Desafios e oportunidades para uma
carreira em Relações Internacionais
Gustavo Glodes Blum¹
*Este texto traz algumas reflexões promovidas durante a Semana de
Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA, na
palestra intitulada “O internacionalista no mercado de trabalho: uma
perspectiva a partir de experiências reais”. Na mesa, enquanto palestrantes,
tivemos a honra de contar com a presença de Bruna Zulauf, Marina Sperafico,
Daniel Dall’Agnol e Felipe Salomão, a quem agradecemos pelos depoimentos que
permitiram a escrita deste texto.
Da mesma forma como o Brasil,
durante muito tempo, foi chamado de “país do futuro”, desde a sua fundação no
país, em 1974 na Universidade de Brasília, a profissão de Relações
Internacionais tem sido chamada “a profissão do futuro”. Será que, assim como o
Brasil, esta profissão já chegou ao seu encontro inadiável com o seu momento de
ascensão social?
Nossa tese, dentro deste pequeno
texto que se destina tanto aos estudantes de Relações Internacionais já
inseridos nos cursos de graduação ao redor do Brasil, quanto àqueles que estão
em dúvida sobre se devem ou não seguir essa carreira num vestibular que está se
aproximando, é de que sim, mas também depende do esforço de cada profissional
formado pelo curso.
Hoje, são inegáveis os sinais
cotidianos de que se vive, em muitas partes do mundo, numa realidade que se
pode chamar de globalizada. Esta realidade está baseada não apenas na ideia de
que haja um contato cada vez maior entre pessoas de todas as partes do mundo,
mas também que os processos de funcionamento – econômicos, políticos, sociais,
culturais, ambientais – dependem cada vez mais da conexão de vários pontos
diferentes do globo para que se completem.
Através do avanço das redes
técnicas de circulação ou de comunicação, o contato entre diferentes culturas e
os processos derivados destes contatos, tanto comerciais como políticos,
favorece a ação de um profissional que seja capaz de facilitar este tipo de
intercâmbio. São poucas as profissões que são capazes de vivenciar, em diversas
oportunidades cotidianas, em direto, as consequências de todos os
acontecimentos mundiais.
Já que está baseado em uma
multidisciplinariedade com relação à sua ementa, o curso de Relações
Internacionais permite que o seu profissional consiga sistematizar, em sua
análise e sua ação, uma série de conhecimentos que podem parecer esparsos.
Através das matérias estruturantes do curso – Ciência Política, Direito,
História, Economia e Geografia Política – o aluno é capaz de ter uma visão
holística da sociedade mundial, sendo capaz de estabelecer as similitudes e
diferenças. Isso o torna apto e preparado para atuar com relação a essas
sociedades, facilitando, justamente, o intercâmbio de informações e produtos
necessários nessa nova era global.
Porém, e apesar desta aptidão, há
certa reticência a partir do mercado de trabalho com relação aos estudantes e
profissionais de Relações Internacionais. Ao mesmo tempo em que há um glamour com relação à profissão, que é
vista como uma ótima oportunidade para se conhecer os diversos países do globo
em viagens eternas regadas a champagne (ainda que saibamos que não é esta a
realidade), esta boa vontade permanece aí.
Num determinado momento de nossa
conversa sobre a profissão, um aluno nos perguntou: o quê diferencia o
profissional, e o quê faz com que uma empresa, uma universidade, um órgão
público, prefira um aluno de Relações Internacionais a outro candidato com uma
formação mais específica? Ao fim e ao cabo, por que contratar um estagiário de
Relações Internacionais se podem contratar um de Administração, de Economia, de
Direito etc.?
É aí que entram dois aspectos
básicos da formação do internacionalista. Todos os estudos desenvolvidos nos
anos de formação do curso, a forma em desenvolver as análises sobre as
estratégias dos Estados, empresas, organizações internacionais, entre outros
dos diversos atores das RIs, permitem ao internacionalista obter uma leitura
estratégica a respeito de diversos temas.
Para além da possibilidade de
agir enquanto um diplomata corporativo, por exemplo, representando
institucionalmente a empresa dentro e fora do país, o internacionalista se
enquadra muito bem em funções que exigem a construção de cenários, seleção de
variáveis relevantes e tomada estratégica de decisões. Ainda que, durante a
graduação, este tipo de pensamento esteja focado no Sistema Internacional, na
atuação profissional esta visão holística pode ser percebida facilmente, se
adaptando em razão da facilidade de mobilidade social do internacionalista,
desde muito cedo acostumado com a diversidade cultural, sexual, política e
acadêmica.
Ainda assim, e apesar de todas essas
capacidades, o profissional de Relações Internacionais que está localizado fora
dos grandes centros econômicos, políticos e culturais do Brasil encontra
dificuldades para se inserir no mercado de trabalho. Ou, ainda que se insira,
não será dentro de uma vaga de emprego típica de Relações Internacionais. O
problema é que, fora destes mesmos centros, a possibilidade de existirem tais
vagas é muito pequena. Falando a partir de onde estou baseado, a cidade de
Curitiba, posso afirmar que se existirem mais de dez vagas específicas para
Relações Internacionais, estarei surpreso.
É aí que entra a ação específica
do profissional. É o estudante e o profissional de Relações internacionais que
devem se mostrar disponíveis para o trabalho, divulgando as suas habilidades.
Aproveitando-se da sua formação enquanto um comunicador – afinal, pode-se
afirmar que nossa formação se enquadra, dentre outras, numa ação destinada à
comunicação política e estratégica – deve ser utilizada para que consiga
alcançar as suas possibilidades. Da mesma forma, é aqui que o glamour acaba: a entrada nem sempre é
pela porta da frente.
Assim como no caso de diversas
outras profissões, o caminho é longo e árduo. No início, o profissional fará
diversas coisas que são típicas de início de profissão – assim como um médico
começa a sua carreira enquanto plantonista, e um estagiário da área do Direito
começa carregando processos em direção ao Fórum da sua cidade. Mesmo assim,
devido ao seu dinamismo, é a partir destas atividades iniciais que se inicia
uma possibilidade de começar de baixo e ir abrindo espaços por dentro das
empresas: a diplomacia não precisa ser apenas corporativa, mas também se aplica
ao próprio profissional, que pode explicar internamente o quê é capaz de fazer.
Ao mesmo tempo, suas formações
complementares (as línguas que se fala além do inglês e do espanhol), cursos
específicos e interesses em campos especializados dentro das RIs se torna o
trunfo do profissional. Tal qual como nas monografias a serem feitas ao final
do curso, a grande gama de temas de ação dentro das Relações Internacionais
permite ao profissional se especializar naquilo que mais tem interesse – desde
o setor financeiro, até a ação destinada à questão ambiental, passando por
todos os possíveis temas entre estes dois. É possível afirmar que existem
várias possibilidades dentro da mesma “plataforma”, e um campo inesgotável de
especializações possíveis.
Portanto, cada profissional de
Relações Internacionais acaba sendo um diplomata de si, da empresa em que
trabalha, mas, principalmente, do curso de graduação como um todo. Nosso
fortalecimento passa pela ação conjunta, e a empregabilidade em RI faz parte de
uma dinâmica conjunta de todos os profissionais da área: ao mesmo tempo em que
nos fortalecemos no mercado, fortalece-se a área, e se cria uma
retroalimentação conjunta que só tem a beneficiar a todos.
Por fim, uma palavra final a
respeito pela riqueza múltipla das RIs: está na nossa formação acreditar em
algum grau de cooperação. É por isso que temos um contato tão fácil com
profissionais de diversas outras áreas. Ao invés de um exclusivismo
profissional, é a chance dos Internacionalistas de, num mundo em grande parte
globalizado, apoiarem não a divisão de atividades em “caixinhas”, mas estimular
a cooperação com cientistas políticas, economistas, historiadores, jornalistas,
geógrafos, juristas, etc.
Quem sabe não podemos ser a ponta
de lança numa nova fase, de disseminação do conhecimento e colaboração entre
diversas áreas, numa nova rede de ação profissional e construção teórica e
prática de um novo mundo.
¹ Gustavo Glodes Blum é Internacionalista
formado pelo Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), e Mestre em Geografia
pela Universidade Federal do Paraná. Atualmente, faz parte do Corpo Docente do
curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA com foco nas áreas de Geografia
Política, Geopolítica e Política Internacional Contemporânea.