Andrew Traumann
Recentemente, o Itamaraty anunciou que reconhece a eventual criação de um futuro Estado Palestino nas fronteiras pós Guerra dos Seis Dias em 1967. Neste conflito, Israel capturou a Cisjordânia, Faixa de Gaza, as Colinas de Golã, a península do Sinai e a cidade de Jerusalém. A primeira se mantém sob ocupação até hoje, e a construção de assentamentos para os colonos judeus, considerados ilegais pelas leis internacionais, continua sendo o calcanhar de Aquiles das negociações entre os dois povos. Gaza foi desocupada unilateralmente em 2005 pelo então primeiro-ministro Ariel Sharon e hoje é governada pelo Hamas. A península do Sinai foi devolvida ao Egito em 1980 e Golã e Jerusalém, sagradas para judeus, muçulmanos e cristãos, definitivamente anexadas, sendo esta última declarada “capital eterna e indivisível” do povo judeu, mesmo que política e administrativamente a capital israelense continue sendo Tel Aviv.
O apoio brasileiro à causa palestina não é novidade. Vale lembrar que o estabelecimento de relações formais entre Brasil e a Autoridade Palestina data de 1975, quando a OLP foi autorizada a montar uma representação em Brasília, com sede na então existente Liga dos Estados Árabes. No ano anterior, o chanceler brasileiro Francisco Azeredo da Silveira discursou na ONU a favor da soberania e autodeterminação do povo palestino, opondo-se à guerra de conquista perpetrada por Israel. Em 1993, a representação foi elevada à categoria de "Delegação Especial da Palestina", com status diplomático semelhante às organizações internacionais credenciadas no Brasil, de acordo com os termos de um acordo concluído em novembro desse ano entre o governo brasileiro e a OLP por um intercâmbio diplomático. Agora, a representação palestina terá status oficial de embaixada, coisa que na prática já ocorre desde 1998.
Hoje, mais de cem países reconhecem o Estado Palestino, inclusive China, Rússia e Índia, os países que juntamente com o Brasil formam o BRIC, bloco dos principais países emergentes. Seguindo a iniciativa brasileira, Argentina e Uruguai também reconheceram o Estado Palestino e os três governos fizeram questão de enfatizar que tal gesto em nada muda suas relações com Israel e seu direito de viver em paz e segurança com seus vizinhos.
Mas, afinal, o que quer a Autoridade Palestina com esses pedidos de reconhecimento de seu Estado, sendo que na prática seu território continuará sob ocupação? Na verdade, pode-se notar uma mudança de estratégia dos palestinos sob a liderança de Mahmoud Abbas, no sentido de buscar as vias diplomáticas, já que décadas de violência em nada adiantaram, mas, pelo contrário, só prejudicaram a causa de seu povo. Mesmo sabendo que uma resolução sobre o reconhecimento da Palestina fatalmente seria vetada pelos EUA no Conselho de Segurança da ONU, os palestinos então levariam o caso à Assembléia Geral, onde certamente obteriam a maioria. Israel não teria como se opor, já que foi criado da mesma forma, em 1947 (numa sessão presidida pelo brasileiro Oswaldo Aranha), e os palestinos teriam a seu favor o peso do reconhecimento do mais importante organismo internacional para utilizar nas negociações com Israel. Em maio deste ano, os países árabes, a Turquia e o Irã aprovaram um adendo ao TNP (Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares) que propõe um Oriente Médio livre de tais armas até 2012, obviamente com o intuito de fazer com que Israel, a única potência atômica da região, o assine. São os árabes aprendendo a jogar pelas vias diplomáticas.
Andrew Traumann é professor de História das Relações Internacionais pelo Unicuritiba,mestre em História e Política pela UNESP e doutorando em História,Cultura e Poder pela UFPR.
Parabéns Andrew: texto muito esclarecedor.
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