quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Por que comemorar os cem anos da Revolução Russa?

Artigo apresentado no curso de extensão “História, Cultura e Poder", ministrado pelo Prof. Eduardo Teixeira de Carvalho Junior, no Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA). As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.



* Por: Raphael Rigoni Rodrigues 

Completando cem anos em outubro deste ano, a Revolução Russa é provavelmente o maior símbolo histórico do século XX. Em menos de cinquenta anos a Rússia, um feudo atrasado, se tornaria a segunda maior potencia industrial do mundo, controlando por sua influencia metade do mundo. Por esses e outros motivos ela merece ser lembrada e estudada.
A Revolução Russa foi um movimento além do seu tempo e ficará marcada por toda historia. A revolução foi comandada por Vladimir Lenin que depôs a família imperial dos Romanov, líderes do Estado Russo desde o século XVI. A revolta popular era clara, a Rússia de 1917 era um Estado majoritariamente rural e atrasado que ainda vivia das glórias do passado, afundado em crises internas, em meio a uma guerra onde russos eram massacrados, a comida não era suficiente e o czar mais impopular que nunca. A revolução nos olhares populares representou mais do que simplesmente uma mudança, mas uma esperança de um povo desacreditado em seus czares. Ao decorrer dos anos os Romanov adquiriram uma fortuna dificilmente igualada pelos maiores dos burgueses, porém o povo russo somente poderia sonhar com o esplendor real da família imperial. Quando Lenin surge e fala para o trabalhador, a própria teoria Leninista foi moldada de acordo com as necessidades do povo russo, como a união do trabalhador do campo e do trabalhador urbano. Pela primeira vez em muito tempo alguém falava para a população. Dos primeiros passos de uma insatisfação popular até a morte de um Rei, qualquer semelhança entre as revoluções Russa e Francesa não é mera coincidência, se olharmos nas mentes dos dois principais nomes da revolução de outubro, Lenin e Trotsky, vemos o grande impacto deste evento na elaboração das teorias revolucionarias dos bolcheviques, um revolucionário francês em Moscou em 1920 teria dito “Eles conhecem a revolução francesa melhor que nós” (Hobsbawm, 1996, p. 73 e 62).
Ocorrendo 128 anos antes, a Revolução Francesa não foi um fenômeno isolado, mas sim uma dentre outras revoluções que tomaram forma no final do mesmo século. Entretanto foi a mais fundamental, sendo muito mais radical que qualquer outro levante, representou o fim não só de uma dinastia, mas de todo um sistema.  Representado a primeira republica moderna europeia, simboliza o inicio de um novo tempo, e por consequência o fim de outro. Ela surge primeiramente da insatisfação da população francesa em relação a sua monarquia. A burguesia, com o apoio das classes mais baixas, acabaria por degolar o rei, sua esposa, mas não só eles, toda a estrutura de mundo antigo e seu sistema. A Revolução Francesa representou para o mundo da sua época algo nunca visto antes. A completa destruição do status quo, da tomada de Bastilha até os dias finais da revolução, ela só tinha um objetivo, o povo. Segundo Hobsbawm (2010) ela não foi liderada por um partido ou movimento organizado, nem ao menos chegou a ter lideres, o que a difere da maioria dos outros movimentos, geralmente centrados na figura de uma única pessoa. Foi o consenso geral de ideias de um grupo social coerente que deu ao movimento uma unidade, esse grupo foi a burguesia. Porém fazendo uma referência ao livro Revolução dos bichos de George Orwell “Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais que os outros”.
A Revolução Francesa, por sua vez, deu o terreno necessário para o desenvolvimento da burguesia, semelhante à Revolução Russa, grande parte da massa era constituída por membros das classes mais baixas, os Sans-Coulouttes, entretanto foram os burgueses, que no controle politico revolucionário, colheram os frutos da revolução. Pode-se dizer que a Revolução Russa surge como uma consequência inevitável da Francesa, surgindo como um processo de maturação. Como citado anteriormente a burguesia foi a força motriz para os franceses e eles fariam o possível para salvaguardar seus direitos. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em seu primeiro artigo define “Todos os homens nascem e são livres e iguais em direitos”. Porém neste mesmo artigo reconhece distinções sociais em utilidade comum e ainda assume a propriedade privada como um bem natural e inviolável.
Por outro lado, a Revolução Russa, influenciada pelas ideias marxistas, enxerga na burguesia um inimigo, a guerra de classes. Ela teria como foco o russo comum, o trabalhador. Fazendo uma referência a Revolução Francesa, a Revolução Russa foi uma continuação por outros meios, foi uma Revolução de Sans-Culottes. O nome vem de um grupo da revolução francesa de mesmo nome, eram os membros das classes mais baixas ou lideres entre os comuns. Seu nome vem do Francês “Sem Calções”, vestimenta associada aos membros das classes superiores. A ausência de uma burguesia russa influenciou muito no formato da sociedade soviética, uma vez que a população era majoritariamente dividida entre nobres e ex-servos.
A Revolução Russa merece ser lembrada, pois como sua antecessora francesa teve um papel de destaque na formação de uma maneira diferente de se ver o mundo, a quebra de status quo. Em primeira vista a União Soviética pode ter acabado em 1989, e sua influencia direta pode ter também se exaurido com o tempo, mas seus impactos sociais estarão para sempre presentes no mundo. O mundo nunca mais foi o mesmo depois de 1917, assim como 1789. Os lideres de Estados vizinhos, tiveram que lidar com uma situação nunca vista antes, a justificação de poder que fugia do socialmente aceito. Em 1789 foi quebrada a relação soberano e servo, pela primeira vez a liberdade, igualdade e fraternidade foi mostrada ao mundo, a França pós-revolucionaria estenderia seus domínios de Portugal até a Polônia e da Normandia até o sul da Sicília, um Estado do povo havia subjugado seus inimigos monarcas e espalhado os ideais de sua revolução pelos quatro cantos da Europa.
Já em 1917, o individuo quebra as correntes que o aprisionavam em classes, a paz, o pão e terra foram cobrados de cada nobre e a Rússia czarista de servos e proletários, tornara-se a primeira republica socialista do mundo. Essa que vivia uma situação de quase pleno emprego, enquanto em 1930 os países capitalistas enfrentavam a pior crise da historia. Vale lembrar que em 1945 os russos colocariam sua bandeira sobre o Reichstag. Mas mais que isso a Revolução Russa mostrou para o mundo uma coisa ainda maior, como uma fênix, ela nos mostrou que existe sim uma forma diferente de se pensar, diferente do status quo. Afinal, não existe muita diferença entre o pão, a paz e a terra e a liberdade a igualdade e a fraternidade. Quando colocada em perspectiva, a Revolução Russa demonstra muito mais para a humanidade do que ela própria: a luta de toda sociedade pela liberdade. Toda uma luta inerente a qualquer sociedade.

Referencias Bibliográficas
FLORENZANO, M. A Revolução Russa Em Perspectiva Histórica e Comparada. São Paulo. 2008.
HOBSBAWM, E.  Ecos da Marselhesa: dois séculos reveem a Revolução Francesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
HOBSBAWM, E. A Era Das Revoluções. Rio De Janeiro. Paz & Terra, 2010.

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