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sexta-feira, 12 de agosto de 2016

A TECNOLOGIA ALIADA A SOLIDARIEDADE - RECONECTANDO VIDAS: MIGRAÇÕES FORÇADAS ALÉM DOS NÚMEROS

Por Francielle Guimarães Uber[1]

Em 2015, a População mundial foi estimada em 7,3 bilhões[2]. Uma parcela desse total é assolada pelas migrações forçadas, decorrentes de guerras, fome e das mais diversas perseguições que colocam suas vidas em risco. Segundo o relatório anual “Tendências Globais[3]” produzido pela Agência das Nações Unidas para Refugiados,  e datado do mesmo ano, alguns números resultantes desse panorama são:


São 65,3 milhões de pessoas deslocadas no mundo. Tal dado é composto por 21,3 milhões de refugiados, 40,8 milhões de deslocados internos e 3,2 milhões solicitantes de refúgio.
Em média, 24 pessoas são forçadas a sair de suas casas, a cada minuto, a cada dia, contabilizando aproximadamente 34.000 pessoas por dia. Jovens e crianças abaixo dos 18 anos compõem 51% do total de pessoas deslocadas. Contabilizou-se, ao menos, 98.400 crianças desacompanhadas ou separadas de seus familiares.
Países chamados “em desenvolvimento” hospedaram aproximadamente 13,9 milhões de refugiados e solicitantes de refúgio, enquanto nos países chamados “desenvolvidos”, somou-se aproximadamente 2,2 milhões.
O Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki Moon, alertou que: "Estamos enfrentando a maior crise de refugiados e deslocados do nosso tempo. Acima de tudo, esta não é apenas uma crise de números; é também uma crise de solidariedade".
Os dados são alarmantes. A falta de solidariedade internacional é um problema crescente, grave e de amplo trabalho e discussão.
No entanto, também há solidariedade em meio a tanto sofrimento. Atores não – governamentais tem desenvolvido trabalhos autônomos, ou ainda em parceria com Organismos Internacionais, buscando auxiliar as pessoas que se encontram nessas condições de migrações forçadas.


Na tentativa de minimizar a falta de informação sobre os familiares e amigos que foram deixados para traz durante a fuga, a ONG REFUNITE[4](RU), criada em 2005, resolveu unir tecnologia e inovação para reconectar essas pessoas. Através da parceria com empresas da área de tecnologia e informação, como por exemplo a Ericsson e recentemente a FreeBasics (Facebook), foi ampliado o alcance da ajuda aos refugiados e deslocados internos. A estreita parceria com a ONU, nos campos de refugiados e em diversos pontos na África e Oriente Médio, além de voluntários espalhados por todo o mundo, é fundamental para o sucesso desse trabalho.
A RU não promove a reunião física, no entanto, oferece uma ferramenta segura e anônima de busca, que é preenchida e gerenciada pelo próprio usuário, para garantir a invisibilidade dos que temem ter seus nomes e localização expostos.
Até então, o método utilizado era o de escrever cartas ou ligações telefônicas, quando havia tal possibilidade, e sem a garantia da entrega (no caso da carta), além da incerteza da localização dos familiares, caso ainda estivessem com vida.
Alguns dados importantes do site:
- 500.000 deslocados à procura de familiares desaparecidos, cadastrados na plataforma online;
- Os serviços da RU estão presentes em mais de 15 países;
- Mais de 23 línguas, com novas línguas sendo constantemente sendo adicionadas;
- Refunite & Freebasics[5] - é um pacote de softwares livres disponibilizado pelo Facebook – atualmente está disponível no Iraque, Níger, Libéria, Gana, República Democrática do Congo, África do Sul, Ruanda, Quênia, Tanzânia, Paquistão e Filipinas;
A REFUNITE enfrenta os desafios da tecnologia: construir uma ferramenta tecnológica simples, que beneficie a limitação de usuários de países como a Somália ou o Sudão do Sul. Ou ainda, enfrentar as limitações e as instabilidades do acesso digital móvel, como no Iraque, por exemplo.

Além dos Números

Yonas Samuel, homem de negócios e ativista político da Eritréia, é uma das pessoas que conseguiu se reconectar a sua família através da plataforma da REFUNITE.
Casado e com uma filha, apanhou até quase a morte ao ser acusado pelo governo do Zimbábue por apoiar líderes oposicionistas. Quando recuperou a consciência, já não tinha mais informações concretas do paradeiro da sua família, que havia fugido para um destino desconhecido por ele. Partiu, então, para a África do Sul e passou por diversos países, quando finalmente chegou ao Brasil em março de 2008.
Acreditando que não mais encontraria informações sobre a sua família, visto que já havia dedicado muito tempo e tentado de todas as formas encontra-los, estava cético e cansado. Em São Paulo, finalmente cadastrou-se na REFUNITE, utilizando apenas duas palavras: “expresso” e “Sudão”. A paixão pelo café expresso era reconhecida pela família, portanto ele sabia que era uma característica pessoal forte para ser reconhecido. Do outro lado, a família do Yonas, que encontrava-se refugiada no Reino Unido e estava o procurando constantemente desde a separação, reconheceu a palavra “expresso”. Naturalmente, trocaram mensagens e logo tiveram a certeza que eram pai e filha, esposa e marido.
Ao lembrar da família e recordar alguns trechos de sua história, Yonas sempre dizia emocionado que a dor de não saber se a família dele estava viva ou não, era insuportável. A felicidade do reencontro, ainda que virtual, era de tamanha alegria que ele não imaginava mais poder passar nessa vida.
A história do Yonas é mais do que um número: é a vida humana sendo colocada como prioridade, devolvendo a humanidade a um indivíduo que teve sua vida destruída em incontáveis aspectos. Tive a oportunidade de acompanha-lo, ainda que brevemente, mas o suficiente para acreditar que a tecnologia, aliada à solidariedade, fazem a diferença. Não importa a quantidade de pessoas que se consiga ajudar; o valor de uma só vida é imensurável.



[1] Internacionalista, graduada pelo Centro Universitário Curitiba, e pós-graduada em Gestão de Processos Sociais pelo Centro Universitário Barão de Mauá-SP.
[5] https://refunite.org/free-basics-user-journey-3/

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