A
seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3°
período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a
orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele
Hastreiter, e a supervisão do monitor da disciplina, Gabriel Thomas
Dotta. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não
refletem o posicionamento da instituição.
O Dilema das Ilhas Malvinas após o Reconhecimento da
Extensão da Plataforma Continental Argentina
Daniel O. de
Andrade
Lucas Q. Martins
A crescente importância do
Atlântico Sul no cenário geopolítico global envolve, para a Argentina,
importantes demandas territoriais sobre as Ilhas Malvinas e as Ilhas
Atlânticas. Tais demandas encontram-se imbricadas em uma histórica disputa com
o Reino Unido, que neste ano receberam um novo e importante elemento: a
plataforma continental argentina foi legalmente expandida a incluir os arredores
das ilhas.
As Ilhas Malvinas, em
inglês, Falkland Islands, e em
espanhol, Islas Malvinas, são
destaques geopolíticos do Atlântico Sul por serem palco de uma histórica
disputa, que pode ser sintetizada pelos seguintes pontos: primeiramente, a posição
estratégica das ilhas relativa ao tráfego marítimo na região austral; em um
segundo momento, a questão do orgulho nacional, tanto para Argentina, quanto
para o Reino Unido; posteriormente, o fato de que a posse de territórios
adjacentes à Antártica poderia, eventualmente, outorgar direito sobre esse
continente em negociações futuras; e, finalmente, a recente descoberta e
exploração de petróleo no arquipélago pelos ingleses.
O conflito intitulado Guerra
da Malvinas, episódio central na história do arquipélago, ocorreu entre os dias
2 de abril e 14 de junho de 1982, terminando com a vitória da armada britânica.
O conflito começou com a reclamação da Argentina pela soberania do arquipélago,
então sob o domínio do Reino Unido, que havia invadido e tomado à força as
ilhas em 1833, pouco após a independência argentina.
Este conflito remonta desde
o período colonial, ou seja, já era objeto de litígio entre Grã-Bretanha e
Espanha. Após a independência da Argentina, a nação considerou-se herdeira dos
direitos espanhóis sobre as ilhas, uma vez que a sub-administração colonial que
exercia o controle sobre as ilhas era aquela que se tornaria a Argentina. Esta
disputa, então, passou a ser travada entre Argentina e Reino Unido, até a total
ocupação, por parte dos ingleses, das ilhas em 1833.
Em 1982, as tropas
argentinas, a mando de um ditador em fim de carreira, desembarcaram nas
Falkland. Em poucas horas tomaram o arquipélago esquecido no Atlântico Sul. A
ação, uma tentativa atabalhoada do general Leopoldo Galtieri pra desviar a
atenção dos problemas de seu governo e dar sobrevida ao regime linha-dura,
acabou saindo pela culatra. Três semanas depois da invasão, navios de guerra
britânicos enviados pela então primeira-ministra Margaret Thatcher chegaram às
ilhas e, em meros 74 dias, renderam as mal equipadas e mal treinadas forças
invasoras. Em meio à escalada de tensão na relação entre a Argentina e o Reino
Unido, a União Europeia reafirmou sua posição de que os territórios que fazem
parte do arquipélago estariam sob autoridade britânica, conforme estabelecido
pelos últimos tratados fundadores do bloco.
A
discussão acerca da soberania reacendeu há alguns anos devido à notícia da
instalação de petrolíferas pelo Reino Unido. O programa de exploração de
petróleo no arquipélago é severamente questionado pela Argentina e provocou uma
nova escalada nas relações bilaterais entre os dois países. O Estado argentino passou
a incorporar, desde então, a questão do petróleo às reclamações diplomáticas
internacionais. Além disso, cada vez mais tem pressionado para que se reiniciem
negociações acerca da posse, rejeitadas pelos britânicos.
O
Reino Unido justifica a sua rejeição às negociações com a invocação de um
pretendido direito à autodeterminação por parte da população das ilhas, argumento
este que tem sido rejeitado de forma reiterada pelas Nações Unidas. Isso pois a
ONU entendeu que uma população transplantada pela potência colonial, como é o
caso das Ilhas Malvinas, não é um povo com direito à livre determinação no
sentido de aceitação ou não de um terceiro, visto que não se diferencia do povo
da metrópole.
Se antes
a afirmação da autonomia argentina sobre exploração econômica nas Ilhas
Malvinas, a despeito de seu controle efetivo pelo Reino Unido, era algo totalmente
questionável, agora, após a recente notícia do aumento da plataforma
continental argentina ser reconhecido pela ONU de forma a contemplar as ilhas, a
questão toma novos rumos.
A
plataforma continental de um país ribeirinho é a última área do mar sobre a
qual um Estado pode ter seus direitos reconhecidos pelo direito internacional. Em
alguns casos, pode estender-se para além das tradicionais áreas do mar
territorial, da zona contígua e da zona econômica exclusiva, que somados chegam
a 200 milhas náuticas desde o litoral do país. Mediante pleito, fundamentado
pela Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, e aprovação da Comissão
competente, a plataforma pode estender-se até atingir o máximo de 350 milhas
náuticas, permitindo ali a exploração econômica exclusiva do país. Em março
deste ano, a Argentina teve seu pleito de extensão da plataforma continental aprovado,
o que resultou na incorporação das Ilhas Malvinas no alcance da nova posse.
Com
isso, a demanda argentina ganha novo teor, amparado juridicamente e amplamente
reconhecido pela comunidade internacional. Mas, vale destacar, tal fato só
afirma um direito de exploração econômica sobre o leito do mar, o que no caso
dos arredores das Malvinas, incluem minerais e hidrocarbonetos, os quais estão são
explorados efetivamente pelo Reino Unido. Com o aval da ONU, a Argentina incorpora
1.7 milhão de quilômetros quadrados ao seu território marítimo, aumentando em
35% a sua superfície atual, atingindo por fim a marca-limite das 350 milhas
náuticas desde o litoral.
Quanto
à questão da soberania em sua forma plena, devemos lembrar que em uma abordagem
puramente democrática, as Ilhas Malvinas seriam um território ultramarino
britânico, pois em 2013, através de um plebiscito, os moradores do arquipélago
votaram massivamente (99,8% dos consultados) a favor de permanecer sob o
domínio da Rainha. Não obstante, segue pertinente a observação argentina de que
a suposta população malvina que respondeu ao plebiscito é de origem britânica,
transplantada para ali após a vitória do Reino Unido na guerra, restando pouquíssimos
nativos das ilhas.
O
Reino Unido diz que decisão da ONU sobre a plataforma não afeta a soberania. A
decisão foi anunciada pelo ministério argentino das relações exteriores e
atende a uma petição apresentada pela Argentina em 2009. De acordo com o
comunicado britânico, segundo o jornal argentino Clarín, “é importante notar
que é um comitê de conselho, que faz recomendações que não são legalmente
obrigatórias. Essa comissão não tem jurisdição sobre questões de
soberania", e acrescenta ainda que "o importante é o que pensam os
moradores das ilhas Falkland. Eles deixaram claro que querem ser um território
britânico e apoiamos seu direito de determinar seu futuro".
Com
relação à resposta britânica, por fim, cabe destacar que é muitíssimo vasto o
debate na doutrina jurídica internacional quanto à obrigatoriedade legal das
ditas recomendações dos órgãos competentes, uma vez que, sendo todas suas
decisões nomeadas recomendações, tomá-las como não obrigatórias em situações de
litígio esvaziaria todo o sentido do Direito do Mar, deixando suas medidas às
arbitrariedades estatais. Ainda, é de se notar que o próprio parecer final
reconhece a existência de um litígio envolvendo os dois países, o que, de certa
forma, é também uma vitória argentina.
Bibliografia:
VARELLA,
Marcelo D. Direito Internacional público. - 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
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the Falkland Islands. Disponível em: http://www.falklands.gov.fk/results-of-the-referendum-on-the-political-status-of-the-falkland-islands/
ONU
reconhece aumento de plataforma continental da Argentina. - Texto de Nahuel
Mercado Diaz. Disponível em: http://www.clarin.com/br/ONU-reconhece-plataforma-continental-Argentina_0_1549045279.html
VAZ, Alcides Costa . O
ATLÂNTICO SUL NAS PERSPECTIVAS ESTRATÉGICAS DE BRASIL, ARGENTINA E ÁFRICA DO
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ANDRADE, Mariana Dionísio; HISSA, Carolina
Soares. ILHAS MALVINAS: UMA QUESTÃO DE SOBERANIA. Disponível em: <http://www.fa7.edu.br/recursos/imagens/File/direito/ic2/vi_encontro/Encontro_Fa7_lhas%20Malvinas.pdf >
A
QUESTÃO MALVINAS 50 anos da Resolução 2065 (XX) das Nações Unidas. Disponível
em: http://docplayer.com.br/12528967-A-questao-malvinas-50-anos-da-resolucao-2065-xx-das-nacoes-unidas-a.html
http://www.ambito.com/620884-la-ue-reafirma-que-para-el-bloque-las-malvinas-son-territorio-britanico
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