sábado, 27 de outubro de 2012

A luta por corações e mentes no Paquistão




            
Por Andrew Patrick Traumann *
       

A tentativa de assassinato da estudante paquistanesa  Malala Yousafzai de 15 anos de idade no último dia 9 pode ser considerado um turning point nas relações entre a sociedade paquistanesa e a ideologia Talebã. Há muito não se via tamanha comoção no país.  Malala, que desde os 11 anos de idade já escrevia num blog em urdu para a BBC sob o codinome Gul Makai (Flor de Milho em urdu) e que já foi indicada a diversos prêmios internacionais pela sua luta em nome da educação feminina no Paquistão é um símbolo de uma luta que ocorre não só naquele país,mas também no vizinho Afeganistão: a luta por corações e mentes. Num país onde 25 milhões de crianças estão fora da escola o nome da batalha é educação.
       
Na cultura afegã e paquistanesa a mulher é vista como o depositário da honra de uma família e aquela que vai transmitir os valores morais e religiosos aos filhos. Para impedir que os valores da família ou clã sejam atingidos as saídas das mulheres  de suas  casas são restringidas ao máximo e assim como a interação com homens que não sejam o marido ou parentes próximos. A educação feminina  não é  bem-vista por muitos fundamentalistas pois em sua visão a educação religiosa é a única que realmente importa e a mulher deve se dedicar ao papel  de mãe,esposa  e dona de casa. Há um medo de que a transmissão de valores não exclusivamente religiosos se dissemine  e enfraqueça o papel da religião na sociedade.  O Talebã se alimenta do antiamericanismo disseminado na região por conta das guerras ao Afeganistão e Iraque e procura também dominar ideologicamente a sociedade por meio  de suas madrassas, escolas religiosas onde os alunos não são ensinados a raciocinar e interpretar o Alcorão mas apenas a  memorizá-lo. É extremante comum em países como Índia, Afeganistão e Paquistão que jovens memorizem o Alcorão inteiro mesmo sem falar uma palavra em árabe,ou seja decoram apenas o som das palavras sem saber  seu significado.

No momento enquanto Malala segue internada no Hospital Queen Elizabeth na Inglaterra,o país segue dividido. Por um lado, a maioria da população,especialmente nas grandes cidades como Lahore,Karachi e Islamabad apoia a causa de Malala e faz manifestações e correntes de orações por sua recuperação, por outro o Talebã tem tentado associar a imagem da menina a uma tentativa do imperialismo norte-americano de dominar o Paquistão por meio da educação feminina (relembrando aqui o papel destinado a mulher como transmissora de valores). No Paquistão e nos países islâmicos de um modo geral teorias da conspiração como esta são muito populares,e o conservadorismo social faz com que muitos  creiam que o Talebã é um dique de contenção contra valores estrangeiros vistos como imorais.

O governo paquistanês está custeando o tratamento de Malala e promete lhe oferecer um prêmio por sua coragem. Enquanto isso os dois homens que invadiram seu ônibus escolar e a balearam continuam foragidos. A luta continua.

* Andrew Patrick Traumann é professor de História das Relações Internacionais do UNICURITIBA e doutorando em História,Cultura e Poder pela UFPR.


Um comentário:

  1. É um atraso que sociedades desta natureza ainda resistam e incorporem por parte de alguns segmentos e ou membros, valores ancestrais baseados em ideologias religiosas, que não modificam e ou transformam com o passar dos séculos. Acredito que não é fácil nascer mulher nestes países infestados de fundamentalistas islâmicos que castigam com a morte seus supostos inimigos do Alcorão, que por uma ou outra razão contrarie seus preceitos religiosos. Em contrapartida é muita coragem desta criança "lutar" contra os fanáticos fundamentalistas islâmicos, que só tem uma visão reta da realidade e das transformações repentinas e mundanas. Mas não deixa de não ter sido proveitoso e vitorioso em partes, o ato desta garota que enfrentou não somente os fundamentalistas islâmicos do seu país e sim toda a conjuntura e a organização dos fanáticos religiosos que estão dentro do islã e que cultuam costumes e valores desta forma. Estes “valores” que sejam incorporados e repassados aos seus descendentes através das mulheres, é um todo conturbado porque deve ser um sacrifício você separar às mulheres do mundo onde habitam e da Sociedade contemporânea moderna que a cada espaço de tempo surge novas mudanças de comportamentos dos humanos, não que eu defendo certas mudanças, apenas estou citando aqui. É um sistema de isolamento, onde às mesmas só podem ter contato praticamente com os familiares, e de maneira alguma podem ter contato com pessoas de sexo oposto que não seja família, caso isto aconteça é um martírio blasfêmico, onde muitas vezes a vítima é punida com a morte ou castigos horrentos, onde é muito comum no Afeganistão e no próprio Paquistão as mulheres serem vítimas de ácidos no rosto e que o deformam as suas faces para resto de suas vidas, até o ponto de muitas mulheres suicidarem, por simplesmente perderem o gosto e o amor de viver. Mas a luta sempre é bem vinda em qualquer momento da História, sem luta não há vitória, a própria vitória é uma luta.

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