A seção "Relações Internacionais - Teoria aplicada na Prática" é produzida por alunos do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Teoria das Relações Internacionais, Dra. Janiffer Zarpelon. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
O avanço das Políticas Globais
de Meio Ambiente
Por: * Matheus
Walger Nascimento
Mil toneladas
de dióxido de carbono emitidas pela China ou pelos EUA afetam igualmente o
mundo e não fazem distinções quanto às fronteiras nacionais. Quando se trata de
questões ambientais, decisões unilaterais de um país têm o potencial de
prejudicar, no mínimo, os países vizinhos. Um bom exemplo são as barragens que
a China está construindo nos rios Salween e Mekong e que podem afetar o
abastecimento de água de países como Laos, Camboja e Vietnã. A falta de água
nesses países prejudicará a pesca e o desenvolvimento da agricultura,
acarretando em profundos problemas na esfera social.
O aumento de
gases estufa, principalmente o dióxido de carbono, na atmosfera tem alterado o
clima em todo o globo. O IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças
Climáticas) prevê que a produção de alimentos pode sofrer com um grande impacto
em todo o mundo devido ao aquecimento global. Isso afetaria, principalmente, os
países pobres da Ásia e da África, mas grandes produtores agrícolas, como o
Brasil, também sentiriam seus efeitos já na próxima década. No Brasil, por
exemplo, essas mudanças climáticas tornariam certas regiões inaptas para o
cultivo de grãos. O aquecimento global, portanto, tornaria os custos da
produção agrícola mais caros, podendo gerar um aumento de preços global nesses
produtos primários, o que afetaria, majoritariamente, as populações que possuem
menor renda no mundo e que dependem da agricultura como sustento.
Não só os
grandes países industrializados contribuem para os problemas ambientais. O
setor agropecuário pode agravar o problema e contribuir (e muito) para a
emissão de mais gases de efeito estufa. O desmatamento e a queima da vegetação
para o plantio, bem como o uso em larga escala de fertilizantes nitrogenados
(que exigem muita energia para sua produção) e de maquinário movido a
combustíveis fósseis na produção são exemplos de ações que contribuem para o
aquecimento global. É importante perceber que, apesar dos países desenvolvidos
poluírem muito mais pelas vias industriais, os países subdesenvolvidos também
colaboram nisso, a mudança no regime de chuvas e de áreas secas previstos para
as próximas décadas são, portanto, causas diretas da ação de todos os países em
maior ou menor grau.
É imperativo destacar
o caráter transnacional de fenômenos que afetam o meio ambiente, ou seja,
fenômenos que produzem efeitos através das fronteiras nacionais.Com a
globalização e os avanços nos meios de comunicação, bem como a evolução de
estudos na área ambiental, os países tomaram consciência dos sérios problemas
ambientais que assolavam o mundo e tudo isso culminou na convocação emblemática
pela Assembleia Geral da ONU, em 1968, da Conferência das Nações Unidas sobre o
Meio Ambiente Humano, que foi realizada em Estocolmo em 1972. Um fato marcante
dessa conferência foi o confronto entre as perspectivas dos países
desenvolvidos e em desenvolvimento.
Enquanto os
países ricos estavam procurando medidas imediatistas para a conservação da
Terra com a intenção de evitar um grande desastre, os países subdesenvolvidos e
em desenvolvimento argumentavam sobre diversos problemas (frutos de seu
subdesenvolvimento) como a miséria, falta de saneamento básico, graves
problemas de moradia, etc. Argumentavam que precisavam se desenvolver
rapidamente para solucionar esses problemas e se questionavam sobre a
legitimidade das recomendações dos países ricos, que alcançaram seu
desenvolvimento por meio de uma intensa atividade industrial com o uso
predatório de recursos naturais. A Conferência, que contou com a participação
de 113 países, 250 ONGs e os organismos da ONU produziu a Declaração sobre o
Meio Ambiente Humano, que contém princípios de comportamento e responsabilidade
quanto a questões ambientais.
Mais tarde,
em 1988, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução sobre a
realização de uma Conferência sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, com o
objetivo de examinar a situação ambiental mundial desde 1972, examinar
estratégias para incorporar critérios ambientais ao processo de
desenvolvimento, estabelecer mecanismos que possibilitassem a transferência de
tecnologias não-poluentes aos países subdesenvolvidos e estabelecer um sistema
de cooperação internacional nessa matéria. Os principais produtos dessa
conferência foram 5 documentos, entre eles a famosa Agenda 21, que estabelece a
importância de cada país de se comprometer, juntamente com todos os setores da
sociedade, na busca pela solução dos problemas ambientais.
Interdependência Complexa
A
Interdependência significa dependência mútua, ela, por si só, não é nem boa nem
má, podendo ser maior ou menor. É possível relacioná-la, no âmbito pessoal, ao
voto de casamento, em que cada uma das partes é dependente da outra: "na
riqueza ou na pobreza, para melhor, ou para pior". A interdependência
entre os Estados funciona de maneira similar, às vezes é para melhor, outras
para pior. A "solução" para a interdependência seria o isolacionismo,
mas isso é raramente possível ou vantajoso em um mundo globalizado, ou seja,
que é constituído por redes mundiais de interdependência. Existe um alto custo
econômico envolvido quando nações se "divorciam" do mundo, como é o
caso da Coréia do Norte.
O Idealismo Clássico tem como
foco o fato de que a interdependência geraria a paz. No entanto, o
aprofundamento da interdependência não significa necessariamente que ocorra paz
e cooperação, o conflito de interesses continua mesmo em um mundo de
interdependência.
A
Interdependência Complexa é recente, mas seu processo é antigo. A
interdependência econômica aumentou muito após a Segunda Guerra Mundial
juntamente com a expansão tecnológica. Hoje podemos identificar diversos
atores, interagindo por múltiplos canais e sobre diversos temas.
Existem quatro distinções que
explicam as dimensões da interdependência: as suas origens, os benefícios, os
custos relativos e a simetria.
- As origens: Pode ser de um processo natural (físico) ou de um processo social (que
depende da ação dos atores). Muitas vezes as origens da interdependência
engloba esses dois processos. Um terremoto que demande ajuda internacional pode
ser um exemplo de um processo de interdependência natural, enquanto
investimentos estrangeiros em uma economia podem representar um processo social
de interdependência;
- Os
Benefícios: No Realismo os benefícios geralmente
seguem a lógica da "soma zero", na qual um Estado ganha e outro
perde. Os benefícios provenientes da interdependência não são previsíveis, são
complexos. Existem diversas outras somas quando se trata de um processo de interdependência,
não se nega a possibilidade dos dois Estados perderem ou ganharem;
- Os Custos
Relativos: São os efeitos e custos que o processo da
interdependência causa. Podemos dividi-los em sensibilidade e vulnerabilidade.
A sensibilidade representa o quanto os países são sensíveis no processo de
interdependência no curto prazo. A vulnerabilidade representa os efeitos dos
custos relativos do processo de interdependência no longo prazo. Vale ressaltar
que a vulnerabilidade depende também do fato de estarem ou não disponíveis
substitutos ou fontes alternativas de abastecimento. Um país pode ser sensível,
mas devido outras fontes de abastecimento (de petróleo, por exemplo) não ser
vulnerável;
Simetria: A simetria equilibrada das relações no processo de interdependência é
bem rara. Assim como também é raro uma situação de total desiquilíbrio (um país
precisa de tudo, o outro de nada). A assimetria está no centro da política de
interdependência.
A interdependência
pode ser considerada uma fonte de poder, um país que é relativamente mais
dependente têm menos poder que outro país que é menos dependente.
Devido ao
alto grau de interdependência, que é extremamente complexa e, de certo modo,
imprevisível, os Estados tendem a estabelecer instituições internacionais para
lidar com problemas comuns. Isso gera uma previsibilidade maior no
comportamento dos Estados. Quando se fornece informações e se reduz os custos
das relações interestatais, as organizações internacionais conseguem promover a
cooperação através das fronteiras. Tanto as organizações formais (OMC, EU,
OCDE, etc.), quanto os regimes internacionais (conjunto de acordos) servem para
esse fim. Essas instituições aprofundam a cooperação e ampliam os objetivos
comuns.
Quando
falamos de Interdependência Complexa, podemos perceber que parece que os
pressupostos básicos do Realismo foram invertidos. Devemos, porém, frisar que o
Realismo e a Interdependência Complexa são modelos ideais, o mundo real se
situa em algum ponto entre os dois. Podemos identificar uma relação semelhante
à Interdependência quando nos voltamos para países como França e Alemanha hoje.
Se a Alemanha cresce, a França também se beneficia. Por outro lado, também
podemos verificar uma relação semelhante ao Realismo quando olhamos Índia e
Paquistão. Podemos, ainda, verificar relações que se assemelham com algum ponto
entre o Realismo e a Interdependência, como é o caso da China e dos EUA.
Análise do Avanço das
Políticas Globais de Meio Ambiente através da Interdependência Complexa
Com a
globalização e os avanços tecnológicos, o ser humano não só conseguiu encurtar
as distâncias, como também conseguiu alterar o ambiente de maneira extrema. O
desenvolvimento e o progresso foram acompanhados de um predatório uso dos
recursos naturais. Como herança desse processo, possuímos diversos problemas
ambientais: espécies de animais e plantas estão desaparecendo da terra,
colocando em risco cadeias inteiras; o aquecimento global está alterando as
áreas plantáveis do mundo, bem como derretendo as calotas polares e elevando o
nível dos mares, o que afetará populações inteiras em certas ilhas e regiões
costeiras; o uso indiscriminado da energia nuclear pode gerar danos
irreparáveis para o mundo.
Como foi
abordado anteriormente, os fenômenos que afetam o meio ambiente possuem um
caráter transnacional. Não é possível garantir um clima estável apenas para um
país, por exemplo. O clima, para ser estável para um, precisa ser estável para
todos. Os Estados dependem mutuamente uns dos outros nessa matéria, a segurança
climática é, portanto, um patrimônio comum da humanidade.
O processo de
origem da interdependência, quando se trata da matéria ambiental, se dá,
principalmente, através de um processo social.
As ações dos atores causaram danos ao meio ambiente, danos que têm
grande potencial de prejudicar a vida humana futura e presente na Terra.
No que se
refere aos benefícios conquistados nesse processo de interdependência,
verificamos que a proteção global do meio ambiente beneficiaria a todos (no
quesito da vantagem de viver em um mundo preservado e limpo). No entanto,
percebemos também a assimetria desses benefícios. Como foi apontado pelos
países subdesenvolvidos e em desenvolvimento na Conferência de Estocolmo, os países
desenvolvidos já haviam se industrializado e conquistado um bom nível de vida.
Fizeram isso através de um uso predatório dos recursos naturais contribuindo
largamente para os problemas ambientais atuais.
Quando
transferimos essa ideia para a esfera dos custos, percebemos que, embora todos
os países sejam sensíveis ao processo de interdependência, os países
subdesenvolvidos e em desenvolvimento teriam mais chances de se tornarem
vulneráveis a longo prazo. Enquanto os países ricos possuem capital e tecnologia
para aplicar sistemas de desenvolvimento sustentável, os outros países
necessitariam dessa tecnologia e capital, tendo que se sujeitar aos países
desenvolvidos.
É
praticamente impossível regular uma matéria desse calibre sem a existência de
instituições para isso. O alto grau de interdependência nessa matéria faz com
que os Estados estabeleçam essas instituições para lidar com a questão do meio
ambiente. Podemos destacar alguns acordos que regulam o tema, como a Convenção
da Biodiversidade e a Convenção Sobre a Mudança do Clima, dois documentos
dentre os cinco que foram produzidos na Conferência
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1992.
Referências:
NYE, JOSEPH O. Cooperação e Conflito nas Relações
Internacionais.
SARFATI,
GILBERTO Teoria das Relações Internacionais.
SITES
CONSULTADOS
* Matheus Walger Nascimento é acadêmico do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.
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