terça-feira, 6 de setembro de 2016

Relações Internacionais - Teoria aplicada na Prática: O avanço das Políticas Globais de Meio Ambiente


A seção "Relações Internacionais - Teoria aplicada na Prática" é produzida por alunos do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Teoria das Relações Internacionais, Dra. Janiffer Zarpelon. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.


O avanço das Políticas Globais de Meio Ambiente


                                                                                         Por: * Matheus Walger Nascimento

Mil toneladas de dióxido de carbono emitidas pela China ou pelos EUA afetam igualmente o mundo e não fazem distinções quanto às fronteiras nacionais. Quando se trata de questões ambientais, decisões unilaterais de um país têm o potencial de prejudicar, no mínimo, os países vizinhos. Um bom exemplo são as barragens que a China está construindo nos rios Salween e Mekong e que podem afetar o abastecimento de água de países como Laos, Camboja e Vietnã. A falta de água nesses países prejudicará a pesca e o desenvolvimento da agricultura, acarretando em profundos problemas na esfera social.
O aumento de gases estufa, principalmente o dióxido de carbono, na atmosfera tem alterado o clima em todo o globo. O IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) prevê que a produção de alimentos pode sofrer com um grande impacto em todo o mundo devido ao aquecimento global. Isso afetaria, principalmente, os países pobres da Ásia e da África, mas grandes produtores agrícolas, como o Brasil, também sentiriam seus efeitos já na próxima década. No Brasil, por exemplo, essas mudanças climáticas tornariam certas regiões inaptas para o cultivo de grãos. O aquecimento global, portanto, tornaria os custos da produção agrícola mais caros, podendo gerar um aumento de preços global nesses produtos primários, o que afetaria, majoritariamente, as populações que possuem menor renda no mundo e que dependem da agricultura como sustento.
Não só os grandes países industrializados contribuem para os problemas ambientais. O setor agropecuário pode agravar o problema e contribuir (e muito) para a emissão de mais gases de efeito estufa. O desmatamento e a queima da vegetação para o plantio, bem como o uso em larga escala de fertilizantes nitrogenados (que exigem muita energia para sua produção) e de maquinário movido a combustíveis fósseis na produção são exemplos de ações que contribuem para o aquecimento global. É importante perceber que, apesar dos países desenvolvidos poluírem muito mais pelas vias industriais, os países subdesenvolvidos também colaboram nisso, a mudança no regime de chuvas e de áreas secas previstos para as próximas décadas são, portanto, causas diretas da ação de todos os países em maior ou menor grau.
É imperativo destacar o caráter transnacional de fenômenos que afetam o meio ambiente, ou seja, fenômenos que produzem efeitos através das fronteiras nacionais.Com a globalização e os avanços nos meios de comunicação, bem como a evolução de estudos na área ambiental, os países tomaram consciência dos sérios problemas ambientais que assolavam o mundo e tudo isso culminou na convocação emblemática pela Assembleia Geral da ONU, em 1968, da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, que foi realizada em Estocolmo em 1972. Um fato marcante dessa conferência foi o confronto entre as perspectivas dos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Enquanto os países ricos estavam procurando medidas imediatistas para a conservação da Terra com a intenção de evitar um grande desastre, os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento argumentavam sobre diversos problemas (frutos de seu subdesenvolvimento) como a miséria, falta de saneamento básico, graves problemas de moradia, etc. Argumentavam que precisavam se desenvolver rapidamente para solucionar esses problemas e se questionavam sobre a legitimidade das recomendações dos países ricos, que alcançaram seu desenvolvimento por meio de uma intensa atividade industrial com o uso predatório de recursos naturais. A Conferência, que contou com a participação de 113 países, 250 ONGs e os organismos da ONU produziu a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, que contém princípios de comportamento e responsabilidade quanto a questões ambientais.
Mais tarde, em 1988, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução sobre a realização de uma Conferência sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, com o objetivo de examinar a situação ambiental mundial desde 1972, examinar estratégias para incorporar critérios ambientais ao processo de desenvolvimento, estabelecer mecanismos que possibilitassem a transferência de tecnologias não-poluentes aos países subdesenvolvidos e estabelecer um sistema de cooperação internacional nessa matéria. Os principais produtos dessa conferência foram 5 documentos, entre eles a famosa Agenda 21, que estabelece a importância de cada país de se comprometer, juntamente com todos os setores da sociedade, na busca pela solução dos problemas ambientais.

Interdependência Complexa

A Interdependência significa dependência mútua, ela, por si só, não é nem boa nem má, podendo ser maior ou menor. É possível relacioná-la, no âmbito pessoal, ao voto de casamento, em que cada uma das partes é dependente da outra: "na riqueza ou na pobreza, para melhor, ou para pior". A interdependência entre os Estados funciona de maneira similar, às vezes é para melhor, outras para pior. A "solução" para a interdependência seria o isolacionismo, mas isso é raramente possível ou vantajoso em um mundo globalizado, ou seja, que é constituído por redes mundiais de interdependência. Existe um alto custo econômico envolvido quando nações se "divorciam" do mundo, como é o caso da Coréia do Norte.
O Idealismo Clássico tem como foco o fato de que a interdependência geraria a paz. No entanto, o aprofundamento da interdependência não significa necessariamente que ocorra paz e cooperação, o conflito de interesses continua mesmo em um mundo de interdependência.
A Interdependência Complexa é recente, mas seu processo é antigo. A interdependência econômica aumentou muito após a Segunda Guerra Mundial juntamente com a expansão tecnológica. Hoje podemos identificar diversos atores, interagindo por múltiplos canais e sobre diversos temas.
Existem quatro distinções que explicam as dimensões da interdependência: as suas origens, os benefícios, os custos relativos e a simetria.
- As origens: Pode ser de um processo natural (físico) ou de um processo social (que depende da ação dos atores). Muitas vezes as origens da interdependência engloba esses dois processos. Um terremoto que demande ajuda internacional pode ser um exemplo de um processo de interdependência natural, enquanto investimentos estrangeiros em uma economia podem representar um processo social de interdependência;
- Os Benefícios: No Realismo os benefícios geralmente seguem a lógica da "soma zero", na qual um Estado ganha e outro perde. Os benefícios provenientes da interdependência não são previsíveis, são complexos. Existem diversas outras somas quando se trata de um processo de interdependência, não se nega a possibilidade dos dois Estados perderem ou ganharem;
- Os Custos Relativos: São os efeitos e custos que o processo da interdependência causa. Podemos dividi-los em sensibilidade e vulnerabilidade. A sensibilidade representa o quanto os países são sensíveis no processo de interdependência no curto prazo. A vulnerabilidade representa os efeitos dos custos relativos do processo de interdependência no longo prazo. Vale ressaltar que a vulnerabilidade depende também do fato de estarem ou não disponíveis substitutos ou fontes alternativas de abastecimento. Um país pode ser sensível, mas devido outras fontes de abastecimento (de petróleo, por exemplo) não ser vulnerável;
Simetria: A simetria equilibrada das relações no processo de interdependência é bem rara. Assim como também é raro uma situação de total desiquilíbrio (um país precisa de tudo, o outro de nada). A assimetria está no centro da política de interdependência.
A interdependência pode ser considerada uma fonte de poder, um país que é relativamente mais dependente têm menos poder que outro país que é menos dependente.
Devido ao alto grau de interdependência, que é extremamente complexa e, de certo modo, imprevisível, os Estados tendem a estabelecer instituições internacionais para lidar com problemas comuns. Isso gera uma previsibilidade maior no comportamento dos Estados. Quando se fornece informações e se reduz os custos das relações interestatais, as organizações internacionais conseguem promover a cooperação através das fronteiras. Tanto as organizações formais (OMC, EU, OCDE, etc.), quanto os regimes internacionais (conjunto de acordos) servem para esse fim. Essas instituições aprofundam a cooperação e ampliam os objetivos comuns.
Quando falamos de Interdependência Complexa, podemos perceber que parece que os pressupostos básicos do Realismo foram invertidos. Devemos, porém, frisar que o Realismo e a Interdependência Complexa são modelos ideais, o mundo real se situa em algum ponto entre os dois. Podemos identificar uma relação semelhante à Interdependência quando nos voltamos para países como França e Alemanha hoje. Se a Alemanha cresce, a França também se beneficia. Por outro lado, também podemos verificar uma relação semelhante ao Realismo quando olhamos Índia e Paquistão. Podemos, ainda, verificar relações que se assemelham com algum ponto entre o Realismo e a Interdependência, como é o caso da China e dos EUA.

Análise do Avanço das Políticas Globais de Meio Ambiente através da Interdependência Complexa

Com a globalização e os avanços tecnológicos, o ser humano não só conseguiu encurtar as distâncias, como também conseguiu alterar o ambiente de maneira extrema. O desenvolvimento e o progresso foram acompanhados de um predatório uso dos recursos naturais. Como herança desse processo, possuímos diversos problemas ambientais: espécies de animais e plantas estão desaparecendo da terra, colocando em risco cadeias inteiras; o aquecimento global está alterando as áreas plantáveis do mundo, bem como derretendo as calotas polares e elevando o nível dos mares, o que afetará populações inteiras em certas ilhas e regiões costeiras; o uso indiscriminado da energia nuclear pode gerar danos irreparáveis para o mundo.
Como foi abordado anteriormente, os fenômenos que afetam o meio ambiente possuem um caráter transnacional. Não é possível garantir um clima estável apenas para um país, por exemplo. O clima, para ser estável para um, precisa ser estável para todos. Os Estados dependem mutuamente uns dos outros nessa matéria, a segurança climática é, portanto, um patrimônio comum da humanidade.
O processo de origem da interdependência, quando se trata da matéria ambiental, se dá, principalmente, através de um processo social.  As ações dos atores causaram danos ao meio ambiente, danos que têm grande potencial de prejudicar a vida humana futura e presente na Terra.
No que se refere aos benefícios conquistados nesse processo de interdependência, verificamos que a proteção global do meio ambiente beneficiaria a todos (no quesito da vantagem de viver em um mundo preservado e limpo). No entanto, percebemos também a assimetria desses benefícios. Como foi apontado pelos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento na Conferência de Estocolmo, os países desenvolvidos já haviam se industrializado e conquistado um bom nível de vida. Fizeram isso através de um uso predatório dos recursos naturais contribuindo largamente para os problemas ambientais atuais.
Quando transferimos essa ideia para a esfera dos custos, percebemos que, embora todos os países sejam sensíveis ao processo de interdependência, os países subdesenvolvidos e em desenvolvimento teriam mais chances de se tornarem vulneráveis a longo prazo. Enquanto os países ricos possuem capital e tecnologia para aplicar sistemas de desenvolvimento sustentável, os outros países necessitariam dessa tecnologia e capital, tendo que se sujeitar aos países desenvolvidos.
É praticamente impossível regular uma matéria desse calibre sem a existência de instituições para isso. O alto grau de interdependência nessa matéria faz com que os Estados estabeleçam essas instituições para lidar com a questão do meio ambiente. Podemos destacar alguns acordos que regulam o tema, como a Convenção da Biodiversidade e a Convenção Sobre a Mudança do Clima, dois documentos dentre os cinco que foram produzidos na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992.

Referências:
NYE, JOSEPH O. Cooperação e Conflito nas Relações Internacionais.
SARFATI, GILBERTO Teoria das Relações Internacionais.

SITES CONSULTADOS


Matheus Walger Nascimento é acadêmico do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba. 

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