segunda-feira, 9 de outubro de 2023

Artigo - O papel do Tribunal Penal Internacional frente à Guerra na Ucrânia

 

O PAPEL DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL FRENTE
 À GUERRA NA UCRÂNIA


       Por Priscila Caneparo   

Engana-se quem acredita que o conflito Rússia X Ucrânia tenha se iniciado em 24 de fevereiro de 2022. Engana-se igualmente quem acredita que as consequências da guerra vão impactar apenas o território europeu e, se muito, o território russo.

A verdade é que as tristes mazelas de uma guerra trespassam seu tempo e espaço. Porém, para compreender a necessidade de tais ações, precisamos, primeiro, apresentar a realidade do conflito que, como já dito, remonta a um tempo passado.

O conflito armado no leste ucraniano iniciou-se em março de 2014, quando então as forças governamentais ucranianas lutaram contra os separatistas, apoiados pela Rússia, pelo controle de grande parte das regiões fortemente industrializadas – riquíssima em jazidas de carvão - quais sejam, Donetsk e Luhansk, na região de Donbas.  Desde então, mais de 14 mil pessoas já perderam suas vidas e um terço do território fora deixado nas mãos dos separatistas.

Não obstante, a integração política da região com a Rússia perpetrou a tentativa de assegurar o extermínio da cultura ucraniana da região: ambas as regiões de Donetsk e Luhansk aboliram o ucraniano como língua estatal em 2020, sendo que as escolas locais retiraram a história Ucrânia de seus currículos.

Faz-se claro, então, que as áreas separatistas do lesta da Ucrânia tornaram-se dia após dia mais separadas da realidade ucraniana, tanto economicamente, quanto ideologicamente, politicamente e socialmente. A invasão russa ao território ucraniano - já que o governo de Volodymyr Zelensky tentou retomar o controle da região - era uma questão de (pouco) tempo. É, inegavelmente, um conflito que repousa, também, na perspectiva Ocidente X Rússia.

Ocorre que há mais complexidade à questão. Desde 2004, quando as ex-repúblicas soviéticas da Estônia, Letônia e Lituânia aderiram à OTAN e à União Europeia, o governo russo deixou bem claro que iria se opor a qualquer esforço de um outro Estado pós-soviético – e aí entra a Ucrânia – que porventura viera a concentrar esforços na entrada em ambas as organizações.

Neste diapasão, a Ucrânia pretendia estabelecer laços mais fortes com o Ocidente e deixou transparente a sua intenção de ingresso tanto na OTAN, quanto na União Europeia, o que foi visto como uma ameaça à segurança russa. Com um exército fraco e sem aliados militares até então, a Ucrânia se viu vulnerável a uma invasão russa. E, de fato, foi o que aconteceu no fim de fevereiro de 2022. 

Assim, em 2023, ainda que (bem) extemporaneamente, o Tribunal Penal Internacional (TPI) expediu um mandado de prisão contra o então Presidente russo, Vladmir Putin, e contra Maria Lvova-Belova, especificamente pelas ações de adoção em massa de crianças ucranianas, a partir da deportação ilegal para a Rússia – que, em última análise, acaba por se enquadrar em uma tipificação de crime contra a humanidade e, igualmente, em crime de guerra. Ok, mas aí diversos questionamentos práticos acabam por emergirem: Putin, de fato, será preso? O TPI pode atuar neste cenário, já que nem a Rússia e nem a Ucrânia fazem parte do Estatuto de Roma (tratado de criação do Tribunal)? O que seriam os chamados crimes de guerra que, a todo momento, encontram-se noticiados pela mídia?

Bem, vamos lá: ainda que a ordem de prisão de Vladmir Putin e de Maria Lvova-Belova possa ser cumprida em qualquer um dos 123 países-membros do Tribunal Penal Internacional (incluído, neste rol, o Brasil), dificilmente serão presos – especialmente Vladmir Putin. Explico o motivo: para se ter o cumprimento do mandado, Putin teria que visitar um daqueles 123 membros do TPI e, igualmente, este Estado teria, via acordo de cooperação para com o TPI, entregá-lo à jurisdição do Tribunal (instituto chamado de surrender). Ninguém, especialmente por conta da soberania dos Estados e do princípio da territorialidade, sem a autorização do Conselho de Segurança (ONU), pode invadir a Rússia para capturar o então Presidente russo. Na minha percepção, a expedição do mandado foi, em última análise, uma resposta tardia do Tribunal à pressão internacional. Infelizmente, não terá efeito prático e muitos poderão vir (com razão) questionar a efetividade da adoção de tais medidas pelo TPI.

Adentrando à segunda questão – que, de fato, é a mais polêmica -, temos que observar o cenário com cautela. Evidentemente, o Tribunal Penal Internacional, inicialmente, só poderia julgar nacionais (já que é o único tribunal internacional onde o indivíduo é processado e julgado, e não o Estado) de cujos Estados integram o Tribunal Penal Internacional ou pessoas que, ainda que não nacionais de países signatários do Estatuto de Roma, tenham perpetrado uma ou mais das quatro tipificações ali previstas (crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra e crime de agressão) em território de cujo Estado integre o TPI. Ocorre que nem Rússia, nem Ucrânia fazem parte do Tribunal Penal Internacional. Em uma análise superficial, poderíamos entender que o mandado expedido pelo TPI não possuiria força jurídica vinculante, por não se enquadrar em nenhum dos cenários aptos a possibilitar com que o Tribunal exerça sua jurisdição. Porém, desde 2013, segundo os termos do artigo 12(3), do Estatuto, a Ucrânia concedeu duas autorizações especiais (uma em 2014 e outra em 2015) para que o Tribunal Penal Internacional pudesse exercer sua jurisdição em relação às ações desenroladas e aos conflitos que estariam ocorrendo nas regiões de Lugansk, Donestk e na Crimeia, bem como em relação aos atos cometidos no território ucraniano desde 20 de fevereiro de 2014, não fixando data e ampliando a competência para todo o território do país. Em última análise, o TPI tem plena condição e poder para expedir mandado de prisão contra Putin e, inclusive, condená-lo por conta da perpetração da barbárie em território ucraniano desde 2013.

Chegando à última pergunta, para compreendermos o que são os crimes de guerra, precisamos voltar nosso olhar aos crimes internacionais, já que fazem parte de tal conceito. É inegável que certos crimes afetam os interesses de toda a comunidade internacional, uma vez que ameaçam a paz e a segurança internacionais, acabando por chocar com a própria consciência da humanidade. De tal forma, os crimes internacionais só estarão configurados quando a conduta vier a ser o resultado de uma ação ou omissão estatal, partilhando da ideia de o Estado, muitas vezes, estar representado por um indivíduo ou por um grupo de pessoas.

Em relação aos crimes de guerra, um dos crimes descritos como internacionais segundo o Estatuto de Roma, tais estão abarcados na ideia do Direito Humanitário, tendo surgido a partir das Convenções de Genebra (1949). Definiu-se que algumas normas de direitos humanos, em tempos de guerra, devem ser respeitadas, incluindo, aí, a impossibilidade de deportação forçada, como o que, infelizmente, está acontecendo com as crianças ucranianas.

É claro e inquestionável que há um contexto fático imensurável de cometimento de crimes internacionais no território ucraniano. Porém, o que me preocupa é se, com esse mandado de prisão vindo do TPI – e que sabemos que terá um efeito prático muito duvidoso –, o Tribunal como um todo não perderá a sua credibilidade e deixará, daqui para a frente, de conseguir atuar em situações tão alarmantes como a da Ucrânia que, até então, estava alcançando êxito em reverter os casos de violação e de cometimento de crimes internacionais. Espero, com muita esperança, que eu esteja errada e que o TPI conquiste ainda mais palco no cenário de combate aos crimes internacionais.


Um comentário:

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