A seção "Noções de Direito Internacional" é coordenada pela Professora Michele Hastreiter e contém artigos escritos pelos alunos da Especialização em Relações Internacionais e Diplomacia do UNICURITIBA.
O
DIREITO INTERNACIONAL CONSUETUDINÁRIO NA ATUALIDADE
Amanda Pimenta[1]
Dalvino Passarin
Filho[2]
INTRODUÇÃO
O
Direito Consuetudinário é aquele que se baseia nos costumes para declarar os
efeitos e consequências legais aplicáveis a quem cometeu determinado ato. Aos dias de hoje, a Inglaterra é um exemplo
de país que utiliza o formato em seu sistema jurídico doméstico.
Sobre a origem dos costumes, esses
são de “origem não litigiosa”. Eles não têm sua raiz em disputas resolvidas por
árbitros, mas sim de práticas derivadas da “convivência social”. O início do
costume é, então, a “convenção”.
Segundo Gusmão, o Direito
Consuetudinário “é o direito costumeiro, não-escrito, usual. “Consuetudinário”
vem da palavra latina consuetudine, que
significa costume.”[3]
O costume, para ele, em relação às fontes do direito, é a mais antiga.
DIREITO INTERNACIONAL CONSUETUDINÁRIO
O
art. 38.1(b) do Estatuto da Corte Internacional de Justiça descreve o direito
internacional consuetudinário como sendo um “costume internacional, como prova
de uma prática geral aceita como sendo o direito”. Em outras palavras, o
direito internacional consuetudinário é uma lei não-escrita que “governa” as
ações e interações dos Estados.[4]
Para
ser considerada uma norma de direito internacional consuetudinário, a doutrina
majoritária considera que deve haver a presença de dois elementos básicos: a prática
do Estado e opinio juris. A prática
do Estado se refere a uma prática geral e consistente por parte dos Estados,
enquanto a opinio juris significa que
essa prática é seguida pela crença de ser ela legalmente obrigatória.[5]
A
referida visão doutrinária é seguida pelo órgão das nações unidas denominado International Law Comission (ILC),
responsável por promover o desenvolvimento do direito internacional e sua
codificação. O ILC já publicou dois relatórios acerca da identificação de
direitos internacionais consuetudinários, e um terceiro está a caminho. No
segundo relatório o órgão faz referência à prática de Estado e opinio juris, conforme a seguinte
definição:
Prática
de Estado
Para
ser considerada norma internacional consuetudinária, segundo a ILC, deve
atender a dois requisitos: 1. A prática, além de relevante, deve ser genérica,
ou seja, deve ser suficientemente difundida e representativa; e 2. A prática
deve ser consistente.[6]
Ademais,
uma prática de Estado é genérica se for seguida por uma maioria de Estados que
tiveram a oportunidade de aplicar a prática. A prática também necessita ser
consistente, ou seja, deve ser aplicada de maneira consistente pelos Estados,
sem que haja contradições ou discrepâncias.
Opinio Juris
Apesar
de existirem alguns doutrinadores contra o requisito da opinio juris, este é reconhecido como necessário para a formação da
norma internacional consuetudinária pelo ILC. Os doutrinadores que se
posicionam contrários argumentam que o requisito se trata de um paradoxo: como
uma nova lei de direito internacional consuetudinário pode surgir se a prática
relevante deve vir acompanhada da convicção de que essa prática já faz parte do
ordenamento jurídico? Apesar do paradoxo, o ILC já se posicionou à favor da
presença do opinio juris para a
formação de uma norma internacional consuetudinária.[7]
Para
o ILC, a definição de opinio juris –
apresentada no Comission’s Draft
Conclusion 10 – é a seguinte: 1. O requerimento de que a prática genérica
deve ser aceita como norma significa que a prática em questão deve ser
acompanhada de um “senso de obrigação legal”; 2. O reconhecimento como norma
cogente é o que diferencia uma norma de direito internacional consuetudinário
de um hábito ou mero costume.[8]
Direito Internacional
Consuetudinário na Atualidade
Alguns
exemplos de normas consuetudinárias no Direito Internacional são: dever de
não-agressão, ou não abrir forças contra outro Estado; o dever de não violar a
soberania de outro Estado; o dever de não interromper o comércio marítimo
pacífico; perseguição de navio em alto-mar, quando existem evidências de que um
navio viola as leis marítimas internacionais.
Uma
questão interessante para o Direito Internacional Consuetudinário surgiu com os
conflitos envolvendo atores não-estatais. Por exemplo: O Estado Islâmico na
Síria. Existiria um direito costumeiro de o Estado ter o dever de proteger sua
soberania e não deixar com que atores não-estatais surgissem e ameaçassem a
soberania de outros Estados?
No
caso específico da Síria: esta perdeu o controle de parte de seu território
para o Estado Islâmico, que ameaça a soberania de países ocidentais, como a
França e os Estados Unidos. A questão que emerge é se, com a ausência de
controle e do dever de cuidar de seu território e sua população, haveria o
direito de outros Estados intervirem no conflito, atacando o referido ator não
estatal em território de um país “neutro” (por mais que a Síria, como sabemos,
está ativa no combate contra os grupos rebeldes).
Com
relação à prática de Estado,
vários foram os Estados que já alegaram legítima defesa considerando a
indisposição ou a incapacidade de Estados neutros conterem grupos
rebeldes/insurgentes dentro de seus territórios.
Entre
eles: os Estados Unidos, quando da invasão do Camboja para atacar membros Viet Congs (1970); A Turquia, quando da
invasão do Iraque para atacar membros do grupo PKK (1995); Uganda, quando
permaneceu no território da República Democrática do Congo, após o presidente
ter declarado a expulsão de todas as tropas militares estrangeiras, para
perseguir membros de um grupo rebelde, hostil ao governo de Uganda (1998);
Rússia, quando bombardeou a Geórgia para atingir militantes rebeldes chechenos
(2001); Colômbia, quando as forças do exército perseguiram membros da FARC até
atravessarem as fronteiras com o Equador (2008); Estados Unidos e coalisão,
quando atacaram e atacam bases do Estado Islâmico na Síria e no Iraque (2014).
Já
quanto a opinio juris, a maioria dos países acima citou a
incapacidade de os Estados protegerem seus territórios como justificativa do
uso da força. Em 1970, um assessor jurídico dos Estados Unidos disse que era
impossível para o governo do Camboja tomar qualquer ação para prevenir as violações
que ocorreram. Em 1990, a Turquia frequentemente apontava a incapacidade do
Iraque em exercer autoridade na porção norte de seu território. Uganda também
alegava que a República Democrática do Congo não estava exercendo controle
efetivo em todo o seu território, deixando espaço para os grupos rebeldes
contrários à Uganda. Vladimir Putin defendeu o direito de a Rússia usar força
como forma de autodefesa, caso a Georgia provasse incapaz de estabilizar a zona
de segurança de suas fronteiras. Finalmente, o representante permanente dos EUA
citou explicitamente o teste de “indisposição e incapacidade” do Estado em
conter sua segurança interna, justificando os ataques de bombas à Síria,
indicando que a Síria estava incapaz de lidar com o Estado Islâmico em seu
território.
No
entanto, apesar de alegada pelos países que se utilizam da força em seu favor,
alegando autodefesa e incapacidade de outros Estados em lidar com seus
territórios, esta ainda é uma questão atual no Direito Internacional
Consuetudinário que se encontra sem resposta. Talvez, com o passar do tempo,
cortes internacionais e a doutrina demonstrará sua legitimidade seu espaço no
Direito Internacional Consuetudinário.
REFERÊNCIAS
·
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. Rio de
Janeiro: Forense, 2005.
·
LIMA, Hermes. Introdução à Ciência do Direito. 31 ed. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1996.
·
LARSSON,
Anton. The right of states to use force against non-state actors – is the
“unwilling or unable” test costumary internacional law? Thesis in Public
Internacional Law, Stockholm University, 2015.
[1] Aluna da disciplina de Direito
Internacional Público, especialização em Relações Internacionais e Diplomacia,
Unicuritiba.
[2] Aluno da disciplina de Direito
Internacional Público, especialização em Relações Internacionais e Diplomacia,
Unicuritiba.
[3] GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. Rio de
Janeiro: Forense, 2005. p 119.
[4]
LARSSON, Anton. The right of states to use force against non-state actors – is
the “unwilling or unable” test costumary internacional law? Thesis in Public
Internacional Law, Stockholm University, 2015.
[5] Idem.
[6] Idem.
[7] Idem, p. 9.
[8] Ibid.
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