Páginas

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Redação Internacional: o Brasil nas manchetes do mundo na semana de 16/08 a 23/08

                                               

Por Fernando Yazbek

             O ano de 2020 parece não dar trégua no empilhamento de tragédias. Enquanto o número de mortes pela pandemia do novo coronavírus se aproxima dos120 mil brasileiros, nem a fauna do país está a salvo. O sul do Brasil, que enfrentou duras secas nos últimos meses, registrou temperaturas negativas, chuva congelada e neve nesta semana. Até Porto Velho, capital de Rondônia, teve mínima de 7ºC no coração do norte brasileiro. Apesar da frente fria, o pantanal mato-grossense encara a maior queimada das últimas duas décadas. O jornal inglês The Guardian dá conta de que cerca de 12% da vegetação da floresta foi afetada pelo fogo que ameaça destruir “o maior refúgio de araras azuis ameaçadas de extinção no mundo”. A reportagem traz entrevistas com especialistas locais que garantem que o incêndio generalizado foi provocado pelo avanço da agropecuária. Carlos Rittl, ambientalista ouvido pelo Guardian, acredita que a “hostilidade” do presidente Jair Bolsonaro com as questões ambientais contribui para que “pessoas taquem fogo sem medo de serem punidas”. O Ibama, órgão ambiental, foi enfraquecido na atual gestão federal, relembra a mídia londrina. 


         A mídia catari também destacou as queimadas na salva brasileira, mas desta vez na Amazônia. Al Jazeera, maior agência de notícias da língua árabe, soltou um vídeo sobre a situação dos milhares de focos de incêndio que acometem a floresta. O audiovisual traz depoimento de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, que prometeu esforços para conter uma tragédia ambiental ainda pior do que a do ano passado. A produção relembra que o presidente Jair Bolsonaro acusou o ator e ativista Leonardo di Caprio de ter ateado fogo na floresta e que, recentemente, o vice-presidente Hamilton Mourão convidou o artista para conhecer a Amazônia de perto em uma caminhada.  

           O desmatamento na Amazônia faz com que Berlim esteja cético quanto a ratificação do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, noticiou a Deutsche Welle. O periódico afirma que a chanceler alemã, Angela Merkel, está com “sérias dúvidas” sobre a aproximação dos blocos e que vê as queimadas na região norte do Brasil com “grande preocupação”. Fontes garantem que, depois de reunião com sueca Greta Thunberg e outros ativistas, Merkel firmou compromisso de não assinar o texto presente do acordo. DW recapitula que o tratado de livre-comércio entre os blocos da Europa e da América do Sul, assinado em julho de 2019, está enfrentando resistência cada vez maior dos europeus devido à política ambiental desastrosa do governo Bolsonaro. Além disto, “os ataques ao Estado de direito, aos direitos humanos e à democracia sob o governo brasileiro atual também são argumentos na Europa contra o acordo”, salientou o jornal. 


         Em Portugal, a polêmica administração bolsonarista nas áreas ambientais novamente repercutiu. Desta vez, o tema era a lei de proteção aos povos indígenas, que sofreu uma série de vetos do presidente Bolsonaro que dificultavam o acesso a água, a remédios e a hospitalização para índios. O Público elenca discursos de senadores de diversos partidos e estados criticando os vetos do executivo: “inacreditável”, “crueldade sem limite” e “desumano”, sublinha a imprensa portuguesa. O Congresso conseguiu derrubar os vetos do Palácio do Planalto, um alívio para os mais de 146 povos indígenas afetados pela covid-19. Citando a plataforma de monitoramento da situação indígena durante a pandemia, o Público faz uma cronologia do espalhamento do vírus entre os povos tradicionais sob a “omissão do Estado brasileiro”. Houve mais de 25 mil casos de infecção pelo Sars-Cov2 e perto de 700 mortes de indígenas brasileiros.

          Com os vetos derrubados no Brasil, a família Bolsonaro quis legislar na Argentina. O portenho Clarín noticiou os tuítes do deputado federal pelo Republicanos de SP, Eduardo Bolsonaro, em que o filho do presidente fala de uma “venezuelização” da Argentina. O jornal lembra que o deputado é presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara e um “braço latino americano” de Steve Bannon, “guru da extrema-direita” que foi preso esta semana por fraude nos Estados Unidos. 

            A mídia argentina lamenta que a publicação de Eduardo Bolsonaro tenha acontecido justamente no “melhor momento das relações diplomática entre os dois países nos últimos 9 meses”. Daniel Scioli, embaixador da Casa Rosada, havia se encontrado com Jair Bolsonaro dias antes. Clarín ainda frisou que, durante a pandemia, Brasília deixou de ser a principal parceira econômico de Buenos Aires, que duas décadas depois se voltou a Pequim.

             O New York Times volta a tratar da pandemia no Brasil. Para o jornal estadunidense, a “resposta caótica” ao novo coronavírus do governo brasileiro fez do país uma “oportunidade única” para pesquisadores da vacina. Assim, o Brasil “surge como um potencial e vital ator global para se acabar com a pandemia”, uma vez que as três mais promissoras vacinas do mundo contam com voluntários e cientistas brasileiros. O jornal retoma as falas do presidente que menosprezaram a doença e “sabotaram” as medidas de isolamento e uso de máscara. Pela “desorganizada coordenação brasileira”, países vizinhos ao Brasil militarizaram suas fronteiras e representantes da classe médica pediram a Corte Internacional de Justiça o indiciamento de Bolsonaro por crimes contra a humanidade.

            Times também discorre sobre o sistema público e universal de saúde brasileiro, “um dos melhores programas entre os países em desenvolvimento”. Apesar de ter contido surtos de febre amarela e malária, o SUS tem tido recentes e progressivos desinvestimentos. Além de sobreviver com menores orçamentos, o sistema ainda tem de lutar contra campanhas de desinformação e movimentos anti-vacina, amplamente propagados em mídias sociais. Pela primeira vez em 25 anos, afirma o jornal, o Brasil não bateu as metas de vacinação em 2019. 


         O filme de terror vivido pela menina de dez anos, estuprada desde os seis pelo tio, foi notícia no Le Monde. A criança que engravidou em decorrência da violência sexual conseguiu, na justiça pernambucana, o direito ao aborto legal que fora recusado no Espírito Santo, estado da menina. “À medida que os casos de violência sexual contra crianças se repetem, religiosos conservadores, evangélicos e católicos brasileiros, cada vez mais, se escondem por trás dos ‘valores’ defendidos pelo atual governo”, estampou o jornal francês. Isto porque a criança teve a identidade e o hospital onde realizaria o aborto revelados por militantes de direita nas redes sociais. Deste vazamento, uma pequena multidão se aglomerou em frente ao ambulatório para protestar contra a interrupção da gravidez forçada. 

A ministra Damares Alves chegou a enviar assessores que tentaram convencer a família da menina para que ela mantivesse a gravidez. O Le Monde destaca que, por se tratar de uma menor de 14 anos, cumpriam-se todos os requisitos para a legalidade do aborto num país que é uma democracia laica “apesar” de Jair Bolsonaro e seus apoiadores.


 

Já o espanhol El País tratou de antirracismo, feminismo e transparência para falar sobre a cultura no Brasil. A direção artística do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro foi remodelada para entrar e consonância com estres 3 princípios. Dentre uma centena de candidatos do concurso público para o cargo, Keyna Eleison e Pablo Lafuente vão dirigir o MAM. Ela, carioca negra, e ele, espanhol, aspiram juntos a uma reconfiguração do museu, que pretende reabrir na metade de setembro. 

            Lafuente disse ao jornal que, num país desigual, não se pode anunciar que o museu está aberto e esperar que as pessoas venham: são precisos programas específicos para cada grupo. 



Do guru ideológico preso por fraude a históricos parceiros comerciais receosos, o artigo 4º da Constituição Federal de 1988 vai virando cada vez mais um documento de museu que, ao que tudo indica, se transforma num grande necrotério de cinzas e caixões infantis. 

 

Referências:

ANDREONI, Manuela. LONDOÑO, Ernesto. Coronavirus Crisis Has Made Brazil an Ideal Vaccine Laboratory. The New York Times. Rio de Janeiro, 16 ago. 2020. Disponível em <https://www.nytimes.com/2020/08/15/world/americas/brazil-coronavirus-vaccine.html>

COVID-19: Congresso do Brasil anula vetos de Bolsonaro à lei de proteção indígena. Público. 20 ago. 2020. Disponível em <https://www.publico.pt/2020/08/20/mundo/noticia/covid19-congresso-brasil-anula-vetos-bolsonaro-lei-protecao-indigena-1928696>

EL hijo de Jair Bolsonaro cuestionó el decreto de Alberto Fernández sobre la telefonia celular, Internet y la TV paga. Clarín. Buenos Aires, 22 ago. 2020. Disponível em <https://www.clarin.com/mundo/hijo-jair-bolsonaro-cuestiono-decreto-alberto-fernandez-telefonia-celular-internet-tv-paga-venezuelanizacion-argentina-continua-_0_SzGfphY97.html>

GORTÁZAR, Naiara G. MAM Rio diversifica direção artística para mudar “cultura branca” dos museus no Brasil. El País. 20 ago. 2020. Disponível em <https://brasil.elpais.com/cultura/2020-08-20/mam-rio-diversifica-direcao-artistica-para-mudar-a-cultura-branca-dos-museus-no-brasil.html>

MERKEL diz ter sérias dúvidas sobre acordo UE-Mercosul. Deutsche Welle. 21 ago. 2020. Disponível em <https://www.dw.com/pt-br/not%C3%ADcias/s-7111>

PHILLIPS, Tom. Fears for endagered macaw as fire devastes Brazilian wetland. The Guardian. Brasília, 19 ago. 2020. Disponível em <https://www.theguardian.com/world/2020/aug/19/hyacinth-macaw-brazil-fire-pantanal-endangered-birds>

VIGNA, Anne. Brésil: le gouvernement de Jair Bolsonaro, um relais politique pour les anti-avortement. Le Monde. 21 ago. 2020. Disponível em <https://www.lemonde.fr/international/article/2020/08/22/au-bresil-un-relais-politique-pour-les-anti-avortement_6049646_3210.html>

YANAKIEW, Monica. Amazon fire: Raging blazes raise fears of a repeat of 2019. Al Jazeera. Rio de Janeiro, 21 ago. 2020. Disponível em <https://www.aljazeera.com/news/2020/08/amazon-fire-raging-blazes-raise-fears-repeat-2019-200821112341112.html>


Nenhum comentário:

Postar um comentário