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terça-feira, 2 de abril de 2019

Direito Internacional em Foco: O Pacto Mundial para a Migração:uma análise do posicionamento do Estado Brasileiro.

Maria Eduarda Prux Loewen, Bethânia Marcello Trazer, Yanka Ramos Borges, Maria Clara Guerra Azevedo de Barros, Luiz Guilherme Rostelato Freitas**


Em linhas gerais, o pacto para a migração é uma busca ambiciosa para a regulamentação das condições de migrações ao redor do globo. Não possui caráter vinculativo, isto é, respeitará primeiramente a soberania nacional, mas buscará nortear as ações de cada Estado signatário. Vale salientar que, como o próprio nome diz, o pacto tratara com exclusividade das condições dos migrantes, não nacionais que estão em solo de outro país em busca de trabalho.


 As nuances do Pacto

As primeiras discussões do pacto foram iniciadas em julho de 2018, e foi aprofundado até o dia 8 de dezembro do mesmo ano para que em Marraquexe, Marrocos, ocorresse a assinatura do mesmo. 


O pacto conta com ao todo 23 objetivos a serem buscados pelos signatários. Os objetivos são claros e passíveis de reflexão na realidade, citando os objetivos 9, e 10 em seguida, “Reforçar a resposta transnacional ao contrabando de migrantes” e “Prevenir, combater e erradicar o tráfico de pessoas no contexto internacional migração”. O tráfigo humano, triste realidade vívida por várias pessoas que se encontram em trabalho análogo a escravidão, que são exploradas para fins sexuais, para a adoção ilegal ou para tráfico de órgãos é tratado diretamente no conteúdo do pacto.


Não obstante, existem objetivos que atribuem novas práticas administrativas para o tratamento regular, como o que se encontra nos objetivos 1, 2, e 4, na sequência, “Recolher e utilizar dados precisos e desagregados como base para o políticas”, ”Minimizar os fatores adversos e os fatores estruturais que obrigam as pessoas a deixar seus país de origem”, e “Assegurar que todos os migrantes tenham prova de identidade legal e documentação adequada”.


A regularização e padronização para a migração significa uma maior previsibilidade e segurança para o migrante, além da desburocratização do sistema. Vale salientar que uma desburocratização não significa uma maior facilidade para ingressar no país, mas sim que o processo será mais claro e eficiente. E por fim, com o objetivo 23, que diz, “Fortalecer a cooperação internacional e as parcerias globais para garantir a segurança, ordenação e migração regular”, o Pacto visa relembrar os Estados que, mesmo sendo diferentes nos mais diversos pontos, o interesse em comum deles é com a defesa de seus nacionais onde quer que estejam.


 Simpatizantes e contrários ao pacto

 Dentre os 194 países membros da ONU, países como Áustria, Austrália, Bulgária, Chile, República Tcheca, República Dominicana, Eslováquia, Estônia, Hungria, Itália, Israel, Lituânia, Polônia e Suíça não compareceram à conferência em Marrocos, e não aderiram ao Pacto.


Os Estados Unidos de Donald Trump, se abstiveram das negociações do acordo por pedido direto do governo, balizado pela sua política hiperprotecionista e anti-imigração, adotada pelo atual governo.


 Entre os que não confluíram com o pacto também é preciso mencionar Israel, que embora tenha firmado o acordo já se manifestou dizendo que não o aplicará pela razão das fronteiras do país serem interesses de primeira instância, e em virtude da questão palestina, que a muito vem causando caos na área.


 O Chile também já havia pronunciado contrário, e justificando suas ações afirmando que migrar não é um direito humano.


 A Bélgica, detentora de um governo orientado à direita e fortemente atrelada a questão religiosa, dividida por duas comunidades, a Flamenga e a Francófona, manifestou-se por meio do primeiro ministro, Charles Michel, flamengo, que aderia ao pacto pelo fato de não ter caráter vinculante.


Contudo, a comunidade flamenga fortemente contrária ao avanço da religião islâmica no país, se colocou prontamente contrária a qualquer adesão ao pacto por criar precedentes para ações futuras do Estado.


 Durante a votação para a adesão do pacto, a maioria no governo se posicionou a favor, e o partido que representava a comunidade flamenga se removeu completamente do governo, deixando apenas Charles Michel, que posteriormente renunciou ao cargo por estar a frente de um governo de minoria e insustentável.



Brasil e suas relações com o pacto

Em 2018, o Brasil foi representado pelo chanceler Aloysio Nunes Ferreira na conferência em Marrocos, visando a celebração do pacto. Michel Temer, até então presidente do Brasil, exaltou o acordo e relembrou ainda a aprovação da recente lei de migração brasileira, que facilita a regularização de estrangeiros no território.


Contudo, a afeição do Brasil com o Pacto teve data de validade estipulada, já que, na ocasião, o então futuro chanceler Ernesto Araújo publicou em sua rede social que o país não permaneceria no acordo, afirmando que “O governo Bolsonaro se desassociará do Pacto Global de Migração que está sendo lançado em Marraqueche, um instrumento inadequado para lidar com o problema. A imigração não deve ser tratada como questão global, mas sim de acordo com a realidade e a soberania de cada país”.


Vale lembrar que o Pacto de Migração não tem caráter legalmente vinculante, ou seja, não há sanção para os países que não seguirem suas recomendações. Com apenas nove dias de seu mandato presidencial, o presidente Bolsonaro também se manifestou sobre a decisão, “O Brasil é soberano para decidir se aceita ou não migrantes. Quem porventura vier para cá deverá estar sujeito às nossas leis, regras e costumes, bem como deverá cantar o nosso hino e respeitar nossa cultura. Não é qualquer que entra em nossa casa, nem será qualquer um que entrará no Brasil via pacto adotado por terceiros. NÃO AO PACTO MIGRATÓRIO”.


 As justificativas para a saída do pacto não condizem com a realidade, e a decisão de saída do pacto tem um caráter muito mais estratégico do ponto de vista político, sendo assim, fortalecer a aliança entre Brasil e Estados Unidos, tão almejada pelo governo Bolsonaro. Em encontro recente entre o presidente Jair Bolsonaro e Donald Trump, o presidente do Brasil destacou em entrevista o apoio pelas políticas restritivas de imigração adotadas pelo norte americano, entre elas a construção do muro na fronteira com o México, e relacionou ainda a política migratória com a manutenção da democracia no hemisfério Sul, deixando claro o seu posicionamento diante dos migrantes.



 Sintomas brasileiros espelhados no pacto


A assistência ao imigrante é o básico que um país pode oferecer como forma de garantir a dignidade humana de povos vindos de todos os países, e não somente daqueles que atendem algum interesse do território.


A desistência do pacto é mais um fato que transforma o Brasil num país não atraente para a migração. Em vários momentos da história brasileira, a migração só foi bem vista quando o migrante era europeu, pressupondo que este seja rico e branco. As medidas de “branqueamento” da população após a abolição da escravatura levaram a abertura dos portos para a imigração e, mais tarde, o viés racial tornaria-se ainda mais explícito com a promulgação do DECRETO-LEI Nº 7.967 DE 27 DE AGOSTO DE 1945, que dizia explicitamente em seu artigo 2° que é necessária a defesa da composição étnica, admitindo a migração só em casos de ascendência europeia.


Estes são exemplos para mostrar que o Brasil tem um caráter racista e preconceituoso a respeito da migração. O Brasil, um país multiétnico, formado por migrantes, não deveria abster-se de um Pacto que é tão compatível com a sua população, levando em consideração que de acordo com dados da ONU a migração no Brasil cresceu mais de 20% nos últimos dez anos. Todavia, este é um dado não preciso, uma vez que o tráfico de pessoas e as condições desumanas a que são submetidos os imigrantes irregulares são realidade no Brasil, e muitas vezes há dificuldades para a obtenção de dados estatísticos precisos.


Atualmente, o Brasil possui uma Constituição que prevê igualdade para os não nacionais (salvo exceções especificas como a defesa de cargos estratégicos), conferindo-os segurança e todo o rol dos direitos e garantias fundamentais. Contudo, a realidade é que muitos desses migrantes sequer sabem de seus direitos, e ainda, os não documentados vivem com medo de uma deportação, e por isto, sequer procuram por serviços públicos para fazer valer os seus direitos. Assim, vivem quase que como no limbo do direito. Com sua configuração de governo atual, o Brasil toma uma face muito diferente em vários aspectos, da que vinha sendo construída com a aprovação da Nova Lei de Migração.


 A negação do tratado pressupõe além disso a falta de interesse com os problemas nacionais já apresentados, ou ainda, a má interpretação de textos internacionais, como já visto no parecer do presidente em sua rede social. A forma como o governo busca seus objetivos e estabelece prioridades se mostra com cada ação feita, e com cada oportunidade perdida.


 Segundo o Ministério das Relações Exteriores existem cerca de 3 milhões de brasileiros vivendo no exterior, contudo, o IBGE aponta como 500 mil brasileiros morando no exterior, um número seis vezes menor. Isso se dá pela forma de pesquisa utilizada pelo IBGE, que conta apenas os brasileiros em condições de regularidade, o que revela a possibilidade de 2,5 milhões de brasileiros encontrarem-se em irregularidade administrativa alhures.


 Em contrapartida, segundo dados do IBGE são cerca 400 mil imigrantes residentes no Brasil, cerca de 0,2% da população. Isto significa que há um movimento migratório negativo: menos gente entrando do que saindo do país. Percebe-se, assim, que a conduta do atual governo contra ao Pacto, diferente do como é imaginado, tem muito mais peso sobre os brasileiros fora do país do que com os não nacionais aqui residentes. É o Brasil acima de tudo se colocando acima dos próprios brasileiros.



Referências































**A seção "Direito Internacional em Foco" é produzida por alunos do 3° período do Curso de Relações Internacionais do UNICURITIBA, com a orientação da Profa. Msc. Michele Hastreiter. As opiniões manifestadas no texto pertencem aos autores e não à instituição.






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