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segunda-feira, 18 de maio de 2015

China, Política Brasileira e Desenvolvimento Econômico na Semana Acadêmica do Curso de Relações Internacionais do UniCuritiba

Por Carlos Magno Esteves Vasconcellos[1]



Na semana passada, o Curso de Relações Internacionais do UniCuritiba realizou, nas dependências da instituição, a sua Semana Acadêmica relativa ao primeiro semestre de 2015. Na oportunidade, além de um interessante debate entre atuais acadêmicos e ex-alunos do Curso e hoje profissionais atuantes e bem sucedidos no mercado de trabalho, foram realizadas outras três palestras com temáticas de grande relevância para os internacionalistas, a saber: A ascensão econômica da China e seus reflexos na geopolítica mundial contemporânea; Política e democracia no Brasil, 30 anos depois da redemocratização; Repensando o desenvolvimento econômico: a instrumentalização pela empresa pública – a experiência da Petrobrás, ou a atração do capital estrangeiro.  
  
Na primeira destas palestras, sobre a ascensão econômica da China, os trabalhos foram desenvolvidos pelo cientista político e consultor de empresas Fernando Marcelino Pereira, na condição de palestrante, e pelo administrador de empresas e Professor de Comércio Exterior de nossa instituição, sr. Marcelo Grendel, na condição de debatedor. O tema dispensa comentários no tocante à sua relevância internacional, tendo em vista as transformações pelas quais passou e o lugar que alcançou a China na economia mundial nas últimas décadas. Vale acrescentar que, para os internacionalistas, conhecer melhor o país de Confúcio, de Mao Tsé Tung e de Deng Xiaoping tornou-se uma urgente obrigatoriedade, afinal de contas a China é atualmente nosso principal parceiro comercial.
As exposições orais dos srs. Fernando Marcelino e Marcelo Grendel foram deveras esclarecedoras, permitindo aos presentes construir uma visão muito mais apurada do significado da expansão econômica da China, assim como dos desafios que isso apresenta para o sistema internacional. De modo geral, o assunto foi explanado pelo palestrante através de uma análise bidimensional: primeiro, as grandes políticas econômicas e afins implementadas pelo governo chinês no plano interno; em seguida, as ações estratégicas de política externa. Dois ensinamentos de importância maior podem ser destacados da palestra: primeiro, no plano interno, o fato de que, apesar de todas as reformas econômicas vivenciadas pela China a partir da década de 1970, reformas liberalizantes e facilitadoras de relações sociais capitalistas na economia, o Estado chinês continua a funcionar como o grande guardião e garantidor da prosperidade econômica e da estabilidade social do país. A maior presença do capital privado chinês e do capital privado estrangeiro não eclipsaram a preponderância do Estado no controle da sociedade nacional. Segundo, no plano externo, a extraordinária dependência econômica da China em termos de matérias-primas, produtos agrícolas e mercados consumidores externos. Essa dependência tem dado à política exterior chinesa um perfil extremamente ofensivo e invasivo sobre os mercados internacionais. Aí parece residir um dos pontos de atrito mais sensíveis da política internacional contemporânea. Ao mesmo tempo, para países como o Brasil, faz nascer uma grande oportunidade para a construção de um modelo de cooperação internacional que ofereça alternativas mais auspiciosas ao seu desenvolvimento.
A palestra versando sobre Política e Democracia no Brasil, 30 anos depois da redemocratização, não podia ser mais oportuna. O país saiu no passado recente de um dos períodos mais sombrios de sua história: uma ditadura que durou vinte anos. O fim do capitalismo autoritário no Brasil foi trágico! A ilusão de transformar o país em uma grande potência mundial degenerou-se em um pesadelo de bancarrota econômica e crise social. Em 1985, a redemocratização nacional foi acolhida com grande esperança pela sociedade que acreditava poder reescrever o seu futuro a partir do diálogo social. Contudo, a redemocratização do Brasil chegou com um gosto meio amargo. O primeiro presidente civil do país, após sua redemocratização, surgiu de um arranjo político entre as forças progressistas e as forças do atraso, e acabou favorecendo o representante das forças do atraso, na figura do sr. José Sarney. Quatro anos depois, em 1989, na primeira eleição direta para a presidência da república os brasileiros elegeram o político que se auto intitulava o “caçador de marajás”: Fernando Collor de Mello. Foram dois anos de intenso aventureirismo político. Em 1992, acusado de inúmeras práticas de corrupção, o sr. Collor de Mello renunciava. Em seu lugar, assumia o vice-presidente, sr. Itamar Franco, para o qual ninguém havia depositado um voto sequer nas urnas. Itamar Franco estava fadado a cumprir um mandato sem brilho nem grandes realizações, mas, em seu último ano à frente do Executivo nacional, lançou um novo plano econômico que – ao conseguir domar a inflação - o colocou na história do país: o Plano Real. Surfando na popularidade do Plano Real, Itamar elegeu seu sucessor, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso. FHC governou com apoio popular durante seu primeiro mandato e conseguiu se reeleger depois de aprovar o instituto da reeleição presidencial junto a um Congresso Nacional que lhe era francamente majoritário. Com um segundo mandato desastroso, o sociólogo se viu obrigado à ceder o Palácio do Planalto para outro inquilino: o operário Luis Ignácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores. Quando Lula chegou à Presidência da República uma nova onda de grandes esperanças tomou conta do país. Finalmente, o Brasil parecia estar pronto para romper com toda uma série de más tradições: politicagem, corrupção, nepotismo, etc... Mas, já no primeiro mandato do presidente Lula, as esperanças de um Brasil diferente foram sendo golpeadas pelas denúncias do famigerado mensalão. Vinte e cinco anos após a redemocratização do país e oito anos de governo do Partido dos Trabalhadores as transformações socioeconômicas e políticas do Brasil pareciam pequenas diante das necessidades e das expectativas sociais. Apesar de tudo, em 2010, Lula conseguiu fazer sua sucessora, a presidenta Dilma Rousseff, primeira mulher a ocupar o cargo mais elevado da Republica. As gestões de Dilma Rousseff à frente do Governo Federal têm sido manchadas por denúncias de corrupção e outras práticas políticas fraudulentas que, aliadas aos fracos resultados no campo econômico, vem criando um campo fértil para o ressurgimento de forças políticas conservadoras que suspeitava-se ultrapassadas.
Aonde conduziu-nos a democracia? O que esperar do cenário político-partidário nacional?
As palestras dos professores Violeta Caldeira e Marlus Vinícius Forigo tiveram o propósito de responder a questões como estas. Os dois palestrantes, com formação acadêmica em Ciência Política e vasta experiência no magistério superior em nossa instituição, fizeram uma habilidosa e qualificada discussão sobre o desenvolvimento e o modus operandi da política e do sistema político-partidário brasileiro. Embora tendo se utilizado de métodos diferentes de abordagem, os palestrantes pareceram convergir para uma mesma conclusão: o problema da democracia política nacional é de ordem sistêmica. Isso significa dizer que a simples alternância de governantes à frente do Executivo nada significa. Significa dizer também que, depois de implantada institucionalmente, a democracia brasileira carece de um salto de qualidade, isto é, de uma ampla reestruturação. Com a explanação do professor Marlus Forigo aprendemos que um dos grandes problemas da democracia brasileira foi o processo de desideologização dos partidos políticos identificado, principalmente, nas campanhas políticas e governos de FHC e Lula/Dilma (1995-2015). Com a análise da professora Violeta Caldeira descobrimos, entre outras coisas, que a lógica de funcionamento e relacionamento que o Congresso Nacional impõe aos partidos políticos levou não apenas à criação de uma estrutura de poder altamente hierarquizada dentro dos partidos, mas também a uma forte centralização do poder político partidário nas mãos de suas principais lideranças. Juntando as falas dos palestrantes percebe-se que o sistema político e, portanto, a democracia brasileira perdeu representatividade. Dito de outra forma: a política brasileira tornou-se um campo de batalha descolado dos interesses e anseios políticos da sociedade. Para complicar um pouquinho mais a situação, os palestrantes deixaram a impressão de não acreditarem que o quadro geral apresentado possa ser reestruturado a partir dos partidos políticos ou do Congresso Nacional, mas somente por instituições da sociedade civil organizada.
De um modo geral, a palestra sobre Política e Democracia no Brasil despertou o interesse dos alunos do Curso de Relações Internacionais pois esses puderam compreender que, na ausência de um sistema político representativo, até mesmo a diplomacia brasileira ficará refém do casuísmo político.  
A terceira palestra da Semana Acadêmica esteve sob a responsabilidade das professoras Jaqueline Ganzert Afonso, internacionalista e mestre em Ciência Política pela Universidade de Montreal, Canadá, e Michele Hastreiter, mestre em Direito Internacional pela PUC-PR. As professoras Jaqueline e Michele trouxeram para os acadêmicos de Relações Internacionais do UniCuritiba uma interessante reflexão sobre a problemática do desenvolvimento econômico nacional e do papel que aí desempenha o capital nacional e o capital estrangeiro. Ainda que não seja discutido sob a perspectiva da exclusividade do capital nacional ou do capital estrangeiro no desenvolvimento do Brasil, o assunto suscita polêmica.
A história econômica do Brasil registra um relacionamento intenso e constante com o capital estrangeiro desde a independência, no início do século XIX. Inicialmente sob a forma de capital-dinheiro, depois sob a forma de capital mercadoria e, finalmente sob a forma de capital-produtivo (investimentos diretos) o capital estrangeiro sempre ocupou lugar de destaque na economia brasileira. Excetuando o presidente João Goulart, que acabou destituído do poder por um golpe militar, os governantes do Brasil jamais criaram problemas com os investidores estrangeiros. Nem mesmo Getúlio Vargas, Lula ou Dilma Rousseff, normalmente tidos como presidentes nacionalistas ou esquerdistas, criaram problemas para investidores estrangeiros no Brasil. Hoje, depois de 25 anos de políticas econômicas liberalizantes, o capital estrangeiro possui posição de preponderância inquestionável na economia nacional. Talvez seja esta a razão da polêmica que o tema suscita entre nós: até que ponto, a presença ostensiva do capital estrangeiro em nossa economia deve ser responsabilizada por sua fragilidade e instabilidade? Não seria do interesse do país o fortalecimento das empresas nacionais, de modo a reduzir a dependência econômica em relação aos investimentos estrangeiros? Quais as ações efetivas que o governo brasileiro poderia implementar para facilitar a vida do empresariado nacional e, ao mesmo tempo, limitar o campo de ação e influência das empresas estrangeiras?
A professora Jaqueline Ganzert Afonso se propôs a resgatar, em sua fala, a experiência brasileira com políticas de fortalecimento do capital nacional através da intervenção direta do Estado na economia. Seu objeto específico de reflexão foi a Petrobrás e sua instrumentalização para atender objetivos de uma política de desenvolvimento industrial do país. Por outro lado, a professora Michele Hastreiter trouxe à reflexão as diversas modalidades de acordos internacionais relacionados aos investimentos estrangeiros ressaltando a natureza controversa dos mesmos. Além disso, chamou a atenção do público presente para a assimetria de responsabilidades entre investidores estrangeiros e países hospedeiros nos acordos subscritos até o momento. Tal assimetria se revelaria, segundo a palestrante, através das cláusulas contratuais que, via de regra, estariam preocupadas principalmente com a segurança dos investidores.
Temas variados e atuais, de relevância inquestionável para os acadêmicos do Curso, e discutidos por intelectuais qualificados fizeram da Semana Acadêmica de Relações Internacionais mais um evento de excelência do UniCuritiba. A expectativa que fica é que as sementes de interesse plantadas durante as palestras possam agora frutificar em audaciosos projetos de pesquisa acadêmica.    



[1] Carlos-Magno Esteves Vasconcellos é doutor em Economia pela Escola Superior de Economia de Varsóvia, Polônia. É também professor titular das disciplinas de Economia Política Internacional e Empresas Transnacionais no Curso de Graduação de Relações Internacionais, e do módulo em Economia Política da Globalização da Pós-Graduação em Diplomacia e Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba-UniCtba.   

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