Foto: o ministro britânico para a Europa, David
Lidington, e a diretora do
Utrikespolistika Institutet, Anna Jardfelt, em Estocolmo no dia 02 de outubro de 2012. Fonte: arquivo pessoal.
Por Gabriela Prado
Em tempos de crise do euro
e crise na União Europeia (UE), os contrastes dentro do continente europeu
ficam mais visíveis — vide post anterior, sobre a pesquisa Transatlantic Trends
2012, publicado em 03 de outubro — e a ambiguidade do projeto europeu de
integrar e respeitar as individualidades ao mesmo tempo fica praticamente
palpável. Não se trata aqui de acrescentar uma voz ao coro que prega o fim da
UE — até porque como já vimos a maior parte dos europeus de fato acredita no
projeto (segundo a Transatlantic Trends 2012, 61% acham que a UE foi positiva
para seus países), mas de observar de perto as expectativas para o futuro.
No dia 02 de outubro o
ministro britânico para a Europa, David Lidington, esteve no Instituto de Política Externa sueco (Ui)
para falar sobre como o Reino Unido vê a Europa. Durante mais de uma hora o
ministro falou e respondeu à perguntas sobre os desafios à frente para a UE, o
compromisso que o Reino Unido pretende — ou não — assumir e sobre algumas
similaridades entre as políticas britânica e sueca em relação à UE. E deixou bem
claro: o Reino Unido quer participar ativamente da UE, desde que o bloco
respeite as diferenças e particularidades de cada Estado-membro. Participar
sim, mas com autonomia.
Os três principais desafios
levantados pelo ministro foram: competitividade, comprometer-se a olhar para
fora e ter responsabilidade democrática. Segundo Lidington, a Europa vai
precisar ser mais competitiva frente às economias emergentes da América Latina
e ao gigante chinês se quiser manter o status e os benefícios sociais que tem hoje,
por exemplo. Ainda que o mercado comum tenha sido um excelente passo nessa
direção, existem poucos avanços em áreas estratégicas como um mercado comum no
âmbito digital e energético, setores-chave para melhorar a competitividade do
bloco. É preciso também tornar as regras mais “business-friendly” - leia-se flexibilização
- e investir em acordos ambiciosos de livre comércio com países-chave, como o
acordo com a Coreia do Sul que entrou provisoriamente em vigor em 2011.
Pensando ainda na expansão
das relações para fora do que hoje é o bloco europeu, Lindinton foi claro ao
defender a inclusão dos países a leste dos Bálcãs e da Turquia — desde que,
claro, cumpram com as condições necessárias para a entrada no bloco. É curioso
que haja uma defesa tão categórica dessa ampliação em um momento de crise como
esse (resultada parcialmente de uma integração muito rápida e pouco monitorada
de economias tão diferentes), mas compreensível sob a luz da necessidade de
maior dinamismo a determinadas áreas da economia europeia.
No que diz respeito à
responsabilidade democrática, o governo britânico considera que a UE precisa
aprender a lidar com as demandas democráticas dos países: usar ou não o euro,
fazer ou não parte do espaço Shengen e por aí vai. Não é surpresa que essa seja
uma demanda do Reino Unido que, por motivos próprios, não participa nem do
espaço Shengen e nem adotou o euro. A Europa precisa, assim, “respeitar a
diversidade” ao tratar de como os países vão se integrar, e será necessário
para isso uma nova arquitetura da UE – diferente desta que está sendo moldada
desde os anos 50.
A questão sobre a “nova
arquitetura” da Europa, assim, é absolutamente central para a Europa em geral e
para o Reino Unido em especial, que quer fazer parte mas não quer abrir mão de
sua identidade e autonomia (não era essa uma das condições dos tais blocos
econômicos?). O governo britânico busca uma forma de “estar na Europa mas sem
ser governado por ela”, o que resume a percepção e objetivo britânicos para o
continente. Num âmbito em que as nuances são fundamentais, como declarou a
ex-secretária sueca para a Europa, a declaração acima não deixa dúvidas sobre a
direção que o Reino Unido defende para a UE. Ficamos esperando os próximos
capítulos.
Gabriela
Prado é internacionalista formada pelo Unicuritiba em 2009 e concluiu em 2012 o
MSc International Business Negotiation pela École Supérieure du Commerce de
Rennes. Atualmente mora em Estocolmo e é membro do Utrikespolitiska Institutet
(Swedish Institute of International Affairs).
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