Por Gustavo Glodes-Blum*
Os anos de 2013, 2014 e 2015 foram e serão decisivos para a
estrutura política da América do Sul. Nestes três anos, definiram ou definirão
seus governos para os próximos mandatos sete dos doze países que constituem a
região: Chile, Venezuela, Colômbia, Brasil, Uruguai e Argentina. Os resultados
destas eleições alteram de forma leve ou profunda a cartografia política desta
região, dependendo do país e do movimento político que nele ocorre, sobretudo
com relação aos dois principais blocos de poder da região: a Aliança do
Pacífico e o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL). A tabela abaixo apresenta o
resultado das eleições já realizadas na região.
Ano
|
País
|
Turno
|
Candidato eleito
|
Candidato opositor
|
2013
|
Venezuela
|
Segundo
|
Nicolás Maduro (50,6%)
|
Henrique Capriles (49,1%)
|
Chile
|
Segundo
|
Michelle Bachelet (62,16%)
|
Evelyn Matthei (37,83%)
|
|
2014
|
Colômbia
|
Segundo
|
Juan Manuel Santos (50,95%)
|
Óscar Iván Zuluaga (45,00%)
|
Bolívia
|
Primeiro
|
Evo Morales (61,04%)
|
Samuel Doria (24,49%)
|
|
Brasil
|
Segundo
|
Dilma Rousseff (51,63%)
|
Aécio Neves (48,36%)
|
|
Uruguai
|
Segundo
|
A ser definido
|
||
2015
|
Argentina
|
A ser realizada
|
Estes seis países, segundo o Fundo Monetário Internacional
(FMI), representam 85% da economia da América do Sul, representando um forte
desnível entre estes e os outros cinco países da região – Paraguai, Peru, Equador,
Guiana e Suriname. Desta forma, os grupos políticos que ascenderam ou
ascenderão aos governos serão responsáveis por determinar os rumos políticos e
econômicos da América do Sul em razão de seus preceitos políticos. A tabela
abaixo apresenta a produção de riquezas nos países da América do Sul em 2013,
segundo o FMI:
País
|
Valor do PIB em Bilhões de Dólares
|
Porcentagem do PIB Regional
|
|
Argentina
|
488,213
|
12%
|
|
Bolívia
|
29,802
|
1%
|
|
Brasil
|
2242,854
|
54%
|
|
Chile
|
276,975
|
7%
|
|
Colômbia
|
381,822
|
9%
|
|
Equador
|
94,144
|
2%
|
|
Guiana
|
2,97
|
0%
|
|
Paraguai
|
28,333
|
1%
|
|
Peru
|
206,542
|
5%
|
|
Suriname
|
5,057
|
0%
|
|
Uruguai
|
56,345
|
1%
|
|
Venezuela
|
373,978
|
9%
|
|
América do Sul
|
4187,035
|
100%
|
|
Fonte: Fundo Monetário Internacional
(FMI), Base de Dados da Perspectiva Econômica Mundial, Abril de 2014.
|
|||
O que se apresenta, segundo os dados apresentados, é que a
vitória política dentro de qualquer um destes países é muito relevante para
compreender os projetos políticos que estão em andamento na região. Tanto a
Aliança do Pacífico como o Mercosul encontram-se, atualmente, em um momento de
revisão das suas estruturas. Enquanto a vitória de Michelle Bachelet no Chile
representa uma possível estagnação do avanço da Aliança, diversos setores –
sobretudo aqueles ligados à indústria e ao agronegócio – no Brasil e na
Argentina questionam a continuidade do Mercado Comum.
O Mercosul, que foi criado em 1994 mas que ganhou força a
partir do fim da década de 1990, se tornou, dentro da estratégia de integração
regional, uma das forças motrizes da integração regional. Foi a partir do
Mercosul que, em 2008, o ex-presidente brasileiro Luís Inácio Lula da Silva
criou, utilizando-o como plataforma para tal, a União das Nações
Sul-Americanas, a UNASUL.
Esta estrutura, que previa uma profunda integração entre os
países da América do Sul nos quesitos de energia, educação, saúde, ambiente,
infraestrutura, segurança e democracia, segundo a própria instituição,
conseguiu, pela primeira vez, reunir sob um mesmo espectro todos os países da
região – inclusive países como a Guiana e o Suriname, tradicionalmente
afastados de iniciativas regionais. Porém, com a entrada da Venezuela no
Mercosul aceita pelo Parlamento paraguaio ao fim de 2013, finalizando um
processo que se iniciara ainda em 2006, ambas as iniciativas foram enxergadas
como pertencentes ao “Giro à Esquerda”, ou seja, aos governos populares de
tendência de centro-esquerda que assumiram o poder nestes países.
Geopoliticamente, o Mercosul conta com um claro viés de
aumento da integração tendo como base o apoio ao consumo interno, o aumento dos
fluxos comerciais e industriais dentro do próprio bloco. Para isso, as
estratégias de distribuição de renda e de desenvolvimento do mercado consumidor
interno são fundamentais, tendo sido estas algumas das principais políticas
perseguidas pelos governos de seus países-membros. A figura abaixo, criada pela
Secretaria Geral do Mercosul, apresenta alguns dados a respeito dos
Estados-membros do bloco.
Figura 1.
Estados-membros do Mercosul e dados internos ao Bloco.
Como contraposição ao “Giro à Esquerda”, os governos do
México, do Peru, da Colômbia e do Chile criaram, em 2011, a Aliança do
Pacífico. Esta estrutura tem uma intenção completamente diversa daquela do
Mercosul. De acordo com sua Secretaria Geral, a Aliança busca, ao tentar criar
uma Área de Livre Comércio, “converter-se em uma plataforma de articulação
política, integração econômica e comercial, e projeção ao mundo, com ênfase na
região da Ásia-Pacífico”.
Desta forma, fica clara a intenção dos governos destes
países, que têm um nível maior de comunicação com o Oceano Pacífico que com as
economias para além da Cordilheira dos Andes, de se inserir numa grande
estratégia global de acesso ao mercado chinês e asiático em Geral. Criado no
âmbito de governos com características neoliberais e mais voltadas às
estratégias de inserção na lógica global da cadeia de produção, a Aliança se
apresentou como uma contraposição ao Mercosul e à Unasul, já que seus preceitos
ideológicos diferem destes últimos, sobretudo num forte apoio às estratégias
dos Estados Unidos da América na região. A figura abaixo, produzida pela
Secretaria Geral da Aliança, demonstra a intenção em perseguir este tipo de
política.
Figura 2.
Estados-membros da Aliança do Pacífico e sua inserção geográfica na zona
costeira do Oceano Pacífico.
Fonte:
Secretaria Geral da Aliança do Pacífico, 2014.
O quê demonstram as recentes eleições nos sete principais
países da região é que, de certa forma, o projeto da Aliança do Pacífico é
aquele que pode ser prejudicado em razão da recente cartografia política da
região. A candidata de centro-esquerda Michelle Bachelet, que assume o seu
segundo mandato como Presidente do Chile após derrotar a candidata de
centro-direita Evelyn Mattheis no segundo turno, pode representar uma quebra na
continuidade da Aliança e uma guinada tanto no Mercosul como na Unasul,
instituição da qual, entre 2008 e 2009, Presidente pro tempore.
Dos países que já terminaram seu processo eleitoral, apenas
a Colômbia apresenta a continuidade de um processo político que apoia
fortemente a Aliança do Pacífico. Porém, devido a pressões externas e internas,
haverá que se aguardar para perceber quais os reais impactos destas eleições
nos processos de integração da região.
Gustavo Glodes Blum é Professor de Geografia Política do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA