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terça-feira, 7 de abril de 2020

Em pauta: Coronavírus e Refugiados - o que acontece com quem não pode ficar em casa?

Imagem: Campo de refugiados na Grécia em quarentena, após caso de Coronavírus. Fonte - https://oglobo.globo.com/mundo/grecia-poe-segundo-campo-de-refugiados-em-quarentena-apos-novo-caso-de-coronavirus-24352760


Por Alécia Alves*

O novo coronavírus já atingiu mais de 1 milhão de pessoas no mundo, ocasionando em torno de 60 mil mortes e mais de 220 mil pessoas recuperadas desde o início da pandemia. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) trata-se de uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional – o mais alto nível de alerta da Organização” (dados atualizados em 3 de abril). A tendência, segundo especialistas, é que muitas pessoas ainda sejam infectadas antes que o caso se estabilize.

O surto alertou as Organizações Internacionais e levou os Estados a tomarem medidas rigorosas de prevenção, como exigir que a população evite aglomerações, permaneça em suas casas, que não faça contato com outras pessoas e tomem outras medidas como lavar as mãos, não compartilhar objetos e higienizá-los sempre que possível e, em caso de sintomas, procurar um atendimento médico o mais rápido possível. No entanto, existe uma parcela da sociedade que está impossibilitada de seguir as recomendações para evitar o contágio dessa doença: os refugiados.

Como permanecer em casa e evitar aglomerações quando o perigo está em casa e é preciso fugir? Ou, como ficar em casa quando a realidade num campo de refugiados é de pessoas que sequer tem uma casa e que vivem amontoadas umas com as outras em barracas ou ao ar livre?

Embora o coronavírus tenha parado boa parte das atividades econômicas do mundo todo, as causas que levam ao deslocamento forçado de pessoas persistem: perseguições por razões étnicas, religiosas, políticas ou de pertencimento a um determinado grupo social - ou ainda, graves e generalizadas violações de direitos humanos - não deixaram de existir simplesmente porque há uma pandemia em curso. No entanto, obrigados a abandonarem seus países por motivos alheios a sua vontade, os refugiados agora encontram fronteiras ainda mais rígidas e fechadas devido a medidas de alguns governos para evitar a entrada e a saída de pessoas em seus territórios em decorrência da crise do coronavírus.

Aqueles que obtêm sucesso em fugir de situações de conflito, perseguições, problemas econômicos ou ambientais são barrados nas divisas e obrigados a viver em situações desumanas em centros de refugiados, onde aguardam a regulamentação do seu status para que possam de fato migrar com todas as condições dignas de que tem direito. Esse processo, contudo, pode demorar muito mais do que o necessário devido a alta demanda e aos obstáculos e burocracias impostas pelos próprios governos muitas vezes pouco dispostos a acolher esses imigrantes. Durante esse período, aguardam aglomerados mulheres, crianças e idosos em situação de calamidade pública.

Assim, as recomendações de controle da pandemia passam ao largo: tomar banho, lavar as mãos regularmente e evitar aglomerações é praticamente impossível nos cenários de superpopulação e de falta de condições básicas de higiene em que muitos refugiados se encontram. Outros fatores como o debilitado acesso a uma alimentação de qualidade e a carência de serviços médicos básicos também os tornam ainda mais suscetíveis de serem vitimados pela pandemia.

Estima-se que “mais de 70 milhões de pessoas estão em situação de deslocamento forçado no mundo, das quais pouco menos da metade vive em campos de refugiados ou abrigos, em geral superlotados e onde o acesso à rede de esgoto e à água tratada é precário”, segundo O Globo.  

A Grécia, por exemplo, passa por uma das maiores crises humanitárias internacionais e conta com cinco campos de refugiados em suas Ilhas. Dois deles já foram colocados em quarentena, em razão de casos confirmados do coronavirus. De acordo com a BBC Brasil, há em torno de 42 mil pessoas nas ilhas gregas com capacidade para 6 mil imigrantes, dos quais mais de 14 mil são crianças. Um dos casos mais críticos é o de Moria, em Lesbos, o maior campo de refugiados da Europa, que abriga aproximadamente 20 mil refugiados num espaço projetado para 3 mil pessoas. A ilha com cerca 80 mil habitantes, conta com apenas o hospital de Mitilene, que não seria capaz de suportar um possível surto de coronavírus e entraria em absoluto colapso.

Estes refugiados correm ainda o risco de perderem uma das poucas assistências que recebem, que são das ONG Internacionais. Para evitar a entrada do vírus, seria necessário fechar a entrada para os voluntários que vem do continente para as ilhas. Nesse sentido, a tendência é que haja um isolamento total e vidas sejam largadas a própria sorte.

Num cenário em que o mundo está voltado a proteger-se contra o coronavírus nos grandes centros urbanos e pouco tem conhecimento sobre essas situações que acontecem em países em desenvolvimento e em áreas remotas do mundo, os imigrantes que já sofrem preconceito em um contexto normal, em tempos de crise são apontados como inimigos número um e dificilmente serão alvos de proteção e acolhimento no continente Europeu.

Vários outros exemplos como esses poderiam ser citados. Outro caso preocupante se encontra em Bangladesh: a minoria mulçumana rohingyas, perseguida em Mianmar - cerca de 855 mil pessoas - vivem em 34 campos do país com densidade de aproximadamente 40 mil pessoas por metro quadrado.

Os cinco países que mais recebem refugiados são Turquia, Paquistão, Uganda, Sudão e Alemanha, sendo que a maioria vem da Síria, Afeganistão, Sudão do Sul e Mianmar. Tanto os países receptores quanto os emissores de refugiados pouco recebem ajuda do restante da comunidade internacional.

É indiscutível que a crise humanitária na qual os refugiados se encontram é uma bomba relógio cuja responsabilidade permanece sendo jogada de um lado para o outro e sendo protelada até as últimas consequências. Diante da “pandemia de dimensões apocalípticas”  que ora enfrentamos, o relógio da bomba acelera.

Enquanto os países jogam uns para os outros  a responsabilidade de tomar medidas enérgicas para evitar uma grande tragédia, a única certeza que se tem é que toda vida merece ser respeitada e protegida em sua dignidade. Não é porque estamos todos preocupados com nossa própria sobrevivência que devemos esquecer daqueles que já lutaram muito para sobreviver. Que lembremos, também, dos refugiados nesta pandemia.


REFERÊNCIAS



ORGANIZAÇÃO PAN AMERICNA DE SAÚDE; ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDES. Folha informativa – COVID-19. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875. Acesso: 2 de abril de 2020.



O GLOBO MUNDO. Superlotados, campos de refugiados são um dos espaços mais vulneráveis à Covid-19. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/superlotados-campos-de-refugiados-sao-um-dos-espacos-mais-vulneraveis-covid-19-1-24328645. Acesso em: 3 de abril de 2020.


BBBC NEWS BRASIL. 3 crises internacionais 'ocultadas' pelo coronavírus. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-51890194. Acesso em: 03 de abril de 2020.




*Alécia Alves é aluna do 7º período de Relações Internacionais. Este é o seu primeiro texto como membro oficial da equipe do Blog Internacionalize-se.

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