segunda-feira, 25 de junho de 2012

As ilusões fatais das potências decadentes


Wallerstein: em países como EUA e Israel, nem governos, nem sociedades enxergam seu declínio relativo. 
Tal cegueira produz erros desastrosos
Por Immanuel Wallerstein | Tradução: Daniela Frabasile 
Blowback [algo como revertério] é um termo criado pela Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA). Significava originalmente significava as consequências negativas não intencionais, infligidas a um país por suas próprias operações de espionagem. Por exemplo, se uma operação secreta da CIA levasse a um ataque de represália contra cidadãos norte-americanos que não estavam cientes da iniciativa, isso era considerado um blowback. Mas hoje, muitas operações não são secretas (por exemplo o uso de drones no Paquistão ou no Iêmen). E os ataques de represália muitas vezes são assumidos publicamente. No entanto, alguns países parecem não deixar de se envolver em tais operações.
Precisamos de uma definição mais útil de blowback, para explicar como e por que eles estão ocorrendo em muitos lugares. Penso que o primeiro elemento é que os países envolvidos com operações desse tipo são, sim, poderosos – mas menos poderosos do que acostumaram-se a ser. Quando estavam no ápice de seu poder, podiam desprezar os blowbacks, por serem desdobramentos limitados e não-intencionais. Mas agora que são menos poderosos, as consequências não são tão reduzidas. Ainda assim, parecem sentir necessidade de lançar tais operações com ainda mais força e ainda mais abertamente.
Vamos analisar dois casos famosos de blowback. Um deles envolve os Estados Unidos. Nos anos 80, Washington queria expulsar o exército da União Soviética do Afeganistão. Para isso, apoiou o mujahidin. Um dos líderes mais famosos dos grupos que os EUA apoiaram era Osama Bin Laden. Assim que as tropas soviéticas se retiraram, Osama Bin Laden criou a Al-Qaeda e começou a atacar os Estados Unidos.
Um segundo caso diz respeito a Israel. Nos anos 70, Telaviv considerava Yasser Arafat e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) seus principais oponentes. Buscando enfraquecer organização, financiou-se um braço palestino da Irmandade Muçulmana, conhecido como Hamas. O Hamas cresceu, e de fato enfraqueceu a OLP de alguma forma. Mas em certo ponto, tornou-se um oponente mais efetivo ao Estado israelense que a própria OLP havia sido.
Hoje, todos sabem desses acontecimentos. Outros, envolvendo Grã-Bretanha e França, também poderiam ser citados, e a lista de países que sofreram blowbacks é ainda maior. Então, pergunta-se:, por que eles continuam agindo de forma que parece enfraquecer seus próprios objetivos? Fazem isso exatamente porque seu poder está declinando.
Precisamos enxergar o tema como uma questão de temporalidade nas políticas de estado. Os blowbacks ocorrem quando as potências em declínio envolvem-se em ações que, a curto prazo, alcançam os objetivos imediatos; mas, a médio prazo, apressam ainda mais o declínio – portanto, a longo prazo, são auto-derrotas. A decisão mais óbvia das potências declinantes seria não reiniciar o ciclo. As operações secretas já não funcionam para alcançar os objetivos do país a longo prazo.
Voltando aos exemplos: será que o presidente Obama e o primeiro-ministro Netanyahu não entendem as consequências do que fazem? E se entendem, por que continuam essas operações, até mesmo vangloriando-se delas? Na realidade, penso que os dois chefes de governo, e também os serviços de inteligência dos dois países entendem a ineficácia das operações. Mas eles enfrentam dilemas imediatos.
Primeiro, eles são políticos, interessados em permanecer no poder. Ambos enfrentam, em seus países, forças políticas para as quais suas políticas não são suficientemente agressivas. E nenhum confronta-se movimentos políticos fortes que reivindiquem uma revisão radical das políticas nacionais. Em outras palavras, a extrema direita é, nos dois países, muito forte; e a esquerda, mesmo que moderada, é fraca. A razão de fundo para isso é que a opinião pública não aceita, em nenhum dos dois países, a realidade do declínio relativo de poder.
O que os líderes podem fazer é esconder – até certo ponto – que empurram os problemas com a barriga. Mas como as atividades de inteligência tornaram-se, na prática, muito mais transparentes, eles só podem fazer isso por algum tempo. Quando a possibilidade se esgota, eles passam a acreditar, para se manterem no poder no curto prazo, devem conservar políticas que, conforme sabem, não vão dar certo a longo prazo.
There is another reason. Obama hasn’t given up on one impossible dream – restoring the United States to a position of unquestioned hegemony. And Netanyahu hasn’t given up on another impossible dream – a Jewish state of Israel in the entire former British Mandate. And if they won’t renounce these dreams, they certainly cannot assist their peoples into coming to terms with the new geopolitical realities of the world-system and to the realities of their country’s decline in relative power.
Há outra razão. Obama ainda não desistiu de um sonho impossível – restaurar a posição de hegemonia inquestionada dos Estados Unidos. E Netanyahu não desistiu de outra quimera – um Estado judaico-israelense muito ampliado, abrangendo as fronteiras do antigo Mandado Britânico na Palestina. E se eles não desistirem desses sonhos, certamente não poderão ajudar os cidadãos a entenderem as novas realidades geopolíticas do sistema-mundo e a própria realidade de que o poder de seus países está em declínio.
Artigo publicado em 20/06/12. 
Disponível em: http://www.outraspalavras.net/2012/06/20/as-ilusoes-fatais-das-potencias-decadentes/

Um comentário:

  1. Realmente não é fácil dar confiança e até mesmo fomentar um grupo que de certa forma no início é taxado como oposição ao governo e que anos depois, que se declara rompimento de suas relações com os países que fortaleceram e criaram o mesmo, como nos exemplos mais conhecidos citados no artigo e demais outros grupos que foram criados desta maneira, sempre com o intuito de enfraquecer os "supostos inimigos" dos países fortes. O fato é que estes grupos que agem com interesses próprios e não por interesse de quem os patrocina,são declarados posteriormente pelos países que ajudaram a derrubar os seus inimigos(governos ditadoriais),como grupos terroristas e inimigos fatais a nação que fomentou este mesmo grupo. O que nota-se é que estes grupos são fracos e necessitam de ajuda externa tanto política como financeira, para se manter e também ter status perante a sociedade como de uma causa ou uma luta, que os mesmos anseiam. Muitas vezes sempre em prol de algo, mas que por trás disto tem sempre um país forte que os patrocina e que depois é vítima do próprio veneno que semeou. Mas por outro lado vemos que há uma necessidade para que um país forte, ou que se diga potência econômica, necessite desta manobra para manter-se hegemônico ou com uma forte influência externa diante dos problemas do mundo, sejam eles políticos ou econômicos. Pois é parte principal das políticas do país Hegemon, o intrometimento exterior, em outras palavras as políticas externas do hegemon são de uma ambição, que se desloca de dentro para fora, são políticas intervencionistas, que se baseiam na maioria das vezes em sua própria Democracia, ou modelo de governança, como se as sociedades dos Estados Nações fossem constituídas da mesma massa cultural, de mesmos costumes e tradições. Há uma enorme discrepância entre os Estados, mas ao final os interessados "Governos”, querem mesmo é construir métodos que possam manter-se no poder por muitos anos, digam-se aqui dois ou mais mandatos.

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