terça-feira, 3 de março de 2020

Me indica um livro: O Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago





Por Manuela Paola



Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago,  pode ser considerado um dos livros mais conhecidos do mundo, assim como Cem anos de solidão e Anna Karenina. No entanto, sua história e a forma como ela é contada está bem longe de ser ordinária. Os personagens não têm nome e sua descrição se resume a apenas um fato: o médico, a mulher do médico, o primeiro cego, e por aí vai. No começo, pode parecer um pouco confuso, mas conforme a leitura anda, nota-se que essa lacuna é essencial para o desenvolvimento da história. Esta autora, particularmente, sempre gostou de saber o nome dos personagens, mas surpreendeu-se quando apreciou a falta deles. Sinceramente, deixar esse mistério foi uma jogada surpreendente de Saramago - com certeza, é um dos fatores que prende o leitor ao livro.

A cegueira mencionada no título da obra é a base do enredo. O primeiro cego, um dos personagens, encontra-se de repente numa total branquitude - diferente da escuridão que imaginamos ao falar de cegueira. A partir dele, outras pessoas são “contaminadas” e também param de enxergar, como o homem que ajudou o primeiro cego e o médico que o atendeu. Quando uma quantidade considerável de pessoas não mais enxerga, o governo fica alarmado e decide colocá-las em quarentena, assim como aquelas que entraram em contato com os cegos. Mais preocupados em parar a disseminação da “doença” do que em descobrir a causa, as autoridades isolam os infectados em um manicômio abandonado, sem nenhum auxílio médico, contando apenas com a própria noção de sobrevivência. Curiosamente, uma das personagens escapou do destino que assolou a todas as outras: a mulher do médico é a única que enxerga. Para não se separar do marido, ela deixou que todos os outros acreditassem que também tinha perdido sua visão. Dessa forma, ela foi uma personagem essencial na sobrevivência de tantos outros.

Em todos os capítulos, José Saramago mostra como o egoísmo e a maldade podem aflorar em uma situação única, assim como o instinto de sobrevivência e proteção de outros seres humanos. A selvageria é uma constante em determinados personagens e nos lembra de que nunca conhecemos alguém verdadeiramente. Mas mais importante que isso, a situação em Saramago colocou seus personagens principais fez com que a união em prol do bem de todos prevalecesse, causando a sua sobrevivência.

A vida imita a arte é uma frase comumente usada para designar uma situação real que já foi descrita anteriormente em algum livro, filme ou até mesmo pintura. O paralelo com a realidade e a obra de José Saramago é bem clara. No começo do ano, o ressurgimento de um conhecido vírus chamado coronavírus fez com que o governo chinês isolasse uma cidade inteira - Wuhan - em quarentena. Tem-se pouca informação da quarentena, logo, é interessante observar o modo como as notícias sobre a doença atingiram as pessoas. Algumas entraram em pânico, comprando máscaras e álcool em gel; outras deixaram aflorar o mais puro racismo que existe dentro de si. Pelo simples fato de que o vírus se originou na China, pessoas desta nação passaram a ser alvo de xenofobia em tantos outros países. Como na famosa obra, o pânico transformou e aflorou nas pessoas o que nelas há de pior. 
O brilhantismo com o qual José Saramago escreveu Ensaio sobre a cegueira se estenderá por inúmeras gerações. Mesmo escrito em 1995, a obra permanece atual, nos permitindo fazer diversos paralelos com o contemporâneo. Esta autora espera poder fazer, também, um paralelo com o final do livro. Boa leitura!

Nenhum comentário:

Postar um comentário