A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais da UNICURITIBA, com a orientação da professora de Direito Internacional Público, Msc. Michele Hastreiter, e a supervisão do monitor da disciplina, Gabriel Thomas Dotta. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores e não refletem o posicionamento da instituição.
A proteção
internacional dos investimentos estrangeiros e o direito à água: o caso
argentino
Emílio Augustin, Luís Gabriel Brito e Francielly Costa
Os recursos hídricos de um Estado
são comumente geridos por órgãos públicos, sendo a gestão por entes privados
pouco usual. Constam, em página da internet do Centro de Parcerias
Público-Privadas em Recursos de Infraestrutura (tradução livre para Public-Private
Partnership in Infrastructure Resource Center) do Banco Mundial, como sendo treze
apenas as nações cujas águas tem envolvimento do setor privado. De todo o
mundo, quando lembramos das dezenas e dezenas de países hoje estabelecidos,
pode-se afirmar que o número de treze é um que caracteriza como exceção o
acesso de entes particulares aos recursos hídricos domésticos – também
denominados “águas interiores” na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito
do Mar.
Inaugurou-se nos anos oitenta a
já citada modalidade de privatização (ou PPP, parceria público-privada), em
1981, no Chile, com o seu Código de Aguas.
Com o passar dos anos, alguns outros governos adotaram medidas semelhantes, e
nos chama a atenção como estudantes de Relações Internacionais o que houve com
a Argentina.
Em Tucumán, na Argentina, foi
organizado um boicote ao pagamento de contas de água. Tal boicote fez com que a
empresa Veolia deixasse a região. Em Santa Fé realizou-se um referendo,
forçando a renegociação do contrato firmado com uma subsidiária da empresa Suez,
que culminou com sua saída. A mesma Suez, em conjunto com outras duas (Aguas
Argentinas e Vivendi) viram-se prejudicadas quando, durante a crise econômica
cujo auge deu-se nos meses entre o final do ano de 2001 e início de 2002, o
governo argentino recusou-se a permitir a elevação de preços por parte de
concessionárias privadas, mesmo diante do caos inflacionário em que estava
inserido o país. A alegação do governo argentino é a de que deveria ser
garantido à população argentina o direito à água, direito humano e fundamental.
As
três empresas, então, entraram com ação no Centro Internacional para a
Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (ICSID na sigla em inglês para International
Center for the Settlement of Investment Disputes). Baseadas nos Acordos Bilaterais de
Investimento existentes entre a Argentina e o país de origem das empresas
envolvidas (França e Espanha), as empresas alegaram que a proibição do reajuste
da tarifa da água consistia em uma expropriação indireta dos investidores
estrangeiros.
Este processo denotou várias
questões com relação ao Direito Internacional dos Investimento Estrangeiros e
os Direitos Humanos e, considerado a essencialidade do serviço prestado pelas
empresas estrangeiras, a decisão
proferida pelo tribunal de investimentos era capaz de afetar milhares de
pessoas, visto que dependiam dos serviços prestados.
Um grupo de empresas não - governamentais
entrou com petição no mesmo ICSID para que houvesse transparência no processo
das águas argentinas e solicitou sua participação como Amicus Curiae (ou amigos
da corte, em latim, cujos papéis seriam o de fornecer suas perspectivas,
conhecimentos e argumentos a fim de auxiliar o tribunal na conclusão). O
tribunal admitiu a petição, os requerentes foram considerados como adequados já
que tinham os três fatores de importância: independência, experiência e
conhecimento, e a transparência foi
compreendida pelos juízes como algo benéfico no processo de arbitragem entre
investidores e Estado. Isto levou, inclusive, ao ICSID a rever suas normas,
aprovou a Regra 37, que entrou em vigor em 10 de Abril de 2006 e regula a
permissão de pessoas ou entidades que não uma das partes em litígio para
apresentar uma petição escrita ao tribunal a respeito de uma questão do âmbito
de algum de seus casos.
Não obstante, o ICSID acabou
considerando que a República Argentina infringiu normas de proteção
internacional dos investimentos estrangeiros e determinou o pagamento de uma indenização, a
título de reparação, na ordem de US$405.000.000,00 para a multinacional Suez.
Sobre o conflito entre a proteção aos Direitos Humanos e a honra aos
compromissos firmados em tratados, Feitosa e Neri concluem que “a compatibilização
dessas duas esferas não é fácil e tem levado a controverter interesses de grande
importância, com clara tendência à ocorrência de afrontas aos Direitos Humanos.”
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Aguas Argentinas
S.A., Suez Sociedad General de Aguas de Barcelona S.A., Vivendi Universal S.A.
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Acesso em 09 de maio de 2016.
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