Mesmo que a atual diminuição do poder dos Estados Unidos no cenário internacional não signifique necessariamente uma perda da hegemonia no curto prazo, é visível o cenário de transformação dentro do sistema interestatal capitalista.
Por Luciano Wexell Severo*
Por Luciano Wexell Severo*
Por isso, entendemos que o Brasil e a América do Sul devem aproveitar a conjuntura favorável e avançar rapidamente na construção e consolidação de um bloco regional forte. A análise da economia e da geografia sul-americanas permite considerar que existem condições especiais e imensas potencialidades para isso.
Os países da América do Sul têm um PIB de U$ 4,3 trilhões, uma população de 390 milhões de habitantes, uma área superior a 17 milhões de quilômetros quadrados, mais de 20% da água doce do mundo, o controle da Amazônia e acesso aos dois maiores oceanos.
Além disso, a região controla grande parte da produção mundial de alimentos, biodiversidade e reservas de petróleo e gás. Ao mesmo tempo, mantém absoluta harmonia entre as religiões, no geral conta com línguas comuns e com uma história compartilhada. Possui, portanto, as principais condições necessárias para manter um ritmo elevado de desenvolvimento e para formar um espaço integrado capaz de possibilitar uma inserção internacional soberana e elevados níveis de satisfação social.
Juntas, as economias da América do Sul têm abundância de recursos, mão de obra disponível e capacidade de produção dos bens necessários para a satisfação das suas necessidades. As exceções seriam alguns produtos específicos e certos tipos de bens de capital e de alta tecnologia. Inclusive por isso não há dúvidas de que a associação das cadeias produtivas regionais poderia desempenhar um efeito muito positivo no fortalecimento das estruturas industriais e na redução da vulnerabilidade externa das nações sul-americanas.
No entanto, o período colonial estabeleceu que cada país devia manter suas veias abertas para o exterior, as suas ligações diretas com as metrópoles. Assim, consolidaram-se os caminhos mais curtos para os portos, como cordões umbilicais próprios de cada economia periférica, como drenos de riqueza aos países centrais. É fácil notar que, apesar de alguns avanços, os países do subcontinente mantêm-se de costas uns para os outros, da mesma maneira que estiveram durante os últimos cinco séculos.
Esta situação pode estar mudando nos últimos anos, desde a chegada de governos com orientações políticas não-neoliberais ou de esquerdas. Justamente neste momento torna-se cada vez mais necessário aprofundar a discussão sobre os projetos regionais de integração física e o seu financiamento através de recursos e mecanismos próprios, como o Banco do Sul, a Corporação Andina de Fomento (CAF), o BNDES, o Convênio de Créditos Recíprocos da ALADI, o Sistema de Moedas Locais (SML) do Mercosul e o Sistema Único de Pagamentos e Créditos Recíprocos (Sucre) do bloco bolivariano.
Por este motivo foram tão importantes a criação da Nova Arquitetura Financeira Regional (NAFR) e do Conselho de Infraestrutura e Planejamento (Cosiplan) dentro da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL). Falemos especificamente do Cosiplan, que hoje é a entidade centralizadora dos planos estratégicos e coordenadora das ações da Iniciativa para a Integração da Infraestrutura da América do Sul (IIRSA).
Como se sabe, a IIRSA, atualmente com mais de 520 projetos no valor de US$ 96 bilhões, foi criada em 1990 sob a orientação do “Regionalismo Aberto” da CEPAL e do “Novo Regionalismo” do BID. A iniciativa funcionaria como a espinha dorsal da proposta estadunidense de anexação continental, a chamada Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). A proposta da IIRSA, que continuou existindo apesar do enterro da ALCA em Mar del Plata, em 2005, se concentrou no fortalecimento de "corredores de exportação", aprofundando ainda mais a condição de nossos países como vendedores de mercadorias de baixo valor agregado para os centros industriais.
A mudança está exatamente na criação do Cosiplan. Desta forma, os governos da UNASUL assumiram a direção do processo e a tendência é intensificar as obras orientadas para a efetiva integração regional em energia, transportes e comunicações. Entende-se como essencial que os Estados nacionais e as populações fortaleçam o seu poder de intervenção nos projetos. Um dos compromissos da nova entidade sul-americana é exatamente definir as instâncias de participação das comunidades.
Ao mesmo tempo, o grande desafio é esquivar-se de ideias ambientalistas fundamentalistas e anti-desenvolvimento, assimiladas facilmente por uma parcela ingênua e despolitizada das esquerdas. Esses movimentos, cujo líder bem poderia ser o ex-vice-presidente estadunidense Al Gore e seu falacioso filme sobre o aquecimento global, atuam camuflados em Organizações Não-Governamentais (ONGs) financiadas por igrejas, empresas e governos dos países desenvolvidos.
Entendemos que o mais importante neste caso é fortalecer a visão global de planejamento e organização para a integração regional sob critérios políticos e estratégicos, e não pelo simples estímulo do mercado ou das empresas privadas. O pensamento integracionista dos governos da América do Sul será executado, no caso da infraestrutura, via Cosiplan. Esta coordenação permitirá que as linhas de ação não tenham efeitos isolados, possibilitando relacionar e articular a integração física com os esforços de facilitação do comércio intra-regional e de expansão da complementação das cadeias produtivas.
Parece crucial que haja um número crescente de técnicos, profissionais e especialistas dedicados a esse assunto, dentro das universidades e dos órgãos públicos das nações sul-americanas.
* Luciano Wexell Severo é economista, professor visitante da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) e Doutorando do Programa de Economia Política Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Artigo publicado em 15 de fevereiro de 2012 no seguinte link: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=175802&id_secao=7
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