanto o
balanceamento neste cenário tende a ser ineficiente.
Para Mearsheimer, apenas nas Américas há a configuração onde há uma
potência hegemônica regional, os EUA. Porém os Estados Unidos não são um
hegêmona global, o sistema internacional contemporâneo não é unipolar, mas a
posição que ele possui é a mais vantajosa possível dentro da realidade global
atual, precisa agir apenas visando conservar essa dinâmica impedindo que outro
Estado alcance o status de hegêmona
regional também. Para ele, a melhor forma de garantir isso é apenas deixar
que a própria competição e balanceamento das outras regiões impeça a ascensão
de um hegêmona, com isso ele, como um
balanceador externo (offshore balancer)
realizaria um buck-passing para as
potências de cada região, preservando seu status, interferindo apenas se os
regionais não forem capazes de impedir sozinhos, em regiões onde há uma multipolaridade desequilibrada. E os
outros estados tendo que arcar com os custos desse balanceamento poderia
inclusive aumentar seu poder relativo.
Os Estados Unidos têm o “maior gasto militar no mundo, o projeto do
orçamento para o ano financeiro de 2019 é de 700 bilhões de dólares (mais de 2
trilhões de reais) para as despesas militares. Desta soma, 24 bilhões de
dólares (77 bilhões de reais) devem ser destinados para modernização da tríade
nuclear, e 6 bilhões (19 bilhões de reais) — para os sistemas de defesa
antimíssil”. Ele não hesita em usar força no cenário internacional para manter
seu poder, como foi feito na guerra do Iraque, do Vietnã, e tantos outros
momentos da história. Nenhum outro país têm força suficiente para contrapor o
seu poder, seja no seu próprio sistema ou em outros, está rodeado de países com
menor capacidade, e nos outros continentes há um balanceamento entre as
potências existentes, portanto sua posição geográfica é muito favorável. É um
país que valoriza muito seu hard power,
como defende Mearsheimer que seja feito, e isso têm claramente funcionado muito
bem para reafirmar e acrescentar ao seu poder, sendo o país com o maior poder
bélico (inclusive maior poder nuclear), a maior economia mundial com o maior
PIB, tendo um soft power imenso, ele é incontestavelmente o Estado mais
poderoso do mundo.
Referências:
DINIZ, Eugenio. Política
Internacional: Guia de Estudos das Abordagens Realistas e da Balança do Poder. Capítulo 3 - O Realismo
Ofensivo de John J. Mearsheimer. Editora: PUCMINAS, 2007.
SPUTNIK
BRASIL. Orçamento militar norte-americano supera 10 vezes o russo. Disponível
em: https://br.sputniknews.com/defesa/2018030110635332-orcamento-militar-eua-russia-conflito/ Acesso
em Maio de 2018.
* Beatriz Deneka é estudante do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
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