quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Continuidade X Mudança no Planejamento da Defesa Estadunidense

Juliano da Silva Cortinhas

No dia 9 de agosto do corrente, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, expôs seu programa para alterar a lógica dos investimentos militares do país, anunciando diversas propostas para reduzir seu orçamento de defesa. Apesar de não significar uma ampla redefinição das políticas dos Estados Unidos, a redução pode ser um primeiro passo, em termos geoestratégicos, para a redefinição da relação do governo Obama com as indústrias de armamentos e as Forças Armadas. Essa possibilidade, porém, deverá enfrentar ampla resistência no Congresso, órgão que aprova a proposta final de orçamento.


Dentre as medidas anunciadas por Gates, destacam-se três: o fechamento do Comando de Forças Conjuntas (Joint Forces Command), localizado na Virgínia, a redução do número de generais e almirantes no país e, por fim, uma reorganização do relacionamento entre o Departamento de Defesa e as indústrias de armamentos. Apesar de parecerem um indício de que, finalmente, os Estados Unidos reformularão sua política de defesa, não há clareza quanto à economia que as mudanças proporcionarão aos cofres do país e, além disso, tais medidas dificilmente serão aprovadas.

Em relação à primeira, assim que Gates realizou seu discurso, iniciou-se uma movimentação dos senadores e deputados da Virgínia para cancelar o fechamento do comando, responsável pela organização das missões conjuntas das três Forças do país. Para esses legisladores, independentemente de seu partido, o fechamento do Comando significa a perda de 5.800 empregos e, portanto, acarreta um prejuízo enorme para as eleições legislativas de novembro.
A segunda medida tende a ser aprovada com maior facilidade pelos congressistas, pois hoje há cerca de mil generais e almirantes nos EUA, e Gates propõe o corte de apenas 50 desses postos, que são altamente remunerados.
Por fim, a terceira proposta será a que vai enfrentar maior resistência dos legisladores. O Pentágono pretende aumentar as restrições à contratação de empresas privadas para a elaboração de projetos militares, como a construção de novos programas de armamentos. A grande dificuldade que será enfrentada no Congresso se refere ao fato de que tais empresas mantêm uma grande proximidade com os legisladores. Como o rol de empresas de armamentos nos EUA é muito extenso, praticamente todos os congressistas mantêm ligações com os interesses da indústria. Além disso, as contribuições eleitorais dessas empresas são essenciais para a reeleição dos legisladores. No último ciclo eleitoral, 92 de 100 senadores e 410 dos 435 deputados receberam auxílios financeiros das indústrias de defesa, o que demonstra o quanto os interesses de ambos estão em consonância, devido aos amplos esforços de lobby dos empresários.
Essa conexão, somada à preocupação dos legisladores com os empregos em seus distritos, representam uma parte importante da explicação sobre os investimentos em defesa dos Estados Unidos, que têm crescido exponencialmente desde 2001. Em relação ao resto do mundo, os gastos militares daquele país representam cerca de 50% do investimento global, o que significa que há um grande excesso de gastos nessa área.
A estrutura organizacional do governo estadunidense, que divide o poder de formular o orçamento entre o Executivo, que constrói a proposta, e o Legislativo, que aprova os números finais, faz com que as empresas tenham uma grande influência no processo. Os legisladores tendem a se preocupar com interesses mais específicos que o secretário de Defesa, pois focam, preponderantemente, a reeleição e, portanto, a garantia de empregos e, consequentemente, votos.
Há diversos exemplos históricos de propostas de redução orçamentária que não saíram do papel e, claramente, as atuais medidas não reduzirão sensivelmente os gastos de defesa dos Estados Unidos, que hoje giram em torno de impressionantes US$ 700 bilhões. O grande problema que a gestão Obama enfrenta, neste momento, é a incapacidade de conciliar tais números com os déficits em conta, provocados pelos anos de má gestão de Bush e pela crise financeira de 2008.
Aparentemente, nem o próprio presidente sabe como tirar o país desse cenário e reorganizar sua economia.

Coordenador do curso de Relações Internacionais do UniCuritiba

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