Artigo realizado na disciplina de Instituições Internacionais, sob orientação da Profa Dra Janiffer Zarpelon, do Curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
* Otávio Henrique Simiano do Bomfim
O conceito de
integração regional fechada, em suas vísceras, se opõe ao paradigma
estabelecido pelo modelo liberal internacional do século XX, assim como vai de
encontro às recomendações e às características do GATT (ou OMC, nos dias
atuais), por estabelecer vantagens destinadas à determinados países no comércio
internacional, de acordo com o princípio da não-discriminação. Porém, após a
formação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço e da Comunidade Econômica
Europeia, pilares do surgimento da União Europeia, a tendência à formação de
unidades regionalistas se incrementou, com o posterior surgimento da NAFTA, por
exemplo.
No âmago das
integrações se encontram os Estados, que visam conciliar os seus interesses
para a manutenção de um sistema que conceda vantagens a todos os participantes
frente à austeridade de outros países, regiões ou blocos. Este é o novo
paradigma do comércio e da política internacional: a convivência da
globalização com a regionalização.
As contradições
contemporâneas vivenciadas pela União Europeia decorrem da incompatibilidade de
uma organização baseada nos interesses estatais em detrimento das necessidades
dos indivíduos. O caso mais recente é o da Grécia, que se encontra em uma crise
absoluta, tanto política quanto econômica, enquanto o bloco integrado tenta
decidir o destino de um país que deveria ser soberano, demonstrando a desproporção
entre as potências europeias e os países subdesenvolvidos da região.
O desenvolvimento
industrial e comercial da América Latina foi marcado, durante toda a sua
história, por tentativas de criação de um método próprio à região de estruturação
industrial e comercial, idealizando a saída do subdesenvolvimento. Nesse
sentido, desenvolveu-se um intelectualismo que defendia o regionalismo aberto,
que era considerado um estágio intermediário, um multilateralismo que levaria à
futura abertura total do mercado. Esse pensamento, promovido pela Cepal, é
visto com desconfiança por alguns teóricos, como Celso Furtado, que observam o
subdesenvolvimento não como um estágio comum a todos os países, que precede o
desenvolvimento, mas sim como uma condição histórica exclusiva às economias periféricas,
que são inseridas no sistema com a lógica de permanecerem nessa posição.
A integração da
América Latina, uma vontade histórica na região, se popularizou, primeiramente,
com o movimento integracionista de Simon Bolívar que, entre vários outros fatores,
provavelmente falhou por conta da falta de consolidação dos próprios Estados
individuais, não estando estes preparados para uma integração. Embora
fracassado o pan-americanismo, seu legado foi importantíssimo para a formação
de um espírito integracionista.
À exemplo das
questões supracitadas, surgiu a Associação Latino-Americana de Livre Comércio
(ALALC), nos anos 1960, numa tentativa de integrar o subcontinente
comercialmente, sendo extremamente influenciada pelos pensamentos bolivarianos
de oposição à austeridade, assim como a Comissão Especial de Coordenação
Latino-americana, criada por países da Organização dos Estados Americanos, que
buscavam fazer frente aos Estados Unidos. Além disso, o conceito da ALALC
recebeu influências da criação da Comunidade Econômica Europeia (CEE), pelo
Tratado de Roma, e influenciou o pensamento cepalino. A ALALC não previa
favorecimentos relativos à países menos desenvolvidos, mas sim um tratamento
igual à todas as nações envolvidas.
Nos anos da década
de 1980, a ALALC se transformou na Associação Latino-americana de Integração
(ALADI), sendo que esta buscava continuar os projetos daquela. Com o objetivo
de eliminar gradativamente obstáculos ao comércio recíproco entre os
países-membros, impulsionar a cooperação solidária entre os povos
latino-americanos, promover o desenvolvimento econômico e social
harmonicamente, renovar a integração latino-americana de acordo com a sua
própria realidade e criar uma área de preferências econômicas, buscando o
estabelecimento de um mercado comum latino-americano, a instituição se propõe a
promover a regulação e o desenvolvimento do subcontinente. Em seu âmbito,
desenvolveram-se acordos de alcance parcial e acordos regionais, que se somaram
aos acordos regionais da Comunidade Andina de Nações e do Mercosul. Além disso,
o conceito de igualdade foi substituído pelo de equidade, dando benefícios
adicionais aos países que mais necessitavam.
O Mercosul, por sua
vez, foi a consequência do desenvolvimento da ALADI. No seu contexto, estabeleceu-se
uma zona de livre comércio, em sua criação pelo Tratado de Assunção,
expandindo-se posteriormente à uma integração aduaneira, liberdade de migração,
uma certa internalização de laudos pelos países partes e uma relação sócio laboral
integracionista, conquistada pelos sindicatos.
A evolução das
instituições internacionais latino-americanas é notável, principalmente em
relação a persistência dos países em desenvolver um projeto tão difícil de
integração. Porém, ao discutir-se as contradições do bloco do Mercosul,
percebe-se que os objetivos da instituição permanecem inacabados. Com as
recentes crises na Argentina, por exemplo, testemunhou-se o levantamento de
diversas barreiras contra produtos brasileiros, o que demonstrou a fragilidade
da suposta União Aduaneira entre os Países Partes e as debilidades jurídicas do
ambicioso projeto. As regras do jogo dentro do bloco são ineficazes, sem
legitimidade, além da falta de credibilidade de seu recém-criado sistema de
solução de controvérsias.
A União Europeia, criada
no sentido de moldar e fortalecer a paz, numa época em que os blocos regionais
não eram comuns, teve cerca de 30 anos para moldar algo próximo à uma
integração efetiva. O Mercosul, por sua vez, não possui esse tempo, o que causa
uma certa euforia em vários tomadores de decisão dos Estados envolvidos. Nesse
sentido, as tomadas de decisões no âmbito do bloco acabam por ignorar as
assimetrias de poder existentes entre os países do continente, além de manter
um diálogo muito pobre com suas respectivas sociedades civis, não prestando o
serviço necessário aos produtores nacionais e à população no geral. Por essas questões, observa-se a integração
de sociedades no mesmo molde da União Europeia: de cima para baixo. Embora a
União Europeia ainda não seja totalmente efetiva, os Estados envolvidos tiveram
um intervalo de tempo muito superior para lidar com as contradições internas ao
bloco, sem a pressa característica ao Mercosul.
Para um
desenvolvimento saudável e sólido das instituições do Mercosul, é necessário
que se mantenha um ritmo adequado ao estabelecido pelas sociedades envolvidas.
O bloco ainda se caracteriza por sua pouca influência no âmbito interno dos
Estados e do próprio subcontinente, caracterizando-se como poder de barganha em
negociações com países de outras regiões e com outros blocos, mas não como
instrumento de desenvolvimento das próprias nações envolvidas. Dessa forma, os
indivíduos que habitam a América Latina não sentem, em seu cotidiano, a
influência das decisões tomadas pelo bloco, o que demonstra ainda mais a sua
falta de conexão com a sociedade civil.
Fora do contexto
comercial, é necessária uma integração cultural, um reconhecimento maior da
pluralidade do continente. O primeiro passo dado foi o estabelecimento do
Português, Espanhol e Guarani como idiomas oficiais do bloco, além da criação
do Setor Educacional do Mercosul, que tem como pretensão promover pesquisas
acadêmicas integradas e intercâmbios de alunos dentro do bloco, favorecendo a
circulação do conhecimento e da informação. Mais concretamente, propõe-se
também uma união de diversos países latino-americanos na concessão de segurança
e garantias de liberdade aos povos indígenas da região, frente ao processo de
desenvolvimento não planejado que acaba por prejudicar sociedades inteiras de
indígenas por um ganho ínfimo na produção de energia, expansão da agropecuária
etc.
O diálogo
necessário para o avanço da integração pan-americana envolve todos os setores
das sociedades de cada país, como os industriais, os comerciantes, os movimentos
sociais, as sociedades indígenas, os prestadores de serviços e os governos. O conceito de integração não é utópico, mas a
sua realização enfrenta obstáculos complexos, que podem ser resolvidos saindo
da base e indo em direção ao topo, respeitando o ritmo imposto pelos próprios
participantes, como estabelece o spillover neofuncionalista (tendo as questões
internas dos Estados uma maior influência na formação de necessidades), não por
um sistema externo e austero, para se estabelecer um sistema de instituições
efetivas por meio da eficiência administrativa para que se promova o desenvolvimento
de uma eficácia cada vez maior.
* Otávio Henrique Simiano do Bomfim: aluno do 4 Período do Curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
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