A seção "Redes e Poder no Sistema Internacional" é produzida pelos integrantes do Grupo de Pesquisa Redes e Poder no Sistema Internacional (RPSI), que desenvolve no ano de 2018 o projeto "Redes da guerra e a guerra em rede" no UNICURITIBA, sob a orientação do professor Gustavo Glodes Blum. A seção busca compreender o debate a respeito do tema, trazendo análises e descrições de casos que permitam compreender melhor a relação na atualidade entre guerra, discurso, controle, violência institucionalizada ou não e poder. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.
Teoria da Guerra Preventiva na Invasão do Iraque e a reestruturação das noções de Segurança Internacional
Matheus R. F. Silva *
Segundo o dicionário, “segurança é o estado de qualidade ou condição de uma pessoa ou coisa que está livre de perigos e incertezas, assegurada de danos e afastada de todo o mal”. Apenas por essa simples definição, é perceptível que a segurança de um Estado é algo de extrema complexidade, pois ter ou não ameaças é algo que não se pode controlar. Estes “perigos e incertezas” assombram todos os países do globo, incluindo a última hegemonia do Sistema Internacional, os Estados Unidos da América. Os estadunidenses foram, há exatos 15 anos atrás, responsáveis pela ressignificação do conceito Segurança Internacional após invadirem o Iraque em prol de sua “Guerra ao Terror”.
Em 2003, mesmo sem o aval do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas e sem o consentimento do Sistema Internacional, o exército americano invadiu o território iraquiano, pois, segundo George W. Bush, em discurso proferido logo após os ataques do 11 de setembro,
“O único caminho para derrotar o terrorismo enquanto uma ameaça ao estilo de vida americano é detê-lo, eliminá-lo e destruí-lo, onde ele floresce. Percebe-se que há uma mudança na maneira de pensar, elaborar e agir para ter segurança. Ela passa de um conceito defensivo, onde se visava livrar-se de perigos, assegurar-se de danos, para uma estratégia de uma “segurança a partir da ofensiva”
A principal causadora dessa guinada do significado de Segurança Internacional é a Teoria da Guerra Preventiva.
A Guerra Preventiva é uma ação militar que tem a intenção de fortalecer os aparelhos defensivos e de evitar ataques do Estado ou grupo que está se atacando, mesmo que não haja um perigo de ataque iminente, tampouco provas concretas que esteja sendo planejada uma estratégia ofensiva ao agente que está se sentindo ameaçado.
Um perfeito exemplo para essa situação ocorreu uma década e meia atrás: Os Estados Unidos da América marcharam ao Iraque, invadiram um país soberano para buscar armas químicas sem a provas que estas existiam e voltaram para casa deixando milhares de mortos, sequelas irreversíveis para o Iraque e com US$ 802 bilhões à menos nos cofres americanos. Como afirmou o então presidente Bush,
"Lutamos com nossos inimigos no exterior em vez de esperar que eles cheguem ao nosso país. Buscamos formar o mundo, não meramente ser formado por ele, e influenciar eventos para melhor em vez de ficar à mercê deles".
Em inúmeros momentos em seu discurso, Bush deixa a entender que continuará usando os ataques arbitrários da Guerra Preventiva como estratégia na Guerra do Iraque. Inclusive, para tentar justificar suas ações e tentar trazer o mínimo de legitimidade para os ataques no Oriente Médio, compara o ataque ao World Trade Center com Pearl Harbor que, em 1941, levou os yankees à Segunda Guerra Mundial.
Não foi somente Bush que, por meio do discurso, tentou legitimar a Guerra Preventiva. O então secretário de Estado do governo Bush, Colin Powell em seus discursos na ONU (quando foi decidido que a invasão não seria legítima) citou um exemplo onde a Guerra Preventiva foi efetiva e decisiva para manter a ordem: a destruição do reator nuclear iraquiano Osirak pela força aérea israelita em 1981. Powell lembra também do atentado que matou 11 pessoas diante do consulado norte-americano em Karachi, no Paquistão, em junho de 2002, e relata que medidas deveriam ser tomadas com antecedência nessa situação tendo em vista o risco iminente, tentando legitimar o discurso da Guerra Preventiva.
Hoje, tendo conhecimento do poderio bélico dos Estados ao redor do globo e suas redes de alianças com outros grupos e próprios Estados, é quase impossível de imaginar a ocorrência de ataques “preventivos”, semelhante ao citado no texto. Tendo um exemplo prático atual, é impossível imaginar os Estados Unidos atacando a Coréia do Norte preventivamente após às ameaças nucleares norte-coreanas, sem que nos encaminhemos para uma terceira Guerra Mundial. A tecnologia nuclear traz a questão securitária mais uma vez para o polo defensivo, como era no pré-invasão da Guerra do Iraque. Retomando o conceito inicial, o domínio da prática nuclear é o que “afasta a humanidade de todo o mal”.
* Matheus R. F. Silva é acadêmico do curso de Relações Internacionais, e Monitor da disciplina de Política Internacional Contemporânea.
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