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quarta-feira, 31 de maio de 2017
Por Onde Anda: Heber Rocha Costa, egresso do UNICURITIBA, é oficial de assuntos civis na MINUSCA (United Nations Multidimensional Integrated Stabilization Mission in the Central African Republic)
A seção "Por onde anda" entrevista egressos do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA sobre experiências acadêmicas, profissionais e de vida concretizadas após o término do curso e é coordenada pela Prof. Michele Hastreiter e pela Prof. Angela Moreira.
Nome Completo: HEBER ROCHA COSTA
Ano de ingresso no curso de Relações Internacionais: 2003
Ano de conclusão do curso de Relações Internacionais: 2008
Ocupação atual: Servidor Público Internacional - Oficial de Assuntos Civis – MINUSCA
Blog Internacionalize-se: Conte-nos um pouco de sua trajetória profissional após a formatura no curso de Relações Internacionais.
Heber Costa: Desde o início do curso eu sempre trabalhei. Inicialmente, para poder custear meus estudos e complementar a ajuda financeira que minha família me mandava, eu me dividi entre a faculdade e duas escolas de Inglês, onde atuava como professor. O primeiro ano do curso foi assim, correndo entre as aulas na faculdade e as escolas de inglês. No segundo ano entrei para o programa de trainees da Câmara Americana de Comércio (AMCHAM), fui trainee por um ano e depois de uma longa competição entre 90 trainees espalhados por 10 unidades regionais no Brasil, eu me classifiquei em primeiro lugar na equipe de Curitiba e segundo no ranking nacional. Os bons ventos me deram a oportunidade de iniciar um departamento de Comércio Exterior para a unidade regional da AMCHAM em Curitiba. Na época, essa unidade não existia e os associados da AMCHAM precisavam muito de apoio para ter acesso ao mercado Americano e outras partes do mundo. Depois de dois anos na posição de coordenador de Comércio Exterior, recebi um convite quase que irrecusavel da parte do CEO da organização para me tornar o Gerente Nacional de Relações Internacionais, desta vez o posto sendo em São Paulo.
Com o coração apertado, deixei minha confortável vida em Curitiba e meus amigos, que considero como parte da minha família, para embarcar nessa nova etapa, de muita responsabilidade, porém de tremenda oportunidade. O grande detalhe, nesse período eu ainda tinha que terminar o curso de RI e defender a minha monografia. Então eu passava dois dias da semana em SP e tentava o máximo possível estar em Curitiba, de modo a não extrapolar a cota de faltas. Um turbilhão entre o mundo acadêmico e o mundo da iniciativa privada. O CEO da minha organização, a professora Ângela e o eterno e carinhoso suporte do meu orientador Prof. Carlos Vargas tornaram a minha labuta mais leve.
Depois de minha temporada em São Paulo, o desejo por uma carreira internacional com as Nações Unidas falou mais alto. Minha intuição dizia para sair da minha zona de conforto e embarcar em uma nova jornada, de muitas incertezas imediatas, porém com a certeza que no decorrer dos anos, tudo o que eu tinha planejado para minha vida pessoal e profissional iria se materializar, se eu perseverasse e continuasse vivendo na leveza do ser. Assim, eu me desliguei da Amcham em São Paulo e voltei para o conforto da minha família em Macapá, no Amapá, um estado pelo qual tenho muito carinho e orgulho. Por seis meses, postulei incansavelmente para vários mestrados na Europa e nos EUA. Fui aceito em várias universidades, porém a que me chamou mais a atenção foi a Universidade de Genebra.
Embarquei então em um programa bastante interessante, se tratava de um mestrado misto entre a Universidade de Genebra e o Geneva Center for Security Policy. Tive o privilégio de aprender e trabalhar com pessoas com altíssimo nível acadêmico e igualmente com altíssima experiência de campo. Meus colegas de classe eram na verdade diplomatas, servidores das Nações Unidas, oficiais de forcas armadas de vários países, todos tinham muita experiência profissional. Em princípio, o programa focava em profissionais de meia carreira e que tivessem já uma sólida experiência profissional. Meu tempo na AMCHAM foi crucial para que eu fosse aceito, essa experiência mudou minha vida.
Ao findar o curso, eu apliquei para uma vaga não remunerada nas Nações Unidas em Genebra, passei algum tempo aprendendo sobre o Sistema das Nações Unidas e participei de um pequeno grupo de recém-formados, que trabalhou na elaboração de um relatório que analisava a questão da mudança climática sob a perspectiva dos Direitos Humanos.
Muitos de vocês vão se lembrar de um catastrófico terremoto que aconteceu no Haiti em 2010. Por meados de Julho de 2010, eu iniciei a minha primeira experiência profissional trabalhando em um contexto de peacekeeping. Troquei a pacífica e agradável Genebra por Port-de-Paix, no Haiti. Uma cidade altamente afetada pelo terremoto e, para piorar, com uma grave epidemia de cólera que matou centenas de pessoas entre 2010-2011. Trabalhei depois em outras partes do Haiti, como em Hinche e Porto Príncipe. Na época, eu trabalhei como consultor para a Organização dos Estados Americanos (OEA), porém muito próximo da MINUSTAH. Voltei em uma outra ocasião como observador internacional para as eleições presidenciais e, durante esse tempo, eu entendi que o meu coração e atividade profissional estavam no lugar certo, exatamente em harmonia com minha missão de vida.
Deixei o Haiti para embarcar em uma jornada do outro lado do mundo, literalmente o lugar mais distante da minha família que já trabalhei. A bela, pequena e preciosa Ilha do Timor Leste. Por vários anos o Timor passou por um período muito turbulenciado, envolvendo violência contra civis, fragilidade política e a busca por independência da Indonésia. Em 1999, o Conselho de Segurança aprovou a United Nations Mission in East Timor (UNAMET), que teve como objetivo organizar e conduzir uma consulta popular para identificar se o povo Timorense aceitava ou não a independência da Indonésia. Depois da UNAMET, várias outras missões foram aprovadas, eu peguei os últimos anos da United Nations Integrated Mission in Timor-Leste (UNMIT). Para mim, foi uma imensa alegria poder trabalhar em um país com um contexto muito peculiar, de estrondosa beleza e ver com meus proprios olhos como uma missão de paz pode sim ajudar um país a sair de crises securitárias e se auto-reconstruir.
Depois das belas praias e corais magníficos do Timor, a vida me agraciou com uma nova missão, desta vez, na República Democrática do Congo (MONUSCO). Por lá, trabalhei durante 3 anos com projetos de estabilização, comunicação estratégica e policy-making. Passei por vários momentos difíceis na RDC, incluindo o tempo em que a capital do Kivu do Norte (Goma) foi tomada por um grupo armado chamado M-23. Tive a oportunidade de trabalhar com o General Santos Cruz. Tomo a liberdade de mencionar o seu nome aqui, pois sei que recentemente ele esteva no UNICURITIBA para dar uma palestra. Santos Cruz foi para mim um grande exemplo de vida e de muito orgulho patriótico, pois em minha opinião ele representa o melhor que um Force Commander pode ser em uma missão de paz.
Durante o mestrado, eu aceitei o desafio de escrever sobre o processo de construção de paz da República Centro Africana (RCA). Na época, a crise da RCA era quase que ignorada pela comunidade acadêmica, não existiam fontes sobre o contexto aqui, e eu sofri muito para produzir a minha dissertação. Desde 2009, eu tenho seguido as dinâmicas de conflito e intervenções de paz implementadas na RCA. O desejo de contribuir para a RCA esteve presente em meu coração e imaginação desde os tempos de Genebra. Assim que surgiu uma oportunidade para servir com a MINUSCA eu imediatamente topei.
Inicialmente trabalhei em Bria, no Leste da RCA, com inteligência e produção de análises sobre a dinâmica dos grupos armados em todo o Setor Leste do pais. Para tal, eu tinha que me “infiltrar” no meio desses grupos, ganhar confiança e credibilidade para ter acesso a informações privilegiadas. Até então, esta foi a minha posição mais fascinante em um contexto de peacekeeping. Obviamente que, na época, a situação aqui era permissível para ter esse contato mais próximo. Hoje tudo mudou e já não é tão fácil criar esse “rapport”. Uma carga de cansaço tomou conta de mim e, assim, tomei um ano sabático para conhecer o mundo depois da minha experiência em Bria. Entre missões, idas e vindas eu conheci algo em torno de 65 países...
Depois disso, voltei para a MINUSCA, dessa vez na capital Bangui, atuando como Oficial de Assuntos Civis. Produzo análises sobre Proteção de Civis, Extensão e Restauração da autoridade do Estado e processos de reconciliação e paz. Ser um staff member da ONU continua sendo uma profissão de indescritível prazer, misturado com uma boa pitada de desafios e adrenalina.
Blog Internacionalize-se: Conte-nos sobre como foi sua decisão de trabalhar na ONU. Este sempre foi o seu objetivo ao ingressar no Curso de Relações Internacionais?
Heber Costa: Fiz uma parte do ensino médio nos EUA (High School) e, em uma aula de “World Governments”, o desejo de ser um funcionário das Nações Unidas brotou em meu coração.
Blog Internacionalize-se: Como foi o seu processo de recrutamento? O que considera ter sido decisivo para ter sido selecionado?
Heber Costa: Sem dúvidas a experiência de campo, nos contextos de conflito e pós-conflito são fatores decisivos para uma posição de staff member da ONU.
Blog Internacionalize-se: Como é o dia a dia na ONU?
Heber Costa: Uma mistura de comunicação com vários atores, leituras e mais leituras e constante produção de relatórios analíticos e informativos. Participo também de varias reuniões e ocasiões formais.
Blog Internacionalize-se: Quais são as principais dificuldades do trabalho em campo, nas missões das Nações Unidas?
Heber Costa: Sem dúvidas o contexto de segurança, que por vezes pode sem bem perigoso.
Blog Internacionalize-se: Qual foi a experiência mais desafiadora que já teve profissionalmente?
Heber Costa: Quando trabalhei em Bria e tive que ganhar a confiança de lideres de grupos rebeldes.
Blog Internacionalize-se: Que conselhos daria para nossos alunos que sonham trabalhar na ONU?
Heber Costa: Sem mestrado é quase que impossível conseguir sequer um estágio com a organização. Depois tem a questão das línguas: Inglês e Francês é quase que mandatório. Depois busque o máximo de field experience possível. Obviamente que compartilho esses conselhos de acordo com a minha experiência no DPKO, trabalhar com as Agências do sistema pode ser um pouco diferente.
Blog Internacionalize-se: Quais as aptidões e conhecimentos desenvolvidos no curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA que mais o ajudam na sua profissão atual?
Heber Costa: Diplomacia, capacidade analítica e argumentativa.
Blog Internacionalize-se: Qual a lembrança mais marcante do período de faculdade?
Heber Costa: Eventos relacionados ao ENERI em Florianópolis, sobre os quais prefiro não detalhar.
Blog Internacionalize-se: Qual conselho deixaria para os nossos alunos?
Heber Costa: A vida profissional começa na faculdade, mesmo que você não trabalhe. Procure desde o início criar competências profissionais e trilhar um caminho. Inevitavelmente, a trajetória não vai acontecer como planejada, porém o preparo e a persistência, de uma maneira ou outra, vão te levar muito próximo de onde você inicialmente almejou estar. Always follow your heart.
segunda-feira, 29 de maio de 2017
Direito Internacional em Foco: O reconhecimento da independência do Brasil
A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão do monitor da disciplina, Matheus Walger Nascimento. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
O reconhecimento da independência do Brasil
Gabriela de Carvalho Pellenz, Larissa Cordeiro de Souza e Lígia Maffessoni Penia
Por meio de uma expedição
portuguesa que contava com 13 barcos liderados por Pedro Álvares Cabral,
descobriu-se o Brasil. Com a chegada dos portugueses, em 1500, iniciou-se o
processo de conhecimento destas terras a fim de nomear suas ilhas e territórios.
O processo de colonização foi caracterizado pela formação de vilas, criação de
engenho de cana-de- açúcar e, por conseguinte, a escravidão. Com o
desenvolvimento do processo de colonização nas Américas, surgiu em Portugal o
interesse de garantir seu poder e dominação sobre o que estava sendo produzido
no Brasil, em especial a produção agrícola que era revertida em riqueza para
sua Coroa. Manter o domínio sobre esta atividade econômica foi o desafio do
Pacto Colonial, que para isso estabeleceu regras, dentre elas o exclusivismo. O
Brasil só poderia comprar e vender produtos de sua metrópole, ou seja, venda de
matéria-prima a preços baixos e, em contrapartida, compra de produtos
manufaturados a preços elevados.
Em novembro de 1807, a
França de Napoleão invadiu Portugal. Dom João VI, rei português, e sua corte
vieram fugidos para o Brasil, iniciando o Período Joanino. Neste processo,
houve a abertura de portos brasileiros, que resultou na grande entrada de
produtos ingleses no Brasil; estabelecimento de indústrias, inicialmente de
ferro; investimento em educação e cultura; e estruturação econômica, com a
criação do Banco do Brasil e da Casa da Moeda. Tudo isso já caracterizou uma
unidade nacional com Instituições sérias e estrutura crescente. O fim deste
período ocorreu com a expulsão da França do território português, que antecedeu
a Independência do Brasil. A Revolução Liberal e a pressão política fez com que
D. João VI retornasse à Portugal, ficando no Brasil seu filho, D. Pedro I, como
príncipe-regente.
Dom Pedro I, proclamador
da Independência brasileira, foi às margens do rio Ipiranga o porta voz da
declaração elaborada por José Bonifácio de Andrada e Silva e assinada pela
então esposa do imperador, Leopoldina. Empenhada na tarefa de reconhecimento do
novo país, logo se preocupou em comunicar-se com o imperador da Áustria e com o
rei de Portugal, seu pai e seu sogro, respectivamente.
O reconhecimento não foi
apenas externo, mas teve que acontecer internamente. Grande parcela da
população brasileira era adepta do Brasil colonial de monarquia absoluta, como
tinha acontecido até então. Os estados do Pará e Maranhão sendo focos de
comerciantes portugueses, declararam apoio às cortes lusitanas; outros estados
que reconheceram o novo país de modo tardio foram Piauí e Alagoas.
Reconhecimento significa
a decisão do governo de um Estado existente de aceitar outra entidade como um
Estado. O Estado é a pessoa de Direito Internacional Público que se acha dotada
de capacidade plena, tanto no âmbito interno, quanto no externo, recordando-se
que nem as Organizações Internacionais nem a pessoa humana, apesar da
importância que esta ocupa na atualidade, possuem a totalidade e a extensão dos
poderes inerentes à situação jurídica do Estado. Ou seja, o Estado, para
existir e garantir a soberania, não depende de reconhecimento estrangeiro. Este
reconhecimento é apenas um ato diplomático, onde um Estado Soberano reconhece
como membro componente da sociedade internacional outro Estado, concedendo-o a
capacidade para realizar acordos diplomáticos. Vale ressaltar que o
reconhecimento é fundamental para que o Estado possa coexistir no cenário
internacional, embora não seja essencial.
Garantir o reconhecimento
estrangeiro de Estado nem sempre é acessível, podendo durar anos e envolver grandes
negociações. Como foi o caso do Brasil, que em 1822 conquistou sua
independência, mas só garantiu o reconhecimento estrangeiro, através do Tratado
de Paz e Aliança, concedido pelo Rei de Portugal.
O primeiro Estado a
reconhecer o Brasil como país independente foram os Estados Unidos, em maio de
1824. O gesto político deveu-se ao interesse dos EUA em aproximar-se das outras
nações americanas, durante a execução da nova política externa adotada pelo
país, a doutrina Monroe, na qual defendiam aos países americanos a
autodeterminação: por serem independentes, não poderiam submeter- se à
dominação das potências europeias, por exemplo em processos de colonização. A
partir desse momento, Estados europeus também atribuíram ao Brasil o
reconhecimento como país autônomo, livre e independente. O reconhecimento
inglês foi tido brevemente já que com ele se assegurou os benefícios que o país
já tinha nas relações comerciais. Os primeiros monarcas a reconhecer o Brasil,
entretanto, foram os dos reinos de Benin e Lagos, reinos situados à costa da
África. O interesse por trás desse movimento foi justamente o transporte de mão
de obra escrava, já que os reinos eram dois dos três maiores núcleos de
exportação de escravos africanos ao Brasil.
O reconhecimento tácito
por Portugal só foi se dar anos mais tarde- em 1825; acontece perante o tratado
de Paz, amizade e aliança- celebrado entre Dom João VI e DP I. O peculiar
tratado que reconhece o Brasil como autônomo e ao mesmo tempo concede ao Rei de
Portugal o título de imperador.
ART. II – Sua Majestade Imperial, em
reconhecimento de respeito e amor a seu augusto pai o Senhor D. João VI, anuiu
a que sua Majestade Fidelíssima tome para a sua pessoa o título de Imperador.
Porém,
ART. I – Sua Majestade Fidelíssima
reconhece o Brasil na categoria de Império independente e separado dos Reinos
de Portugal e Algarves; e a seu sobre todos muito amado e prezado filho D.
Pedro por Imperador, cedendo e transferindo de sua livre vontade a soberania do
dito Império ao mesmo seu filho e a seus legítimos sucessores. Sua Majestade
Fidelíssima toma somente e reserva para a sua pessoa o mesmo título.
No contexto de
independência do Brasil, o povo pouco participou, uma vez que as antigas
práticas escravistas se mantiveram. Fato é que a partir de 7 de setembro de
1822, houve a emancipação política, entretanto, a soberania e autonomia do
Estado Brasileiro permaneceram aguardando o reconhecimento de outros Estados.
REFERÊNCIAS
História do Brasil EUA reconhecem a
independência do Brasil. Disponível em:
<http://opiniaoenoticia.com.br/brasil/eua-reconhecem-a-independencia-do-brasil/>.
Acesso em: 11 mar 2017.
Pacto Colonial. Disponível em:
<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiageral/pacto-colonial.htm>.Acesso
em: 11 mar. 2017
O Pacto Colonial. Disponível em:
<http://historiadomundo.uol.com.br/idade-moderna/o-pacto-colonial.htm>.Acesso
em: 11 mar. 2017
A Doutrina Monroe. Disponível em:
<http://historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/a-doutrina-monroe.htm>.
Acesso em: 18 mar. 2017.
CONVENÇÃO ADICIONAL AO TRATADO DE
AMIZADE E ALIANÇA DE 29 DE AGOSTO DE 1825, ENTRE EL-REI O SENHOR D. JOÃO VI, E
D. PEDRO I, IMPERADOR DO BRASIL, ASSINADO NO RIO DE JANEIRO NAQUELA MESMA DATA,
E RATIFICADA POR PARTE DE PORTUGAL EM 25 DE NOVEMBRO, E PELA DO BRASIL EM 30 DE
AGOSTO DO SOBREDITO ANO. Disponível em:
<http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/bilaterais/1825/b_3/>.
Acesso em: 19 mar. 2017.
GOMES, José Laurentino. 1822.: Nova
Fronteira, 2010.
NASCIMENTO, G. E. do; ACCIOLY, Silva
Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público.São Paulo: Saraiva, 2000
"A foto, produção do artista visual Israel Kislansky, retrata o Monumento do Ipiranga, localizado em São Paulo, obra do arquiteto Manfredo Manfredi e do escultor Ettore Ximenes para celebrar o primeiro centenário da Independência Brasileira."
sábado, 27 de maio de 2017
Redes e Poder no Sistema Internacional: Memórias em ruínas - a destruição de construções como meio de eliminar a cultura de um povo
A seção "Redes e Poder no Sistema Internacional" é produzida pelos integrantes do Grupo de Pesquisa Redes e Poder no Sistema Internacional (RPSI), que desenvolve no ano de 2017 o projeto "Redes da guerra e a guerra em rede" no UNICURITIBA, sob a orientação do professor Gustavo Glodes Blum. A seção busca compreender o debate a respeito do tema, trazendo análises e descrições de casos que permitam compreender melhor a relação na atualidade entre guerra, discurso, controle, violência institucionalizada ou não e poder. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.
Memórias em ruínas
A destruição de construções como meio de eliminar a cultura de um povo
Maria Vitoria Essenfelder *
Guerra. Uma palavra que imediatamente nos traz à mente imagens de destruição e ruínas. Todos os dias são reportadas noticias sobre as consequências destes eventos, como a perda de inocentes vidas, de pessoas feridas e das quais foi retirado tudo o que tinham.
Mas quando vemos o resultado da guerra, nos perguntamos: quais os danos para aqueles que ficaram? Qual o impacto naqueles que estão vendo tudo o que um dia foram construções extraordinárias, sendo devastadas num piscar de olhos, em questão de minutos? Aquele lugar, que alguém cresceu vendo, sendo derrubado como se não valesse nada. Quais são os efeitos da devastação tanto de patrimônios históricos quanto de construções que um dia tiveram um significado notável para estas pessoas? Seja por motivos religiosos, políticos, pessoais ou por serem importantes para determinado povo, o que se percebe é que a destruição física de espaços têm um função política simbólica muito forte nos conflitos.
É claro que a perda de uma vida é irreparável, e a de uma construção provavelmente não será tão dolorosa, mas querendo ou não, estes edifícios e monumentos fazem parte da cultura de uma sociedade. Quando são destruídas um pedaço da identidade é eliminada, e é sim um fato marcante, tanto para a cultura, para a história ou para apenas uma única pessoa.
Através dos anos, inúmeras guerras ocorreram, e como resultado, construções foram destruídas quase tão facilmente quanto a derrubada de uma fileira de dominós. Estes eventos muitas vezes ocorrem como uma consequência inevitável, mas eventualmente, são propositais. Têm como objetivo enfraquecer uma cultura ou ainda causar tensões, seja entre governos, entre grupos sociais ou entre religiões.
Uma dessas ocasiões ocorreu em julho de 2015, quando a mesquita do profeta Yunus, localizada em Mossul, no Iraque, foi destruída pelo grupo Estado Islâmico (ISIS). A mesquita foi construída no século XIV, sobre ruínas da cidade assíria de Nínive, datadas de ao menos 800 anos antes de Cristo. A mesquita era dedicada à figura bíblica de Jonas, considerado um profeta por muitos mulçumanos. O grupo fundamentalista, porém, defende uma interpretação mais conservadora e extremista do islamismo, que considera a adoração de profetas proibida. A mesquita era reverenciada tanto por cristãos e mulçumanos, e desta forma, o Estado Islâmico atingiu centenas de pessoas, que consideravam o lugar como sagrado. Simplesmente por pensar que a sua interpretação de uma crença é a mais correta, o grupo impediu que pessoas pratiquem sua religião no seu local de preferência.
A Mesquita de Ferhat Pasha também foi afetada por consequências de conflitos. Exemplo da arquitetura islâmica e otomana, a mesquita foi construída em 1579, na Bósnia e Herzegovina. Devido à guerra que aconteceu no país entre 1992 e 1995, foram destruídas 16 mesquitas no país, dentre as quais a de Ferhat Pasha. No dia 7 de maio de 1993, as forças sérvias da Republika Srpska, ordenaram a demolição da construção, colocando uma grande quantidade de explosivos dentro do local. Alguns detritos foram roubados e usados como aterro, enquanto o resto foi levado para o lixão da cidade. Já o terreno foi usado posteriormente como um estacionamento. Após este acontecimento, em que um lugar sagrado foi completamente arrasado e tratado como se fosse nada, os responsáveis foram presos e condenados a 32 anos de prisão por crimes de guerra.
A edificação foi reconstruída em 2016, mas mesmo assim não substitui a construção original, que tinha inclusive crenças sobre suas origens. É possível afirmar que algumas coisas nunca serão recuperadas e nem iguais a original.
Já a Biblioteca Nacional de Bagdá foi outro exemplo de intolerância e desrespeito ao patrimônio cultural em meio a conflitos armados. No ano de 2003, a biblioteca foi incendiada e saqueada por partidários de Saddam Hussein, que tinham a intenção de destruir todos os registros do regime do partido Baath. Os EUA, como força ocupante, tinham a responsabilidade de garantir a segurança e tomar medidas contra eventos como este, mas na época as tropas americanas concentraram suas forças de proteção em apenas dois lugares, o Ministério do Interior e o Ministério do Petróleo. Assim, negligenciaram museus, bibliotecas e locais de alto valor histórico. As consequências do incêndio são incalculáveis, já que se estima que 60% do material de arquivos, 25% de seus livros, jornais, livros raros e a maioria de suas fotografias e mapas históricos foram perdidos, incluindo ainda uma das copias mais antigas do Alcorão de que se tem registro;
Ou seja, devido a interesses políticos e partidários, grande parte de documentos e livros, considerados como patrimônios da humanidade foram arruinados e transformados em cinzas. Eram relíquias insubstituíveis e inestimáveis, que nunca mais serão recuperadas, de grande importância por conterem a historia de povos, culturas e regiões.
Através destes poucos exemplos de danos causados ao patrimônio cultural por guerras e conflitos, é possível salientar que construções e monumentos tem um peso significativo na cultura de um povo. Tantos foram os patrimônios atingidos por estes conflitos através dos anos que seria impossível mostrar todos em poucos parágrafos. Porém, quando estes locais, edifícios e símbolos são perdidos, não devem ser simplesmente apagados de nossas memórias.
* Maria Vitoria Essenfelder é acadêmica do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), e pesquisadora do Grupo de Pesquisa RPSI - Redes e Poder no Sistema Internacional.
sexta-feira, 26 de maio de 2017
Acontece no UNICURITIBA: Entrevista com a Professora Tatyana Friedrich, da Universidade Federal do Paraná, sobre a Nova Lei de Migrações
Na Semana Acadêmica do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA (que aconteceu nos dias 09,10 e 11 de maio), recebemos a Professora da Universidade Federal do Paraná, Tatyana Friedrich, para discutir a Nova Lei de Migração - que então ainda aguardava sanção presidencial.
A professora Tatyana é Mestre e Doutora em Direito pela Universidade Federal do Paraná, onde coordena o Projeto Refúgio, Migrações e Hospitalidade, que presta atendimento à população Migrante em Curitiba.
Antes da sua palestra, ela deu entrevista à Prof. Michele Hastreiter, para o Blog Internacionalize-se.
A sanção da lei aconteceu no dia 24/05, após a realização desta entrevista, e a análise dos vetos presidenciais não foi contemplada por esta entrevista.
Blog
Internacionalize-se: O que muda com a nova lei de migrações?
Tatyana: A Nova
Lei de Migrações traz muitas alterações, representa uma grande mudança da
racionalidade administrativa – no sentido de tirar o foco de uma concepção do
Estado em relação a migração e passar para uma concepção da ótica do migrante,
da pessoa humana que precisa por algum motivo sair do seu país e partir para
outro. Ela tem foco em direitos humanos, na proteção da pessoa que precisa vir
para o Brasil. Denominada como Lei das Migrações, ela vem para substituir-se ao
Estatuto do Estrangeiro e não trata mais só do estrangeiro, mas de migrante no
sentido amplo (imigrante e emigrante). Ela traz, portanto, também normas que
protegem o brasileiro no exterior e não apenas o imigrante no Brasil. Uma outra
grande mudança também é que ela trata de uma política migratória – que até
então não existia no Brasil – e traz todo um rol de direitos fundamentais,
individuais e coletivos, calcados em princípios constitucionais.
Blog
Internacionalize-se: Como esta mudança afeta o dia a dia dos migrantes?
Tatyana: Afeta de
modo bastante efetivo e contundente, porque fala em direitos fundamentais do
migrante – a última legislação não partia da ideia de direitos dos migrantes,
era uma legislação arbitrária, da época da ditadura militar. Esta nova lei, ao
contrário, passou por todo um processo de discussão no Congresso Nacional, com
a participação das entidades que trabalham com migrantes e é muito mais bem preparada para tratar do
atendimento ao migrante. Ela prevê não só direitos civis e políticos ao
migrante, mas também direitos sociais, econômicos e culturais. Proíbe a
discriminação, a xenofobia e a criminalização da migração. A outra legislação
tinha a visão do estrangeiro como criminoso, inimigo, aquele que vinha de fora
para atrapalhar a condução do país, a soberania e a segurança nacional. Ela tem
um viés muito importante na regularização do migrante que não tem sua
documentação em dia, possibilitando a conversão de vistos, regularizar a pessoa
que não tem visto e permitir que ela se organize e obtenha o visto no Brasil (e
não necessariamente antes de entrar) – coisa que era impossível na legislação
anterior e afeta toda a população migrante no Brasil.
Blog
Internacionalize-se: Estamos vivendo um momento em que na Europa e nos Estados
Unidos – especialmente - a tendência é endurecer as políticas migratórias. Mesmo
aqui no Brasil, percebemos um momento de retrocesso social em uma série de
outras áreas. Como você posiciona esta nova lei neste contexto?
Tatyana: Esta lei
acaba sendo um alento em matéria de direitos humanos, porque realmente temos
visto uma alteração muito pouco democrática em áreas muito sensíveis ligadas
aos direitos fundamentais das pessoas no Brasil (trabalhista e previdenciária,
por exemplo). Por uma contingência política,
acabamos tendo a aprovação desta lei – que tem como seu autor o Senador que
hoje é chanceler do Brasil, o Aloysio Nunes. Por toda essa conjuntura, esta lei
que é bastante progressista – não tanto quanto as entidades que trabalham com
migrantes gostariam, mas, na comparação com a legislação atual é bastante
avançada – e acaba tendo as condições políticas que permitem seu avanço. Porém
ela não veio de cima para baixo, houve todo um trabalho de advocacy e de tencionamento das entidades que trabalham com
migrantes – órgãos governamentais (como a Defensoria Pública da União e dos
Estados, o Conselho de Migração e de Refugiados) entidades religiosas, laicas e
universidades – fizeram bastantes pressões para que a lei fosse aprovada.
Blog
Internacionalize-se: A professora menciona que o projeto de lei não é o ideal
diante das demandas de quem atua com a população migrante. Quais demandas não
foram atendidas?
Tatyana: A
legislação é muito ampla, e por isso muito aberta. Há vários artigos que falam
sobre a regulamentação posterior que precisa ser feita. Então, há muita coisa
que ainda precisará ser regulamentada e as diretrizes não são objetivas. Além
disso, embora ela fale de não criminalização da imigração, existe um grande
gargalo que é o fato de que o órgão que vai tratar da política migratória é a
Polícia Federal. Esperava-se que fosse um órgão da sociedade civil – retirando a
questão da esfera policial.
(Nota do Blog
Internacionalize-se: a entrevista foi realizada antes do veto do Presidente
Michel Temer a alguns pontos importantes da Nova lei, como a anistia a
imigrantes irregulares e o perdão de imigrantes expulsos antes da entrada em
vigor da Constituição de 1988)
Blog
Internacionalize-se: A professora menciona que existem várias questões que ainda
dependem de regulamento. Nós temos hoje mais de 100 Resoluções Normativas do
Ministério do Trabalho com tipos de vistos para a população migrante. Muitas,
me parecem incompatíveis com a Nova Lei. Como fica a situação enquanto os
regulamentos não forem alterados.
Tatyana: Teremos
um momento de transição, um limbo jurídico. O CNIg é um órgão plural e já criou
um grupo de trabalho para começar a rever os Regulamentos vigentes. Alguns
regulamentos talvez possam ser os mesmos, mas muitos precisarão ser modificados.
quinta-feira, 25 de maio de 2017
Direito Internacional em Foco: Relações Diplomáticas e Consulares: semelhanças e diferenças
A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão do monitor da disciplina, Matheus Walger Nascimento. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
Relações Diplomáticas e Consulares: Semelhanças e Diferenças.
Ana Paula Rautter, Maria Clara Pires e Marina Castilho
As relações diplomáticas e consulares são importantes para manter uma atmosfera de cordialidade entre as nações, o que não significa dizer que estas serão necessariamente aliadas. Essas relações existem desde o período áureo das civilizações grega e romana. No entanto, não eram muito estáveis, pois não tinham uma base fixa para resolver assuntos pendentes relativos ao “país” de origem do, ainda não chamado, Diplomata. Na mesma época, surgiram relações consulares também na Grécia e em Roma, que tratavam mais da resolução de conflitos em relação a indivíduos e não ao Estado. Durante as Cruzadas, quando europeus iam guerrear no Oriente Médio, também eram mandados representantes confiáveis para resolver divergências entre seus “nacionais” e os estrangeiros. Estes eram chamados de juízes, que assumiram futuramente o título de Cônsul.
Na Paz de Westfália de 1648 houve uma espécie de oficialização das relações diplomáticas, tornando-as permanentes. Porém estas continuaram a existir na base dos costumes, o que tornava a matéria confusa, visto que cada país tinha uma forma de tratar suas relações exteriores. Apenas com a Convenção de Viena de 1961 que a diplomacia foi de certa forma homogeneizada, com normas e regulamentos. Também na Convenção de Viena sobre as relações consulares, assinada em 1963, ficam explícitas as atribuições que regulam essas relações no âmbito internacional.
As relações diplomáticas e consulares divergem em seu papel de atuação. Enquanto a diplomacia trata dos assuntos dos Estados, os cônsules cuidam dos interesses dos particulares, ou seja, de pessoas físicas e jurídicas no exterior. Os cônsules exercem funções de registro, como contratos e registros de nascimento, casamento, etc. Outra função é zelar pelos nacionais de seu país de origem quando encontram-se em situações delicadas, como em casos de enfermidade, óbito ou problemas jurídicos. Por esses motivos os consulados ficam nas cidades onde há maior concentração de particulares que precisarão eventualmente de auxílio.
Diferentemente do cônsul, o diplomata assume um papel político, em que é encarregado de representar seu Estado na comunidade internacional. Além disso, desempenha o papel de negociar os interesses de sua nação perante a outra. Também é função do diplomata informar o Estado acreditante, ou seja, seu Estado de origem, sobre as condições presentes no país acreditado, que é onde exerce sua missão. A embaixada deve necessariamente se encontrar na capital de cada Estado para exercer suas funções políticas.
Quanto aos privilégios e imunidades diplomáticas e consulares, é imperativo ressaltar que as prerrogativas são restritas às suas funções fora do seu país de origem. Dentre vários privilégios dos diplomatas são os de destaque a isenção fiscal de imposto direto e o fato dos diplomatas serem possuidores de imunidade penal e civil, ou seja, não podem ser processados, presos ou chamados para depor como testemunha no Estado acreditado. Além disso, não é necessária a passagem dos diplomatas pela alfândega e o local, veículo e documentos da missão, assim como a mala do diplomata, são invioláveis. Mesmo com a imunidade diplomática, a prática de crimes graves, como homicídio, pode levar o diplomata a ter o título de persona non grata, ficando a critério do país acreditante manter ou não a imunidade do indivíduo. Caso a imunidade seja mantida, o diplomata tem um período relativamente curto para sair do país antes que seja automaticamente submetido às leis locais.
No que tange aos cônsules, estes têm privilégios bastante semelhantes aos dos diplomatas, a única diferença é que são menos amplos: as inviolabilidades e a isenção de tributos é a mesma dos diplomatas, porém a imunidade penal não se aplica a crimes graves e a civil apenas nos atos praticados no exercício da função. Uma diferença importante a ser ressaltada é a de que para se tornar diplomata deve-se passar por um concurso, ao passo que existem duas formas de se tornar cônsul: através de concurso (cônsul de carreira) ou através do convite de determinado Estado para representar este em outro país (cônsul honorário).
Para finalizar, é mister compreender que o rompimento das relações diplomáticas, que pode ocorrer por razões de cunho tanto econômico (necessidade de cortar gastos) quanto político, não acarreta na sumária extinção das relações consulares, visto que o simples rompimento diplomático não impede a presença e residência de nacionais no estrangeiro, e estes necessitam do serviço prestado pelo consulado.
REFERÊNCIAS
terça-feira, 23 de maio de 2017
Teoria das Relações Internacionais: Sobre o Neo-realismo de Kenneth Waltz
Artigo apresentado na disciplina de Teoria das Relações Internacionais I, do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba, ministrado pela profa Dra Janiffer Zarpelon.
Por: Tiago
Viesba Pini Inácio
Waltz
é o fundador da teoria Neorrealista ou Realismo Estrutural – onde faz uma
reinterpretação da teoria Realista – na qual, o enfoque do sistema
internacional permanece sendo o Estado (ator racional e unitário), são
desenvolvidas leis sobre as relações internacionais e chega se ao entendimento
do caráter peculiar e estrutural do sistema internacional. Em sua obra de doutorado, Waltz procura
examinar sistematicamente a pergunta fundamental das Relações Internacionais:
Qual a causa da guerra? A resposta é caracterizada em três níveis de análises
ou “imagens” e, dessa forma, o autor discute como podem ser classificadas as
teorias de política internacional. Para ele, as teorias que se concentram em
indivíduos (primeira imagem) ou nações (segunda imagem) como nível de análise
são reducionistas, enquanto as que focam o sistema internacional (terceira
imagem) são sistêmicas.
Levando
se em consideração as teorias reducionistas, Waltz em um primeiro momento
utiliza a primeira imagem para tentar explicar as guerras, assim, os conflitos
internacionais seriam causados pelo comportamento dos indivíduos. Com essa
relação entende se que as guerras são causadas pelo egoísmo e pelos impulsos
mal direcionados dos seres humanos, entretanto o autor, ainda em sua análise, propõe
uma solução para a questão: se estas são as causas primarias dos conflitos,
então, a sua eliminação, deve ser orientada pelo esclarecimento dos homens ou
por meio de reajustes morais e sociais com a inserção de valores culturais e da
religião para modificar o comportamento humano. Com essa primeira conclusão o
autor faz uma crítica à teoria do estado de natureza, entendendo que as ações
humanas não são as causas das guerras, pois, tais valores já estão inseridos
dentro das diversas sociedades e mesmo assim, os conflitos ainda são uma
realidade dentro do sistema internacional. Ainda dentro das teorias reducionistas,
mas já em um segundo momento, o autor pensa como explicação para as guerras a
segunda imagem, assim sendo, os Estados, mas, mais especificamente a sua
organização interna, seriam a chave para se compreender os conflitos, ou seja,
a ideia geral seria de que Estados com defeitos causariam guerras. A solução
apontada pelo autor é que bastaria à reforma dos Estados, ou seja,
transformá-los em democracias capitalistas para eliminação dos conflitos. Com
essa segunda conclusão o autor, mais uma vez, não chega a uma imagem que se
caracteriza pela causa das guerras, pois, mesmo Estados democráticos e
capitalistas entram em ações militares contra outros Estados.
Já
levando se em consideração as teorias sistêmicas e a terceira imagem, o sistema
internacional, Waltz conclui que a guerra é causada pela anarquia internacional
e pela guerra de todos contra todos, em que os Estados que sobrevivem dentro do
ambiente internacional são os que conseguem recursos para a manutenção do seu
status quo (um verdadeiro darwinismo político). Dessa forma, há um enfoque na
estrutura política, pois, o conflito ocorre simplesmente, segundo o autor,
porque não há um poder superior ao dos Estados e, deste modo, o uso da força
estaria sempre presente para a solução dos choques de interesses (ou seja, a
análise do sistema é o que impacta sobre os Estados como um todo). Mas o que significa uma visão sistêmica?
Segundo Waltz, é preciso olhar as propriedades e interações das partes, bem
como os elementos se organizam. Assim, a forma de organização dos elementos
altera o comportamento e as interações entre as unidades e, portanto, em
relações internacionais, haveria a necessidade de se usar uma visão sistêmica
para se compreender a estrutura internacional.
Entendidas
estas premissas iniciais, parte se para uma diferenciação do Realismo Clássico
do Neorrealismo de Waltz: o primeiro tem como principal variável do sistema
internacional o poder (representa um fim em si mesmo) e este, aliado à
orientação expansionista dos Estados, seriam os principais responsáveis pelas
rivalidades constantes dentro do ambiente internacional, outro ponto, é que os
Estados sempre buscam maximizar seu poder em busca do interesse nacional, a
partir de uma situação de soma-zero onde o acréscimo de poder de um Estado resulta
no decréscimo do poder dos demais; já o Neorrealismo tem como principal
variável a sobrevivência (o poder é um instrumento, um meio) e o Sistema de
Estados é definido como um conjunto de unidades em interação criando uma estrutura
.
Assim
sendo, um sistema pressupõe unidades (Estados Nacionais), uma interação
(comunicação entre os atores) e uma Estrutura (mecanismo de regras que guiam o
comportamento dos Estados). O que caracteriza cada uma dessas partes?
Estrutura: é definida
pela disposição das partes no sistema e pelos princípios dessa disposição. Para
a formação de um sistema que reduza a variedade de comportamentos dos atores e
resultados é necessário, em primeiro lugar, uma socialização, onde o que
importa é a interação das unidades entre si e não como estão dispostas, pois
isto é uma propriedade do sistema, e a partir dessa interação, estabelecem a
estrutura - sistema de regras e mecanismos que ditam as regras de conduta a
serem seguidas pelos próprios Estados dentro do sistema internacional – e, em
segundo lugar, a competição, aonde ocorre à manutenção dessa estrutura pela
disputa dos próprios Estados - os sistemas competitivos são regulados pela
racionalidade dos atores mais bem sucedidos, ou seja, os Estados não são livres
e a competição se da no nível da racionalidade dos polos do sistema; Unidades:
são os Estados que devem procurar promover sua própria segurança; e Interação:
definida pela distribuição dos poderes entre as unidades (das capacidades).
Quais seriam as características que criam essa
estrutura? Segundo o autor, a estrutura é definida por três características, em
primeiro lugar pelo principio da ordenação (ou seja, como essa estrutura é
ordenada) e em segundo lugar as especificações das funções das unidades do
sistema (a divisão do trabalho, esta é diretamente vinculada ao princípio da
ordenação). Pode haver dois possíveis Sistemas de ordenamento: o Hierárquico
(caracterizado pelo princípio da subordinação), em que há um Estado ou órgão
superior que dita às regras da estrutura, a qual irá apresentar um alto grau de
especialização do trabalho onde cada região se especializará em uma atividade,
essa divisão das tarefas é feita pelo órgão supremo com o intuito de reduzir os
custos das atividades; ou o Anárquico (caracterizado pelo princípio da
coordenação), representado pela atual estrutura do sistema internacional, em
que apesar dos Estados serem iguais juridicamente, existe hegemonias que
influenciam o sistema - para Waltz, existem atores não estatais na política
internacional, entretanto, eles não são relevantes para a sua compreensão
porque não podem alterar a estrutura internacional. Ou seja, a estrutura é
definida pelos grandes atores e não pelos pequenos. Dessa forma, a estrutura
apresenta um baixo grau de especialização, em um contexto de self-help, onde todos
os Estados procuram realizar as mesmas atividades o que gera um alto grau de
competição.
Segundo
Waltz, no Sistema Hierárquico, as unidades preferem maximizar seus ganhos
mediante a especialização e a cooperação. Especializam-se em atividades que
melhor executem a custos mais baixos, disponibilizando o excedente de recursos
e serviços para as outras; por haver uma entidade reguladora central há
garantia de cumprimento dos contratos, contudo esse alto grau de
interdependência gera uma maior vulnerabilidade, além disso, o custo de quebrar
a relação de interpendência seria muito alto. Os Estados dependeriam muito uns
dos outros devido as diferentes tarefas que desempenham e aos diferentes bens e
serviços que produziriam e trocariam. Outra critica feita pelo autor, principalmente
em relação a ONU, é que esse órgão não seria autônomo e tenderia a agir de
maneira arbitraria, principalmente, devido ao seu financiamento pelas potências.
Já em relação ao Sistema Anárquico, o contexto de self-help é baseado no
interesse próprio e garantiria a própria segurança, além disso, a não execução
de atividades imprescindíveis implicaria numa posição de vulnerabilidade da
unidade.
E
a última característica que define estrutura, segundo Waltz, é a distribuição
das capacidades: os estados são parecidos nas tarefas que enfrentam, apesar
disso, alguns têm maior capacidade de realiza-las devido ao tamanho de sua
população e de seu território, obtenção de recursos naturais, força militar,
economia, entre outras – características que dão maior possiblidade de realizar
suas atividades domésticas e que, por sua vez, dão maior poder no sistema
internacional. As capacidades em termos waltzianos equivalem ao poder nacional
descrito em outras teorias realistas. No entanto, o foco nas capacidades
relativas implica estudar quanto ‘poder’ um país tem em comparação ao outro. É
a capacidade relativa, essencialmente em termos de segurança o elemento central
das relações entre os Estados, em que diferenças são de capacidade, não de
funções – quanto mais polos no sistema, ou seja, quanto maior o número de potências
mais competição tende a ser generalizada, já o contrário também é valido,
quando um número restrito de unidades se destaca, a competição fica restrita as
maiores (gera mais estabilidade). As mudanças nas distribuições de capacidades
são consideradas aquelas feitas dentro do sistema, pois afetam a relação entre
as unidades, mas não as regras de relacionamentos entre as unidades, que
somente seriam modificadas em uma mudança estrutural, dada pelo princípio de
ordenamento, ou seja, uma mudança de anarquia para hierarquia ou vice-versa.
Assim,
o sistema internacional possui, segundo o autor, determinadas características:
os Estados são menos relevantes que a estrutura, pois, estão presos a ela; o
próprio sistema ignora questões de ética e avaliações subjetivas como a
natureza humana; ganhos relativos/ assimétricos da cooperação pode afetar sua
capacidade de sobrevivência (ganhos relativos se caracterizam por um ganhar e o
outro perder, já ganhos absolutos ocorrem quando todos ganham, ideia de
cooperação); e finalmente, a cooperação deve ser evita, utilizada somente
quando estritamente necessária.
Os
problemas gerados das interações no Sistema Hierárquico (existência de um órgão
superior) são traduzidos em: custos organizacionais altos; força bélica desse
órgão superior as grandes potências; disputa pelo controle dos recursos; e este
atuaria de forma arbitrária para manter a ordem (seria injusto). Por outro
lado, a interação das unidades no Sistema Anárquico geraria uma Balança de Poder
(para se manter a ordem), esta política prevalece onde quer que apenas dois requisitos
existam: que a ordem do sistema seja anárquica e seja povoado por unidades que
desejam sobreviver. Dentro desse contexto, a primeira preocupação dos estados
não é maximizar o poder, mas manter suas posições no sistema, contudo na maior
parte das vezes os estados equilibram seu poder, gerando uma paz armada ao
invés de maximiza-lo. Segundo Waltz, existem dois tipos de Equilíbrio de Poder:
o Sistema Multipolar (mais instável e inseguro), em que as unidades focam no
próprio sistema criando alianças (exemplo do Conserto Europeu do século XIX),
gerando um alto grau de dependência e agindo em prol da Balança esquecendo se
dos seus interesses nacionais; e o Sistema Bipolar (mais estável e seguro),
onde há um balanceamento através do fortalecimento interno de cada um, tornando
a guerra entre os mesmos menos provável, pois, Estados com força nuclear evitam
guerras entre si e existe uma maior previsibilidade dos comportamentos a partir
de uma coexistência pacífica.
Kenneth
Waltz, ao elaborar sua teoria foi um dos primeiros autores do realismo que de
fato analisou o sistema internacional a luz correta do nível de análise. Sua
contribuição da teoria sistêmica fez uma feliz abordagem da estrutura que rege
e conduz o ambiente internacional e as interações entre os Estados, como bem
observável no contexto da Guerra Fria as disputas entre EUA e a URSS levaram a
construção de uma balança de poder bipolar por um lado, e um bandwagon do
outro, em que os Estados mais fracos seguiam as grandes potências. Exemplos que
comprovam isso são as relações no Oriente Médio, principalmente entre Israel e
o Egito que nesse contexto, houve uma polarização das unidades mais fracas em
torno dos polos do sistema. Outra questão são os comportamentos dos polos do
sistema atualmente, apesar de um contexto de Sistema Unimultipolar, os polos do
sistema atuam de forma orientada em manter seu status quo, baseados na busca
pela sobrevivência dentro do sistema internacional; e a própria estrutura
anárquica do sistema impede o surgimento de um órgão superior pela ideia de
self-help, em que as unidades buscam atender seus próprios interesses em
detrimento de uma cooperação, questão muito bem compreendida no discurso do
Brexit, em que o Reino Unido procura salvaguardar suas capacidades e seus interesses
nacionais frente às pressões da UE por uma maior cooperação e imposição de
normas.
Ao
final da Guerra Fria em 1991, alguns aspectos da teoria de Waltz são revisados
em razão do abrupto rompimento da rivalidade bipolar por meio de brechas de
cooperação ainda maiores durante o final da gestão Gorbachev. Contudo, Waltz é
um autor múltiplo e impactante, ele continua contribuindo para a renovação e a
ampliação do neorrealismo em várias correntes. Suas visões, mesmo após a Guerra
Fria, ainda são debatidas como forma de adaptar seus pilares para além das
meras lógicas bipolares de “soma zero”. Ou seja, sua perspectiva pode ser
aplicada, com coerência, aos novos desafios da agenda externa e, além disso,
pode se observar a apropriação de suas conclusões principalmente no que diz
respeito sobre a estrutura do sistema internacional na teoria de outros autores
mais contemporâneos, como na de Mearshein, demonstrando a relevância da teoria
de Waltz.
*Tiago Viesba Pini Inácio: estudante de Relações Internacionais do curso de Relações Internacionais do Unicuritiba.