Por Pedro Henrique Garbellotti de Melo*
Crises
econômicas costumam ser associadas ao retorno de medidas protecionistas (nacionalismo
econômico), e hostilidades contra minorias (nacionalismo étnico-cultural)
(BRUBAKER, 2011, p. 93). Portanto,
será abordado nesse artigo, se a crise financeira é o fator fundamental para o
desencadeamento dos nacionalismos ou se esta é apenas um dos fatores que
contribuem para o seu surgimento.
Em fevereiro de 2009, a revista The Economist publicou um artigo que
atenta ao fato de que a “reemergência do nacionalismo econômico [...] está transformando
a crise econômica em uma crise política e ameaçando o mundo em depressão”. No
contexto da grande depressão de 1930, as medidas tomadas pelo Estado como o
aumento de tarifas, desvalorização da moeda e diversas outras medidas para
proteger a economia nacional, levaram ao surgimento de diversas contramedidas
adotadas por outros países, desencadeando as famosas “tariff wars” e uma série
de desvalorizações competitivas da moeda, agravando a crise (BRUBAKER,
2011, p. 98). Portanto fica
claro o temor no trecho acima.
Entretanto, hoje em dia, vivemos em uma
economia totalmente globalizada e se torna cada vez mais difícil que o Estado
defenda o interesse nacional perante o mercado global sem sofrer algum tipo de
retaliação econômica, como visto na grande depressão (WORKMAN, 2009). Outro
fator que impede o surgimento de protecionismos, é que a maioria das trocas
internacionais ocorre em áreas de livre comércio ou por acordos comerciais e
estes estão regulados pela Organização Mundial do Comércio; sem contar a maior
dependência de empréstimos do Fundo Monetário Internacional (BRUBAKER, 2011,
P.98).
É evidente que, mesmo com medidas em favor da
liberalização econômica, os Estados procuraram e ainda procuram proteger os seus
produtores e a sua economia nacional, mesmo no apogeu do liberalismo e do
comércio internacional. Como diz o historiador Eric Hobsbawm (2013, p. 39): “A
economia novecentista era mais internacional
do que cosmopolita. [...] O desenvolvimento da economia moderna foi
integralmente vinculado às “economias nacionais.” Dessa forma, as medidas
protecionistas que foram tomadas na crise de 2008, não representam efetivamente
o nacionalismo econômico, mas sim medidas mínimas e necessárias para o bom
funcionamento do próprio livre-comércio.
Ações protecionistas não incluem apenas
medidas para proteger os produtores locais, mas também buscam proteger os
trabalhadores nacionais (BRUBAKER, 2011, p. 104). E isso pode acabar resultando
em um nacionalismo de cunho étnico-cultural, ou seja, contra os imigrantes.
Primeiramente, em um mundo de Estados-Nações os cidadãos nacionais são,
naturalmente, mais privilegiados do que os estrangeiros (WIMMER, 2002 apud
BRUBAKER, 2011, p. 95). Logo, políticas para proteger os trabalhadores locais
não estão limitadas aos períodos de crise. Todos os que são considerados
cidadãos legítimos do país têm acesso ao mercado de trabalho, enquanto apenas
algumas categorias de imigrantes possuem o direito de atuar neste mercado.
Pode-se dizer que mesmo quando existem medidas restritivas para os estrangeiros,
elas mais coincidem com a crise
econômica, do que necessariamente são causadas
pelo colapso financeiro (BRUBAKER, 2011, p. 100).
Nacionalismos étnico-culturais também podem
emergir contra uma minoria que possui algum papel importante na economia, como
por exemplo, é o caso dos judeus, que frequentemente foram vistos como culpados
pelas crises financeiras (LINDEMANN, 1997 apud BRUBAKER, 2011, p. 104). Também
pode surgir contra grupos que não são classificados como beneficiários da
crise, como os imigrantes africanos e mulçumanos.
Todavia, a crise economia não cria
necessariamente tais respostas contra essas minorias, ela apenas destaca e dramatiza essas oposições (BRUBAKER, 2011, p. 103). Isso porque a
xenofobia, que não é um fenômeno novo, é um reflexo dos cataclismos sociais e
dos grandes movimentos internacionais de população. E esta tem sua real força nas
próprias contradições da ideologia do capitalismo globalizado, que fracassou no
estabelecimento da livre movimentação internacional da força de trabalho, ao
contrário do capital e do comércio (HOBSBAWM, 2007, p. 92).
Assim as crises financeiras podem apenas
fornecer um recurso retórico para que os políticos ou os grandes empresários
mudem o foco do problema real, ou seja, eles podem utilizar essas minorias como
bode expiatório (BRUBAKER, 2011, p. 105). Consequentemente, nesses períodos, a
receptividade popular desses tipos de discurso, infelizmente, também aumenta,
tanto que em 2011, os partidos de extrema direita obtiveram resultados recordes
na maioria dos países europeus (BBC BRASIL, 2011). Assim, a crise em si não
gera o nacionalismo étnico-cultural.
Portanto, após essa discussão, fica claro que
tanto o nacionalismo econômico quanto o nacionalismo étnico-cultural não são
necessariamente frutos de crises econômicas. Como diz Dani Rodrik: “O
protecionismo foi o “cão que não latia” durante a crise de 2008. E em relação
às respostas da população perante aos imigrantes, a crise foi apenas um fator
que reforçou uma situação endêmica de Estados-Nações, ou seja, houve um
fortalecimento dos critérios protonacionais, gerando uma onda de racismo e
xenofobia contra as minorias, tirando o foco dos verdadeiros culpados pela
crise econômica.
*Pedro Henrique Garbellotti de Melo é graduando do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
Fonte da imagem: http://www.nato.int/
REFERÊNCIAS
BBC BRASIL. Nacionalismo
avança e conquista eleitores na Europa. Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/04/110418_nacionalismo_europa_mdb.shtml.
Acesso: 01/12/2013.
CALHOUN, Craig (org);
DERLUGUIAN, Georgi (org). The deepening
Crisis: Governance Challenges after Neoliberalism Volume II.1. ed.Nova York:
NYU press, 2011.
HOBSBAWM, Eric. Globalização,
Democracia e Terrorismo. 1. Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
______. Nações e
Nacionalismo desde 1780.6. ed. São Paulo : Paz e Terra, 2013.
RODRIK, Dani. The Myth of Rising Protecionism. Disponível em: http://www.project-syndicate.org/commentary/the-myth-of-rising-protectionism.
Acesso:
01/12/2013.
THE ECONOMIST.The
Return of Economic Nationalism.Disponível em: http://www.economist.com/node/13061443.
Acesso: 01/12/2013.
WORKMAN, Garrett.Economic Nationalism: Transatlantic Responses to the
Financial Crisis in Comparative Perspective. 2009.
Disponível em: https://cdr.lib.unc.edu/indexablecontent?id=uuid:b1cfe74e-3cab-4c41-9556-f523bb798543&ds=DATA_FILE.
Acesso: 01/12/2013.
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