Imagem: Campo de refugiados na Grécia em quarentena, após caso de Coronavírus. Fonte - https://oglobo.globo.com/mundo/grecia-poe-segundo-campo-de-refugiados-em-quarentena-apos-novo-caso-de-coronavirus-24352760
Por Alécia Alves*
O novo coronavírus já atingiu mais de 1 milhão de pessoas no mundo, ocasionando em torno de 60 mil mortes e mais de 220 mil pessoas recuperadas desde o início da pandemia. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) trata-se de uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional – o mais alto nível de alerta da Organização” (dados atualizados em 3 de abril). A tendência, segundo especialistas, é que muitas pessoas ainda sejam infectadas antes que o caso se estabilize.
O surto alertou as Organizações
Internacionais e levou os Estados a tomarem medidas rigorosas de prevenção,
como exigir que a população evite aglomerações, permaneça em suas casas, que não faça contato com outras pessoas e tomem outras
medidas como
lavar as mãos, não compartilhar objetos e higienizá-los sempre que possível e, em caso de sintomas, procurar um atendimento médico o
mais rápido possível. No entanto, existe uma parcela da sociedade que está impossibilitada
de seguir as recomendações para evitar o contágio dessa doença: os refugiados.
Como permanecer em casa e evitar aglomerações quando o
perigo está em casa e é preciso fugir? Ou, como ficar em casa quando a
realidade num campo de refugiados é de pessoas que sequer tem uma casa e que
vivem amontoadas umas com as outras em barracas ou ao ar livre?
Embora o coronavírus
tenha parado boa parte das atividades econômicas do mundo todo, as causas que
levam ao deslocamento forçado de pessoas persistem: perseguições por razões
étnicas, religiosas, políticas ou de pertencimento a um determinado grupo
social - ou ainda, graves e generalizadas violações de direitos humanos - não
deixaram de existir simplesmente porque há uma pandemia em curso. No entanto,
obrigados a abandonarem seus países por motivos alheios a sua vontade, os
refugiados agora encontram fronteiras ainda mais rígidas e fechadas devido a
medidas de alguns governos para evitar a entrada e a saída de pessoas em seus
territórios em decorrência da crise do coronavírus.
Aqueles que obtêm
sucesso em fugir de situações de conflito, perseguições, problemas econômicos
ou ambientais são barrados nas divisas e obrigados a viver em situações
desumanas em centros de refugiados, onde aguardam a regulamentação do seu
status para que possam de fato migrar com todas as condições dignas de que tem
direito. Esse processo, contudo, pode demorar muito mais do que o necessário
devido a alta demanda e aos obstáculos e burocracias impostas pelos próprios
governos muitas vezes pouco dispostos a acolher esses imigrantes. Durante esse
período, aguardam aglomerados mulheres, crianças e idosos em situação de
calamidade pública.
Assim, as
recomendações de controle da pandemia passam ao largo: tomar banho, lavar as
mãos regularmente e evitar aglomerações é praticamente impossível nos cenários
de superpopulação e de falta de condições básicas de higiene em que muitos
refugiados se encontram. Outros fatores como o debilitado acesso a uma alimentação
de qualidade e a carência de serviços médicos básicos também os tornam ainda
mais suscetíveis de serem vitimados pela pandemia.
Estima-se
que “mais de 70 milhões de pessoas estão em situação de deslocamento forçado no
mundo, das quais pouco menos da metade vive em campos de refugiados ou abrigos, em geral superlotados e onde o acesso à
rede de esgoto e à água tratada é precário”, segundo O Globo.
A Grécia, por
exemplo, passa por uma das maiores crises humanitárias internacionais e conta
com cinco campos de refugiados em suas Ilhas. Dois deles já foram colocados em quarentena, em razão de casos confirmados do coronavirus. De acordo com a BBC Brasil, há em
torno de 42 mil pessoas nas ilhas gregas com capacidade para 6 mil imigrantes,
dos quais mais de 14 mil são crianças. Um dos casos mais críticos é o de Moria,
em Lesbos, o maior campo de refugiados da Europa, que abriga aproximadamente 20
mil refugiados num espaço projetado para 3 mil pessoas. A ilha com cerca 80 mil
habitantes, conta com apenas o hospital de Mitilene, que não seria capaz de
suportar um possível surto de coronavírus e entraria em absoluto colapso.
Estes refugiados
correm ainda o risco de perderem uma das poucas assistências que recebem, que
são das ONG Internacionais. Para evitar a entrada do vírus, seria necessário
fechar a entrada para os voluntários que vem do continente para as ilhas. Nesse
sentido, a tendência é que haja um isolamento total e vidas sejam largadas a
própria sorte.
Num cenário em que o
mundo está voltado a proteger-se contra o coronavírus nos grandes centros urbanos
e pouco tem conhecimento sobre essas situações que acontecem em países em
desenvolvimento e em áreas remotas do mundo, os imigrantes que já sofrem
preconceito em um contexto normal, em tempos de crise são apontados como
inimigos número um e dificilmente serão alvos de proteção e acolhimento no
continente Europeu.
Vários outros exemplos
como esses poderiam ser citados. Outro caso preocupante se encontra em Bangladesh:
a minoria mulçumana rohingyas, perseguida em Mianmar - cerca de 855 mil pessoas
- vivem em 34 campos do país com densidade de aproximadamente 40 mil pessoas
por metro quadrado.
Os cinco países que
mais recebem refugiados são Turquia, Paquistão, Uganda, Sudão e Alemanha, sendo
que a maioria vem da Síria, Afeganistão, Sudão do Sul e Mianmar. Tanto os
países receptores quanto os emissores de refugiados pouco recebem ajuda do
restante da comunidade internacional.
É indiscutível que a crise humanitária
na qual os refugiados se encontram é uma bomba relógio cuja responsabilidade
permanece sendo jogada de um lado para o outro e sendo protelada até as últimas
consequências. Diante da “pandemia de dimensões apocalípticas” que ora enfrentamos, o relógio da bomba
acelera.
Enquanto os países jogam uns para os
outros a responsabilidade de tomar
medidas enérgicas para evitar uma grande tragédia, a única certeza que se tem é que toda vida merece ser respeitada e protegida em sua
dignidade. Não é porque estamos todos preocupados com nossa própria
sobrevivência que devemos esquecer daqueles que já lutaram muito para
sobreviver. Que lembremos, também, dos refugiados nesta pandemia.
REFERÊNCIAS
ORGANIZAÇÃO
PAN AMERICNA DE SAÚDE; ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDES. Folha informativa –
COVID-19. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875.
Acesso: 2 de abril de 2020.
O GLOBO MUNDO. Superlotados, campos de refugiados são um dos espaços mais vulneráveis à Covid-19. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/superlotados-campos-de-refugiados-sao-um-dos-espacos-mais-vulneraveis-covid-19-1-24328645. Acesso em: 3 de abril de 2020.
BBBC NEWS BRASIL. 3 crises internacionais 'ocultadas' pelo coronavírus. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-51890194. Acesso em: 03 de abril de 2020.
*Alécia Alves é aluna do 7º período de Relações Internacionais. Este é o seu primeiro texto como membro oficial da equipe do Blog Internacionalize-se.
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