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segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Leituras geopolíticas: O lado sombrio das Olimpíadas e os crimes envolvendo delegações



A seção "Leituras Geopolíticas" é produzida por alunas e alunos do 5° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação do professor de Geografia Política, Me. Gustavo Blum, e a supervisão da monitora da disciplina, Nathalia Valladares. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.



O lado sombrio das Olimpíadas e os crimes envolvendo delegações

Larissa Ferreira, Luiz Schinzel e Matheus Souza *


Desde seu anúncio, as Olimpíadas no Rio de Janeiro sempre estiveram cercadas de muito pessimismo e desconfiança. O mesmo clima esteve presente, há dois anos, quando o Brasil recebeu a Copa do Mundo. Contudo, assim como foi na competição dois anos atrás, a olimpíada do Rio, pode ser considerada um sucesso. Apesar da situação precária do país em diversas áreas, como saúde e educação, assim como precariedade da Vila Olímpica, pode-se dizer que o Brasil passou ileso de algo que poderia ser mais grave.

O mundo hoje vive a sombra do terrorismo internacional. No dia 14 de julho, a cidade de Nice sofreu um ataque terrorista do grupo Estado Islâmico. No dia 26, um padre foi assassinado por dois terroristas que declararam fidelidade ao grupo terrorista enquanto celebrava uma missa. Com a aproximação do início dos jogos, o Brasil preparou-se para enfrentar uma ameaça. É necessário recordar o momento histórico, em 1972, durante as Olimpíadas de Munique, no qual onze atletas da comitiva israelense foram assassinados por um grupo terrorista palestino conhecido como Setembro Negro. No contexto atual e à luz dos atentados de Munique, é possível acreditar que a ameaça que o Estado Islâmico fizera ao país, como revelou a ABIN em junho, era algo que não podia ser ignorado.

Nada ocorreu. No final de julho, a polícia federal conseguiu prender doze pessoas suspeitas de planejaram um atentando durante os jogos. A polícia confirmou que as doze pessoas presas eram, na verdade, amadoras, não se conheciam e só tinham em comum a simpatia pelo Estado Islâmico. Essa ação da polícia levantou críticas, pois, para muitos aparentou uma espécie de propaganda do governo brasileiro para propagar a ideia de estaríamos preparados para enfrentar qualquer ameaça que comprometesse os jogos.

No dia 1 de julho, quatro dias antes da abertura do evento, dois contêineres contendo equipamento de uma TV alemã que cobriria os jogos foram roubados no Rio de Janeiro, provocando um prejuízo de R$1,3 milhões de reais. Um mês antes, a atleta paraolímpica australiana Liels Tesch afirmou nas redes sociais que fora assaltada enquanto pedalava na orla do Rio. Dois dias antes da abertura dos jogos, filipinos relataram aos jornalistas que tiveram US$ 1,5 mil furtados dos seus alojamentos.

Logo no início dos jogos, a denúncia de estupros contra as camareiras por atletas das delegações internacionais chocou as autoridades do Rio. Na manhã do dia 5 de agosto, o boxeador marroquino Hassan Saada foi preso acusado de ter estuprado duas camareiras. No dia seguinte, o boxeador turco Mehmet Nadir Unal enfrentaria Saada. Como o marroquino estava preso, Unal venceu por W.O. eliminado o marroquino da competição e colocando um fim nos jogos para ele. No dia 8, o boxeador da Namíbia, Jonas Junius, foi preso por beijar uma camareira à força e oferecer dinheiro em troca de sexo. Diferente de Saada, Junius foi solto três dias mais tarde e pôde enfrentar o francês Hassan Anzille. Saada também fora solto nesse mesmo dia, mas ficou proibido de se aproximar da acomodação oficial dos atletas ou deixar o Rio sem autorização.

Embora esses casos chamem a atenção, o protagonismo mesmo ficou com os nadadores dos EUA: na madrugada do dia 14 de agosto, o nadador Ryan Lochte e outros três nadadores teriam sido assaltados ao sair de uma festa. Na terça-feira, dois dias depois a Justiça manda apreender os passaportes de Ryan Lochte e de James Feigen. Ambos teriam dado versões diferentes do ocorrido fazendo com que a Justiça acreditasse que o caso fora inventado. No dia seguinte, os outros dois nadadores, Gunnar Bentz e Jack Conger, foram impedidos de embarcar de volta para os EUA. Mais tarde, reconheceram que mentiram sobre o assalto.

O caso ganhou repercussão internacional. No Brasil, a imagem predominante foi a de que o país conseguira se impor diante de um país estrangeiro e que o que foi feito não ficaria impune. Já a mídia internacional foi um pouco mais contundente. O New York Post afirmou que “Ryan Lochte é tudo que o mundo odeia dos americanos”. Já Alex Cuadros, escrevendo para o “New Yorker” afirmou que os brasileiros estavam obcecados com o caso Lochte por causa do complexo de vira-lata do país, uma vez que a versão contada pelos nadadores “feriria o orgulho da nação e mostraria que país não conseguiria defender seus cidadãos mesmo com 85 mil oficiais nas ruas”.

Podemos questionar com os recentes acontecimentos, a imagem que o Brasil tem no exterior. O fato de terem ocorrido crimes nessas Olimpíadas envolvendo atletas e delegações não é exclusividade brasileira, porém a forma em que é difundida a imagem que se tem acerca da beleza das mulheres brasileiras e a ideia da impunidade que existe no país pode ser um fator determinante para compreender o caso dos americanos por exemplo.

É interessante analisar que quando fala-se de olimpíadas, fala-se também sobre a função e importância dos atletas como formadores de representatividade de suas nações, assim como personificadores do espírito olímpico. Neste papel, têm a imagem de deixar os conflitos internacionais em prol da respeitabilidade entre os povos na construção de relações pacíficas entre as nações por meio do esporte.

A missão do espírito olímpico, conforme o Comitê Olímpico Internacional (COI) em seu programa, é construir um mundo pacífico e melhor que requer entendimento mútuo, em concordância com o espírito de amizade, solidariedade e jogo limpo (fair play). Isso inspira e motiva a juventude do mundo para o que o melhor seja feito por meio da educação e do entretenimento interativo por desafios. O olimpismo busca solidificar valores e ideais naqueles que promovem tolerância e entendimento em tempos de turbulência nos quais vivemos para fazer um mundo mais pacífico e melhor para as próximas gerações.

A representatividade também está presente nos jogos, sendo tão criticada a questão de crimes cometidos por atletas durante as olimpíadas, já que suas ações são consideradas reverberações das ações e intenções de seus países. Quando certos atletas de nações cometem crimes num pais sede das olimpíadas, eles estão ferindo a respeitabilidade a nação que os recebeu e manchando o nome de seus países por serem representantes destes. 

* Larissa Ferreira, Luíz Schinzel e Matheus Souza são acadêmicos do 5º Período do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA). Matheus Souza também é membro do Grupo de Pesquisa "Redes e Poder no Sistema Internacional".

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Acontece no UNICURITIBA: Entrevista com Aline Caleffi Lima sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável





No dia 24 de outubro de 2016, teve início a Semana Acadêmica do Curso de Relações Internacionais. Em celebração ao Dia das Nações Unidas, o UNICURITIBA recebeu a jornalista Aline Caleffi Lima, que é analista técnica do SESI (Serviço Social da Indústria) do Paraná

Em palestra realizada no Grande Auditório do UNICURITIBA, a jornalista falou aos alunos sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e  Agenda da ONU para 2030**. Após a palestra, concedeu entrevista ao Prof. Gustavo Blum, para o Blog Internacionalize-se.



Blog Internacionalize-se: Qual o impacto da mudança dos ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - metas da ONU entre 2000 e 2015) para os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável - metas da ONU para o período de 2015 a 2030) na sua opinião?

Aline: Acho que a principal mudança é a questão de se incluir objetivos e metas específicas para a questão econômica e ambiental. Não deixamos de lado as questões sociais que são muito importantes para o desenvolvimento dos municípios, estados e países, mas incluímos as questões ambientais  e econômicas para que a gente tenha sim a questão da sustentabilidade como um todo, para que não fiquemos só em um dos tripés da sustentabilidade. Acho que este é o principal ganho dos ODS em relação aos ODM.

Blog Internacionalize-se: Como você indicou na sua palestra, isto faz com que o compromisso com os ODS seja trazido para agentes não-estatais?

Aline: Sim, como são 17 objetivos que abrangem questões muito amplas sociais, econômicas e ambientais, não tem como uma instituição ou o cidadão olhar para os ODS e não se enxergar. Torna-se um compromisso de todas as instituições, de todo o mundo pelo desenvolvimento. E ele é global, mas começa com ações locais, no bairro, no município e com impacto para todos.

Blog Internacionalize-se: Como se dá a aplicação e o monitoramento dos objetivos  nesta conexão do global com o local?
Aline: Os indicadores brasileiros dos ODS ainda não foram definidos. Nós temos sim as metas globais e os indicadores globais, mas existe ainda uma discussão parada no governo federal – com o IBGE como ponto focal central – para definir o que pode ser medido no Brasil. Ainda estamos na fase de definir quais os indicadores brasileiros que vamos monitorar. O SESI-PR já tem o compromisso de criar um portal para o monitoramento, assim que tivermos os indicadores. Hoje, mesmo não tendo os indicadores brasileiros, é possível fazer um alinhamento dos projetos que realizamos aos ODS e fazer nossa lição de casa, pensando no que podemos fazer em nossa casa, em nossa família ou comunidade, para interferir positivamente pelos ODS.

Blog Internacionalize-se: Quem são os principais articuladores para o desenvolvimento destes indicadores?

Aline: O IBGE, a Secretaria de Governo da Presidência da República – que coordena os trabalhos -, o PNUD, vários Ministérios. E ainda não se definiu quem convidar da Sociedade Civil. O PNUD e o Ministério das Relações Exteriores ainda estão definindo quem convidar para compor o grupo – que por enquanto é governamental e tem participação do PNUD.

Blog Internacionalize-se: E qual o papel das parcerias, da articulação de redes, para o alcance dos objetivos?

Aline: Esta formação de redes e de parcerias é essencial para atingir os objetivo e também uma forma de divulgar os projetos. As instituições fazem muito, mas divulgam pouco. Elas são essenciais para replicar os projetos. O movimento “Nós Podemos Paraná”, do qual a UNICURITIBA faz parte, é principalmente formador de parcerias, no fomento de boas práticas.

Blog Internacionalize-se: Os ODS preveem a criação de um ambiente seguro para a vida humana e dos direitos humanos – que tem a pretensão de serem universais. Como isto se relaciona com a manutenção das características culturais regionais?

Aline: Nós temos algumas metas – principalmente no ODS 5, de igualdade de gênero – em que as diferenças culturas são significativas, como a mutilação feminina que acontece na África, por exemplo. Não sabemos como essas metas serão implementadas pelos países que tem esses problemas. Deve haver um esforço, uma rede internacional, para que os países que têm questões culturais que agridem direitos humanos façam adequações aos ODS sem conflitos. É preciso unir as agencias da ONU para que estes ODS específicos possam ser alcançados. 


** Confira aqui quais são os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Acontece no UNICURITIBA: Entrevista com o Major Flávio Henrique Pinheiro da Costa, Chefe da Seção de Planejamento e Gestão do CCOPAB


No dia 24 de outubro de 2016, teve início a Semana Acadêmica do Curso de Relações Internacionais. Em celebração ao Dia das Nações Unidas, o UNICURITIBA recebeu o Major Flávio Henrique Pinheiro da Costa - chefe da Seção de Planejamento e Gestão do Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPAB). 

Em palestra realizada no Grande Auditório do UNICURITIBA, o Major falou aos alunos sobre a participação de tropas brasileiras no Haiti, Congo e Líbano  - além de outras missões para as quais o país envia soldados.  Ao final, o Major concedeu a seguinte entrevista à Prof. Michele Hastreiter, para o Blog Internacionalize-se. 


Entrevista com o Major Flávio Henrique Pinheiro da Costa, Chefe da Seção de Planejamento e Gestão do CCOPAB



Blog Internacionalize-se: Como acontece a decisão do exército brasileiro de participar de uma missão de paz?

Major Flávio Henrique Pinheiro da Costa: O governo brasileiro diz para a ONU que tem um número "X" de militares para ser enviado em missões de paz, e a ONU deixa este número em stand by. Então, o Brasil comunica a ONU – por exemplo – de que pode enviar 850 militares para uma missão e aí na hora que tem um movimento de tropas – vamos dizer que algum país precisa sair de uma missão da ONU por questões diversas, por exemplo –  a ONU pergunta ao Brasil, através da uma missão permanente do Brasil na ONU -  que é como se fosse uma embaixada do Brasil na ONU em Nova York - se o Brasil se voluntaria para enviar uma tropa com um efetivo “tal” para "tal" missão. E depois o Congresso Nacional autoriza o envio das tropas.

Blog Internacionalize-se: E quais são as diretrizes para a decisão do Congresso Nacional? Existe algum tipo de balizador –  por exemplo a adequação disto perante os princípios constitucionais que regem o Brasil nas suas Relações Internacionais, como a não intervenção e a primazia dos direitos humanos?

Major Flávio: Este estudo é feito de modo aprofundado pelo Itamaraty, que vai passar ao Presidente e ao Congresso as razões para o Brasil se desdobrar em missões neste ou naquele país. É o Itamaraty que analisa as possibilidades de inserção brasileira, a gente só recebe a decisão de ir para um país e envia as tropas.

Blog Internacionalize-se: Como é o relacionamento do exército brasileiro com as missões de outros países?

Major Flávio: É muito bom. Tanto na parte de comando – por exemplo, no Haiti, o comandante do braço militar é um General Brasileiro e nós temos tropas de diversos países compondo a MINUSTAH (a missão da ONU no Haiti). O relacionamento do exército brasileiro é muito bom –  o militar brasileiro é tido como competente e agregador. Ele tem um bom desempenho, mesmo se comparado com exércitos de primeiro mundo. A nossa instrução, postura e disciplina é considerada "TOP" lá fora, mesmo quando comparado com exércitos que tem materiais mais avançados. O militar brasileiro é tido como destaque, tanto no relacionamento interpessoal, como no desempenho.

Blog Internacionalize-se:  Então, no Haiti, o Brasil ocupa uma posição de liderança. Como é a participação do Brasil nas outras missões de paz da ONU?

Major Flávio: Na missão do Líbano o Brasil também ocupa uma posição de liderança na Força Marítima, comandada por um Almirante Brasileiro. Não é uma chefia de toda a missão, mas do seu braço marítimo. O Brasil também já liderou a missão do Congo. Atualmente, a nossa liderança maior é no Haiti e no Líbano. Nas outras missões, enviamos indivíduos, como observadores militares.


Blog Internacionalize-se: Existem vagas de atuação para civis nas Operações de Paz?

Major Flávio: Na MINUSTAH existem algumas áreas – como o GENDER UNIT, por exemplo, que pode ser ocupada por civis. No Timor Leste também, até hoje há Agências da ONU no local, inclusive a parte de Gênero. São vagas das agências da ONU espalhadas pelo mundo  - que recrutam pessoas com tais e tais habilidades, algumas como voluntárias e outras de modo remunerado.


Blog Internacionalize-se: Como é o treinamento realizado pelo CCOPAB para que um soldado seja enviado para uma missão de paz?

Major Flávio: Se for enviado um contingente, no Haiti por exemplo, o ciclo de treinamento dura quatro meses e meio. Neste período, recebemos os Oficiais de Estado Maior, damos instrução, depois recebemos os Comandantes de Subunidade de Pelotão para passar as instruções. Eles vão voltar para os quartéis que comandam e dar as instruções que nós demos para os sargentos e soldados, porque nós não temos condição de receber todos os soldados para dar o treinamento e instrução diretamente. Além disto, temos alguns cursos específicos, antes da missão sair que também são feitos pelo CCOPAB. Por exemplo, para quem será intérprete na missão, nós temos um curso expedito de técnica de interpretação e tradução. Então o sujeito que fala inglês e francês vai ao CCOPAB para receber a instrução de como atuar. Depois, faltando duas semanas para o embarque, nosso pessoal do CCOPAB vai ao local de preparo para dar o exercício final, certificando o batalhão que está indo.

Blog Internacionalize-se: Existem cursos do CCOPAB abertos à civis?

Major Flávio: Sim.  O Curso de Proteção de Civis, o Curso de Coordenação Civil e Militar, os nossos Workshops Internacionais nos quais participam pessoas da área acadêmica ligada a Peace keeping, e o curso para jornalista e assessores de imprensa em áreas de conflito. (Nota do Blog Internacionalize-se: as vagas para os cursos são abertas para as Instituições parceiras do CCOPAB, que elegem os participantes. O UNICURITIBA firmou recentemente parceria com o CCOPAB). 

Blog Internacionalize-se: Onde nossos alunos podem acompanhar as atividades do CCOPAB?


Major Flávio: O site do CCOPAB (http://www.ccopab.eb.mil.br/pt/)  é atualizado permanentemente, dentro dele há o Material Básico das Nações Unidas de treinamento, links interessantes e informações sobre os cursos.  

domingo, 23 de outubro de 2016

Opinião: Haiti, uma breve análise da pobreza.




Haiti, uma breve análise da pobreza.

Eduardo Lema Mazzafera.
Estudante do primeiro período de Relações internacionais da Unicuritiba

Cinco países dividem o arquipélago das Grandes Antilhas, destes, quatro usam espanhol como língua oficial e, mesmo que dois deles falem inglês, apenas um tem como língua oficial o francês ou o criolo haitiano.
A língua é apenas um exemplo da dificuldade em encontrar paralelos quando se trata do Haiti: o traçado geopolítico e histórico que resultam na situação atual é, como em diversos casos na América Latina, um terreno de especialistas.

Geralmente após apresentar o mais pobre país da América Latina, o noticiário internacional revela um novo desastre natural à atingir a ilha (nos últimos 6 anos mais de 100.000 vítimas de acontecimentos do gênero), todavia, não parece caber à mídia ressaltar qual foi a primeira nação negra independente da América, ou como um líder negro organizou e, mesmo que por um alto preço, expulsou os colonizadores de seu pais, tornando o Haiti o segundo país a conquistar independência nas américas.

Entender porque alguns países são ricos e outros pobres é parte da análise de qualquer perspectiva geopolítica, este caso não é exceção. Alguns autores apontam que a colônia francesa subsidiava um quarto da riqueza da metrópole, a “pérola das Antilhas” um dia produziu cerca de 75% do açúcar do mundo. Após a independência a ex-colônia foi obrigada a pagar algo em torno de 150 milhões de Francos (prática comum em processos de independência) o pagamento da indenização foi o único meio de obter reconhecimento diplomático de um ocidente que impôs diversos embargos, comprometendo o próximos 100 anos da economia Haitiana.

No começo do século passado a elite que controlava o país descobriria um novo mercado de exportação explorando a própria terra, vendendo madeira e desmatando três quartos da mata nativa antes do século XX, atualmente a população rural sofre com a terra quase incultivável do Haiti fruto da erosão. Logo a economia dependente de recursos naturais viria a decair, jogando o país em outra crise e aumentando a pobreza.

A história política da ilha (aqui incluo a república dominicana) é, obviamente, mais complexa que o resumo a seguir, mas para efeitos didáticos ela pode ser apresentada da seguinte forma: de 1915 a 1934 os Estados Unidos ocupariam a ilha, em 1957 Papa Doc instauraria sua ditadura através de uma polícia violenta chamada de Tonton Macoutes. O Haiti viveria sob a sombra do ditador por 30 anos (15 deles pertencentes ao seu filho, Baby Doc). Foi somente no ano da posse de Collor que o Haiti teria sua primeira eleição democrática e, apenas para ressaltar a dificuldade em se estabelecer uma democracia duradoura, a antiga milícia corrupta tentou dois golpes contra o presidente eleito (num espaço de dois anos) sendo que o segundo destes obteve êxito. Um presidente eleito democraticamente só iria tomar posse durante período relevante em 2008.

Experimente agora um exercício de perspectiva: A formação de seu país é marcada pela brutalidade comum ao período colonial, empregando uma força de trabalho escrava que excede o resto da população em milhares, após uma guerra sangrenta, finalmente independência (não reconhecida). Agora com terras inférteis e economia em frangalhos o país tropeça em direção à democracia, exceto pelo fato de ele estar situado ao lado de Cuba (consequentemente, muito perto de um dos maiores intervencionistas do mundo) e o medo do comunismo estabelecer uma longa relação de interferência externa, empurrando e colocando no poder hora um ditador, hora um primeiro-ministro ilegítimo, tornando impossível a consolidação de uma democracia (é importante ressaltar: no começo de 2016, o senado tentou sumariamente suspender o segundo turno das eleições. Cerca de 220 pessoas foram presas pelas Forças de Paz da ONU). Conclua agora o exercício com aquilo que normalmente se noticia a respeito do Haiti; sua lista interminável de desastres naturais sempre agravantes de qualquer situação de pobreza e conflito que deixam pilhas de corpos para trás.

É importante compreender um país além dos problemas que o definem, porém. O Haiti é muito mais que sua pobreza, com uma língua própria e tendo o Vodu haitiano (uma mistura de religiões africanas e com elementos católicos) como uma de suas religiões mais importantes, o país tem dois patrimônios mundiais reconhecidos pela UNESCO (Sans-Souci Palace e Citadelle Laferrière), após tantas ocupações sua herança cultural é uma rica mistura de aspectos africanos e ocidentais. É um dos membros fundadores das Nações Unidas, sem contar no contingente de intelectuais que, fugindo do regime de “Papa Doc”, deixaram sua marca nos Estados Unidos.  

Por fim, alguns atribuem à Minustah (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti), sob o comando do general Brasileiro Ajax Porto Pinheiro a diminuição da violência que parece ocorrer, apesar dos incidentes nas últimas eleições e das críticas que alguns relatam dos capacetes azuis (soldados engravidando mulheres e a cólera, reconhecida como de responsabilidade das tropas nepalesas pela ONU em 2010). O país talvez veja perspectiva de se reerguer. 



Fontes:

Katie Traynor, Haiti: a brief history. Disponível em: http://crudem.org/haiti-a-brief-history/. Acesso em: 19 de Outubro de 2016.


Karen Fragala Smith, Reasons Behind Haiti´s Poverty. Disponível em: Http://www.newsweek.com/reasons-behind-haitis-poverty-70801. Acesso em: 19 de Outubro de 2016.

João Paulo Charleaux, Gabrielle Apollon, O que faz do Haiti um país de crises ininterruptas. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/entrevista/2016/10/13/O-que-faz-do-Haiti-um-pa%C3%ADs-de-crises-ininterruptas. Acesso em 19 de Outubro de 2016.


João Paulo Charleaux, Mais um terremoto no Haiti Só que agora é nas urnas. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/01/21/Mais-um-terremoto-no-Haiti.-S%C3%B3-que-agora-%C3%A9-nas-urnas>. Acesso em 19 de Outubro de 2016.

sábado, 22 de outubro de 2016

Leituras geopolíticas: "Deu no New York Times" - A representação dos Jogos Olímpicos da Rio 206 nos veículos internacionais de mídia


A seção "Leituras Geopolíticas" é produzida por alunas e alunos do 5° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação do professor de Geografia Política, Me. Gustavo Blum, e a supervisão da monitora da disciplina, Nathalia Valladares. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.

"Deu no New York Times"
A representação dos Jogos Olímpicos da Rio 2016 nos veículos internacionais de mídia

Karislla Boiko, Isabela Leal e Rebeca Fontoura *

Os jogos Olímpicos no Brasil tiveram início no dia 5 de agosto e foram encerrados no dia 21 do mesmo mês. Em meio a este evento internacional que envolveu 206 países participantes, o mundo voltou seus olhos para o Rio de Janeiro e diversos jornais registraram desde a cerimônia de abertura até os jogos. Entre elogios e críticas, foram destacados os principais jornais internacionais que comentaram sobre o assunto. 

Selecionamos alguns dos principais veículos de comunicação e a forma como representaram estes elementos em suas matérias:


NEW YORK TIMES (Estados Unidos da América)

O jornal afirmou que o Brasil teve que contornar diversos problemas para sediar os jogos, primeiramente com a crise política e econômica que o país está passando, e a presença de Zika vírus. A cerimonia brasileira poderia ser considerada como “menos impressionante visual e coreograficamente” quando comparada com os jogos de Pequim, e menos “cheio de estrelas” que Londres. Mesmo assim, a abertura de baixo orçamento foi destacada por sua energia contagiante. Com relação ao resto dos jogos, o colunista Roger Cohen afirma que está cansado de ler notícias ruins sobre as olimpíadas no Brasil. Também faz diversas elogias aos jogos dizendo que foram incríveis e que “as olimpíadas são boas para o Brasil e para o resto do mundo”.


LA VANGUARDIA (Espanha) 

O jornal destacou que a abertura foi “uma festa repleta de cor”. Foi o culminar de quatro horas de orgulho Brasileiro, com muita festa, música brasileira, carnaval e um pouco de samba e bossa nova. O jornal afirma que por um momento o Maracanã se transformou em um sambódromo de cor e calor. O show também recebeu pequenas críticas por ser de baixo orçamento: “um show com muita pompa do que Londres e Pequim”, porém um espetáculo que pode ser descrito com o bom sentido da palavra gambiarra (ato de improviso que impressiona).



EL CLARÍN (Argentina) 

O noticiário afirma que abertura em si foi um espetáculo que sem dúvida alguma, chamou atenção, devido os poucos recursos usados, e seu deslumbrante resultado. A cerimônia foi caracterizada como uma grande festa que iluminou os olhos do mundo inteiro com incríveis efeitos visuais, uma trilha sonora encaixada perfeitamente em cada momento com seus dançarinos estupendos. Além disso, o que foi muito ressaltado também foi a alegria do público brasileiro. Povo já conhecido por sua paixão pelo esporte acompanhou a cerimônia de cobertura, apoiando os atletas de todas as modalidades, não deixando de vibrar também pelos esportistas das demais nacionalidades. 



THE GUARDIAN (Reino Unido)

O Guardian não apenas elogiou a abertura da cerimônia e os jogos em si, mas também faz comentários relacionados ao “after Olympics”, referindo-se aos bilhões de gastos que foram investidos para a realização desse evento e os problemas que o país enfrenta atualmente e em como eles seriam enfrentados após o fim dos jogos. É ressaltado que vários hospitais estão em situações precárias, escolas estão sendo fechadas, pessoas passam necessidades, e ainda cita a dívida que o país tem com a Petrobrás, caso de corrupção que ficou conhecido mundialmente. Além também de citar o zika vírus, aumentando assim, as dificuldades de desemprego e violência. Claramente as Olimpíadas foram um sucesso, quando relacionado à visualização do Brasil para com o mundo, isso não pode ser negado. Entretanto, fazendo uma referência ao Brasil como um país contraditório, pois se diz ser uma combinação entre a “beleza e a pobreza”, o jornal deixa em aberto o seguinte questionamento: como ficam os brasileiros, com o país em suas condições atuais, após sediar um dos maiores eventos mundiais? 



THE DAILY TELEGRAPH (Reino Unido)

“Esta foi uma celebração da cultura e da história do Brasil”; “uma celebração musical da cultura brasileira, uma festa de dança e cores que também destacou as glórias e tragédias da maior nação da América do Sul”, ou seja, dando ênfase não só as belezas já conhecidas do país, mas também mostrando momentos ameaçadores do lado mais sombrio da história do Brasil, da escravidão até a criação de mega-cidades e nossas conhecidas favelas.



WASHINGTON POST (Estados Unidos) 

Sob a visão dos jornalistas a “Cerimônia de Abertura do Rio teve um orçamento pequeno e um apelo grande", pois esta foi inovadora que trouxe as preocupações de longo prazo, voltou as atenções do mundo para a criação da Terra para enviar um aviso sobre as alterações climáticas e a necessidade de proteger as maravilhas naturais que o Brasil já teve em abundância. Foi ressaltada também a grande recepção do público presente, que pulsavam juntamente com as luzes, fogos de artifício, acrobacias circenses, samba e bossa nova, reforçando as características de um estilo festivo da nação. Os Jogos Olímpicos, com certeza representaram muito mais do que a honra de receber atletas e pessoas de diferentes nações, como muito bem observado nos noticiários, os brasileiros se reuniram para elogiar a Cerimônia de Abertura e os Jogos Olímpicos, era algo que a população precisava para novamente acreditar e mostrar ao mundo, que apesar das dificuldades, fazemos “jus” à fama de estarmos na lista de povo mais alegre do mundo.


Os jogos olímpicos superaram as expectativas de todos. Entre os muitos aspectos positivos, podemos citar a imagem internacional que foi construída do país. Diversas vezes foi destacada a animação e energia do povo brasileiro. Também foi um grande incentivo ao turismo, e mesmo com todos os gastos (que foram baixos se comparados aos anos anteriores), se converteram em divulgação para o Brasil como um país que sabe prestigiar seus atletas e esportes. Além disso, podemos afirmar que os brasileiros precisavam desde evento, pois ele fez ressurgir o orgulho nacional, e fizeram com que todos percebessem o valor do Brasil, e não somente seus problemas.

* Karislla Boiko, Isabela Leal e Rebeca Fontoura são acadêmicas do 5º Período do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA).

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Relações Internacionais - Teoria aplicada na Prática: "As contribuições do Realismo Moderno são úteis para a compreensão do mundo atual?"





A seção "Relações Internacionais - Teoria aplicada na Prática" é produzida por alunos do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Teoria das Relações Internacionais, Dra. Janiffer Zarpelon. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.

As contribuições do Realismo Moderno são úteis para a compreensão do mundo atual?

                                                                                                            Amanda Ampessan Cavali

Após duas guerras mundiais, uma Europa destruída e desestabilizada e um Estado em ascendência, um professor alemão inicia um estudo que vai tentar explicar a Teoria sobre a Política Internacional. Seguindo uma linha a qual vai inicialmente comparar o sistema internacional com os homens no estado de natureza - estado de anarquia, onde há competição e luta pela sobrevivência – e que leva em conta que o mundo é imperfeito, Hans Morgenthau cria a teoria do Realismo que vai ser explicada no livro A Política entre as Nações. Nele, ele decorre sobre os seis princípios básicos que regem e guiam o relacionamento dos Estados quando falamos das relações internacionais.
Morgenthau nasceu judeu na Alemanha, acabou migrando para os Estados Unidos e se naturalizando norte-americano, o que influencia muito na construção da sua obra, mostra a visão política Ocidental, preocupa-se com os próximos passos dos EUA como hegemonia emergente e com o novo contexto de bipolarismo.
Ele começa seu livro discorrendo sobre o objetivo de apresentar sua teoria e vê-la sendo testada teórica e empiricamente para trazer ordem e sentido aos fenômenos que até agora poderiam parecer inexplicáveis: trazer uma teoria coerente com os fatos e com seus elementos constitutivos. As principais características do realismo se baseiam no equilíbrio de poder, em princípios universais válidos para todas as sociedades, leva em conta precedentes históricos e busca o “mal menor”, já que a paz perpétua seria uma utopia.
Então, apresenta os seis princípios do Realismo Político que são construídos baseando-se na natureza humana e nos processos históricos. O primeiro é justamente o que fala que a sociedade em geral é regida por leis objetivas que refletem a natureza humana. Uma teoria deve partir do princípio de verificação dos fatos e dar a eles sentido mediante a razão. O realismo crê que a natureza de uma política externa deve ser avaliada pelos atos políticos realizados e suas consequências, pois o argumento de uma teoria que é descreditada por ser muito “ultrapassada”, antiga não é racional, mas uma tendência de colocar o presente como superior ao passado. A teoria se baseia em verificar os fatos e dá-los um sentido mediante a razão.
No segundo princípio é apontado que os Estados vão sempre querer aumentar seu poder, já que há uma competição no sistema internacional e a busca pelo poder é necessária para a sobrevivência. Conseguimos então prever os passos que um político pode tomar, pensando que suas atitudes serão tomadas partindo do princípio do interesse do poder. Isso dá a política uma ordem racional e nós conseguimos então entende-la como teoria, e quando falamos do autor internacional criamos uma certa continuidade na política externa, uma evolução racional, coerente embora haja divergências nas qualidades morais dos chefes de estado. Isso evita a preocupação com os motivos e preferências ideológicas. Não é possível julgar que as boas intenções vão levar à melhor solução, para criticar as qualidades políticas e morais devemos conhece-las, não julgá-las pelos motivos finais do político. Aqui o professor cita Robspierre, o advogado que mais tarde se torna líder do partido jacobino na Revolução Francesa que vai se manter no poder na França durante o chamado Período do Terror, ele foi um dos líderes mais virtuosos da história, porém em nome da liberdade, igualdade e fraternidade fez coisas horríveis com aqueles que criticavam o pormenor que seja. Aqui, Morgenthau se baseia nas ideias de um outro filósofo que deu à política o status de ciência e que pode ser chamado de realista clássico por sua contribuição ao estudo das Relações Internacionais: Maquiavel. Ele se propôs a ver e examinar a realidade como ela é, tomou fatos históricos para explicar sua teoria e defendeu como ninguém a ideia que um político não deve agir conforme a moral se essa não vai o guiar ao seu principal papel que é o de garantir a segurança interna e ter um certo controle da segurança externa; resumindo não se deve julgar um “príncipe” pelos seus motivos, mas pelas suas leis que são efetivas e pelo seu exército que mantem a ordem.
Quando a política externa é conduzida sob as condições de controle democrático, deve-se ter cuidado ao procurar apoio popular e acabar deixando de lado a racionalidade que deve ser presada nas relações com outros Estados. Um caso que pode ilustrar esse ponto é atualmente no governo brasileiro em que temos no comando das Relações Exteriores José Serra, que provavelmente deixando-se guiar pelas paixões nacionais de confronto e extremismos de posições políticas, tomou uma decisão no Mercosul de impedir que esse tivesse em seu cargo mais alto um venezuelano, isso tendo como justificativa a ditadura esquerdista em que se encontra a Venezuela e o desejo de afastamento de relações que remetam ou deem continuação ao partido que meses antes estava no poder do Brasil. Essa posição muito provavelmente foi equivocada e trará consequências ruins a todo o bloco econômico. Outra crítica feita por Morgenthau é de associar a uma determinada pessoa ou grupo toda a culpa de algumas questões, dando-nos a ilusão que se eliminarmos os responsáveis o problema será resolvido; e nada mais atual que hoje nossa situação no Brasil, que quer apontar dedos a um grupo político ou a uma pessoa só como únicos culpados pela crise econômica e política, tentamos achar uma solução simples para um problema complexo, definitivamente o nosso maior erro.
            Há outro fator que se baseia no contraste entre a realidade na política internacional e os conceitos, instituições e procedimentos destinados a controlar essa realidade – instrumentos os quais tentamos usar para que consigamos de alguma forma controlar o sistema anárquico internacional. O terrorismo, as operações militares dos EUA em outros países, a intervenção militar da URSS na Europa Oriental são operações que levam consigo muito mais que apenas conceitos e procedimentos internacionais. Na época da Guerra Fria já dizia William Graham "a quantidade de superstição não mudou muito; ela agora está ligada à política e não à religião", e nessa citação Hans usa o exemplo do Macarthismo, que ocorreu nos EUA, que se recusando a estudar e tomar medidas racionais à realidade ameaçadora do comunismo, banalizou e generalizou uma perseguição a todos que aparentassem o mínimo que fosse como simpatizantes do regime comunista.
Uma analogia que o autor faz quando tenta explicar o papel da teoria é o da Politica Internacional como ela é e da teoria racional dela derivada como uma fotografia e um retrato pintado, respectivamente; o retrato tenta retratar tudo que a olho nu somos capazes de captar, e tenta captar a essência da pessoa retratada. Fala também da dificuldade de haver um equilíbrio perfeito de poder, a realidade será sempre uma tentativa de ser o mais próximo possível do sistema ideal de equilíbrio de poder.
O terceiro princípio é que o realismo tem o conceito de interesse definido como poder, característica que é universalmente valida e constante na história da humanidade. Tucídides, realista clássico, analisando as experiências da Grécia antiga, diz que "a identidade de interesses é o mais seguro dos vínculos, seja entre Estados, seja entre indivíduos", o tipo de interesse que determina a ação política em um determinado período da história depende do contexto político e cultural dentro do qual é formulada a política externa. E um elemento perene em sociedades pluralistas é o equilíbrio de poder, que ainda em situação de conflito, consegue manter uma estabilidade. Hans Morgenthau previu a criação dos blocos econômicos quando fala que a nossa divisão em estados-nação seria um dia substituída por unidades maiores e de natureza diferente mais adequadas às exigências morais do mundo de hoje; outro ponto em que a teoria realista se diferencia das demais: prevê as transformações do mundo.
O quarto princípio “os princípios morais universais não podem ser aplicados às ações dos Estados em sua formulação universal abstrata, mas que devem ser filtrados por meio das circunstâncias concretas de tempo e lugar” fala que nós podemos julgar a ação política segundo princípios morais, porém o Estado não pode ficar com medo de infringir uma lei moral e permitir que isso se torne um obstáculo à ação política vitoriosa, antes  vem a prudência, a virtude máxima da política, que vai sempre calcular as consequências políticas da sua “ação moral”.
No quinto princípio, Morgenthau cita que os princípios morais variam de país a país - isso depende da cultura – e que para sermos justos uns com os outros podemos julgar outras nações com as medidas que avaliamos a nossa e com isso executar políticas que respeitem a diversidade de interesses, assim como seguindo e protegendo os nossos próprios e defendendo um julgamento moderado.
            O professor encerra os princípios com o ponto que o realismo político quer e acredita na autonomia na esfera política, assim como nas outras ciências sociais há atitude moral e intelectual, o realista político também pode existir por si só, ele baseia-se na concepção pluralista da natureza humana, somos compostos do homem “econômico”, “político”, “moral”, “religioso”..., porém essas facetas somente são compreendidas quando analisadas de modo separado. O entendimento da política internacional como ela é, e como deve ser e a comparação com a natureza humana – visto que a política é feita por homens e no sistema internacional não há um instrumento que mantenha a ordem por meio da coesão – dão origem a esse livro que se dedica à compreensão teórica do ramo dando explicações e justificativas especiais.
            É exatamente a luta dos Estados em manter ou alterar o status quo que caracteriza o chamado Equilíbrio de Poder, que é o método que os Estados acharam de conviver no sistema internacional de anarquia, forças autônomas que sobrevivem por esse balanço. Morgenthau faz uma analogia com o corpo humano, que assim como o ambiente internacional, é um sistema e quando um de seus órgãos está sofrendo qualquer tipo de perturbação todo o resto do corpo tem que compensar, reestabelecer o equilíbrio para que o corpo continue funcionando normalmente, cada órgão com sua função. “Ser estável sem destruir a multiplicidade dos elementos”. Na esfera doméstica dos Estados são usados dois tipos de “controle”: o horizontal, conhecido como Checks and balances e o vertical, o qual o povo fiscaliza e não deixa que aqueles que governam tendam a balança de poder mais pro lado deles.
Na esfera internacional, os dois padrões de equilíbrio de poder são: a oposição direta e a de competição. A primeira é quando uma nação toma políticas imperialistas em relação a outra, e esta pode reagir de forma a manter seus status quo ou tomar medidas também imperialistas. A nação que começou a tomar atitudes imperialistas quer poder controlar as decisões da outra, e esta tentará resistir à pressão, ampliando seu poder, ou também agir imperialmente. Já o segundo padrão, de competição, mostra duas potências querendo dominar uma terceira, o poder de um de dominar vai ganhar uma resposta do outro no mesmo nível ou de modo a superar esse poder da primeira. Aqui a melhor opção é preservar a independência da nação alvo das outras duas para evitar tentativas de invasão. Conclui dizendo que as nações pequenas devem agradecer ao equilíbrio de poder porque caso contrário não existiriam, pois são alvo fácil de potências.
            Mas e agora, o realismo morreu? Eu creio que não. São tempos em que as relações entre Estados ou até mesmo dentro deles parecem cada vez mais imprevisíveis, como no caso recente do Brexit. Até nas décadas passadas, o órgão internacional com mais poder no mundo, a Organização das Nações Unidas, vem demonstrando um significativo poder na área de resolução de conflitos, intermediação e assinatura de tratados e declarações. É notável a influência de outros atores internacionais como ONGs, transnacionais, Igreja e até indivíduos e impacto que esses fazem na tomada de decisões, que hoje em dia não compete apenas aos Estados tomar. Porém, ainda acredito que dentre todas as preocupações que um Estado deve ter, ainda impera a preocupação com a segurança, seja ela interna em aspecto de manter o status quo, manter no poder de seu país a ideologia que está no poder; seja externa, que aparenta estar mudando de direção, se ontem era a desconfiança com o ataque de outros Estados, hoje é a preocupação com ataques terroristas.
Talvez estamos presenciando uma metamorfose do chamado realismo, porém não deixamos de analisar as situações e transformações do mundo de hoje, de tentar achar soluções que suavizem as consequências más das decisões mal tomadas e, o mais importante, estamos cada vez mais conscientes que a guerra é inútil, nefasta, ignorante e desumana, acredito que há uma tendência que nos leva a cada vez mais evitar essa alternativa. Temos que acompanhar um mundo que necessita se adaptar a mudanças cada vez mais repentinas e problemas que nunca antes tivemos que nos preocupar, porém essa é a ordem natural da natureza humana: crescemos, evoluímos, adaptamo-nos e lutamos para sobreviver.

Fonte:
http://funag.gov.br/loja/download/0179_politica_entre_as_nacoes.pdf
https://politicaeambiente.wordpress.com/2010/07/17/resenha-de-a-politica-entre-as-nacoes-de-hans-morgenthau/
http://www.faculdadedamas.edu.br/revistas/index.php/relacoesinternacionais/article/viewFile/133/108