Por Fernando Yazbek
No quinto dia de guerra no leste europeu, a FIFA – entidade máxima do
futebol internacional – suspendeu a federação russa do esporte. Ato contínuo,
a seleção Sbornaya, anfitriã da última Copa do Mundo de 2018, foi
desclassificada das Eliminatórias para o Mundial que ocorrerá em novembro. A
penalidade afeta também as categorias femininas e de base do país. O Spartak
Moscou, time de segunda maior torcida na Rússia, foi sumariamente eliminado
da Liga Europa, competição de clubes organizada pela UEFA (União das
Federações Europeias de Futebol).
Na semana de abertura dos Jogos Paraolímpicos de Inverno, o Comitê
Olímpico Internacional recomendou a exclusão de atletas russos e bielorrussos
de suas competições. Foi retirada ainda a Ordem Olímpica, maior honraria do
COI, do presidente russo Vladimir Putin. As assimetrias, aqui, se tornam cada
vez mais inevitáveis: Barack Obama, ex-presidente estadunidense e Nobel da Paz, passou todos os dias de seus dois mandatos na Casa Branca em guerra.
Os jogadores de soccer foram à África do Sul e ao Brasil (nas Copas de 2010 e
2014) enquanto os marines iam ao Afeganistão, Iraque, Paquistão, Líbia e
Iêmen.
A Guerra do Golfo (1990-1991) não impediu os Estados Unidos, líder da
coalizão militar que libertou o Kuwait do Iraque de Saddam Hussein, de
sediarem a Copa de 1994 – na qual o Brasil se sagraria tetracampeão.
Washington e Bagdá quase se encontraram nos estádios após se enfrentarem
na guerra. Isto porque o Iraque, estado agressor, não teve seu selecionado
desqualificado nas eliminatórias daquele mundial. A seleção iraquiana,
inclusive, conseguiu a proeza de empatar nos últimos instantes com o Japão,
que até então estava garantida nos Estados Unidos. A “Agonia de Doha”, onde
aconteceu o empate milagroso, é até hoje motivo de orgulho iraquiano e de
vergonha japonesa. Faltou apenas um ponto para os Leões da Mesopotâmia
disputarem jogos ao meio dia de Dallas sob o calor de 46oC.
Mas a comunidade europeia do futebol, aparentemente preocupada com
a democracia e com o direito internacional, não se importa que a Supercopa da Espanha seja disputada na Arábia Saudita nem que o Mundial de Clubes se dê
em Abu-Dhabi. Muito menos que as camisas de suas principais equipes sejam
verdadeiras propagandas de países e regimes que, se levados ao critério
imposto à Rússia, já estariam expulsos de campo há muito tempo.
As Olimpíadas de 1936 aconteceram na Alemanha de Hitler e a Itália de
Mussolini acolheu a Copa de 1938. Jorge Videla ganhou o mundial para a
Argentina torturando opositores em 1978 e Bill Clinton destruía a infraestrutura
iraquiana em 1996 enquanto Atlanta acendia a pira olímpica. Os absurdos do
passado não podem justificar erros do presente – como a Copa a ser realizada
no Catar. Mas se o doping é motivo para banimento olímpico e a guerra é razão
para exclusão no futebol, como o país que mais consome drogas no mundo e
maior beligerante da história humana é justamente quem sanciona a Rússia?
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