Trabalho desenvolvido na disciplina de Instituições Internacionais sob orientação da Professora Janiffer Zarpelon do Curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
* Jessica Ferreira
Nos dias seis e nove de agosto de 1945, respectivamente, nas
cidades de Hiroshima e Nagasaki no Japão, foram lançadas as duas únicas bombas
atômicas utilizadas em ataques militares. Milhares de vidas foram perdidas
instantaneamente, sem mencionar as outras tantas que foram comprometidas
posteriormente por conta da radiação. Será que realmente compreendemos a
magnitude desses eventos? Quer dizer, de cidades inteiras sendo destruídas por
conta da detonação de uma única bomba?
Bom, isso certamente deve ter soado como uma piada de mau
gosto assim que as autoridades japonesas foram notificadas. No entanto,
conforme a realidade os abarcava, isso, com certeza, os atemorizou. A partir
daí o mundo passou a conhecer as mais novas aquisições da corrida armamentista
e, concomitantemente, passou a temê-las. As consequências de seu uso eram
imensuráveis e, logo se teve consciência de que uma guerra nuclear poderia
significar a destruição de quase, senão, de toda a humanidade.
Após os americanos, a URSS, França, Grã-Bretanha e China
conseguiram desenvolver suas próprias ogivas nucleares. A situação era
obviamente preocupante, dado que uma disseminação cada vez maior desta
tecnologia significava maiores chances de que ataques dessa natureza pudessem
ocorrer. Portanto, o mundo cooperou para promover políticas de contenção,
materializadas no ‘Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP) ’. Tal regime
buscava impedir que outros Estados adquirissem armamentos nucleares e que,
progressivamente, houvesse um desarmamento completo. Entretanto, Índia,
Paquistão, Coreia do Norte e Israel conseguiram suas próprias armas nucleares e
não aderiram ao regime.
A República Islâmica do Irã, localizada na conturbada e
estratégica região do Oriente Médio, assim como outros Estados vizinhos, atrai
uma atenção negativa do Ocidente. Afinal de contas, além da resistência a
‘ocidentalização’ de sua sociedade, investe num controverso programa nuclear.
Enquanto muitas autoridades internacionais dizem que tal programa está voltado
para a obtenção de armas nucleares, o Irã insiste em dizer que seus esforços
são pacíficos, voltados para produção de energia.
As suspeitas irão levar a aplicação de sanções ao Irã por
parte dos Estados Unidos, da União Europeia e da ONU, o que irá sufocar e
limitar a economia iraniana. As possíveis consequências da obtenção de armas
nucleares por parte do Irã são diversas. Há quem diga, seguindo um raciocínio
realista, que isso, paradoxalmente, poderia estabilizar a região, pois
viabilizaria uma balança de poder eficiente entre hebreus e muçulmanos.
Entretanto, além da preocupação com o suposto caráter terrorista do regime
iraniano, isso abriria um precedente para o esfacelamento do regime de não
proliferação nuclear.
O impasse perdurou durante anos até que as negociações de um
acordo tivessem início. E finalmente, em julho de 2015, depois de vinte meses
de negociações, chegou-se a uma conclusão. O acordo foi prestigiado pelas
diversas lideranças do mundo e negociado pelos países membros permanentes do
Conselho de Segurança das Nações Unidas, além da Alemanha.
No acordo, o Irã concordou em diminuir sua capacidade
nuclear e não acumular urânio enriquecido, ao passo que os demais países
concordaram em reduzir progressivamente as sanções econômicas e liberar seus
ativos congelados no exterior. Além disso, será permitido à
Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) a fiscalização de usinas
nucleares iranianas, além de promover uma pesquisa junto aos iranianos para
responder questões acerca do passado do programa nuclear deste país.
O papel desempenhado pela AIEA é muito importante, ao passo
que sua notória autonomia legitima sua credibilidade e cria um ambiente de
negociação promissor já que as relações entre as partes se encontram
deterioradas. O acordo, se concluído, permitirá uma injeção considerável de
recursos na economia iraniana, que poderá usufruir, finalmente, de seu
potencial, muito focado na produção de petróleo. Além do mais, isso representa
de certa forma, uma aproximação desta nação com os Estados Unidos, país com o
qual apresentava uma relação conturbada desde a Revolução Iraniana de 1979.
A geopolítica do tão importante Oriente Médio pode estar a
passos de se transformar. As possíveis consequências, como já foram
mencionadas, seriam: o Irã viver um boom
econômico e uma atenuação das hostilidades com o ocidente. Obviamente, isso
preocupa seus principais vizinhos, Arábia Saudita e Israel, ambos parceiros
tradicionais dos Estados Unidos na região e que, até por isso, se sentem
traídos, além de temerem um Irã forte.
O fato de Israel ser o único Estado da região que possui
tecnologia militar nuclear lhe assegura certa preponderância nas relações, o
que este não está disposto a abrir mão. Este país que vive constantemente numa
lógica de sobrevivência devido a todo o contexto do conflito com os palestinos
e as más relações com os demais países muçulmanos alega veementemente que o Irã
estaria a desenvolver bombas nucleares. Entretanto, as evidências para tal são
tão escassas ou inexistentes quanto foram aquelas que justificariam a invasão
norte-americana ao Iraque em 2003.
A Arábia Saudita é um país árabe, ao passo que os iranianos
são persas. Além disso, ambos também se diferenciam quanto a vertente do Islã
que seguem. O Irã é uma república xiita, enquanto que a Arábia Saudita é uma
monarquia sunita. O desenvolvimento econômico iraniano o tornaria mais
importante e influente na região e no mundo, o que assusta e contraria os
interesses sauditas e israelenses.
Enfim, o acordo pode ser considerado uma grande vitória e
pode se tornar a base de relações pacíficas e quem sabe, cordiais no longo
prazo, entre esta famigerada república e os países ocidentais. No entanto,
essas previsões não deixam de ser meras especulações, visto que se trata de
algo difícil de pôr em prática.
Enquanto isso, o mundo aguarda ansiosamente a resposta do
Congresso americano quanto à ratificação do acordo. Quem sabe não estamos
diante de uma alternativa promissora sobre como tratar dos assuntos do Oriente
Médio? Esse documento, apesar de refletir as discrepâncias entre os países, é
fruto de uma racionalização das relações internacionais. Ou seja, diferenças
são postas de lado e é feito um cálculo racional do que se tem a ganhar ou a
perder. A resposta, esperamos, irá se basear nisso e não em preceitos
ideológicos, políticos ou religiosos. Afinal, a vida não precisa,
necessariamente, ser uma “guerra de todos contra todos”.
O regime internacional de não proliferação
nuclear não é perfeito. Longe disso, acaba por oligopolizar a posse de armas
nucleares e consequentemente, funcionar como um mecanismo de manutenção da
distribuição de poder vigente no sistema internacional. Muitas críticas são
feitas com relação a países que ainda não aderiram ao Tratado e mesmo depois de
sua instituição, desenvolveram suas próprias bombas sem sofrer qualquer tipo de
sanção. Também há aqueles que atentam quanto a não observância do artigo que se
refere ao desarmamento das potências nucleares. Porém, não podemos negar que há
uma certa efetividade neste regime, ao passo que cumpre parcialmente seu
objetivo de constranger os países na busca por tecnologia nuclear.
Por Jessica Ferreira - Aluna do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA.
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