Por Thiago Assunção
Em carta
encaminhada no dia 10 de setembro de 2012, ao Secretário Geral da OEA –
Organização dos Estados Americanos, José Miguel Insulza, a República
Bolivariana da Venezuela comunicou que estava denunciando a Convenção Americana
de Direitos Humanos e, portanto, saindo do Sistema Interamericano de proteção
dos direitos humanos.
A iniciativa
foi criticada por diversas organizações internacionais e não governamentais. A
Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay, instou
o país a rever sua decisão, dizendo que a saída da Venezuela pode ser um
precedente perigoso, com potencial para enfraquecer a proteção desses direitos
no âmbito do sistema interamericano[1].
A Anistia
Internacional se manifestou dizendo que “esta ação é uma afronta às vítimas de
violações de direitos humanos e às gerações futuras de venezuelanos e
venezuelanas que não terão mais a possibilidade de recorrer a esse órgão
regional quando não consigam fazer valer seus direitos na Venezuela”[2].
Por trás da
decisão da Venezuela, está a condenação do país pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos, no caso Raúl Diaz Peña. Ele foi acusado e condenado a nove
anos de prisão na Venezuela por atentados à bomba contra as embaixadas da
Colômbia e Espanha em Caracas. Ao ter sua pena convertida em domiciliar, Peña
fugiu para os EUA, alegando ser perseguido politicamente pelo regime de Chávez.
Diaz Peña protocolou então uma petição perante a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos, reclamando de tratamento desumano e degradante que teria recebido na prisão,
em violação aos artigos 5.1 e 5.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos. O
caso chegou à Corte Interamericana, que por fim decidiu que a Venezuela violou
a Convenção, no que diz respeito à integridade física do autor da ação,
determinando o pagamento pelo Estado Venezuelano de uma indenização a Raúl Diaz
Peña, bem como a adequação das condições das cadeias no país.
Chávez
reagiu, dizendo que a Corte não era imparcial e estaria a serviço do imperialismo
norte-americano. As críticas do Presidente Venezuelano ao Sistema
Interamericano não são novas. A Venezuela foi condenada diversas outras vezes
pela corte regional de direitos humanos (assim como o Brasil). Num caso que chamou
atenção, a Corte Interamericana mandou o país reintegrar ao trabalho dois
juízes que teriam sido demitidos pelo Estado por “erro judicial grave”. Esta
sentença foi levada à análise do Tribunal Supremo venezuelano, o qual declarou
que ela violaria a Constituição da Venezuela. Na mesma decisão de setembro de 2008,
o Tribunal solicita a denúncia da Convenção Americana de Direitos Humanos por
parte do Poder Executivo do país.
A decisão da
Venezuela de denunciar a Convenção só terá eficácia depois de transcorrido o
período de um ano da sua comunicação ao Secretário Geral da OEA, que ocorreu no
dia 10 de setembro, como previsto no artigo 78 da Convenção Interamericana.
Enquanto o prazo deste aviso prévio não expirar, a Corte ainda terá jurisdição
em relação às violações cometidas pelo Estado venezuelano, que não ficará
isento de possíveis condenações.
É
preocupante que um país membro da OEA aja desse modo diante de mecanismos de
garantia dos direitos humanos construídos a duras penas no continente. É de se
refletir inclusive, sobre o futuro do sistema interamericano se atitudes como
essa viram moda entre os países que assinaram e ratificaram a Convenção.
O próprio
Brasil andou questionando a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, quando
esta editou uma medida cautelar em abril de 2011, determinando que o Estado
brasileiro suspendesse as obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, e adotasse
medidas urgentes para proteger a vida e a integridade pessoal dos indígenas da
bacia do rio Xingu. O governo brasileiro não gostou do que considerou
ingerência em seus assuntos internos, e reagiu suspendendo sua contribuição
financeira para a OEA por alguns meses, bem como retirando a sua candidatura a
uma vaga na Comissão de Direitos Humanos. Segundo a Professora Flávia Piovesan,
“até então, o Brasil tinha uma postura muito mais aberta, mais cooperativa com
o sistema internacional de proteção”, mas neste episódio “o Brasil respondeu de
maneira agressiva, atacando o sistema interamericano”, o que segundo ela denota
uma mudança de postura do país em relação ao respeito incondicional pelo sistema
interamericano de direitos humanos que vinha sendo colocado em prática[3].
*Para maiores detalhes sobre a saída da
Venezuela do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, inclusive para saber o
que ocorreu com os outros dois países que tentaram fazer o mesmo, recomendamos
a leitura do artigo do Prof. Juan Carlos Sainz-Borgo, “Denuncia de la Convención Americana de Derechos Humanos. Una revisión a
partir de tres intentos”, publicado originalmente
no livro: Gonzalez
Ibañez, Joaquin. “Protección Internacional de Derechos Humanos y Estado de
Derecho. Studia in honorem Nelson Mandela” Washington College of Law, American
University, Washington DC; Universidad Alfonso X El Sabio, Madrid; Ibañez
Editores. Bogotá: 2009, e disponível em: http://www.noticiasclic.com/podra-chavez-sustraer-a-venezuela-de-la-cidh
Thiago Assunção é Mestre em Direitos Humanos e Professor de Direitos Humanos nos Cursos de Direito e Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba.
[1] Disponível
em: http://www.onu.org.br/pillay-insta-venezuela-a-reconsiderar-saida-da-convencao-americana-sobre-direitos-humanos/
acessado em 21/09/2012.
[2] Disponível
em http://anistia.org.br/direitos-humanos/blog/decis%C3%A3o-da-venezuela-de-denunciar-conven%C3%A7%C3%A3o-americana-%C3%A9-uma-afronta-%C3%A0s-v%C3%ADtimas
acessado em 21/09/2012.
[3]
Entrevista à Gazeta do Povo, dia 21 de setembro de 2012, disponível em http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/entrevistas/conteudo.phtml?tl=1&id=1299186&tit=A-escolha-de-vida-de-Flavia-Piovesan>
acessado em 21/09/2012.
Como o Hugo Chávez quer transformar a Venezuela em uma república socialista, ai se tem uma ideia de como será esta nação aos moldes da ex-URSS e o regime de ferro stalinista, que exterminou milhares de opositores durante a sua ditadura mortífera. Vale lembrar que Socialismo e DHs não andam juntos, por isto este questionamento e um possível desligamento da Venezuela da Corte Interamericana de Direitos Humanos, é óbvio que o senhor Chávez quer ter a liberdade de governar a nação Venezuelana a punhos de ferro, violando os DHs dos seus cidadãos. Sendo a Venezuela signatária do Tratado da OEA e da Corte Interamericana de Direitos Humanos, dificilmente terá este âmbito e poderio para com suas ações, até pode violar estes direitos civis, políticos, sociais e culturais como acontece com alguns deles anualmente em seu país, mas é punida e envergonhada diante dos outros Estados-membros. Nos últimos anos a população dos países da América Latina, vem sofrendo violações e danos vergonhosos, no que diz respeito aos DHs, isto deve-se no meu entender a ascensão de governos populistas e esquerdistas nesta região, é o caso do Brasil, Bolívia, Argentina, Equador, Honduras, Guatemala e a própria Venezuela que é a anfitriã deste artigo. Independentemente de qualquer que seja as ideologias, governos e correntes políticas os DHs são universais, inalienáveis, invioláveis e após a segunda guerra mundial esta causa foi abraçada, pela maioria dos países de todos os continentes e devem ser respeitados e colocados em prática e em primeiro plano em todos os Estados do mundo.
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