Por Naiane Ribeiro Cotting
RESUMO
As relações econômicas entre Brasil e
Alemanha vão para além do comércio de exportação de café no período de 1889 a
1914, seu estabelecimento envolve interesses de uma Alemanha imperialista que
via na emigração chances de dilatar sua área de influência, obter fontes
primárias e mercado para seus produtos, por sua vez o Brasil com o advento da
República pretendia ampliar seu escopo de parceiros internacionais, tanto para
fomentar seu mercado de produtos internacionais como para fornecer mão-de-obra
e ocupar vazios demográficos. Nesse quadro a inserção de imigrantes alemães no
Brasil é analisada como um fator econômico, já que se tornou uma empresa e
trouxe importantes consequências para o desenvolvimento econômico brasileiro.
O presente artigo tem como objetivo
mapear e avaliar os interesses e consequências do estabelecimento das relações
econômicas entre Brasil e Alemanha, considerando a inserção de imigrantes
alemães no Brasil e seus reflexos econômicos. O método utilizado para mapear e
avaliar o estabelecimento dessas relações foi a teoria das “forças profundas”
desenvolvida por Renouvin e Duroselle que leva em conta tendências e
características de longa duração que influenciam ou determinam relações externas
de uma determinada unidade estatal considerando interesses econômicos como uma
dessas forças, buscou-se então analisar Brasil e Alemanha como dois atores
neste quadro de mudanças trazidas pelo capitalismo e industrialização.
Apesar de muitos dos interesses de
imperialistas alemães não se consolidarem e dos diversos problemas e
divergências de interesses ligados a imigração, muitos imigrantes estabelecidos
no Brasil além consolidarem grandes empreendimentos industriais proporcionaram
para o Brasil novas possibilidades de comércio com a Alemanha e o êxito
alcançado pelas colônias aqui estabelecidas se incorporaram de forma positiva
ao comércio e indústria nacionais estimulando a economia brasileira.
INTRODUÇÃO
As relações entre Brasil e Alemanha vão para muito
além do café, principal produto brasileiro durante a Primeira República em
termos de exportação, considerando que as relações diplomáticas estabelecidas
entre países envolvem motivações políticas, ideológicas e interesses
econômicos. Esses interesses estão inseridos em um contexto de mudanças
estruturais ocorridas no Brasil, como a mudança de regime político para a
República em 1889. O Brasil, apesar de grande, era ainda um ator secundário no
quadro mundial, fornecendo matérias-primas, café, açúcar, tabaco, borracha e
outros produtos básicos, gravitando entre a Grã-Bretanha e os Estados Unidos. Desta
forma, a diplomacia brasileira se esforçou para divulgar seus produtos na
Europa visando às exportações, à atração de imigrantes e de capitais.
Ao
analisar a reorientação da política externa brasileira com o advento da
República, é possível notar que houve por parte do governo brasileiro
principalmente com a gestão de Rio Branco, um grande esforço por colocar o
Brasil em uma posição mais representativa no quadro internacional, assim como,
fugir do predomínio da Grã-Bretanha, que exercia sobre o Brasil grande
influência econômica. Nesse contexto, segundo Cervo (1992) a americanização das
relações internacionais se mostrava para o Brasil algo vantajosa, já que além
de encontrar mercado para seus produtos de exportação, recebia benefícios em
sua relação com Estados Unidos. Com uma política exterior de viés pacifista, o
Brasil igualmente teve a possibilidade de estabelecer relações com outros
países, como a Alemanha, com quem passou a ampliar o comércio de importação e
exportação e atrair mão-de-obra imigrante, algo que traria grandes
transformações à economia nacional, mas também fazia parte do projeto de
modernização do país com o advento do regime republicano.
BRASIL E
ALEMANHA: JOGO DE INTERESSES E EXPANSÃO ECONÔMICA
Na
Alemanha, foi primeiramente o Zollverein (União aduaneira dos estados alemães, com exclusão da Áustria), em
1834, que demonstrava a aceleração da Segunda Revolução Industrial nos
territórios de língua alemã, situados na Europa Central, em especial as regiões
do Ruhr, do Sarre e da Saxônia. As dificuldades de unificar o país
estenderam-se até a década de 1860, quando o Reino da Prússia passou a liderar
o movimento de unificação, por meio de uma estratégia militar. Maria Luisa Renaux Hering nos oferece um
panorama dessa situação:
O processo de unificação do reino
alemão favoreceu o desenvolvimento econômico e a “revolução industrial’ alemã,
que se iniciou propriamente em 1850 e que teve nos anos subseqüentes à
unificação, conhecidos como” Gründerjahre”, “ Anos de Fundação”, o seu “boom”.
Nesses anos, a emigração foi desmotivada – o Estado necessitava de mão-de-obra
para sua indústria pesada e para construção de ferrovias. A burocratização e
a militarização da vida pública, mais
uma política interna imperialista, juntaram na Alemanha do II Reich
nacionalismo, militarismo e monarquia e a tornaram economicamente a nação mais
poderosa da Europa. O próximo Kaiser, Guilherme II, ambicionando tomar as
rédeas do estado, exigiu a demissão de Otto von Bismarck. Seu governo
caracterizou-se por uma linha política mais conciliatória e assegurou a posição
da Alemanha como “Weltmachtstellung”, potência mundial. (HERING, 1995, p. 32,
grifo do autor).
Com a
saída de Bismarck, a Alemanha guilhermina passou então a desenvolver uma
política externa ambiciosa, especialmente voltada para o imperialismo. Contudo,
não dispunha de espaço econômico suficiente para a dimensão que o desenvolvimento
econômico que sua força produtiva alcançou. Houve assim, uma grande necessidade
por parte da elite política e econômica alemã de dilatar as áreas de influência
do capitalismo alemão, para obter fontes de matérias primas, mercados para
vendas de manufaturas e inversão de capitais acumulados. Nisso, podemos incluir
o esforço em obter melhores mercados consumidores para os produtos industriais
alemães, colônias que pudessem também oferecer fontes de matérias-primas e
locais para investimento dos capitais auferidos com o desenvolvimento
industrial. A Europa Oriental, da Ásia e da América Latina, notadamente o
Brasil figuravam a partir de então como áreas de interesse para os alemães.
Além disso, o Brasil em especial, em função da grande presença de imigrantes
alemães, representava uma área de especial interesse para a diplomacia e o
comércio do Império Alemão.
Por sua
vez, o Brasil tinha grande interesse em ampliar seu escopo de parceiros
internacionais, tanto para fomentar seu mercado de produtos tropicais, quanto
para fornecer mão-de-obra para lavouras de café, ocupar espaços demográficos
vazios, além da formação de pequenos proprietários agrícolas que com seu
trabalho abasteceriam as grandes cidades, construindo juntamente obras
públicas. As colônias eram criadas por iniciativa de particulares ou iniciativa
dos governos, porém existiam divergências entre a política imigratória do poder
central e as reações tomadas pelos governos das províncias.
A IMIGRAÇÃO COMO UMA EMPRESA
De acordo
com Willems (1980) o povoamento sistemático do Brasil meridional com imigrantes
germânicos iniciou-se em 1824. Os imigrantes germânicos abandonaram uma cultura
em plena mudança, com ritmos variados, a sociedade rural estava se
secularizando, e as comunidades vinham se articulando aos mercados urbanos e a
industrialização crescente. Portanto, a imigração esteve ligada a motivos
políticos religiosos, mas também a uma forma de resolver dificuldades
econômicas, prevenindo ou modificando situações indesejáveis.
Um dos
fatores motivadores da colonização privada é o comércio de terras, fundadas com
capital estrangeiro ou brasileiro, organizadas individual ou socialmente, as
terras eram vendidas pelo menor preço possível, adotando o sistema de
colonização adequado a seus desígnios econômicos. Os imigrantes alemães
trouxeram um padrão econômico que influiu decisivamente sobre a cultura do
Brasil meridional, pois eram em geral camponeses habituados com a exploração
capitalista das terras, produzindo não apenas para sua subsistência, mas também
para atender as demandas de um mercado em crescente demanda por variados
produtos, em especial os ligados à produção de alimentos, laticínios e
embutidos. Os imigrantes também representavam uma considerável mão-de-obra
urbana, como trabalhadores relacionados a ofícios necessários para o fomento ao
crescimento das cidades no Brasil. Trabalhavam como marceneiros, alfaiates,
pedreiros, pintores, padeiros, cervejeiros e em outras atividades. Além disso,
apareciam como comerciantes de atacado e varejo, profissionais liberais e
empreendedores, em especial como industriais.
No tocante
às relações entre Alemanha e Brasil, as conexões são já bastante antigas e
precedem a unificação alemã de 1871. Descontando a presença de alemães no
Brasil desde o período colonial (Hans Staden, Erasmo Schetz, João Maurício de
Nassau-Siegen, Barão de Eschwege, entre outros), as relações diplomáticas e
comerciais foram pela primeira vez estabelecidas em 1827, quando as
cidades-livres de Hamburgo, Bremen e Lübeck estabeleceram relações diplomáticas
com o Império do Brasil, seguidas pelo Reino da Prússia. Entre 1827 e 1871,
houve um intenso relacionamento entre os Estados Alemães e o Brasil,
relacionados a uma infinidade de áreas de interesse, desde o comércio de cacau
e madeiras, até o agenciamento de imigrantes para o povoamento e provimento de
mão-de-obra no Brasil. Havia pois, uma vasta gama de interesses que motivaram
as relações entre o Brasil e a Alemanha.
Para que
seja possível analisar e compreender os fatores que levaram ao estabelecimento
das relações entre Brasil e Alemanha consideramos a teoria das forças profundas, elaborada por Pierre Renouvin e
Jean-Batiste Duroselle, que avaliam que:
As forças profundas são aqueles eventos, tendências e características de
longa duração que influenciam ou determinam as relações externas de uma
determinada unidade estatal. Essas forças profundas podem estar relacionadas
com condições geográficas do território do estado, com suas características
demográficas, com seus interesses econômicos, com o jogo de sua política
interna, com a questão da psicologia coletiva, com o nacionalismo, com a
opinião publica, com a influência da mídia e seu controle, com influência das
religiões e dos líderes religiosos, com o papel e a ação do estadista, entre
outras. Nessas condicionantes é que poderemos encontrar os fatores que
determinam as relações internacionais e que servem de interpretação e de
análise para a historiografia das relações internacionais (RENOUVIN &
DUROSELLE, 2000, p.15).
Partindo
desta teoria, é possível considerar que os imigrantes se tornaram um importante
fator econômico tanto para a Alemanha pela importância atribuída ao papel dos
imigrantes alemães vistos como porta de entrada para produtos industriais
alemães no Brasil, assim como elementos facilitadores nas negociações com o
governo brasileiro. No Brasil, os imigrantes são vistos como importante fonte
de mão-de-obra e posteriormente elemento impulsionador para indústria com
inovações técnicas e nova mentalidade trazidas, consequente progresso econômico
nas regiões em que se estabeleceram como analisaremos adiante.
As ”forças
profundas” se fazem presente também na formação da psicologia coletiva alemã
com a consolidação do nacionalismo e do imperialismo, interesses econômicos que
motivaram o governo alemão e as decisões do chefe de estado, considerando as
ambições do Kaiser Guilherme II, a opinião pública e sua manipulação através
das propagandas de emigração e dos grupos de pressão que exercem influência
sobre as decisões do chefe de estado, como representantes da burguesia,
empresários e políticos alemães que lucrariam com a emigração, isso fica
evidente nos escritos de Klaus Richter que analisou fontes alemãs em Hamburgo:
Adeptos do imperialismo e nacionalismo da época consideravam de
interesse nacional que pela emigração os emigrantes não perdessem a sua etnia,
cultura, língua e nacionalidade, mas, sim, formassem poderosos quistos étnicos
no além-mar. Para tal fim, recomendavam que fossem fundadas colônias agrícolas
em regiões que: Sendo pouco habitadas pelos nativos e possuindo condições
climáticas vantajosas, favorecessem uma imigração alemã em grande escala com
boas possibilidades de desenvolvimento. Pelo fato de a população nativa ser de
“raça inferior” garantissem que a etnia, cultura, língua e nacionalidade dos
imigrantes ficariam preservadas. A longo prazo fornecessem matérias primas para
a Alemanha; e, No inicio não desenvolvessem indústria própria, dependendo,
portanto, da importação de produtos industriais da Alemanha. (BRUNN, 1971 apud
RICHTER, 1986, p.13).
Ainda de
acordo com Richter entusiastas pela fundação de colônias agrárias alemãs
demonstravam suas intenções:
Um deles, Karl Ballod, achava em 1899, que seria possível estabelecer de
500 a 750 mil famílias de pequenos camponeses alemães no sul do Brasil. Um
outro, Robert Jannasch, em 1902 calculava que seria possível estabelecer 500 a
750 mil imigrantes por ano, dentro de 16 a 20 anos, já estariam vivendo
naquelas regiões brasileiras, 100 mil colonos alemães, os quais então,
comprariam artigos importados da Alemanha, num valor de aproximadamente, 10 milhões
de marcos. Eis aí, a importância que muitos na época estavam atribuindo à
colonização alemã no Brasil meridional para a indústria e comercio da época.
Segundo eles, os colonos alemães até então introduzidos lá, já estariam
formando uma classe dominante na economia sul-brasileira. Esperava-se que eles,
embora cidadãos brasileiros ficassem economicamente vinculados ao império
alemão. (BRUNN, 1971 apud RICHTER, 1986, p.14).
Contudo,
apesar dessas intenções, muitos desses planos não se mostravam viáveis por uma
série de condições, a grande maioria dos alemães estabelecidos no Brasil
aceitavam a soberania nacional e seus filhos se reconheciam como cidadãos
brasileiros, sem que esse domínio econômico alemão fosse imposto, mas se
preservassem os valores de vida alemães. Além disso, existiam divergências
entre imperialistas alemães, ministros de relações exteriores e ministros do
comércio na Alemanha. Este último, considerava urgente a exploração de novos
mercados transatlânticos e mercados consumidores de produtos alemães. De outro
lado, o ministro do interior não estava interessado na emigração, pelo receio
de falta de mão-de-obra na Alemanha. Assim, vários planos de imigração e
colonização com colonos alemães não foram levados adiante:
Ao mesmo tempo, o embaixador alemão no Brasil, Krauel, visitara as áreas
de colonização teuta. Em 1895, compilou um relatório extremamente positivo
sobre a situação dos alemães e seus descendentes no sul do país. Teriam
alcançado posição econômica fortíssima em Santa Catarina, dominando o comércio
de importação. Joinville seria uma cidade alemã. Mesmo assim, Krauel lamentava
que os teuto-brasileiros ainda não exercessem grande influência política e que,
devido ao numero insuficiente de imigrantes, até então não teriam conseguido
penetrar a região de forma favorável aos interesses alemães. (BRUNN, 1971 apud
RICHTER, 1986, p.17)
O esquema
abaixo exemplifica de forma resumida as complexas relações entre Brasil e
Alemanha levando em conta seus interesses e as “forças profundas”:
AS SOCIEDADES
COLONIZADORAS
Por trás
da iniciativa particular de recrutamento de emigrantes estavam os interesses
das companhias colonizadoras. Havia interesse na exploração de novas áreas,
movimentação de pessoas e venda de propriedades fazendo da emigração uma
empresa e dos emigrantes uma espécie de “mercadoria”. Havia competição entre as
agências que ganhavam por emigrante embarcado, utilizavam-se então de
propagandas. A cidade de Hamburgo era um importante porto de embarque de
emigrantes, não apenas de alemães, mas também de indivíduos originários da
Europa Oriental, como poloneses, judeus, russos, interessados em uma vida
melhor na América.
Segundo Hering (1995) a emigração teve papel
decisivo no florescimento da navegação alemã. Todas as firmas marítimas
importadoras tinham sua quota nos negócios emigratórios. O desenvolvimento das
companhias “Hapag” e do “Nordeutscherlloyd” estava relacionado à emigração. O
recrutamento de passageiros virou uma cadeia de negócios à qual os imigrantes
tinham de se sujeitar. As atividades das sociedades colonizadoras estavam
ligadas a interesses econômicos alemães, apoiados no capitalismo comercial
liberal. Como citado anteriormente, desde 1827 já existia entre o Brasil e
Hamburgo um tratado de comercio e navegação fechado com as três cidades de
Bremen, Lübeck e Hamburgo, visando ampliar as relações econômicas entre ambos.
Os empresários hamburgueses, vendo possibilidades de negócios com a imigração,
e em apoio aos interesses brasileiros, fundaram a “Sociedade de Fomento à
Emigração Alemã para o Brasil.
AS COLÔNIAS E SEUS
REFLEXOS ECONÔMICOS
Por
iniciativa particular ou governamental formaram-se no Brasil vários tipos de
colônias, como as de companhias de colonização e as colônias surgidas pela
iniciativa privada de pessoas físicas. Conforme Pinheiro e Holanda (2006, p.107-108)
a posição do governo brasileiro frente aos problemas de imigração e colonização
dependia em grande parte dos recursos disponíveis e também da política
econômico-financeira adotada. Um mês após a proclamação da República, o governo
provisório atendendo a interesses a imigração, decretou que fossem considerados
cidadãos brasileiros todos os estrangeiros aqui residentes a 15 de novembro de
1889 e aqueles que tivessem residência no país por dois anos. O decreto de janeiro
de 1890 procurava atrair o “proletário agrícola nacional” para a tarefa de
colonização e chamava a atenção sobre a necessidade de povoamento das
fronteiras.
Foi pela
lei orçamentária de 1894 que a colonização e imigração passaram a ser
atribuições dos estados. Uma vez estabelecidos os imigrantes alemães
interferiram grandemente no processo econômico brasileiro, especialmente
passaram a desenvolver indústrias próprias importando maquinismos e promovendo
novas técnicas, além do comércio, fator propulsionador de progresso para o
Brasil. Conforme Oberacker (1968) os empreendimentos industriais frequentemente
se associavam a casas de importação e exportação, que passaram a adotar novos
rumos de comércio no país e assim foram proporcionadas novas possibilidades de negócios
com os alemães. Logo, a participação econômica de empresários ligados ao
comércio de exportação e importação se tornou fundamental para os estados
meridionais do Brasil e para a formação de um segmento empresarial num mundo
burguês em expansão.
Devemos notar que a iniciativa privada
fomentou o surgimento de uma indústria bastante diversificada para os padrões
da época, e que se concentrou no Rio Grande do Sul, no Paraná e em Santa
Catarina. Segundo Fouquet (1974) no Rio Grande do Sul, nomes como Becker, Bins,
Berta, e Wallig lembram fundições e metalurgia; Ritter, Bopp, Thofehrn e Becker
bebidas; Oderich conservas; Dreher vinhos; Neugebauer, chocolates; Poock, fumo;
Strassburger artigos de couro; Gerdau, móveis; Sperb e Renner, produtos
têxteis. No comércio aparecem os nomes Fraeb, Bromberg, Mentz, Ullmann e Bier.
Em Santa
Catarina igualmente se apresentam famílias e pessoas que se notabilizaram,
como: Hering, Renaux, Karsten, Zadrozny, Cremer, Kühnrich e Schlösser, na
indústria têxtil; Albano Scmidt e Paul Werner. Em atividades diversas, as
famílias Feddersen, Lorenz, Weege, Jensen, Colin, Wetzel, Lepper, Stein,
Bornschein e Käsemodel, sendo que no comércio o primeiro lugar cabe a família
Hoepke, a casa Möllmann, fundada em 1869, é uma das mais antigas firmas
comerciais.
Em
Curitiba, no Paraná, a família de Gottlieb Müller desde 1878 era proprietária
da indústria de ferro Marumby, sempre em expansão, e Florian Essenfelder fundou
em 1911 uma fábrica de pianos. Hauer, Boutin, Heissler e Hatschbach, eram nomes
proeminentes na indústria e no comércio. Schrappe pertencia ao ramo editorial,
com a conhecida Impressora Paranaense, enquanto os Stellfeld no ramo
farmacêutico e os Johnscher no ramo hoteleiro.
Destarte,
é possível pontuar regiões específicas de empreendimentos empresariais como o
vale do Itajaí, em Santa Catarina, por exemplo, foco de estudo da historiadora
Maria Luiza Renaux Hering, já citada anteriormente.
Conforme
Hering (1987, p.13) as empresas têxteis do Vale do Itajaí caracterizaram-se
pelo investimento exclusivo de recursos particulares, provenientes de recursos
dos próprios empreendedores, o que os tornou economicamente independentes e com
um certo grau de estabilidade. Constata-se sua independência em relação ao
governo pela ausência de subsídios e favores (isenções fiscais, licenças
especiais) que as empresas mais próximas dos grandes centros recebiam e em relação
às instituições bancárias, inexistentes localmente. Decorre dessa
auto-suficiência e solidez a capacidade de manter-se no mercado e de resistir a
conjunturas difíceis.
Baseando-se
ainda nos estudos de Hering, houve uma integração do vale do Itajaí ao quadro
amplo da industrialização brasileira, na forma de pequenas e médias empresas
familiares, independentes com relação à instituições financeiras, e que
possuíam mão-de-obra qualificada, treinada no ambiente do artesanato e da
revolução industrial alemã, e que trazia
consigo a valorização da qualidade do produto final e do cooperativismo
desenvolvido nas dificuldades surgidas nos primeiros anos da imigração. Estas
atitudes tiveram prolongamento nas relações empresariais que se transformaram
em empreendimentos sólidos e se expandiram nacionalmente de forma autônoma:
(...) se existiu algum fator de ligação externa, como muitos o querem, este
não se teria ligado através das regiões economicamente mais desenvolvidas do
país, mas sim pela expansão da economia catarinense para os projetos
internacionais. Tratava-se de relações pessoais no intercambio entre os
comerciantes alemães e os imigrantes da mesma origem. (HERING, 1987, p.13)
Logo,
mapeando tais reflexos para economia brasileira, pontuando espacialmente a
localização de empreendimentos alemães, foi possível perceber casos específicos
e diferenciados de desenvolvimento econômico principalmente na região Sul do
Brasil. Com desenvolvimento próprio, de acordo com recursos disponíveis e como
forma de resposta a problemas que se apresentaram para estes imigrantes, que
através de muito trabalho e de sua mentalidade de iniciativa, transformaram
suas fábricas em grandes empreendimentos industriais.
Mapeamos
então interesses alemães e brasileiros no estabelecimento de relações
diplomáticas que envolveram questões complexas como pressões internas,
necessidades econômicas e ideologias relacionadas ao imperialismo de fins do
século XIX e início do XX. Nesse jogo de poder, entre divergências, lucros e
fracassos pode-se avaliar de forma positiva os reflexos da imigração alemã para
o Brasil. Os núcleos coloniais podiam ser organizados pelos governos Federal,
Estadual e mesmo Municipal. Particulares e companhias da mesma forma
participaram desse processo, visando lucros trazidos pela venda de imigrantes,
assim, ocuparam-se áreas escassamente povoadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A
imigração esteve ligada às rápidas e mudanças políticas e econômicas ocorridas
na Alemanha, os imigrantes como fatores econômicos trouxeram para o Brasil
mudanças frente ao trabalho, as firmas estabelecidas pelos alemães, em casos
específicos autônomas, em muito contribuíram para o desenvolvimento da vida
econômica brasileira se integrando ao quadro econômico nacional.
Por
outro lado, em relação à questão de que papel o Brasil poderia ter tido no
tocante à expansão do capitalismo imperialista alemão, podemos afirmar que
havia sim um interesse alemão de integrar o Brasil à sua esfera de influência.
A rica e diversificada indústria alemã, especialmente ligada à indústria
eletro-mecânica, siderúrgica, de ferramentas, de produtos químicos e
farmacêuticos, tinha um interesse bastante grande de marcar sua presença no
mercado brasileiro. Também o setor financeiro e de investimentos demonstrava
interesse no Brasil. Nosso país ainda era em grande parte inexplorado e
necessitava de investimentos para criar uma infra-estrutura física para
possibilitar o desenvolvimento econômico. Investidores alemães queriam estar
presentes e participar desse empreendimento, pois significava acesso a novas
oportunidades de negócio. As próprias colônias eram em si um lucrativo negócio.
A arregimentação dos colonos, seu transporte, a criação de facilidades físicas
para a colonização e o povoamento eram empreendimentos muito interessantes em
termos econômicos para comerciantes, armadores de frotas, banqueiros e todos
aqueles que estavam envolvidos no negócio da imigração, em especial, em cidades
portuárias como Hamburgo e Bremen.
No
entanto, quanto à questão de os imigrantes serem vistos como porta de entrada
para produtos alemães no Brasil, as fontes pesquisadas não levam nessa direção.
É certo que nos primeiros tempos de colonização, quanto os colonos ainda não
conseguiram por se estabelecer plenamente e ainda não há uma infra-estrutura
montada, não existe outra opção a não ser consumir os produtos fornecidos pela
Alemanha. Muitos inclusive se tornam grandes importadores de artigos alemães
para o mercado brasileiro.
Mas
não podemos perceber a permanência dessa fidelidade com o desenvolvimento de
uma indústria local nas regiões coloniais. Talvez pelo preço ou pela
dificuldade de se ter acesso a produtos manufaturados, a indústria local
prospera e os imigrantes alemães que se tornaram industriais locais, muitas
vezes concorriam com produtos importados da Alemanha. Isso nos sugere que a
situação do jogo imperialista era mais complexa. Muitas vezes os imigrantes
eram sim porta de entrada para produtos alemães e atendiam aos interesses
geopolíticos e econômicos do imperialismo alemão na América do Sul. Mas, em
muitas outras vezes, eles podiam ser concorrentes e estar trabalhando contra os
interesses alemães em suas regiões. Principalmente com a Primeira Guerra
Mundial, com a diminuição do comércio com a Alemanha e com as pressões do
governo brasileiro para que fosse acelerada a integração dos imigrantes alemães
e de seus descendentes teuto-brasileiros, houve uma ampliação dos interesses
econômicos de empresários teuto-brasileiros em relação às possibilidades de
negócios no próprio cenário brasileiro.
Naiane Ribeiro Cotting é formada em História pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná e cursa especialização em História Contemporânea
e Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
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