Artigo apresentando na disciplina de Teoria das Relações Internacionais ministrado pela Profa Dra Janiffer Zarpelon, do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
Por: * Kimberly Oliveira
A UNASUL surge como proposta para a fusão do MERCOSUL
(Mercado Comum do Sul) e da CAN (Comunidade Andina de Nações), conjugando então
as duas uniões aduaneiras regionais dentro de um ideal de integração
sul-americana. A UNASUL se propõe a ser uma união supranacional que
eventualmente substituirá os blocos que lhe compõe.
A América do Sul é composta por 13 países, em relação ao
MERCOSUL: cinco Estados Partes; um em Processo de Adesão; seis Estados
Associados; e um Estado (Guiana-Francesa) que não participa por ser território
ultramarino francês.
E em relação a CAN (que também possui Estados da América
Central no seu rol de membros): quatro Estados Membros; cinco Membros
Associados (na estrutura da UNASUL); dois países Observadores (México e Panamá,
ambos na América Central); e dois países que não fazem mais parte do bloco.
A região, apesar de rica em recursos naturais, apresenta
como denominador comum para vários de seus países os graves problemas
econômicos e sociais. Outro ponto em comum é a concentração da produção dos
países em bens de consumo e produtos agrícolas, largamente voltados para a
exportação como é o caso do café, banana, cacau e cereais (as commodities).
Com o intuito de impulsionar o desenvolvimento dos países da
região e estimular o comércio entre os Estados através do modelo de Mercado
Comum, a UNASUL surge com o proposito de seguir o modelo da União Europeia, no
que diz respeito ao passaporte, parlamento, e em um futuro distante, uma moeda
comum aos Estados Membros. A Declaração de Cusco foi um documento assinado por
chefes de Estados como uma carta de intenções do bloco, no qual afirmam buscar
parâmetros igualitários entre os países nos âmbitos politico, social,
econômico, ambiental e infraestrutura.
O
bloco seria então uma nova comunidade para unificar a América do Sul,
englobando as politicas de livre comercio e circulação de bens e pessoas já
existentes tanto no MERCOSUL como na CAN.
A Teoria
Neofuncionalista
A teoria foi usada para explicar principalmente o processo
de integração europeu que levou á União Europeia. Ernest Haas distingue quatro
motivações para uma integração regional: o desejo de promover a segurança
regional através de uma defesa conjunta; a promoção da cooperação para o
desenvolvimento econômico; o interesse de uma nação mais forte em controlar
nações mais fracas; e a vontade comum de unificação das comunidades nacionais
numa entidade mais ampla. A integração possibilitaria uma proteção que um
Estado sozinho não seria capaz de prover, mas a união das forças militares
poderia então deter um inimigo. No caso europeu essa união deteria a União
Soviética, considerada o inimigo da Europa na época.
Os Estados seriam o núcleo central (ou funcional), que
dariam inicio ás negociações de integração por serem eles os responsáveis por
tomarem as decisões politicas e serem os detentores da capacidade decisória no
cenário internacional. O processo de integração então se esparramaria (spillover) e demandaria uma posição, a
favor ou contra, da sociedade que é afetada pela integração. A sociedade não
apenas assiste as negociações interestatais, mas procura uma forma de participar
das negociações, e ao longo do tempo é integrada ao núcleo central junto com
novos atores e setores relevantes.
A teoria neofuncionalista entende que o spillover demanda a
criação de uma burocracia voltada para administrar as questões referentes à
integração, com caráter supranacional, para conseguir superar as diferenças
entre as nações, como por exemplo, os valores e interesses que não são
necessariamente os mesmos em todos os Estados. A cooperação entre os países
possibilita que interesses diferentes não causem conflitos, uma vez que
interesses podem mudar ao longo do tempo devido a mudanças ocorridas nas
sociedades, e assim as diferenças podem se acomodar. Dentro de um Estado
encontramos os ‘’valores nacionais’’, que são os elementos centrais da
identidade de determinado Estado, esses valores são defendidos e protegidos
pelos Estados para assegurar a ordem para os diferentes grupos da sociedade.
Nos Estados democráticos, o grupo politico que venceu as
eleições determina as regras e atua de acordo com os interesses dos grupos que
lhe apoiaram sem esquecer os demais grupos. Para Haas, as decisões politicas
são resultados desses múltiplos interesses. Os autores neofuncionalista
acreditam que diversos grupos dentro da sociedade possuam visões diferentes
para a politica externa de seu país. Haas divide esses grupos em cinco categorias,
de acordo com o grau ou a interesse e a preocupação com as questões de politica
externa: grupos permanente e diretamente ligados a questão de política externa,
como organizações internacionais; grupos cuja principal função é a realização
de demandas nacionais, por vezes seus objetivos podem ser dependentes de
resultados de negociações externas; grupos interessados apenas nos problemas
gerais da formulação de politica externa, como organizações civis; grupos
preocupados com as questões domesticas, mas que por vezes se interessam por
alguma questão de política externa; e grupos que só se interessam em questões
externas em tempos de crise ou emergências, que representa a maior parte da
população que só se interessa quando os temas de política externa passam a
afetar diretamente as suas vidas.
O processo de integração é viável quando as expectativas das
elites e as demandas e benefícios da integração convergem, pois essas podem
sustentar o processo. A ligação entre as elites e as organizações nacionais são
essências para garantir a integração regional de forma ampla.
Se os setores-chave, ou o governo, percebem que terão poucos
benefícios com a integração regional, podem começar um processo de
desintegração, que seriam o retrocesso do processo regional. Um quesito chave
para a teoria neofuncionalista é a democratização do sistema politico, e seria
essencial para o spillover, levando as
questões a diferentes grupos e possibilitando a participação destes na
propagação e manutenção do processo de integração. Para garantir esse
spillover, o governo deveria ser capaz de garantir a continuidade dos ganhos
para os beneficiados e uma compensação para os prejudicados. As compensações
são necessárias para equilibrar os possíveis efeitos prejudiciais da
integração, e assim evitar que os prejudicados sem mobilizem contra a
integração e dificultem o andamento do processo.
A teoria neofuncionalista prevê que a integração econômica
não deve se basear apenas na remoção das barreiras administrativas e fiscais ao
comércio, mas deve levar a uma politização do processo de integração. A
politização ampliaria o numero de assuntos discutidos na agenda de negociações,
antes considerados não pertinentes, significando uma maior soberania para o
centro decisório da integração. A teoria também supõe a necessidade da criação
de uma burocracia voltada para a administração das questões de integração,
preferencialmente com caráter supranacional. As soluções regionais seriam
facilitadas, já que os custos de politicas compensatórias podem ser divididos
entre os membros do bloco, mesmo que isso exija uma maior coordenação e
cooperação entre os países.
A análise neofuncionalista prevê duas alternativas no
sistema decisório: o sistema intergovernamental; e o sistema supranacional. O
supranacional é caracterizado pela presença de representantes dos Estados
membros na tomada de decisões e a inexistência de instituições comuns com
poderes acima dos Estados. Nas organizações supranacionais, além dos
representantes dos Estados, são incorporados outros atores das sociedades
envolvidas e as decisões tendem a ter mais autonomia em relação aos Estados
nacionais. A burocracia administrativa é ampliada e um interesse comum é
expandido. O aprofundamento da integração e do spillover teriam a
supranacionalidade como consequência, e a existência deste representaria uma
irreversibilidade do processo de integração, além de garantir a sua
perpetuação. A sociedade ganharia um meio de intervenção na integração e os
governos já não mais controlariam as negociações. A participação da sociedade,
no entanto, não seria suficiente para forçar os Estados a fornecerem uma
compensação para aqueles que fossem prejudicados, mas eles mesmos deveriam,
segundo Haas, promover uma ação conjunta, baseada no supranacionalismo. Isso
possibilitaria a formação de uma coalizão de interesses regionais, não mais
estritamente nacional, e haveria assim um centro de fidelidade.
Haas aponta como os três principais problemas da teoria
neofuncionalista como sendo as suposições: de que um modelo institucional
definido marcaria os resultados da integração; o processo teria uma única
direção; e o incrementalismo seria a principal forma de tomada de decisões.
O neofuncionalismo chega a outras conclusões como a de que o
estuda da integração regional deve estar vinculado a analise do processo de
interdependência internacional, e a integração seria então um regime
internacional. A integração requer explicações que considerem as diferentes
formas de evolução do processo, assim como os diferentes resultados que podem
ocorrer.
Análise Crítica
A proposta de União da América do Sul pode ser a melhor
alternativa para os países do conjunto. Haas identifica quatro motivações para
uma integração regional, e duas delas se aplicam a formação da UNASUL, uma vez
que os Estados membros não estão a procura de um sistema de proteção regional,
não existe o interesse de uma nação forte de controlas as outras, há a vontade
comum de unificação para uma comunidade mais ampla, e o desejo de promover a
cooperação para o desenvolvimento econômico.
Mas seria esse desejo pela cooperação suficiente
economicamente para sustentar um bloco constituído por países conhecidos pelos
problemas econômicos? Embora países como o Chile e o Brasil- que passa por uma
grave crise que afeta diversas áreas além da econômica- tenham um PIB per
capita considerável, outros países como a Venezuela e o Peru não possuem uma
economia semelhante a dos países citados anteriormente.
A área da UNASUL é quase quatro vezes o tamanho da União
Europeia, mas tem um PIB per capita que representa menos da metade quando
comparado ao Europeu. Existe no continente americano o potencial de
investimento em grandes indústrias, agropecuária e as commodities, e em longo
prazo é um investimento com grandes perspectivas de retorno econômico, o que
poderia proporcionar ao bloco um retorno dos investimentos e também capital
para investir em futuros negócios.
O Brasil tem na sua Constituição Federal, no Artigo 4º que "a
República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social
e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade
latino-americana de nações". Um bloco econômico como a UNASUL poderia
promover um grande desenvolvimento para países atualmente em graves crises como
a Venezuela a recuperarem a sua economia e retomarem o crescimento econômico.
Uma integração com países bem sucedidos é de interesse de todos, e assim uma
ajuda financeira a países subdesenvolvidos é de interesses daqueles em
desenvolvimento, uma vez que aumenta seu mercado consumidor e as oportunidades
de investimento. Já que a integração prevê uma coordenação de politicas fiscais
e monetárias.
Embora não seja uma das principais pautas no momento- já que
não há no presente um inimigo em comum aos Estados-, a integração regional
seria um instrumento importante de defesa das nações, já que ao menos os atuais
dez membros do bloco se comprometeriam com a segurança regional. Essa segurança
poderia também ajudar países como a Colômbia no conflito com as FARC, que em
caso de uma integração com livre circulação de pessoas torna esse conflito não
só um problema nacional colombiano, mas um caso para o bloco em conjunto. Esse
comprometimento poderia, inclusive, solucionar esse caso, visto que a Colômbia
não conseguiu ainda resolver, talvez com as forças de seus países vizinhos o
grupo pudesse ser ter suas ações interrompidas. Outro ponto importante da
integração referente à segurança é que as polícias federais teriam uma maior
comunicação, facilitando o trabalho nas fronteiras para evitar o contrabando de
armas, drogas e pessoas.
A UNASUL, portanto, é uma opção viável- em um futuro não
muito próximo- para os países sul-americanos. Os Estados carecem, no entanto,
da disposição dos países de arcarem com os custos iniciais de um integração,
uma vez que nações como o Brasil e a Argentina enfrentam graves recessões e não
poderiam, agora, se comprometer com os gastos necessários para a formação de um
novo bloco no modelo da União Europeia.
Referências
* Kimberly Oliveira é acadêmica do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
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