As fronteiras
da África foram definidas por potências europeias, de acordo com seus
interesses econômicos. De forma alguma esses governos - que invadiram
territórios que não eram seus - se preocuparam em separar corretamente as
inúmeras culturas e tradições que há no vasto continente. Guerras e conflitos
por conta das diferentes etnias são um marco na história da África. Em 2011, um
novo país foi criado: o Sudão do Sul proclamou sua independência do Sudão.
Desde então, ambas as partes vivem em constante conflitos e crises -
humanitárias, políticas e econômicas.
O Sudão
Omar Hassan
al-Bashir governou o Sudão por 30 anos. Ditador como era, o povo sofreu
incondicionalmente em suas mãos. Um conflito em Darfur que aconteceu em 2003,
na região oeste do Sudão, deixou
mais de 300.000 mortos e 2,5 milhões de deslocados, segundo a ONU. Por
crimes de guerra e contra a humanidade, o ditador é procurado pelo Tribunal
Penal Internacional. Em 2010, o TPI adicionou genocídio à lista de crimes de
Bashir.
Em dezembro de 2018, quando o governo aumentou o preço do pão em plena
crise econômica, protestos começaram a surgir. Após tentar reprimir as
mobilizações, al-Bashir decretou estado de emergência em fevereiro de 2019. Não
demorou muito para que os protestos chegassem ao seu ápice: em abril deste ano,
os manifestantes se reuniram em frente ao quartel-general para pedir apoio aos
militares, que acabaram por destituir Bashir.
Desde então, um Conselho Militar
de Transição, liderado pelo general Abdel Fattah al-Burhan, foi criado até que
um novo governante tome o poder do país. Os protestantes pediram que o governo
fosse para as mãos dos civis, o que não foi bem recebido pelo Conselho, que
utilizou de sua força militar para, novamente, reprimir as manifestações.
No
dia 3 de junho, as Forças de Intervenção Rápida mataram 118 pessoas, de acordo
com médicos sudaneses. A diretora do Centro de Traumas Ahfad em Cartum, Sulaima
Sharif, contou que a equipe do Centro tratou dezenas de mulheres que sofreram
abusos pelas Forças de Intervenção. A estimativa é de que 15 delas foram
estupradas. Para que as informações não cheguem para o resto do mundo, o
Conselho fechou a internet do país.
Até onde sabemos, o número de mortos e
feridos pode ser bem maior do que queremos acreditar. Por enquanto, o Conselho
deseja conversar com os protestantes, mas estes recusam o convite e demandam
que o poder seja transferido para os civis. Em 2017, os Estados Unidos
impuseram um embargo econômico ao Sudão por conta das atrocidades cometidas no
país. Um ano depois, o embargo chegou ao fim, e apesar de aparentemente abrir
novas oportunidades para o país, não trouxe os benefícios esperados. Ademais, o
Sudão foi suspenso da União Africana, até que um governo civil seja formado.
O Sudão do Sul
Desde de 1962,
ideias separatistas já povoavam a mente de alguns sudaneses. Quando um líder
favorável à separação, Coronel
Jaafar Muhammad Numeiri, chegou ao poder, estratégias para a criação de
um novo Estado em 1970 surgiram, mas a descoberta de reservas de petróleo na
parte do Sul do Sudão não permitiu que as negociações se concretizassem. Sem
cumprimento das promessas por parte de Numeiri, os separatistas entraram em
conflito com o governo em 1983, iniciando uma guerra civil que durou 20 anos e
matou centenas de milhares de pessoas. Enfim, em 2002, o governo e os
separatistas entraram em um acordo para retomar as negociações da separação.
A
partir de 2005, um governo conjunto foi criado, com a duração de 6 anos, para
depois ser feito um referendo, onde a população decidiria sobre a separação.
Com 99% dos votos a favor, o Sudão do Sul se separou do Sudão, e novos
conflitos entre tropas do norte e do sul voltaram a surgir. Por conta de sua
população etnicamente diversificada, embates étnicos causaram milhares de
mortes e refugiados. Os conflitos entre o jovem país e o Sudão continuaram,
especialmente por causas das reservas de petróleo no sul sudanês.
Para ajudar o
Sudão do Sul a passar por sua guerra civil,
o Conselho de Segurança da ONU aprovou um projeto contando com um efetivo de cerca de
13000 colaboradores, entre soldados e agentes de negociação da paz. No entanto,
a execução do projeto tem sido dificultada pela fuga das famílias, que se
instalam em locais de difícil acesso, tanto para os conflitos quanto para a
ajuda humanitária. Mesmo assim, a ONU insiste nas missões de paz e de proteção
aos civis. Por pressão internacional e temendo embargos, os rebeldes e o
governo assinaram acordos de paz, mas os embates continuam e o sofrimento da
população não tem fim.
Por que ninguém fala sobre o Sudão?
A empatia seletiva está muito
presente. Um incêndio destruiu uma catedral na França, e mesmo que não tenha
machucado ninguém, a comoção internacional foi gigantesca. A situação de países
como o Sudão parece não sensibilizar tanto, quando na verdade deveria ser a
prioridade na ordem do dia de preocupações.
Pessoas estão morrendo, mulheres
sendo estupradas e mais inúmeros direitos humanos, inclusive os políticos, são
violados todos os dias e os grandes veículos de comunicação pouco noticiaram
sobre isso. Os civis estão impedidos de exercer seus direitos de cidadãos e a
democracia está em xeque. Para inverter essa situação, a ajuda internacional
entra em foco com o poder de pressionar as decisões do governo e por isso, ela
é de extrema necessidade. A situação do Sudão e do Sudão do Sul é caótica e é
urgente que a comunidade internacional se mobilize para devolver uma vida digna
para seus cidadãos. O papel da imprensa também tem sua relevância, uma vez que
é seu dever informar à todos os cantos do mundo a precária situação de países
que não ganham a devida atenção.
Referências
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