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terça-feira, 26 de abril de 2016

Redes e Poder no Sistema Internacional: Impactos da nova LATAM na aviação brasileira e sulamericana


A seção Redes e Poder no Sistema Internacional é produzida por integrantes do Grupo de Pesquisa “Redes e Poder no Sistema Internacional”, que desenvolve no ano de 2016 o projeto “Controle, governamentalidade e conflitos em novas territorialidades” no UNICURITIBA, sob a orientação do professor Gustavo Glodes Blum. A seção busca promover o debate a respeito do tema, trazendo análises e descrições de casos que permitam compreender melhor a inter-relação entre redes e poder no SI. As opiniões relatadas no texto pertencem aos seus autores, e não refletem o posicionamento da instituição.

Impactos da nova LATAM na aviação brasileira e sulamericana

Rafael Veenstra*

A nova bandeira da aviação sul americana, LATAM Airlines, deve começar a cruzar os ares do planeta ainda neste ano de 2016. A marca, fruto da unificação das duas marcas TAM e LAN, foi apresentada ao público em evento realizado em agosto passado na cidade de São Paulo com a presença do CEO do grupo, Enrique Cueto, no qual também foi anunciado que as primeiras aeronaves com a nova identidade devem ser apresentadas já no primeiro semestre desse ano. Além da pintura das aeronaves, a mudança também estará presente nos aeroportos, uniformes, websites e programas de fidelidade das empresas, e deverá se concretizar dentro de 3 anos.
A associação das duas gigantes da aviação sul americana foi anunciada no ano de 2010 e concluída no ano de 2012, com a criação da holding chamada LATAM Airlines Group S/A. A distribuição acionária do grupo se deu de forma que 70,6% estivesse nas mãos do lado chileno e 29,4% do lado brasileiro. A LATAM teria ainda 100% das ações preferenciais (sem direito a voto) da TAM, mas apenas 20% das ações ordinárias. Na ocasião, a movimentação foi vista como uma alternativa criativa para viabilizar o negócio, uma vez que a legislação brasileira não permitia um capital volante estrangeiro superior à 20% nas empresas aéreas – o que impossibilitaria, por exemplo, a compra da empresa brasileira pela chilena.
O grupo conta atualmente com mais de 53 mil funcionários, operando para 144 destinos em 26 países e uma frota de 326 aeronaves, além de receitas operacionais que orbitam a casa da dezenas de bilhão de dólares anuais. São números que posicionam a companhia entre as maiores do planeta e permitem traçar planos arrojados, como a meta anunciada de estar entre os três maiores grupos do globo até o ano de 2018. Além de TAM e LAN,  a bandeira da LATAM, também deve ser passar a estampada pelas subsidiárias da LAN no Perú, Argentina, Colômbia e Equador, além da TAM Mercosur, LAN Cargo e ABSA.
A escolha da identidade visual e do novo logo da companhia - que tem uma forma nos remete ao mapa da América do Sul, fazem um apelo à idéia de conexão e valorização de uma só “Latinoamérica”, da integração. Uma noção de integração, porém, que se restringe aos pontos conectados pela extensa malha ofertada pelo grupo.
Se analisarmos o impacto das operações de uma mega-empresa no âmbito regional, observa-se justamente o contrário, uma vez que há um ambiente amplamente desfavorável à competição e ao equilíbrio do mercado. A família à frente do grupo (e que controla a aérea chilena desde o início da década de 90) é conhecida por sua gestão de “pulso firme” e orientação fortemente voltada a números, cortes de gastos e otimização de recursos. Esta visão não abriria espaço para uma real integração do setor no continente – baseada nas necessidades regionais de fomento da atividade do transporte aéreo, sendo muito mais provável que a atuação nesse sentido se dê a partir da/como conseqüência da consideração de fatores a como a rentabilidade operacional e os interesses próprios de expansão ou manutenção da companhia.
O processo todo coloca o Brasil em uma posição de considerável vulnerabilidade uma vez que, imobilizados, deixamos a cargo da iniciativa privada chilena (ainda que o grupo conte com representantes brasileiros em posições importantes, a palavra final será dada pelos chilenos) uma série decisões estratégicas que tem impacto direto e dizem respeito à circulação de pessoas e acessos, dentro de nosso próprio território. Ao consolidar a união, o grupo LATAM abocanhou também um market share de 75% dos voos internacionais de passageiros do país. Para que se possa dimensionar o tamanho do encolhimento da participação, na década de 90 - com as operações simultâneas de empresas como VARIG, VASP e Transbrasil, os voos internacionais realizados por empresas brasileiras correspondiam a cerca de 60% do total. Estima-se que o número seja inferior a 20%, levando em conta até então a participação majoritária da TAM.
A fusão entre grandes companhias aéreas não é novidade, tendo sido realizada inclusive por gigantes da aviação civil mundial como Air France e a holandesa KLM, que uniram forças no ano de 2004 criando a terceira maior empresa do mundo no segmento. Nesse caso, porém, a aliança preservou as marcas e o funcionamento independente das companhias, e os respectivos governos mantiveram a participação em cotas significativas das respectivas empresas. Há um conjunto de elementos inerentes à atividade que eleva as essas grandes empresas de aviação civil um patamar de “patrimônio nacional”. Observa-se que até mesmo nas regiões do planeta onde as experiências de integração regional avançaram de forma bem sucedida, houve esforços para a preservação das empresas de bandeira nacional. e bandeira brasileira caiu para a casa dos 20%. Com a perda da M responde por 75% do market share no transporte de passageiros

O fim anunciado da TAM, a criação de uma marca de identidade híbrida para ocupar as maiores fatias do mercado doméstico e internacional e a transferência do centro estratégico da aviação civil sul americana para a capital chilena, apresentam uma nova realidade à aviação brasileira. Uma movimentação estratégica que nos colocou, apesar do histórico de pioneirismo e participação ativa no desenvolvimento da aviação civil internacional - e das grandes companhias que já operaram em nosso país, do amplo potencial e das dimensões favoráveis; na incomoda posição de coadjuvantes. Assistimos a essa transição com um ar de incredulidade, mas a um passo nos tornarmos, ao menos no que diz respeito à aviação – e pela primeira vez nessa história, um gigante sem bandeira.


* Rafael Veenstra é graduando do 7º Período do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), e membro do Grupo de Pesquisa "Redes e Poder no Sistema Internacional".

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