A seção Direito Internacional em foco é produzida por alunos do 3° Período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter e a supervisão do monitor da Disciplina, Gabriel Thomas Dotta. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição
O Mensalão Além das Fronteiras: O Caso
da Extradição de Pizzolato
Felipe
Baptista e Stephanie Andressa de Oliveira
O ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique
Pizzolato, foi julgado e condenado a doze anos e sete meses de prisão e multa
de mais de um milhão de reais pelo Supremo Tribunal Federal pelos crimes de
peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O julgamento fez parte do
Mensalão, ou Ação Penal n° 470, investigação de esquema de compra de votos de
parlamentares que envolveu políticos, empresários, sócios, tesoureiros,
diretores e gerentes de bancos, com um total de 28 réus – dos quais 25 foram
condenados - sendo Pizzolato o único
foragido.
Sua
fuga aconteceu em setembro de 2013, dois meses antes de ter sua prisão
decretada no Brasil, utilizando-se passaporte em nome de Celso Pizzolato, um de
seus irmãos, morto em 1978.
Pizzolato
possui dupla nacionalidade: brasileira e italiana. Em carta enviada a seu
advogado antes da fuga, o requerido criticou o julgamento do mensalão e avisou
sobre sua ida à Itália, considerada por ele como “legítimo direito de liberdade
para ter um novo julgamento”. Sua saída do Brasil deu-se pelo Rio de Janeiro,
seguindo para o Paraguai e depois para a Argentina, onde deixou pistas
importantes para a Polícia Federal. No aeroporto argentino foram tiradas fotos
suas e copiadas suas digitais, em processo regular pelo qual passam todos os
passageiros estrangeiros que ali desembarcam. Consciente de sua fuga e
decretada sua prisão, a PF inseriu Pizzolato no Sistema de Difusão Vermelha, ou
lista de procurados internacionais, da Interpol.
A
Interpol, Organização Internacional de Polícia Criminal, criada em 1923, é um
sistema de cooperação das polícias de todo o mundo com o fim de mobilização
para encontrar criminosos foragidos internacionalmente. A organização conta
hoje com a participação de 190 Estados. A representação da Interpol no Brasil
se dá através da PF na Capital Federal Nacional.
Em
fevereiro de 2014, Pizzolato foi encontrado e preso na cidade de Maranello,
norte da Itália, pela polícia italiana. O comandante da polícia da província
confirmou que o motivo da prisão foi o mandado de prisão internacional
divulgado pelo site da Interpol. Confirmada sua detenção, o Brasil iniciou os
procedimentos do pedido de extradição, para que aqui pudesse enfrentar a
Justiça nacional por conta de sua participação no Mensalão.
O
pedido brasileiro de extradição fundamentou-se no tratado firmado entre o
Brasil e a Itália em 1989 relativo à matéria. Assim como ocorre com o Brasil, mesmo
a Justiça Italiana autorizando a extradição, a decisão final cabe à Presidência
do país. O fato de Pizzolato possuir também a nacionalidade italiana poderia
ser considerado como um problema para o processo. No entanto, diferentemente do
que ocorre no Brasil, na legislação italiana não há proibição de extradição de
nacionais, sendo os termos definidos pelo tratado em causa. De toda forma, para
caso de negação do pedido, o Brasil já havia afirmado que encaminharia à
Justiça Italiana os documentos relativos ao Mensalão ao país europeu, para que
lá encontrasse julgamento. Ademais, é de notar que na Itália ainda responderia
pelos crimes de falsidade ideológica e porte de documentos falsos, por conta do
passaporte com que desembarcou.
A
extradição é o envio de uma pessoa de um Estado a outro, em que o indivíduo é
acusado ou processado por crime grave, para lá ser julgado ou cumprir pena. O
tratado entre os dois países firma as normas que devem regulamentar o processo.
Para o caso em questão, destacamos algumas:
Art. 3: A
extradição não será concedida: [...] e) se o fato pelo qual é pedida for considerado, pela Parte requerida,
crime político; f) se a Parte requerida tiver razões ponderáveis para supor que
a pessoa reclamada será submetida a atos de perseguição e discriminação por
motivo de raça, religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política,
condição social ou pessoal; ou que sua situação possa ser agravada por um dos
elementos antes mencionados;
Art. 5: A extradição tampouco será concedida: [...] b)
se houver fundado motivo para supor que a pessoa reclamada será submetida a
pena ou tratamento que de qualquer forma configure uma violação dos seus
direitos fundamentais.
Em
primeiro lugar destacamos que, no caso Mensalão, ninguém foi condenado por crimes
políticos, o que impossibilitaria a extradição, e sim por crimes comuns. Aqui: peculato,
corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Em
outubro de 2014, foi proferida a primeira decisão italiana com relação ao
pedido brasileiro, pela Corte de Apelação de Bolonha, de primeira instância. Dentre
os principais argumentos da defesa de Pizzolato, à luz da normativa destacada,
esteve a alegação de que as prisões no Brasil apresentam condições degradantes
que violam o princípio da dignidade humana. Os advogados levantaram, por
exemplo, a situação do Complexo de Pedrinhas, no Maranhão, em que ocorriam
constantes decapitações. Também foi levantado o suposto uso excessivo da imagem
de Pizzolato pela mídia brasileira, o que poderia ter influência no Judiciário
nacional. O Brasil, porém, afirmou que, quando extraditado, Pizzolato cumpriria
pena na Penitenciária da Papuda, no Distrito Federal, que tinha perfeitas
condições de recebê-lo.
A
Corte de Bolonha acatou os argumentos dos advogados de defesa, assim negando a
extradição e soltando Pizzolato, já que, pelas acusações italianas que tinha
contra si relativamente ao uso do passaporte falso, podia responder em liberdade.
A Procuradoria Geral da República, do Brasil, reagiu recorrendo à decisão, que
poderia ser revertida pela Corte de Cassação de Roma. Para o recurso, a
Procuradoria agiu em conjunto com a Advocacia-Geral da União e o Ministério da
Justiça.
Em
fevereiro de 2015, na Corte de Cassação, a Justiça acatou o recurso do Brasil
junto ao Ministério Público da Itália contra a sentença da Corte de Bolonha,
ainda que nenhum fato novo tenha sido apresentado. Poucas horas após a decisão,
Pizzolato se entregou à Justiça Italiana. Em abril do mesmo ano, por fim, a
decisão seguiu para sua fase política, faltando a palavra final do Governo da
Itália - que autorizou a extradição.
O
processo, porém, não acabou por aí. A defesa de Pizzolato ainda apelou na
Justiça Administrativa da Itália, instância que tem poder de suspender decisões
do governo, que emitiu decisão liminar suspendendo a extradição. Em setembro de
2015, porém, o Conselho de Estado da Itália, última instância da justiça administrativa
nacional, rejeitou a decisão anterior, após analisar documentos e vídeos
entregues pelo Brasil comprovando o respeito aos direitos fundamentais dos
presos. Com a decisão do Conselho, o Governo Italiano finalmente tornou-se apto
a entregar Pizzolato ao Brasil.
No
mês seguinte, em uma última tentativa de evitar sua extradição, Pizzolato
apresentou um recurso à Corte Europeia de Direitos Humanos, que se pronuncia
sobre queixas individuais que aleguem violações de direitos humanos. As
decisões da Corte podem obrigar governos europeus a alterarem suas práticas. A
Corte, no entanto, rejeitou o recurso.
Ao
fim do mês, finalmente, Pizzolato foi extraditado e passou a cumprir pena na
Papuda, onde divide cela com mais duas pessoas. De sua pena total, um ano foi
descontado, já que o cumpriu durante as tratativas
do processo de extradição enquanto detido na Itália. O Brasil exigiu, ainda, o
pagamento de mais de R$ 600 mil por parte de Pizzolato, gastos pela República
durante o processo de extradição: gastos da Advocacia-Geral da União com
advogados italianos, viagens, traduções etc.
Por fim, é interessante lembrar que
o caso Pizzolato, envolvendo pedido brasileiro de extradição ao Estado italiano,
ocorreu pouco depois do caso Cesare Battisti, situação inversa, em que a Itália
pediu extradição ao Estado brasileiro, tendo o ex-presidente Lula negado a
mesma, apesar da autorização da Justiça Brasileira. Por conta desta negação, houve
no caso Pizzolato muita especulação sobre a possibilidade de a Itália não
conceder a extradição como certa forma de retaliação. Não foi o caso.
FONTES CONSULTADAS:
MAZZUOLI. OLIVEIRA. VÁLERIO
CURSO DIEITO INTERNACIONAL PÚBLICO 1 ed. REVISTA DOS TRIBUNAIS: SARAIVA, 2006
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/02/1407834-entenda-o-caso-pizzolato-havia-fugido-para-italia-apos-ter-prisao-decretada.shtml
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=116280
http://g1.globo.com/politica/mensalao/noticia/2015/02/pizzolato-se-entrega-justica-da-italia-apos-decisao-sobre-extradicao.html
http://www.diariopopular.com.br/tudo/index.php?n_sistema=3056&id_noticia=OTE0OTk=&id_area=Ng==
http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/bilaterais/1989/b_64
FONTE DA IMAGEM:
http://www.jornaldedomingo.com.br/noticia/16843/henrique-pizzolato-chega-ao-brasil-para-cumprir-pena/
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