segunda-feira, 29 de outubro de 2012

PARA IR ALÉM DO CAFÉ: AS RELAÇÕES ECONÔMICAS ENTRE BRASIL E ALEMANHA (1889-1914)




Por Naiane Ribeiro Cotting


RESUMO

As relações econômicas entre Brasil e Alemanha vão para além do comércio de exportação de café no período de 1889 a 1914, seu estabelecimento envolve interesses de uma Alemanha imperialista que via na emigração chances de dilatar sua área de influência, obter fontes primárias e mercado para seus produtos, por sua vez o Brasil com o advento da República pretendia ampliar seu escopo de parceiros internacionais, tanto para fomentar seu mercado de produtos internacionais como para fornecer mão-de-obra e ocupar vazios demográficos. Nesse quadro a inserção de imigrantes alemães no Brasil é analisada como um fator econômico, já que se tornou uma empresa e trouxe importantes consequências para o desenvolvimento econômico brasileiro.
O presente artigo tem como objetivo mapear e avaliar os interesses e consequências do estabelecimento das relações econômicas entre Brasil e Alemanha, considerando a inserção de imigrantes alemães no Brasil e seus reflexos econômicos. O método utilizado para mapear e avaliar o estabelecimento dessas relações foi a teoria das “forças profundas” desenvolvida por Renouvin e Duroselle que leva em conta tendências e características de longa duração que influenciam ou determinam relações externas de uma determinada unidade estatal considerando interesses econômicos como uma dessas forças, buscou-se então analisar Brasil e Alemanha como dois atores neste quadro de mudanças trazidas pelo capitalismo e industrialização.
Apesar de muitos dos interesses de imperialistas alemães não se consolidarem e dos diversos problemas e divergências de interesses ligados a imigração, muitos imigrantes estabelecidos no Brasil além consolidarem grandes empreendimentos industriais proporcionaram para o Brasil novas possibilidades de comércio com a Alemanha e o êxito alcançado pelas colônias aqui estabelecidas se incorporaram de forma positiva ao comércio e indústria nacionais estimulando a economia brasileira. 



INTRODUÇÃO

As relações entre Brasil e Alemanha vão para muito além do café, principal produto brasileiro durante a Primeira República em termos de exportação, considerando que as relações diplomáticas estabelecidas entre países envolvem motivações políticas, ideológicas e interesses econômicos. Esses interesses estão inseridos em um contexto de mudanças estruturais ocorridas no Brasil, como a mudança de regime político para a República em 1889. O Brasil, apesar de grande, era ainda um ator secundário no quadro mundial, fornecendo matérias-primas, café, açúcar, tabaco, borracha e outros produtos básicos, gravitando entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos. Desta forma, a diplomacia brasileira se esforçou para divulgar seus produtos na Europa visando às exportações, à atração de imigrantes e de capitais.
Ao analisar a reorientação da política externa brasileira com o advento da República, é possível notar que houve por parte do governo brasileiro principalmente com a gestão de Rio Branco, um grande esforço por colocar o Brasil em uma posição mais representativa no quadro internacional, assim como, fugir do predomínio da Grã-Bretanha, que exercia sobre o Brasil grande influência econômica. Nesse contexto, segundo Cervo (1992) a americanização das relações internacionais se mostrava para o Brasil algo vantajosa, já que além de encontrar mercado para seus produtos de exportação, recebia benefícios em sua relação com Estados Unidos. Com uma política exterior de viés pacifista, o Brasil igualmente teve a possibilidade de estabelecer relações com outros países, como a Alemanha, com quem passou a ampliar o comércio de importação e exportação e atrair mão-de-obra imigrante, algo que traria grandes transformações à economia nacional, mas também fazia parte do projeto de modernização do país com o advento do regime republicano.

BRASIL E ALEMANHA: JOGO DE INTERESSES E EXPANSÃO ECONÔMICA

Na Alemanha, foi primeiramente o Zollverein (União aduaneira dos estados alemães, com exclusão da Áustria), em 1834, que demonstrava a aceleração da Segunda Revolução Industrial nos territórios de língua alemã, situados na Europa Central, em especial as regiões do Ruhr, do Sarre e da Saxônia. As dificuldades de unificar o país estenderam-se até a década de 1860, quando o Reino da Prússia passou a liderar o movimento de unificação, por meio de uma estratégia militar.  Maria Luisa Renaux Hering nos oferece um panorama dessa situação:

 O processo de unificação do reino alemão favoreceu o desenvolvimento econômico e a “revolução industrial’ alemã, que se iniciou propriamente em 1850 e que teve nos anos subseqüentes à unificação, conhecidos como” Gründerjahre”, “ Anos de Fundação”, o seu “boom”. Nesses anos, a emigração foi desmotivada – o Estado necessitava de mão-de-obra para sua indústria pesada e para construção de ferrovias. A burocratização e a  militarização da vida pública, mais uma política interna imperialista, juntaram na Alemanha do II Reich nacionalismo, militarismo e monarquia e a tornaram economicamente a nação mais poderosa da Europa. O próximo Kaiser, Guilherme II, ambicionando tomar as rédeas do estado, exigiu a demissão de Otto von Bismarck. Seu governo caracterizou-se por uma linha política mais conciliatória e assegurou a posição da Alemanha como “Weltmachtstellung”, potência mundial. (HERING, 1995, p. 32, grifo do autor).

Com a saída de Bismarck, a Alemanha guilhermina passou então a desenvolver uma política externa ambiciosa, especialmente voltada para o imperialismo. Contudo, não dispunha de espaço econômico suficiente para a dimensão que o desenvolvimento econômico que sua força produtiva alcançou. Houve assim, uma grande necessidade por parte da elite política e econômica alemã de dilatar as áreas de influência do capitalismo alemão, para obter fontes de matérias primas, mercados para vendas de manufaturas e inversão de capitais acumulados. Nisso, podemos incluir o esforço em obter melhores mercados consumidores para os produtos industriais alemães, colônias que pudessem também oferecer fontes de matérias-primas e locais para investimento dos capitais auferidos com o desenvolvimento industrial. A Europa Oriental, da Ásia e da América Latina, notadamente o Brasil figuravam a partir de então como áreas de interesse para os alemães. Além disso, o Brasil em especial, em função da grande presença de imigrantes alemães, representava uma área de especial interesse para a diplomacia e o comércio do Império Alemão.  
Por sua vez, o Brasil tinha grande interesse em ampliar seu escopo de parceiros internacionais, tanto para fomentar seu mercado de produtos tropicais, quanto para fornecer mão-de-obra para lavouras de café, ocupar espaços demográficos vazios, além da formação de pequenos proprietários agrícolas que com seu trabalho abasteceriam as grandes cidades, construindo juntamente obras públicas. As colônias eram criadas por iniciativa de particulares ou iniciativa dos governos, porém existiam divergências entre a política imigratória do poder central e as reações tomadas pelos governos das províncias.

 A IMIGRAÇÃO COMO UMA EMPRESA

De acordo com Willems (1980) o povoamento sistemático do Brasil meridional com imigrantes germânicos iniciou-se em 1824. Os imigrantes germânicos abandonaram uma cultura em plena mudança, com ritmos variados, a sociedade rural estava se secularizando, e as comunidades vinham se articulando aos mercados urbanos e a industrialização crescente. Portanto, a imigração esteve ligada a motivos políticos religiosos, mas também a uma forma de resolver dificuldades econômicas, prevenindo ou modificando situações indesejáveis.
Um dos fatores motivadores da colonização privada é o comércio de terras, fundadas com capital estrangeiro ou brasileiro, organizadas individual ou socialmente, as terras eram vendidas pelo menor preço possível, adotando o sistema de colonização adequado a seus desígnios econômicos. Os imigrantes alemães trouxeram um padrão econômico que influiu decisivamente sobre a cultura do Brasil meridional, pois eram em geral camponeses habituados com a exploração capitalista das terras, produzindo não apenas para sua subsistência, mas também para atender as demandas de um mercado em crescente demanda por variados produtos, em especial os ligados à produção de alimentos, laticínios e embutidos. Os imigrantes também representavam uma considerável mão-de-obra urbana, como trabalhadores relacionados a ofícios necessários para o fomento ao crescimento das cidades no Brasil. Trabalhavam como marceneiros, alfaiates, pedreiros, pintores, padeiros, cervejeiros e em outras atividades. Além disso, apareciam como comerciantes de atacado e varejo, profissionais liberais e empreendedores, em especial como industriais.
No tocante às relações entre Alemanha e Brasil, as conexões são já bastante antigas e precedem a unificação alemã de 1871. Descontando a presença de alemães no Brasil desde o período colonial (Hans Staden, Erasmo Schetz, João Maurício de Nassau-Siegen, Barão de Eschwege, entre outros), as relações diplomáticas e comerciais foram pela primeira vez estabelecidas em 1827, quando as cidades-livres de Hamburgo, Bremen e Lübeck estabeleceram relações diplomáticas com o Império do Brasil, seguidas pelo Reino da Prússia. Entre 1827 e 1871, houve um intenso relacionamento entre os Estados Alemães e o Brasil, relacionados a uma infinidade de áreas de interesse, desde o comércio de cacau e madeiras, até o agenciamento de imigrantes para o povoamento e provimento de mão-de-obra no Brasil. Havia pois, uma vasta gama de interesses que motivaram as relações entre o Brasil e a Alemanha.    
Para que seja possível analisar e compreender os fatores que levaram ao estabelecimento das relações entre Brasil e Alemanha consideramos a teoria das forças profundas, elaborada por Pierre Renouvin e Jean-Batiste Duroselle, que avaliam que:

As forças profundas são aqueles eventos, tendências e características de longa duração que influenciam ou determinam as relações externas de uma determinada unidade estatal. Essas forças profundas podem estar relacionadas com condições geográficas do território do estado, com suas características demográficas, com seus interesses econômicos, com o jogo de sua política interna, com a questão da psicologia coletiva, com o nacionalismo, com a opinião publica, com a influência da mídia e seu controle, com influência das religiões e dos líderes religiosos, com o papel e a ação do estadista, entre outras. Nessas condicionantes é que poderemos encontrar os fatores que determinam as relações internacionais e que servem de interpretação e de análise para a historiografia das relações internacionais (RENOUVIN & DUROSELLE, 2000, p.15).

Partindo desta teoria, é possível considerar que os imigrantes se tornaram um importante fator econômico tanto para a Alemanha pela importância atribuída ao papel dos imigrantes alemães vistos como porta de entrada para produtos industriais alemães no Brasil, assim como elementos facilitadores nas negociações com o governo brasileiro. No Brasil, os imigrantes são vistos como importante fonte de mão-de-obra e posteriormente elemento impulsionador para indústria com inovações técnicas e nova mentalidade trazidas, consequente progresso econômico nas regiões em que se estabeleceram como analisaremos adiante.
As ”forças profundas” se fazem presente também na formação da psicologia coletiva alemã com a consolidação do nacionalismo e do imperialismo, interesses econômicos que motivaram o governo alemão e as decisões do chefe de estado, considerando as ambições do Kaiser Guilherme II, a opinião pública e sua manipulação através das propagandas de emigração e dos grupos de pressão que exercem influência sobre as decisões do chefe de estado, como representantes da burguesia, empresários e políticos alemães que lucrariam com a emigração, isso fica evidente nos escritos de Klaus Richter que analisou fontes alemãs em Hamburgo:

Adeptos do imperialismo e nacionalismo da época consideravam de interesse nacional que pela emigração os emigrantes não perdessem a sua etnia, cultura, língua e nacionalidade, mas, sim, formassem poderosos quistos étnicos no além-mar. Para tal fim, recomendavam que fossem fundadas colônias agrícolas em regiões que: Sendo pouco habitadas pelos nativos e possuindo condições climáticas vantajosas, favorecessem uma imigração alemã em grande escala com boas possibilidades de desenvolvimento. Pelo fato de a população nativa ser de “raça inferior” garantissem que a etnia, cultura, língua e nacionalidade dos imigrantes ficariam preservadas. A longo prazo fornecessem matérias primas para a Alemanha; e, No inicio não desenvolvessem indústria própria, dependendo, portanto, da importação de produtos industriais da Alemanha. (BRUNN, 1971 apud RICHTER, 1986, p.13).

Ainda de acordo com Richter entusiastas pela fundação de colônias agrárias alemãs demonstravam suas intenções:

Um deles, Karl Ballod, achava em 1899, que seria possível estabelecer de 500 a 750 mil famílias de pequenos camponeses alemães no sul do Brasil. Um outro, Robert Jannasch, em 1902 calculava que seria possível estabelecer 500 a 750 mil imigrantes por ano, dentro de 16 a 20 anos, já estariam vivendo naquelas regiões brasileiras, 100 mil colonos alemães, os quais então, comprariam artigos importados da Alemanha, num valor de aproximadamente, 10 milhões de marcos. Eis aí, a importância que muitos na época estavam atribuindo à colonização alemã no Brasil meridional para a indústria e comercio da época. Segundo eles, os colonos alemães até então introduzidos lá, já estariam formando uma classe dominante na economia sul-brasileira. Esperava-se que eles, embora cidadãos brasileiros ficassem economicamente vinculados ao império alemão. (BRUNN, 1971 apud RICHTER, 1986, p.14).

Contudo, apesar dessas intenções, muitos desses planos não se mostravam viáveis por uma série de condições, a grande maioria dos alemães estabelecidos no Brasil aceitavam a soberania nacional e seus filhos se reconheciam como cidadãos brasileiros, sem que esse domínio econômico alemão fosse imposto, mas se preservassem os valores de vida alemães. Além disso, existiam divergências entre imperialistas alemães, ministros de relações exteriores e ministros do comércio na Alemanha. Este último, considerava urgente a exploração de novos mercados transatlânticos e mercados consumidores de produtos alemães. De outro lado, o ministro do interior não estava interessado na emigração, pelo receio de falta de mão-de-obra na Alemanha. Assim, vários planos de imigração e colonização com colonos alemães não foram levados adiante:

Ao mesmo tempo, o embaixador alemão no Brasil, Krauel, visitara as áreas de colonização teuta. Em 1895, compilou um relatório extremamente positivo sobre a situação dos alemães e seus descendentes no sul do país. Teriam alcançado posição econômica fortíssima em Santa Catarina, dominando o comércio de importação. Joinville seria uma cidade alemã. Mesmo assim, Krauel lamentava que os teuto-brasileiros ainda não exercessem grande influência política e que, devido ao numero insuficiente de imigrantes, até então não teriam conseguido penetrar a região de forma favorável aos interesses alemães. (BRUNN, 1971 apud RICHTER, 1986, p.17)

O esquema abaixo exemplifica de forma resumida as complexas relações entre Brasil e Alemanha levando em conta seus interesses e as “forças profundas”:

AS SOCIEDADES COLONIZADORAS

Por trás da iniciativa particular de recrutamento de emigrantes estavam os interesses das companhias colonizadoras. Havia interesse na exploração de novas áreas, movimentação de pessoas e venda de propriedades fazendo da emigração uma empresa e dos emigrantes uma espécie de “mercadoria”. Havia competição entre as agências que ganhavam por emigrante embarcado, utilizavam-se então de propagandas. A cidade de Hamburgo era um importante porto de embarque de emigrantes, não apenas de alemães, mas também de indivíduos originários da Europa Oriental, como poloneses, judeus, russos, interessados em uma vida melhor na América.
 Segundo Hering (1995) a emigração teve papel decisivo no florescimento da navegação alemã. Todas as firmas marítimas importadoras tinham sua quota nos negócios emigratórios. O desenvolvimento das companhias “Hapag” e do “Nordeutscherlloyd” estava relacionado à emigração. O recrutamento de passageiros virou uma cadeia de negócios à qual os imigrantes tinham de se sujeitar. As atividades das sociedades colonizadoras estavam ligadas a interesses econômicos alemães, apoiados no capitalismo comercial liberal. Como citado anteriormente, desde 1827 já existia entre o Brasil e Hamburgo um tratado de comercio e navegação fechado com as três cidades de Bremen, Lübeck e Hamburgo, visando ampliar as relações econômicas entre ambos. Os empresários hamburgueses, vendo possibilidades de negócios com a imigração, e em apoio aos interesses brasileiros, fundaram a “Sociedade de Fomento à Emigração Alemã para o Brasil.

AS COLÔNIAS E SEUS REFLEXOS ECONÔMICOS

Por iniciativa particular ou governamental formaram-se no Brasil vários tipos de colônias, como as de companhias de colonização e as colônias surgidas pela iniciativa privada de pessoas físicas. Conforme Pinheiro e Holanda (2006, p.107-108) a posição do governo brasileiro frente aos problemas de imigração e colonização dependia em grande parte dos recursos disponíveis e também da política econômico-financeira adotada. Um mês após a proclamação da República, o governo provisório atendendo a interesses a imigração, decretou que fossem considerados cidadãos brasileiros todos os estrangeiros aqui residentes a 15 de novembro de 1889 e aqueles que tivessem residência no país por dois anos. O decreto de janeiro de 1890 procurava atrair o “proletário agrícola nacional” para a tarefa de colonização e chamava a atenção sobre a necessidade de povoamento das fronteiras.
Foi pela lei orçamentária de 1894 que a colonização e imigração passaram a ser atribuições dos estados. Uma vez estabelecidos os imigrantes alemães interferiram grandemente no processo econômico brasileiro, especialmente passaram a desenvolver indústrias próprias importando maquinismos e promovendo novas técnicas, além do comércio, fator propulsionador de progresso para o Brasil. Conforme Oberacker (1968) os empreendimentos industriais frequentemente se associavam a casas de importação e exportação, que passaram a adotar novos rumos de comércio no país e assim foram proporcionadas novas possibilidades de negócios com os alemães. Logo, a participação econômica de empresários ligados ao comércio de exportação e importação se tornou fundamental para os estados meridionais do Brasil e para a formação de um segmento empresarial num mundo burguês em expansão.
 Devemos notar que a iniciativa privada fomentou o surgimento de uma indústria bastante diversificada para os padrões da época, e que se concentrou no Rio Grande do Sul, no Paraná e em Santa Catarina. Segundo Fouquet (1974) no Rio Grande do Sul, nomes como Becker, Bins, Berta, e Wallig lembram fundições e metalurgia; Ritter, Bopp, Thofehrn e Becker bebidas; Oderich conservas; Dreher vinhos; Neugebauer, chocolates; Poock, fumo; Strassburger artigos de couro; Gerdau, móveis; Sperb e Renner, produtos têxteis. No comércio aparecem os nomes Fraeb, Bromberg, Mentz, Ullmann e Bier.
Em Santa Catarina igualmente se apresentam famílias e pessoas que se notabilizaram, como: Hering, Renaux, Karsten, Zadrozny, Cremer, Kühnrich e Schlösser, na indústria têxtil; Albano Scmidt e Paul Werner. Em atividades diversas, as famílias Feddersen, Lorenz, Weege, Jensen, Colin, Wetzel, Lepper, Stein, Bornschein e Käsemodel, sendo que no comércio o primeiro lugar cabe a família Hoepke, a casa Möllmann, fundada em 1869, é uma das mais antigas firmas comerciais.
Em Curitiba, no Paraná, a família de Gottlieb Müller desde 1878 era proprietária da indústria de ferro Marumby, sempre em expansão, e Florian Essenfelder fundou em 1911 uma fábrica de pianos. Hauer, Boutin, Heissler e Hatschbach, eram nomes proeminentes na indústria e no comércio. Schrappe pertencia ao ramo editorial, com a conhecida Impressora Paranaense, enquanto os Stellfeld no ramo farmacêutico e os Johnscher no ramo hoteleiro.
Destarte, é possível pontuar regiões específicas de empreendimentos empresariais como o vale do Itajaí, em Santa Catarina, por exemplo, foco de estudo da historiadora Maria Luiza Renaux Hering, já citada anteriormente.
Conforme Hering (1987, p.13) as empresas têxteis do Vale do Itajaí caracterizaram-se pelo investimento exclusivo de recursos particulares, provenientes de recursos dos próprios empreendedores, o que os tornou economicamente independentes e com um certo grau de estabilidade. Constata-se sua independência em relação ao governo pela ausência de subsídios e favores (isenções fiscais, licenças especiais) que as empresas mais próximas dos grandes centros recebiam e em relação às instituições bancárias, inexistentes localmente. Decorre dessa auto-suficiência e solidez a capacidade de manter-se no mercado e de resistir a conjunturas difíceis.
Baseando-se ainda nos estudos de Hering, houve uma integração do vale do Itajaí ao quadro amplo da industrialização brasileira, na forma de pequenas e médias empresas familiares, independentes com relação à instituições financeiras, e que possuíam mão-de-obra qualificada, treinada no ambiente do artesanato e da revolução industrial alemã, e que trazia  consigo a valorização da qualidade do produto final e do cooperativismo desenvolvido nas dificuldades surgidas nos primeiros anos da imigração. Estas atitudes tiveram prolongamento nas relações empresariais que se transformaram em empreendimentos sólidos e se expandiram nacionalmente de forma autônoma:

(...) se existiu algum fator de ligação externa, como muitos o querem, este não se teria ligado através das regiões economicamente mais desenvolvidas do país, mas sim pela expansão da economia catarinense para os projetos internacionais. Tratava-se de relações pessoais no intercambio entre os comerciantes alemães e os imigrantes da mesma origem. (HERING, 1987, p.13)

Logo, mapeando tais reflexos para economia brasileira, pontuando espacialmente a localização de empreendimentos alemães, foi possível perceber casos específicos e diferenciados de desenvolvimento econômico principalmente na região Sul do Brasil. Com desenvolvimento próprio, de acordo com recursos disponíveis e como forma de resposta a problemas que se apresentaram para estes imigrantes, que através de muito trabalho e de sua mentalidade de iniciativa, transformaram suas fábricas em grandes empreendimentos industriais.
Mapeamos então interesses alemães e brasileiros no estabelecimento de relações diplomáticas que envolveram questões complexas como pressões internas, necessidades econômicas e ideologias relacionadas ao imperialismo de fins do século XIX e início do XX. Nesse jogo de poder, entre divergências, lucros e fracassos pode-se avaliar de forma positiva os reflexos da imigração alemã para o Brasil. Os núcleos coloniais podiam ser organizados pelos governos Federal, Estadual e mesmo Municipal. Particulares e companhias da mesma forma participaram desse processo, visando lucros trazidos pela venda de imigrantes, assim, ocuparam-se áreas escassamente povoadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A imigração esteve ligada às rápidas e mudanças políticas e econômicas ocorridas na Alemanha, os imigrantes como fatores econômicos trouxeram para o Brasil mudanças frente ao trabalho, as firmas estabelecidas pelos alemães, em casos específicos autônomas, em muito contribuíram para o desenvolvimento da vida econômica brasileira se integrando ao quadro econômico nacional.
Por outro lado, em relação à questão de que papel o Brasil poderia ter tido no tocante à expansão do capitalismo imperialista alemão, podemos afirmar que havia sim um interesse alemão de integrar o Brasil à sua esfera de influência. A rica e diversificada indústria alemã, especialmente ligada à indústria eletro-mecânica, siderúrgica, de ferramentas, de produtos químicos e farmacêuticos, tinha um interesse bastante grande de marcar sua presença no mercado brasileiro. Também o setor financeiro e de investimentos demonstrava interesse no Brasil. Nosso país ainda era em grande parte inexplorado e necessitava de investimentos para criar uma infra-estrutura física para possibilitar o desenvolvimento econômico. Investidores alemães queriam estar presentes e participar desse empreendimento, pois significava acesso a novas oportunidades de negócio. As próprias colônias eram em si um lucrativo negócio. A arregimentação dos colonos, seu transporte, a criação de facilidades físicas para a colonização e o povoamento eram empreendimentos muito interessantes em termos econômicos para comerciantes, armadores de frotas, banqueiros e todos aqueles que estavam envolvidos no negócio da imigração, em especial, em cidades portuárias como Hamburgo e Bremen.
No entanto, quanto à questão de os imigrantes serem vistos como porta de entrada para produtos alemães no Brasil, as fontes pesquisadas não levam nessa direção. É certo que nos primeiros tempos de colonização, quanto os colonos ainda não conseguiram por se estabelecer plenamente e ainda não há uma infra-estrutura montada, não existe outra opção a não ser consumir os produtos fornecidos pela Alemanha. Muitos inclusive se tornam grandes importadores de artigos alemães para o mercado brasileiro.
Mas não podemos perceber a permanência dessa fidelidade com o desenvolvimento de uma indústria local nas regiões coloniais. Talvez pelo preço ou pela dificuldade de se ter acesso a produtos manufaturados, a indústria local prospera e os imigrantes alemães que se tornaram industriais locais, muitas vezes concorriam com produtos importados da Alemanha. Isso nos sugere que a situação do jogo imperialista era mais complexa. Muitas vezes os imigrantes eram sim porta de entrada para produtos alemães e atendiam aos interesses geopolíticos e econômicos do imperialismo alemão na América do Sul. Mas, em muitas outras vezes, eles podiam ser concorrentes e estar trabalhando contra os interesses alemães em suas regiões. Principalmente com a Primeira Guerra Mundial, com a diminuição do comércio com a Alemanha e com as pressões do governo brasileiro para que fosse acelerada a integração dos imigrantes alemães e de seus descendentes teuto-brasileiros, houve uma ampliação dos interesses econômicos de empresários teuto-brasileiros em relação às possibilidades de negócios no próprio cenário brasileiro.

Naiane Ribeiro Cotting é formada em História pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná e cursa especialização em História Contemporânea e Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

           
REFERÊNCIAS
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