sábado, 27 de agosto de 2011

As taxações americanas ao etanol brasileiro sob análise da Teoria da Interdependência


Roberta de Souza Mansani


É de conhecimento o quanto o Brasil tem lutado contra as taxações do governo dos EUA à entrada dos mais diversos produtos brasileiros. Podemos citar o famoso caso do suco de laranja: o Brasil, maior exportador mundial desse produto - vendendo cerca de US$ 1,7 bilhão por ano e desse total, aproximadamente 23,5%, isto é, US$ 400 milhões, destinam-se aos EUA (dados de 2010 retirados do site Comex do Brasil) - entrou com uma denúncia a OMC, uma vez que, os EUA colocavam uma taxa alta ao produto brasileiro, de modo que o suco de laranja da produção nacional americana ficasse mais barato que o importado. Outro produto brasileiro, da enorme lista, que vem sofrendo com essas taxas é o etanol.

O etanol é um biocombustível que tem como propósito cada vez mais substituir o uso massivo de combustíveis fósseis como o petróleo o gás natural. No caso do Brasil, o etanol é feito a partir da cana de açúcar, já nos EUA é feito do milho. No Brasil, as lavouras de cana de açúcar são extensas, o que faz com que o preço do Etanol fique muito competitivo. Para ter-se idéia, segundo a Sindaçucar (Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool), a produção brasileira tem capacidade de produzir este ano, durante a safra de cana de açúcar, aproximadamente 29 bilhões de litros de etanol, sendo que os EUA compram 60% desse valor.
O grande comprador do etanol brasileiro adota medidas protecionistas baseadas na sua Lei Agrícola (Farm Bill) para incentivar a sua população a demandar etanol americano. Estas medidas se constituem, por exemplo, da sobretaxação do etanol brasileiro em cerca de US$0,54 por galão, tonando-o, no mercado interno americano, mais caro que o produto nacional. Outra medida adotada pelo governo norte americano foi investir em mais produção de milho, barateando-o, por causa da maior oferta, e deixando o produto final, o etanol, consequentemente mais barato. Sendo assim, já foi divulgado, este ano, que o Brasil recorrerá novamente à OMC para esclarecimentos dos subsídios americanos, que são de mais de US$ 6 bilhões destinados ao combustível.
Ainda reagindo, outra iniciativa iniciou-se em 2009 quando o Presidente Luis Inácio Lula da Silva visitou os países da América Central, dentre eles, El Salvador, Costa Rica e Guatemala. A estratégia utilizada pelo governo brasileiro foi aproximar-se dos países da América Central, com o intuito tanto de estabelecer uma aliança frente á crise financeira de 2008, quanto ao apoio e parceria em políticas sociais (como no caso da Guatemala que já usa uma estratégia semelhante ao Bolsa Família) e tecnológicas (como na Costa Rica que, segundo Lula, poderia receber serviços brasileiros de engenharia em construções). Todavia, outro possível interesse do Brasil era estreitar laços com esses países, para talvez utilizá-los como intermediários da venda de etanol para os Estados Unidos. Afinal, os três países, bem como outros da América Central, fazem parte de um Tratado de Livre Comércio com os EUA (o CAFTA), implicando, portanto, em trocas comerciais privilegiadas, eliminando as barreiras que o Brasil encontra comercializando diretamente com os norte-americanos.
Para analisar o caso proposto, é relevante pensarmos na Teoria da Interdependência. Dessa teoria destacam-se quatro conceitos base: a interdependência, a simetria, a sensibilidade e a vulnerabilidade.
Primeiramente, a interdependência deve ser entendida como acontecimentos e fatores que afetam partes distintas de um sistema. Nesse conceito entra a ideia de simetria. Mesmo quase impossível de ocorrer na prática, ela é muito importante, pois se refere ao grau de interdependência que uma parte de um sistema tem de outra. Em outras palavras, é quando um Estado, por exemplo, não depende tão expressivamente de outro. Sendo mais independentes entre si, nenhum dos dois teria que, em alguma relação, recuar seus interesses mais que o outro. O contrário disso se verifica como uma assimetria: quem é mais dependente, acaba por ter que recuar mais.
A sensibilidade diz respeito aos impactos gerados a cada parte e a rapidez destes impactos, que são causados por algumas alterações nas relações entre essas partes do sistema. Já a vulnerabilidade, independentemente do grau de sensibilidade, é a capacidade, tendo em vista custos e agilidade, que um Estado tem para adotar medidas que superem as alterações da relação entre as partes. Consequentemente, um Estado será vulnerável se suas medidas forem ineficazes na prática, demoradas para se desenvolverem ou para produzirem resultados e muito custosas a ponto de inviabilizá-las.
Utilizando estes conceitos para analisar a situação descrita acima, podemos perceber que o Brasil é muito sensível as taxações impostas pelos EUA sobre seus produtos, neste caso específico, o etanol. Isso se deve ao fato do país norte americano necessitar muito de combustíveis, assim, é o maior consumidor destas exportações brasileiras, ao mesmo passo, os brasileiros necessitam vender o seu produto. Verifica-se, então, que ambos dependem, mutuamente um do outro. Entretanto, há uma assimetria da situação: de um lado o Brasil, com uma economia em expansão, mas ainda inferior á dos EUA, e exportando para esse único país mais da metade de sua produção; de outro, os EUA com a maior economia mundial e aumentando sua produção nacional de etanol. 
Desse modo, com o menor poder de barganha, cabe ao país mais dependente, o Brasil, encontrar soluções para o problema que enfrenta, já que necessita continuar exportando para esse destino. Nesse sentido, o Brasil tentou reagir, acionando a OMC quanto ao protecionismo praticado, pelos Estados Unidos, através de subsídios. Contudo, assa medida não traz resultados em curto prazo. No caso do suco de laranja taxado, por exemplo, o Brasil levou anos para ter sua denúncia acatada pela OMC.
Anterior a tentativa de levar o caso a OMC, outro caminho foi sutilmente declarado: a aproximação do Brasil com a América Central. Como explicado acima, as visitas de 2009, do presidente Lula a El Salvador, Guatemala e Costa Rica foram declaradas, por ele próprio, como uma alternativa de levar o etanol até os EUA com menos taxas. Essa provável medida não se verificou efetivamente. Mas, a declaração de Lula tinha provavelmente como objetivo não colocar em prática a estratégia, e sim mostrar que o Brasil estava: atento as taxações, buscando reações e poderia consegui-las através de laços com diversos países. Foi um aviso, afinal.
Essas saídas, para contornar ou solucionar as taxações, por não serem tão eficazes e ágeis, caracterizam uma grande vulnerabilidade brasileira para o problema. Contudo, demonstraram que o país está atento e criando alternativas, para quem sabe, futuramente, conseguir se fortalecer (como no caso da cooperação sul-sul) e melhorar a condução de outros casos que venham a ocorrer.  



Roberta de Souza Mansani é acadêmica do 4º período do Curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.


Fontes consultadas 
http://www.eq.ufrj.br/sipeq/download/barreiras-internacionais-ao-etanol.pdf  (pag 140) 


Um comentário:

  1. Tanto os USA como a Europa usam destes artifícios:o protecionismo comercial aos seus produtos internos,como pretexto que devem de alguma forma proteger os seus produtos a base de subsídios do governo,mas esquecem que as relações comerciais no sistema capitalista moderno é uma troca em que não deverá haver tantas diferenças de competição,nem tampouco taxações abusivas,entre ambos os produtos comercializados,pelos países envolvidos,e quando ocorre isto geralmente acontece um impasse,e que muitas vezes estas controvérsias são resolvidas na OMC. Entretanto o Brasil tem que recorrer a outros meios,para que não seja tão prejudicado neste contexto todo com os USA,uma outra opção seria a busca por novos mercados com todo um embasamento de uma energia limpa,barata e renovável,e que não agride ao ecossistema do planeta,mas sabemos que não é tão fácil,pois quando um estado tenta buscar novos mercados para seus produtos,tem que ao mesmo tempo submeter-se a economia daquele país e também as regras comerciais impostas por aquela nação,e de forma geral adquirir produtos daquele estado em troca da venda dos seus,pois é assim que funciona o comércio entre os estados capitalistas,e também nunca se sabe se estas trocas irão dar certo no curto ou longo prazo. As dependências dos produtos e das economias externas é um fator irreversível,isto sempre vai existir,o que os estados tem que fazer é se proteger,de forma que não atropele as leis vigentes do comércio internacional,atualmente o Brasil tem se "protegido" contra alguns produtos da China de baixo valor de produção em suas matrizes,tanto do setor industrial,como do textil e do setor calçadista,é uma guerra comercial ou o país se protege dentro das leis do comércio internacional ou viola estas mesmas e correm o risco de serem punidos junto a OMC,ou por outro lado,você quebra a sua economia interna,é claro que em termos de economia global,nenhuma nação se arrisca a fazer isto,pois teme a crise econômica interna,as greves de trabalhadores de vários setores da economia,e que deixa vulnerável o sistema de governabilidade dos estados.

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