segunda-feira, 30 de abril de 2018

Direito Internacional em Foco: Caso Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia: Debate entre Direitos Humanos e Soberania

A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão da monitora da disciplina, Marina Marques. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.



A Procedência da CIJ no Caso Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia:
Debate entre Direitos Humanos e Soberania

Amanda Duarte, Beatriz Ritzmann Peceniski, Elizabete Haruka, Maria Eduarda Crepaldi


   Em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha invadiu a Itália. Vários anos depois, as vítimas italianas dos maus tratos e das violações de direitos humanos e seus herdeiros decidiram buscar indenização e reparo por tais ocorridos. Eles recorreram então à justiça italiana solicitando reparos por parte do governo alemão.  Em março de 2004, a Suprema Corte italiana declarou que possuía a jurisdição fundamental para julgar o Estado alemão. Descontente com a justiça italiana, em dezembro de 2008, a Alemanha recorreu à Corte Internacional de Justiça reivindicando o princípio de imunidade de jurisdição de seu Estado perante as cortes italianas. Em janeiro de 2011, a Grécia apresentou uma petição à CIJ requisitando permissão para intervir no caso. 

O caso Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia trata de dois assuntos fundamentais no ambiente internacional, os quais tendem a se chocar: a soberania e os Direitos Humanos. De um lado a Itália, com o pretexto de prezar pela defesa dos Direitos Humanos, desrespeita a soberania alemã. Do outro, a Alemanha, ao zelar pela sua imunidade de jurisdição, argumenta que a Itália está desrespeitando um dos princípios do Direito Internacional Público. Por conseguinte, é dever da Corte Internacional de Justiça determinar qual princípio deverá prevalecer neste caso.

Para compreender plenamente o assunto tratado, é necessário esclarecer alguns conceitos jurídicos, como o de jurisdição, que, segundo Douglas Cunha, consiste na capacidade e na obrigação de um Estado de aplicar o direito em casos concretos. Por consequência, é também revelado o conceito de imunidade de jurisdição, frequentemente empregado no Direito Internacional, o qual nos dizeres de Hildebrando Accioly e Gerado Silva propugna que “os tribunais de um Estado não têm jurisdição sobre outro Estado e não têm competência judiciária em relação a outro Estado”; em tese, tal conceito reconhece que o Judiciário de um Estado não pode submeter a julgamento outro Estado igualmente soberano. Outra ideia importante para nossa compreensão é a da Corte Internacional de Justiça (CIJ) - um dos principais órgãos da ONU que, segundo Cristal Ribeiro, Lígia Melo e João Melo, possui duas missões: 1) decidir, tendo como guia o Direito Internacional, disputas jurídicas entre Estados e 2) opinar sobre questões jurídicas referentes a órgãos da ONU, proferindo resoluções contendo sua opinião, desprovida de imperatividade, sobre as questões levantadas pelos órgãos permitidos. Destarte, recorre-se à CIJ para esta encarregar-se de tornar efetiva a jurisprudência das normas de DI.

A Alemanha vai à Corte Internacional de Justiça de Haia declarando que ao submeter seu país à júri italiano, a Itália violou a imunidade jurisdicional do Estado alemão e, portanto, desrespeitou princípios fundamentais de DIP que sustentam a convivência pacífica entre os Estados no ambiente internacional. O Estado alemão também traz como demais alegações que, como entendimento do Tratado de Paz de 1947, artigo 77(4), a Itália renunciou os direitos de indenização do país e de seus cidadãos. A Alemanha afirma que foram quitadas as dívidas geradas pela guerra e também pelas formas de violação aos Direitos Humanos dos cidadãos italianos. O Estado afirma que a situação de indenizações deve ser tida como completamente resolvida pelo Tratado.

Para justificar a quebra de imunidade jurisdicional alemã, a defesa italiana se fundamenta em uma corrente jurisprudencial que defende a supremacia de Direitos de natureza jus cogens – ou seja, aquelas normas que – no entendimento de Cristal Ribeiro, Lígia Melo e João Melo, compõem um “conjunto de normas não escritas, originárias dos costumes tradicionais” - sobre os demais preceitos de Direito Internacional Público. O Estado italiano declara que a Alemanha não deve gozar de imunidade jurisdicional pois o país tem uma dívida a respeito de violações de Direitos Humanos para/com os cidadãos italianos. Eles declaram que ao passo que a imunidade jurisdicional é um preceito costumeiro de DIP, a proibição do trabalho forçado é tida como uma das primeiras e fundamentais matérias de direitos básicos humanos.  A Itália se justifica argumentando sobre o caráter de Direito superior dos Direitos Humanos sobre a soberania.

Em janeiro de 2011, a Grécia enviou solicitação resgatando concordância para intervir no caso. Seguindo as normas da CIJ, é autorizada a intervenção se o Estado contencioso tiver algum interesse na ordem do Estado interveniente. A Grécia alega em sua petição que o interesse do Estado é intervir apenas nos assuntos que causaram de certa forma alguma consequência ao seu território, levantando os acontecimentos da Segunda Guerra e intensificando a jurisprudência italiana. O Estado grego aponta alguns pormenores, como o fato que ambas as partes não levariam em conta os encadeamentos do caso para outros Estados, alegando o princípio de segurança jurídica.

            Para que um terceiro Estado possa intervir é necessária uma justificativa. A pauta grega recai sobre o o fato do consentimento alemão pela sua responsabilidade internacional e por todas práticas e omissões cometidos pelo Estado, além das violações da dignidade humana realizadas pelo exército de Hitler contra a população grega. A Grécia argumenta com dois instrumentos: 1) a preservação dos direitos gregos, sustentado por todos os meios legítimos, com subordinação às convicções de jurisdição e responsabilidade estatal, e 2) com intenção de advertir a Corte sobre a natureza dos interesses gregos e como a decisão pode afetar o caso. Além disso, a Grécia afirma que não deseja se tornar o terceiro Estado na ocorrência.

            A Alemanha se mostra contra a intervenção grega em todas as instâncias, constatando que os interesses gregos não tinham concordância com o caso apontado; já que para a Grécia o foco eram as violações dos direitos internacionais humanitário e a batalha travada entre a Itália e Alemanha se concentrava no princípio de imunidade de jurisdição. Em contradição, a Itália mostrou-se defensora de seus "aliados" e suas inclinações. Por fim, em 2011, a Corte Internacional de Justiça alega alguma semelhança entre os ocorridos e permite a intervenção do Estado grego no caso.

Em fevereiro de 2012, a Corte Internacional de Justiça em Haia decidiu que, mesmo em casos de violações graves aos Direitos Humanos, um país não pode ser julgado pelo judiciário de outro. Ao contrário do que desejava a Itália, e de algum modo a Grécia, a Alemanha ganha a causa. Dessa forma, pode-se perceber que a disputa entre Alemanha e Itália perante a CIJ faz uma observação sobre a discussão entre os limites do Direito Internacional e das legislações domésticas, sendo isso relevante aos estudos dos limites de um Estado perante o outro e de suas ações diante aos Direitos Humanos. De acordo com o Prof. Valério Mazzouli a soberania e o Direito Internacional nunca terão uma convivência harmônica; pode se dizer que tal pensamento estava presente no julgamento Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia pela Corte Internacional de Justiça.

Referências:


ACCIOLY, Hildebrando; SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de Direito Internacional Público. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 105.
COSTA, Fredson. A Soberania estatal e os Direitos Humanos: um debate atual sobre os limites do Poder do Estado. Disponível em: <https://fredsonsousa.jusbrasil.com.br/artigos/256801164/a-soberania-estatal-e-os-direitos-humanos-um-debate-atual-sobre-os-limites-do-poder-do-estado/amp>
CUNHA, Douglas. Princípios e características da Jurisdição. Disponível em: <https://www.google.com.br/amp/s/douglascr.jusbrasil.com.br/artigos/133293355/principios-e-caracteristicas-da-jurisdicao/amp>
RIBEIRO, Cristal Augustos Carneiro. DE MELO, João Marcos Braga. DE MELO, Lígia Tomás. A imunidade de jurisdição do Estado e as violações dos Direitos humanos. Disponível em: <http://sinus.org.br/2012/wp-content/uploads/02-CIJ.pdf>




A Procedência da CIJ no Caso Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia:
Debate entre Direitos Humanos e Soberania

Amanda Duarte, Beatriz Ritzmann Peceniski, Elizabete Haruka, Maria Eduarda Crepaldi


   Em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, a Alemanha invadiu a Itália. Vários anos depois, as vítimas italianas dos maus tratos e das violações de direitos humanos e seus herdeiros decidiram buscar indenização e reparo por tais ocorridos. Eles recorreram então à justiça italiana solicitando reparos por parte do governo alemão.  Em março de 2004, a Suprema Corte italiana declarou que possuía a jurisdição fundamental para julgar o Estado alemão. Descontente com a justiça italiana, em dezembro de 2008, a Alemanha recorreu à Corte Internacional de Justiça reivindicando o princípio de imunidade de jurisdição de seu Estado perante as cortes italianas. Em janeiro de 2011, a Grécia apresentou uma petição à CIJ requisitando permissão para intervir no caso.
O caso Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia trata de dois assuntos fundamentais no ambiente internacional, os quais tendem a se chocar: a soberania e os Direitos Humanos. De um lado a Itália, com o pretexto de prezar pela defesa dos Direitos Humanos, desrespeita a soberania alemã. Do outro, a Alemanha, ao zelar pela sua imunidade de jurisdição, argumenta que a Itália está desrespeitando um dos princípios do Direito Internacional Público. Por conseguinte, é dever da Corte Internacional de Justiça determinar qual princípio deverá prevalecer neste caso.
Para compreender plenamente o assunto tratado, é necessário esclarecer alguns conceitos jurídicos, como o de jurisdição, que, segundo Douglas Cunha, consiste na capacidade e na obrigação de um Estado de aplicar o direito em casos concretos. Por consequência, é também revelado o conceito de imunidade de jurisdição, frequentemente empregado no Direito Internacional, o qual nos dizeres de Hildebrando Accioly e Gerado Silva propugna que “os tribunais de um Estado não têm jurisdição sobre outro Estado e não têm competência judiciária em relação a outro Estado”; em tese, tal conceito reconhece que o Judiciário de um Estado não pode submeter a julgamento outro Estado igualmente soberano. Outra ideia importante para nossa compreensão é a da Corte Internacional de Justiça (CIJ) - um dos principais órgãos da ONU que, segundo Cristal Ribeiro, Lígia Melo e João Melo, possui duas missões: 1) decidir, tendo como guia o Direito Internacional, disputas jurídicas entre Estados e 2) opinar sobre questões jurídicas referentes a órgãos da ONU, proferindo resoluções contendo sua opinião, desprovida de imperatividade, sobre as questões levantadas pelos órgãos permitidos. Destarte, recorre-se à CIJ para esta encarregar-se de tornar efetiva a jurisprudência das normas de DI.
A Alemanha vai à Corte Internacional de Justiça de Haia declarando que ao submeter seu país à júri italiano, a Itália violou a imunidade jurisdicional do Estado alemão e, portanto, desrespeitou princípios fundamentais de DIP que sustentam a convivência pacífica entre os Estados no ambiente internacional. O Estado alemão também traz como demais alegações que, como entendimento do Tratado de Paz de 1947, artigo 77(4), a Itália renunciou os direitos de indenização do país e de seus cidadãos. A Alemanha afirma que foram quitadas as dívidas geradas pela guerra e também pelas formas de violação aos Direitos Humanos dos cidadãos italianos. O Estado afirma que a situação de indenizações deve ser tida como completamente resolvida pelo Tratado.
Para justificar a quebra de imunidade jurisdicional alemã, a defesa italiana se fundamenta em uma corrente jurisprudencial que defende a supremacia de Direitos de natureza jus cogens – ou seja, aquelas normas que – no entendimento de Cristal Ribeiro, Lígia Melo e João Melo, compõem um “conjunto de normas não escritas, originárias dos costumes tradicionais” - sobre os demais preceitos de Direito Internacional Público. O Estado italiano declara que a Alemanha não deve gozar de imunidade jurisdicional pois o país tem uma dívida a respeito de violações de Direitos Humanos para/com os cidadãos italianos. Eles declaram que ao passo que a imunidade jurisdicional é um preceito costumeiro de DIP, a proibição do trabalho forçado é tida como uma das primeiras e fundamentais matérias de direitos básicos humanos.  A Itália se justifica argumentando sobre o caráter de Direito superior dos Direitos Humanos sobre a soberania.
Em janeiro de 2011, a Grécia enviou solicitação resgatando concordância para intervir no caso. Seguindo as normas da CIJ, é autorizada a intervenção se o Estado contencioso tiver algum interesse na ordem do Estado interveniente. A Grécia alega em sua petição que o interesse do Estado é intervir apenas nos assuntos que causaram de certa forma alguma consequência ao seu território, levantando os acontecimentos da Segunda Guerra e intensificando a jurisprudência italiana. O Estado grego aponta alguns pormenores, como o fato que ambas as partes não levariam em conta os encadeamentos do caso para outros Estados, alegando o princípio de segurança jurídica.
            Para que um terceiro Estado possa intervir é necessária uma justificativa. A pauta grega recai sobre o o fato do consentimento alemão pela sua responsabilidade internacional e por todas práticas e omissões cometidos pelo Estado, além das violações da dignidade humana realizadas pelo exército de Hitler contra a população grega. A Grécia argumenta com dois instrumentos: 1) a preservação dos direitos gregos, sustentado por todos os meios legítimos, com subordinação às convicções de jurisdição e responsabilidade estatal, e 2) com intenção de advertir a Corte sobre a natureza dos interesses gregos e como a decisão pode afetar o caso. Além disso, a Grécia afirma que não deseja se tornar o terceiro Estado na ocorrência.
            A Alemanha se mostra contra a intervenção grega em todas as instâncias, constatando que os interesses gregos não tinham concordância com o caso apontado; já que para a Grécia o foco eram as violações dos direitos internacionais humanitário e a batalha travada entre a Itália e Alemanha se concentrava no princípio de imunidade de jurisdição. Em contradição, a Itália mostrou-se defensora de seus "aliados" e suas inclinações. Por fim, em 2011, a Corte Internacional de Justiça alega alguma semelhança entre os ocorridos e permite a intervenção do Estado grego no caso.
Em fevereiro de 2012, a Corte Internacional de Justiça em Haia decidiu que, mesmo em casos de violações graves aos Direitos Humanos, um país não pode ser julgado pelo judiciário de outro. Ao contrário do que desejava a Itália, e de algum modo a Grécia, a Alemanha ganha a causa. Dessa forma, pode-se perceber que a disputa entre Alemanha e Itália perante a CIJ faz uma observação sobre a discussão entre os limites do Direito Internacional e das legislações domésticas, sendo isso relevante aos estudos dos limites de um Estado perante o outro e de suas ações diante aos Direitos Humanos. De acordo com o Prof. Valério Mazzouli a soberania e o Direito Internacional nunca terão uma convivência harmônica; pode se dizer que tal pensamento estava presente no julgamento Alemanha vs. Itália com intervenção da Grécia pela Corte Internacional de Justiça.

Referências:
ACCIOLY, Hildebrando; SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de Direito Internacional Público. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 105.
COSTA, Fredson. A Soberania estatal e os Direitos Humanos: um debate atual sobre os limites do Poder do Estado. Disponível em: <https://fredsonsousa.jusbrasil.com.br/artigos/256801164/a-soberania-estatal-e-os-direitos-humanos-um-debate-atual-sobre-os-limites-do-poder-do-estado/amp>
CUNHA, Douglas. Princípios e características da Jurisdição. Disponível em: <https://www.google.com.br/amp/s/douglascr.jusbrasil.com.br/artigos/133293355/principios-e-caracteristicas-da-jurisdicao/amp>
RIBEIRO, Cristal Augustos Carneiro. DE MELO, João Marcos Braga. DE MELO, Lígia Tomás. A imunidade de jurisdição do Estado e as violações dos Direitos humanos. Disponível em: <http://sinus.org.br/2012/wp-content/uploads/02-CIJ.pdf>



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